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Contra o comunismo demoníaco: o apoio evangélico ao regime militar brasileiro e seu paralelo com o endosso da direita cristã ao governo Bolsonaro

Against diabolic communism: evangelical support to Brazilian military regime and its parallel with the Christian right endorsement to Bolsonaro government

Resumos

Resumo: Desde 2015, evidenciou-se na Câmara dos Deputados uma coalizão entre direita cristã e bancada da segurança. A eleição de Jair Bolsonaro à Presidência em 2018 foi considerada, por alguns autores, um reavivamento de 1964. Dentre os principais integrantes de seu bloco de sustentação estiveram os evangélicos. A aproximação é inédita? Mais precisamente: o posicionamento das lideranças religiosas reformadas e pentecostais sobre o regime militar (1964-1985) se relaciona às posturas políticas da direita cristã hoje? Pretendendo adentrar nessa questão, o artigo revisa a literatura sobre o tema e conclui fazendo paralelos entre o processo iniciado com o golpe contra Goulart e o da segunda década do século XXI, identificando a retórica anticomunista como o traço de continuidade entre os diferentes momentos históricos.

Palavras-chave:
evangélicos; ditadura militar; anticomunismo; governo Bolsonaro


Abstract: Since 2015, a coalition between Christian right and security bench has become evident in the Brazilian Chamber of Deputies. Some authors considered Jair Bolsonaro election in 2018 a revival of the military regime (1964-1985). Evangelicals were in his support block. Is this approach unprecedented? More precisely: is the position of Reformed and Pentecostal leaders about the Brazilian military dictatorship (1964-1985) related to the political postures of the Christian right today? Intending to get in this issue, the article reviews the literature on the subject and concludes drawing parallels between the process started with the coup against Goulart and the second decade of the 21st century, identifying anti-communist rhetoric as the trace of continuity betwixt the different historical moments.

Keywords:
evangelicals; military dictatorship; anti-communism; Bolsonaro government


Introdução

Desde 2015, ficou evidente na Câmara dos Deputados uma coalizão entre a direita cristã1 1 A direita cristã é a resposta religiosa estadunidense às mudanças culturais trazidas pelo feminismo e pelo humanismo secular dos anos 1960, que teriam dissolvido os costumes e os valores sociais; conta com importante base eleitoral no Partido Republicano daquele país (Carranza 2020:179). No caso brasileiro, é composta majoritariamente por evangélicos, mas também por católicos, sobretudo os carismáticos, e, residualmente, por espíritas. e a bancada da segurança. Naquele ano, religiosos e profissionais da segurança pública organizaram-se, de forma transversal aos partidos, para ter maioria expressiva na Comissão de Direitos Humanos e Minorias. O conjunto2 2 Dos 17 titulares, 9 eram evangélicos ou carismáticos e um era militar. Dos 15 suplentes, dois eram evangélicos e cinco eram policiais ou militares. bloqueou a discussão sobre a efetivação do relatório da Comissão Nacional da Verdade.3 3 Reunião Ordinária da Comissão de Direitos Humanos e Minorias, em 15/04/2015, disponível em https://www.camara.leg.br/evento-legislativo/38613, acessado em 27/01/2018. No mesmo ano, sob a Presidência de Eduardo Cunha - o primeiro evangélico a assumir o comando da Casa legislativa - a Câmara aprovou a redução da maioridade penal,4 4 PEC 171/1993. Essa proposta não foi votada pelo Senado. tendo evangélicos como protagonistas de discursos, encaminhamentos de votação e relatoria, enfatizando a defesa da família e dos “cidadãos de bem”, opondo-os aos inimigos públicos jovens infratores. Na deliberação da PEC, 83% dos evangélicos se posicionaram a favor da matéria, enquanto 68% do conjunto dos deputados o fez (Lacerda 2019:103-107).

Também sob a condução de Cunha, a Câmara aprovou a transformação do homicídio de policiais - e não o cometido por policiais - em crimes hediondos.5 5 PL 3131/2008, transformado na Lei nº 13.142/2015. Deputados evangélicos apresentaram requerimentos para agilizar a votação, realizaram as relatorias e foram, ao lado dos policiais, os principais articuladores para o sucesso da iniciativa (Lacerda 2019:114-118). Capitão Augusto, deputado conhecido por usar o uniforme militar nas sessões parlamentares, atual líder da bancada da segurança, explicou em entrevista à articulação entre as frentes da segurança e evangélica: elas “se ajudam”, “correm juntas”; possuem “os mesmos valores”, inclusive os da “família” e da “moral” (Medeiros; Fonseca 2016MEDEIROS, Étore; FONSECA, Bruno. (2018), Bíblia, boi e bala: um raio-x das bancadas da Câmara. Exame. Disponível em: Disponível em: https://exame.com/brasil/biblia-boi-e-bala-um-raio-x-das-bancadas-da-camara/ . Acesso em 17 de dezembro de 2020.
https://exame.com/brasil/biblia-boi-e-ba...
).

Três anos depois, em 2018, Jair Messias Bolsonaro, ex-militar, foi eleito Presidente da República, encampando luta contra o petismo e contra a corrupção, defesa enfática dos princípios neoliberais, simbologia bélica e valores da direita cristã (Lacerda 2020LACERDA, Marina Basso. (2020), “Jair Bolsonaro: a agenda defendida em sua trajetória política”. In: J. L. P. Guadalupe; B. Carranza. (ed.). Novo ativismo político no Brasil: os evangélicos do século XXI. Rio de Janeiro: Konrad Adenauer Stiftung .). Os integrantes de seu bloco de sustentação foram expressos por ele em seu pronunciamento após a vitória em primeiro turno: evangélicos, forças armadas, policiais e defensores da família tradicional (Bolsonaro 2018BOLSONARO, Jair. (2018), “Entrevista programa Jornal Nacional da Rede Globo de televisão em 8/10/2018”. Jornal Nacional. Disponível em: Disponível em: https://globoplay.globo.com/v/7074274/ . Acesso em 17 de dezembro de 2020.
https://globoplay.globo.com/v/7074274/...
). Os evangélicos aderiram em peso a Bolsonaro - fizeram-no as principais lideranças, como Silas Malafaia, da Assembleia de Deus, e Edir Macedo, da Igreja Universal do Reino de Deus (Iurd), e a maioria dos membros da respectiva bancada no Congresso Nacional (Ig 2018IG. (2018), “Após ruralistas, bancadas evangélica e da bala sinalizam apoio a Bolsonaro”. IG. Disponível em: Disponível em: https://ultimosegundo.ig.com.br/politica/2018-10-03/apoio-a-bolsonaro-deputados.html . Acesso em 17 de dezembro de 2020.
https://ultimosegundo.ig.com.br/politica...
). Estima-se, com dados do Datafolha (Baloussier 2018BALOUSSIER, Ana Virginia. (2018), “Com 60%, Bolsonaro mais que dobra vantagem sobre Haddad entre evangélicos, diz Datafolha”. Folha de S. Paulo, Disponível em: Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/poder/2018/10/com-60-bolsonaro-mais-que-dobra-vantagem-sobre-haddad-entre-evangelicos-diz-datafolha.shtml . Acesso em 17 de dezembro de 2020.
https://www1.folha.uol.com.br/poder/2018...
) e do Estudo Eleitoral Brasileiro, que 70% dos votos válidos dos evangélicos foram para o ex-capitão - o que significou uma mudança em relação ao pleito anterior, quando os votos desses religiosos se equilibraram entre PT e PSDB no segundo turno - tendo sido, a mobilização dos evangélicos, “um dos fatores determinantes para a vitória de Bolsonaro”6 6 No Brasil, entende-se que não há voto confessional, no sentido de que a religião de um candidato seja o fator determinante para o voto dos fiéis, pois existem vários critérios - não necessariamente religiosos - para a decisão do eleitor evangélico. No máximo, há uma tendência de que “irmão vota em irmão”, indicando um voto denominacional. Mesmo essa lógica seria válida apenas para o Legislativo, e não para o Executivo (Boas 2020:125; Guadalupe 2020:63-77; Valle 2019). Supõe-se que a eleição de Bolsonaro em 2018, porém, tenha sido uma exceção nessa tradição, ocorrendo, ali, para a Presidência da República, um voto confessional (Guadalupe 2020:77). Comprovam o argumento os dados relembrados por Nicolau (2020:846-868): Anthony Garotinho, evangélico, que concorreu pelo PSB nas eleições de 2002, foi o primeiro candidato competitivo à presidência que fez um apelo especial aos evangélicos, mas não o conseguiu - parte expressiva das lideranças apoiou Lula. Marina Silva, assembleiana, não conseguiu o apoio de lideranças das principais denominações evangélicas para suas campanhas em 2010 e 2014. Pastor Everaldo, candidato pelo PSC (partido ligado às Assembleias de Deus) em 2014, obteve apenas 2,6% dos votos válidos. Mas cerca de 70% dos evangélicos apoiaram Bolsonaro em 2018. (Nicolau 2020:884-950).

A adesão dos evangélicos a Bolsonaro em parte, certamente, explica-se como retribuição pelas sinalizações que ele ofereceu à direita cristã. Desde 2011 o então deputado protagonizou a agenda moral conservadora, central aos religiosos, chegando a cunhar a expressão “kit gay”7 7 Vital e Lopes (2013:16-118) demostram que há certa disputa pelo protagonismo em relação ao tema. Os autores resgatam pronunciamento de Bolsonaro no Plenário da Câmara, em 8 de dezembro de 2010, em que o então parlamentar alerta que, no ano seguinte, o Governo Federal deveria distribuir um “kit contra a homofobia” nas escolas, e apelado pela atenção da bancada religiosa para o assunto, pois, no seu entender, ela ainda não teria conhecimento sobre o caso. Os autores também apresentam entrevista com a então assessora da Bancada Evangélica, atualmente Ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves, que afirma que foi o ativismo cristão que chamou atenção de Bolsonaro para o tema, e não o contrário. para se referir ao Programa Escola Sem Homofobia, proposto pelo então Ministro da Educação Fernando Haddad - depois do que Bolsonaro quintuplicou sua votação para deputado federal (Lacerda 2020). Logo após anunciar sua candidatura à Presidência, em 2016, Bolsonaro se batizou no Rio Jordão, em Israel, pelas mãos do pastor Everaldo - mantendo, assim, nas palavras de Oualalou (2019OUALALOU, Lamia. (2019), “Los evangélicos y el hermano Bolsonaro”. Nueva Sociedad, 280: 10.:68), “uma ambiguidade religiosa produtiva”, tornando-se evangélico sem deixar de ser católico. Como pontua Jairo Nicolau (2020:895), Bolsonaro foi o primeiro candidato competitivo desde a redemocratização a mencionar Deus em um lema de campanha.

No entanto a centralidade do belicismo e da adesão à Ditadura Militar (1964-1985) no repertório de Bolsonaro é grande demais para ter sido ignorada pelos líderes religiosos. Fez parte de sua agenda, de maneira constante e consistente, desde sua atuação parlamentar, passando por sua campanha, e seguindo em sua gestão como Chefe de Estado, a defesa explícita e constante do regime de exceção, justificado no combate ao comunismo e a seus expoentes (Lacerda 2020).

O deputado se manifestou textualmente a favor da tortura. Em relação aos restos mortais dos desaparecidos políticos, tinha cartaz afixado em seu gabinete com a mensagem: “quem procura osso é cachorro” (Bf 2019BF, Brasil de Fato. (2019), “Bolsonaro encerra grupos responsáveis por identificar ossadas de vítimas da ditadura”. Brasil de Fato. Disponível em Disponível em https://www.brasildefato.com.br/2019/04/22/bolsonaro-encerra-grupos-responsaveis-por-identificar-ossadas-de-vitimas-da-ditadura . Acesso em 17 de dezembro de 2020.
https://www.brasildefato.com.br/2019/04/...
). No impeachment de Dilma Rousseff, em 2016, Bolsonaro louvou Brilhante Ustra, primeiro agente do Estado oficialmente declarado responsável por sequestro e tortura no regime militar. Durante a campanha presidencial, em entrevista, Bolsonaro disse que o período ditatorial no Brasil foi um período muito bom (Buarque 2018BUARQUE, Daniel. (s. d.), “Em entrevista a rádio dos EUA, Bolsonaro defende a ditadura militar”. Blog do Brasilianismo, Disponível em: Disponível em: https://brasilianismo.blogosfera.uol.com.br/2018/07/31/em-entrevista-a-radio-dos-eua-bolsonaro-defende-a-ditadura-militar/ . Acesso em 17 de dezembro de 2020.
https://brasilianismo.blogosfera.uol.com...
). O discurso de Bolsonaro abrindo pela primeira vez a Assembleia Geral da ONU é exemplo contundente do resgate da mentalidade de Guerra Fria como elementar à sua agenda de governo: ao mesmo tempo em que o Presidente brasileiro elogiou os resultados da ditadura de 1964 - “vencemos aquela guerra e resguardamos nossa liberdade” -, ele atualizou os inimigos socialistas, que seriam hoje Cuba, Venezuela e o Foro de São Paulo, associando-os aos ataques que eles promoveriam aos valores familiares e religiosos tradicionais (Bolsonaro 2019BOLSONARO, Jair. (2019), “Discurso do presidente Jair Bolsonaro na abertura da 74ª Assembleia Geral das Nações Unidas - Nova York, 24 de setembro de 2019”. Presidente da República Federativa do Brasil - Discursos, Disponível em: Disponível em: http://www.itamaraty.gov.br/pt-BR/discursos-artigos-e-entrevistas-categoria/presidente-da-republica-federativa-do-brasil-discursos/20890-discurso-do-presidente-jair-bolsonaro-na-abertura-da-74-assembleia-geral-das-nacoes-unidas-nova-york-24-de-setembro-de-2019 . Acesso em 17 de dezembro de 2020.
http://www.itamaraty.gov.br/pt-BR/discur...
).

Para Singer (2020:1), “a chegada ao Planalto de um ex-capitão do Exército, e admirador da ditadura, reviveu 1964”. Também para Schwarz (2019SCHWARZ, Roberto. (2011), “Neoatraso bolsonarista repete clima de 1964, diz Roberto Schwarz”. Folha de S. Paulo , QUAL A DATA? Disponível em: Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/ilustrissima/2019/11/neoatraso-bolsonarista-repete-clima-de-1964-diz-roberto-schwarz.shtml . Acesso em 17 de dezembro de 2020.
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), há bastante em comum entre a vitória de Bolsonaro e o golpe de 1964: em ambos os casos “um programa francamente pró-capital mobilizou, para viabilizar-se o fundo regressivo da sociedade brasileira, descontente com os rumos liberais da civilização”. Para Anderson (2019ANDERSON, Perry. (2019), Brazil Apart: 1964-2019. [Kindle edition ed]. Nova Iorque: Verso.: 213), a colonização do governo Bolsonaro pelos militares faz a ponte de 55 anos entre 1964-2019 ter a fórmula de uma “parábola”.

Ainda que existam respostas exploratórias, são dois temas em aberto entender a adesão dos evangélicos ao atual presidente e como e por que se formou a aliança entre expoentes das forças de segurança e evangélicos no Congresso. Dentro dessas questões mais amplas (por que o apoio da direita cristã a Bolsonaro? E por que a aliança, que o precede, entre religiosos e agentes de segurança?), elemento a investigar é: a aproximação é inédita? Mais precisamente: como foi o posicionamento das lideranças religiosas reformadas e pentecostais sobre o regime militar? À época, para elas, o regime foi motivo de adesão, de rejeição ou de indiferença? Como isso se relaciona à linha da direita cristã hoje? Essas perguntas é que se pretendem responder com este artigo, que faz uma revisão da literatura a respeito da atuação dos protestantes durante a ditadura iniciada em 1964 e, ao final, a relaciona com posturas atuais do grupo político.

O apoio evangélico ao golpe de 1964

No campo evangélico, em 1964, havia no Brasil as igrejas protestantes históricas (ou reformadas ou de missão) - Luterana, Presbiteriana, Congregacional, Anglicana, Metodista e Batista - e, no campo pentecostal, a Assembleia de Deus, presente no Brasil desde meados de 1910 ao lado de outras denominações menores. O neopentecostalismo surgirá na década de 1970 e se expandirá apenas na seguinte, marcadamente com a fundação da Igreja Universal do Reino de Deus (Mariano 1996MARIANO, Ricardo. (1996), “Os Neopentecostais e a Teologia da Prosperidade”. Novos Estudos CEBRAP, 24: 21.:24-25).

A literatura aponta que a postura hegemônica dos líderes evangélicos reformados e pentecostais foi de adesão ao regime. Esses religiosos deram apoio “quase unânime ao golpe de Estado” de 1964. Sua relação com o governo era “vista como muito próxima”, e eles foram até mesmo considerados “sustentáculos civis” da ditadura (Freston 1993:157-158, 172). De acordo com a Comissão Nacional da Verdade (CNV 2014:177), a “postura oficial das igrejas protestantes diante do golpe militar de 1964, por meio de suas lideranças, pode ser classificada, de modo geral, como de apoio, sendo este imediato, da parte de presbiterianos e batistas, ou cauteloso, da parte de metodistas, episcopais e luteranos”. Para Chesnut (1997:147-148), a Assembleia de Deus, por sua vez, “era tão radicalmente anticomunista quanto os generais”.

As mobilizações populares de trabalhadores e o perfil do governo João Goulart tinham forte oposição da liderança evangélica. Em novembro de 1963, meses antes do golpe militar, milhares de evangélicos realizaram o Dia Nacional de Jejum e Oração pela Pátria, “para que Deus salvasse o País do perigo comunista”. Já o movimento da “Marcha da Família com Deus pela Liberdade”, iniciado em março de 1964, teve participação protestante ao lado de forças católicas, leigas e clericais (Campos 2014aCAMPOS, Leonildo Silveira. (2014a), “O Protestantismo de Missão no Brasil, cidadania e liberdade religiosa”. Educação e Linguagem, 17: 76-116.:99; 2014bCAMPOS, Leonildo Silveira. (2014b), “Os Evangélicos, o Golpe e a Ditadura: O Irresistível Canto das Sereias Autoritárias”. In: Z. M. Dias. (ed.). Memórias Ecumênicas Protestantes - Os Protestantes e a Ditadura: Colaboração e Resistência. Rio de Janeiro: Koinonia Presença Ecumênica e Serviço .:184).

O golpe militar que derrubou aquele presidente “foi saudado pela maioria dessas igrejas como ação divina contra os que estavam levando o País ao caos” (Baptista 2007BAPTISTA, Saulo de Tarso Cerqueira. (2007), Cultura política brasileira, práticas pentecostais e neopentecostais: a presença da Assembleia de Deus e da Igreja Universal do Reino de Deus no Congresso Nacional (1999 a 2006). São Paulo: Tese de doutorado, Universidade Metodista de São Paulo.:188-189). Em consequência, uma nova convocação, em 21 de abril de 1964, reuniu evangélicos para agradecer a Deus por ter “ouvido as orações de seu povo” (Campos 2014b:184) - a crença em uma bênção divina era generalizada entre os protestantes (Cavalcanti 2002CAVALCANTI, Robison. (2002), Cristianismo e política: Teoria Bíblica e Prática Histórica. Niterói: Editora Ultimato.:215).

Razões do apoio

O apoio pentecostal ao regime se deveu a dois fatores: o ideológico e o pragmático. Pragmaticamente, de acordo com Freston (1993:158), a comunidade evangélica era “sequiosa de status” e carente de apoio governamental. Para Campos (2014a:82), o golpe proporcionou uma oportunidade inédita para os evangélicos “de legitimar, apoiar e participar tanto da montagem como da manutenção de um regime político no Brasil, ainda que de exceção”.

Isso foi uma via de mão dupla. O regime militar deu apoio aos evangélicos de diferentes matizes,8 8 Não foram os evangélicos os únicos solicitados pelo regime. Paulo Maluf, por exemplo, procurou fortalecer os laços com a umbanda, e João Figueiredo, com os espíritas. Em 1980 foi criado o feriado pelo dia da Padroeira do Brasil, Nossa Senhora Aparecida, santa católica (Freston 1993:158). devido à perda do apoio da Igreja Católica ao governo (sobretudo no pós-1968, assunto que retomaremos adiante), e devido ao rápido crescimento da força protestante desde 1930 (Fernandes 1981:58; Freston 1993:158).9 9 Para as razões do crescimento protestante, ver Mariano (2008) e Mariano (2011). Como mostram dados dos Censos Demográficos, em 1950 havia 1,7 milhões de evangélicos no Brasil; em 1970, já eram 4,8 milhões de fiéis; em 1980, 7,9 milhões.10 10 Em 1970, os evangélicos representavam 5,2% da população brasileira; em 1980, 6,6%; em 1991, 9% (13,2 milhões) (Jacob 2003:34). Em 2000, os evangélicos saltaram para 15,4% (26,2 milhões). Em 2010, 22,2% (42,3 milhões) (IBGE 2010). Em 2019, estima-se que são 31% dos brasileiros (Datafolha 2020).

O regime, assim, investiu nos protestantes: visitas de cortesia, empregos, convênios, nomeações para cargos importantes, ministração de aulas de moral e civismo. Além disso, os religiosos atuaram como estagiários nos cursos da Escola Superior de Guerra (ESG) ou estudaram nos cursos patrocinados pela Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra. Esses cursos foram parte relevante da estratégia de cooptação. Fizeram cursos na ESG vários constituintes evangélicos de 1987 e outros líderes proeminentes, como o pastor presbiteriano Guilhermino Cunha, que foi representante protestante na Comissão Afonso Arinos, e como o “Billy Graham brasileiro”, Nilson Fanini11 11 Em 1982, Nilson Fanini promoveu uma grande passeata chamada Deus Salve a Família, que encheu o Maracanã. Na ocasião, Presidente Figueiredo não só participou, como também foi até o pódio, de onde elogiou o império Reencontro, de Fanini. Em seu discurso, registrou que “no mundo tumultuado pela mudança constante,” o programa de Fanini “preserva os valores elementares da criatura humana, da sua dignidade e da sua espiritualidade” (Cowan 2014:124). (Campos 2014a:102; Freston 1993:158).

Combinando elementos ideológicos e pragmáticos, pesou o medo de as igrejas perderem seu direito ao culto (Guadalupe 2020:20). Como disse o Estandarte, jornal oficial da Igreja Presbiteriana,

Os governantes comunistas de Cuba, da Alemanha Oriental, da China, da Tchecoslováquia e de outros países estão impedindo a pregação gospel. Qual é nossa atitude em relação ao regime diabólico, penetrando poderosamente como um touro furioso matador? É óbvio que o Brasil é o alvo para que toda a América do Sul seja subjugada ao regime leninista. Os comunistas irão nos roubar nosso direito de culto. (Estandarte 11/63) (Chesnut 1997CHESNUT, R. Andrew. (1997), Born Again in Brazil: The Pentecostal Boom and the Pathogens of Poverty. New Brunswick: Rutgers University Press.:148)

Do lado ideológico, falou o anticomunismo. O golpe foi visto como salvaguarda contra as possíveis ameaças soviéticas demoníacas (Santos 2005SANTOS, Lyndon de Araújo. (2005), “O púlpito, a praça e o palanque: os evangélicos e o regime militar brasileiro”. In: A. de Freixo; O. Munteal Filho. (ed.). A ditadura em debate: Estado e sociedade nos anos do autoritarismo. Rio de Janeiro: Contraponto.:161-162). As mobilizações populares e o perfil do governo João Goulart “assustavam a maioria dos evangélicos e em grau superlativo os pentecostais”. Os pentecostais tinham “pavor do comunismo e o consideravam inimigo mortal”, e “em geral associavam mobilizações dos trabalhadores, como passeatas, comícios e greves, com estratégias dos comunistas para solapar a ordem constituída” (Baptista 2007:182-183, 188-189).

Para Baptista (2007:182-183, 188-189), a “origem norte-americana de muitos missionários, formados dentro de uma ideologia antissoviética”, foi o fator determinante para essa marca na mentalidade dos evangélicos. Também para Chesnut (1997:147-148), no caso das Assembleias de Deus, foram decisivas para o apoio ao regime militar suas raízes estadunidenses, imbuídas da mentalidade da Guerra Fria. De acordo com o autor, pastores da igreja alertaram seus fiéis, em linguagem apocalíptica, a respeito da “besta” comunista.

Como aponta Campos (2014b:178, 181, 185, 187-188), o protestantismo de missão no Brasil, por sua vez, ainda que herdeiro das ideologias liberais norte-americanas, adotou mentalidade e práticas autoritárias no contexto do regime militar brasileiro, sobretudo em alívio pelo afastamento do “perigo comunista”. Essa lógica era dualista: Deus e diabo, capitalismo e comunismo, Washington e Moscou, dentro de uma crença de que o “Deus dos exércitos” estava com eles e que, portanto, a batalha contra os poderes diabólicos do comunismo ateu e anticristão já estava ganha. Para o autor, nos meios evangélicos predominava a ideia de que o golpe fora a melhor alternativa para um país ameaçado pelo poderio militar da URSS ou pelo exemplo de Cuba ou da China.

Esforço da direita cristã estadunidense na América Latina no contexto da Guerra Fria

Houve uma ação organizada da direita cristã estadunidense na América Latina, no contexto da Guerra Fria, em enfrentamento ao efeito de movimentos de esquerda: da Teologia da Libertação - surgida no seio da Igreja Católica na década de 1960 e presente sobretudo em El Salvador, México, Equador, Peru, Brasil e Uruguai; das revoluções na Guatemala (1944-1954) e na Nicarágua (1979-1990); do ecumenismo protestante, tido como próximo do marxismo assim como a Teologia da Libertação; e de governos progressistas na Argentina, no Brasil, no Peru, no Uruguai, no Chile, na República Dominicana (Grandin 2006GRANDIN, Greg. (2006), Empire's Workshop: Latin America, the United States, and the Rise of the New Imperialism. Nova Iorque: Metropolitan Books.; Stoll 1990).

Encorajados pela Casa Branca - sobretudo a partir da eleição de Ronald Reagan12 12 A vitória de Reagan é, em parte, tributária do crescimento da direita cristã nos Estados Unidos. Consolida esse processo a criação, em 1979, das organizações Voz Cristã e Maioria Moral. A primeira foi impulsionada por Robert Grant e Richard Zone. Seus membros pertenciam a 37 denominações, mas a maior parte dos ativistas vinha das igrejas Batista e Assembleias de Deus. A Maioria Moral, organização com 100 mil membros, foi fundada por Jerry Falwell. Chegou a ter mais de 300 estações de televisão e 280 de rádio, presente em 31 estados norte-americanos (Diamond 1995:174-175; Finguerut 2009:121-122; Flores 2020; Guth 1983:37; Petchesky 1981:217). -, esses religiosos usaram suas missões para promover a agenda do governo dos Estados Unidos e para dissuadir pessoas de entrarem em movimentos que lutaram por mudança social, em suas formas comunistas, socialistas, nacionalistas, terceiro-mundistas ou religiosas. Investigações do Congresso dos Estados Unidos chegaram a confirmar o uso de missionários pela CIA (agência de inteligência daquele país) na América Central. Os evangélicos entendiam seu trabalho na América Latina como contribuindo para uma missão bíblica, combinando um desejo ardente de ganhar o mundo para Cristo com as pretensões de hegemonia norte-americana (Grandin 2006:159-160; Kourliandsky 2019KOURLIANDSKY, Jean-Jacques. (2019), “Democracia, evangelismo y reacción conservadora”. Nueva Sociedad, 280: 9.: 141; Steigenga; Cleary 2007STEIGENGA, Timothy J.; CLEARY, Edward L. (2007), “Understanding Conversion in the Americas”. In: T. J. Steigenga; E. L. Cleary (ed.). Conversion of a Continent: Contemporary Religion Change in Latin America. New Brunswick, New Jersey and London: Rutgers University Press. : 3-32.:15-16; Stoll 1990STOLL, David. (1990), Is Latin America Turning Protestant? The Politics of Evangelical Growth. Berkeley: University of California Press [Edição Kindle].:1784-1818, 1926). Nas palavras de um missionário citado por Stoll (1990:1692): “Deus tem sua mão especialmente sobre os Estados Unidos da América porque aí está o potencial para a evangelização do mundo, e a evangelização do mundo é o principal propósito de Deus.”

No suporte às operações na América Central havia mais de uma dúzia de organizações da direita cristã. Elas arrecadavam dinheiro, suprimentos médicos, alimentos, bíblias; estabeleceram escolas, clínicas e missões religiosas. As entidades atuavam com estratégias de ajuda humanitária e operações psicológicas, incluídas na noção de “conflito de baixa intensidade”. A direita cristã em particular aplicava sua noção de “guerra espiritual” ou confrontação religiosa com o mal (Diamond 1995DIAMOND, Sara. (1995), Roads to Dominion: Right-Wing Movements and Political Power in the United States. Nova Iorque: Guilford Press.:238-239; Grandin 2006:170-171, 191-193; Stoll 1990:320, 327-335, 1958, 2047; 1993STOLL, David. (1993), “Introduction”. In: D. Stoll;V. Garrard-Burnett. (ed.). Rethinking Protestantism in Latin America. Philadelphia: Temple University Press.:2-3).

Para além da América Central, os veículos mais visíveis eram os programas de televisão, que ofereciam uma mistura harmoniosa de patriotismo, capitalismo e anticomunismo. Por exemplo: o pregador Jimmy Swaggart, ligado às Assembleias de Deus, tinha seus programas transmitidos em três mil estações espalhadas por mais de 140 países, alcançando meio bilhão de pessoas (Stoll 1990:1964, 1977). No Brasil, seu programa era apresentado pela Rede Bandeirantes às manhãs de sábado.

A National Religious Broadcasters, rede de radiodifusão evangélica, tinha várias filiais na América Latina. Uma das maiores ficava no Brasil, onde, na década de 1980, “a NRB financiou a construção de estações de rádio cristãs brasileiras, uma escola de treinamento técnico para radiodifusores cristãos e um transmissor de ondas curtas” (Diamond 1989:42-43). Na década de 1980, os dubladores brasileiros dos televangelistas recebiam treinamento nos EUA. As editoras evangélicas, aportadas no Brasil desde a década de 1960, publicavam conteúdo inspirado na direita cristã norte-americana. Elas associavam o comunismo e a União Soviética com forças diabólicas, e Estados Unidos, capitalismo e Israel com as fronteiras do Reino de Deus (Santos 2005:163).

Também no Brasil, pessoas que ocupavam cargos estratégicos em organizações missionárias ou evangelizadoras eram militares reformados e agentes ligados às chamadas comunidades de inteligência, em particular a CIA (Bittencourt Filho 2014BITTENCOURT FILHO, José. (2014), “Da aventura Protestante... Apontamentos para reflexão”. In: Z. M. Dias (ed.). Memórias Ecumênicas Protestantes - Os Protestantes e a Ditadura: Colaboração e Resistência. Rio de Janeiro: Koinonia Presença Ecumênica e Serviço.:19). O Brasil era, no mundo, o país que mais tinha missionários protestantes norte-americanos, sendo que essa quantidade nada menos que triplicou entre 1960 e 1970 (Fernandes 1981FERNANDES, Rubem César. (1981), “As missões protestantes em números”. Cadernos do ISER, nº 10: 27-84.:41, 58).

Entendia-se que a palavra de Cristo e que os valores do capitalismo de livre mercado deveriam ser os vigentes. O capitalismo é, nessa cosmovisão, um sistema ético, que corresponde à dádiva de Deus que é o livre arbítrio. Os evangélicos relacionavam o lucro com o projeto divino para o homem (Diamond 1989DIAMOND, Sara. (1989), Spiritual Warfare: The Politics of the Christian Right. Boston: South End Press.:84; Grandin 2006:5, 19, 164; High 2009HIGH, Brandon. (2009), “The Recent Historiography of American Neoconservatism”. The Historical Journal, 52, nº 2: 475-491.:489). No caso brasileiro essa ofensiva evangélica visava sobretudo a contrapor a Teologia da Libertação, já mencionada, e a formular uma ideologia moral de livre mercado. A reivindicação católica de redistribuição de riqueza, segundo a direita cristã, basear-se-ia em um entendimento incorreto da sociedade, estimulando a culpa, a inveja e o conflito. O Reino de Deus seria estabelecido não pela guerra entre as classes, mas pela luta entre e bem e o mal (Grandin 2006:164).

Por essas razões, assessores de Reagan, preocupados com o avanço da Teologia da Libertação, reuniram-se em Santa Fé, na Califórnia, em 1980 e em 1989. Eles entendiam-na como um perigo para o capitalismo, defendendo que a política externa norte-americana deveria confrontar o movimento católico. Para eles, as forças marxista-leninistas usaram a Igreja como arma política contra a propriedade privada e o sistema capitalista de produção (Löwy 1996LÖWY, Michael. (1996), The War of Gods: Religion and Politics in Latin America. London: Verso.:66). A Teologia da Libertação estava até mesmo sendo investigada pelo Senado dos EUA em uma subcomissão dedicada ao terrorismo. Os trabalhos do colegiado indicaram que a corrente católica era uma “estratégia cubano-soviética para subverter o hemisfério” (Stoll 1990:1853-1862).

Chilton (1981CHILTON, David. (1981), Productive Christians in an Age of Guilt Manipulators: A Biblical Response to Ronald J. Sider. Tyler: Institute for Christian Economics.:92), do Institute for Christian Economics, definiu que a pobreza era resultado “do controle de Deus sobre culturas pagãs: elas devem passar tanto tempo cuidando de sua sobrevivência que serão incapazes de exercer domínio ímpio sobre a terra”. Como Grandin (2006:164) argumenta, a elaboração evangélica em contraponto à Teologia da Libertação estava em plena consonância com esse pensamento da nova direita. Se o que há não é luta de classes, se o que há é recompensa do bom trabalho e punição do mau, o poderio norte-americano sobre ao mundo, e em especial sobre a América Latina, seria simples expressão da bênção divina.

A posição da presidente da organização evangélica pró-família Concerned Women for America, Beverly Lahaye (1984LAHAYE, Beverly. (1984), Who But a Woman? Nashville: Thomas Nelson Publishers.:9 apud Diamond 1989:1948), também confirma a convergência de visão entre a ideologia capitalista e essa versão do cristianismo. Ela afirma na introdução do seu livro Who But a Woman? que a derrocada de João Goulart no Brasil em 1964 foi uma derrota do comunismo depois que “vários homens de negócios proeminentes começaram a se reunir informalmente em 1961 para deter a imersão do Brasil no totalitarismo”. LaHaye elogia como formaram células para organizar orações, marchas, compra de tempo de antena de televisão e espaço de jornais para proclamar sua mensagem anticomunista.

Cisões nas igrejas

As igrejas, os líderes religiosos e os fiéis, porém, não caminharam em uma única direção. O relatório da Comissão Nacional da Verdade (Cnv 2014:157) concluiu que a atividade de católicos e protestantes dos anos 1950 e 1960 foram determinantes para os processos de estabelecimento e consolidação do regime militar no Brasil. Pelo lado católico, a emergência de ações de promoção dos direitos humanos, a expansão de projetos sociais e educacionais e a realização do Concílio Vaticano II, iniciado em 1962 por iniciativa do Papa João XXIII. Pelo lado protestante, a Confederação Evangélica do Brasil (CEB), expressão mais intensa do movimento ecumênico, e os movimentos de juventude das igrejas avançavam na promoção de projetos educativos e em ações sociais. Nesse contexto, a CEB organizou, em 1962, no Recife, a Conferência do Nordeste intitulada nada menos que Cristo e o Processo Revolucionário Brasileiro (Vilela 2012VILELA, Márcio Ananias Ferreira. (s. d.), “‘Cristo e o processo revolucionário brasileiro’: a Conferência do Nordeste e a responsabilidade social da Igreja Presbiteriana do Brasil”. XI Encontro Nacional de História Oral - Memória, Democracia e Justiça, Disponível em: Disponível em: https://www.encontro2012.historiaoral.org.br/resources/anais/3/1338502095_ARQUIVO_CristoeProcessoRevolucionarioBrasileiro-aConferenciadoNordesteearesponsabilidadedesocialdaIPB.pdf . Acesso em 17 de novembro de 2020.
https://www.encontro2012.historiaoral.or...
).

Entretanto, em 1968, ano do Ato Institucional nº 5, os caminhos de católicos e protestantes se separam. Entre os primeiros, deixou de funcionar a estratégia do regime e da cúpula da Igreja de isolar os esquerdistas. Nas igrejas evangélicas, os progressistas é que ficaram isolados (Freston 1993:158).

No caso católico, conforme as medidas autoritárias e a repressão aumentavam, incluindo a prisão de padres, o apoio ao regime foi diminuindo, de modo que o AI-5 consolidou uma espécie de rompimento entre Igreja e militares. Situação notória foi a dos dominicanos, como dos freis Betto, Tito, Ivo e Fernando, que se aproximaram de Carlos Marighella e da Ação Libertadora Nacional, com quem contribuíram realizando tarefas de apoio. Frei Tito foi preso em 1968 e submetido à tortura. Suas memórias se transformaram em símbolo da luta por direitos humanos.13 13 Informações disponíveis em memoriadaditadura.org. Ao mesmo tempo, a partir de 1968, iniciou-se o processo de constituição da Comissão Brasileira de Justiça e Paz (CBJP), que começou suas atividades em 1971. A partir daí, foram criadas as comissões estaduais, entre elas a CBJP de São Paulo (Cnv 2014CNV - Comissão Nacional da Verdade. (2014), Relatório - Volume II. :159).

O historiador Paulo Cesar Gomes (2014) aponta que, na Igreja Católica, no início do regime soou mais alto a voz dos que o defenderam, tendo essa sido a postura oficial da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil - a ponto de mesmo Dom Helder Câmara, perseguido pelo regime desde 1966, ter mantido a princípio uma postura cordial com o governo, acreditando que os próprios militares reestabeleceriam o regime democrático. A partir do AI-5, porém, tornou-se hegemônica a condenação da violência e de defesa dos direitos humanos - a tortura foi mencionada pela primeira vez pela CNBB em documento oficial somente em 1970.14 14 Para as teorias institucional, marxista e weberiana a respeito da postura de resistência, por parte da Igreja Católica, ao regime militar, ver Gomes (2014:16-20). Ainda para Gomes, embora a Igreja nunca tenha se comportado de modo unívoco e nunca tenha rompido totalmente com o governo, com o endurecimento do regime ela foi um dos poucos espaços que permitiram uma resistência democrática - sendo que, posteriormente, com a abertura, a imagem de uma igreja combativa foi muito reforçada.

Entretanto, no que diz respeito ao ponto de inflexão que foi o AI-5, no campo evangélico se passou o contrário. Para Leonildo Campos (2014a:102; 2014b:187), os evangélicos de missão - presbiterianos, presbiterianos independentes, metodistas, batistas, e parte dos luteranos - passaram a endossar o regime com mais força a partir de 1968. O autor pontua que fez parte desse apoio o silêncio quanto aos desrespeitos aos direitos humanos como a prática de sequestro, tortura, banimento de seus e assassinatos de presos políticos, ao longo de 21 anos de governo autoritário. O autor dá um exemplo, com o texto do Estandarte de 15 de outubro de 1970:

(...) lamentamos como o governo da nação, a quem muito respeitamos e admiramos, tomou a iniciativa de legalizar a loteria esportiva, este mesmo governo que vem lutando com todas as armas para destruir a força da subversão. Damos graças a Deus pelos resultados positivos já alcançados, mas não concordamos, em hipótese alguma, com o jogo aberto e desenfreado que se estabeleceu no país, com a prática da loteria esportiva. Repetimos: admiramos o governo da revolução pela ordem que impôs ao país, pelos benefícios que as medidas governamentais vêm oferecendo a todos nós. É a disciplina em todos os setores criando a ordem e possibilitando o alcance do progresso. (Estandarte de 15/10/70 em Campos 2014a:103)

Campos (2014a:103) pondera: esse texto é emblemático porque, exatamente na época de maior repressão, “o que escandalizava os evangélicos era a decisão do governo de aprovar a Loteria Esportiva”, ao mesmo tempo em que permanecia o entusiasmo e o louvor pelos feitos resultantes da administração militar do País. É também o que concluiu a Comissão Nacional da Verdade (Cnv 2014:177): “o conservadorismo, que sempre foi a tônica entre os evangélicos, provocou a omissão das igrejas frente à imposição da ditadura militar no Brasil e também tornou possível o alinhamento de boa parte das lideranças evangélicas com o governo de exceção”.

Dentre os pentecostais, vale o registro do caso da Assembleia de Deus no Pará, a maior assembleia da época. Contando com apoio certo dos evangélicos, o regime suspendeu nos primeiros cinco anos a ajuda financeira à unidade de Belém. É que “os generais neste momento não viram necessidade de financiar uma organização que tinha demonstrado uma lealdade inabalável para com a sua causa” (Chesnut 1997:148). Além disso, nos primeiros anos do regime a Igreja Católica, maior instituição religiosa do país, ainda dava apoio ao governo militar.

Todavia, em 1968, o governo restabeleceu o auxílio. Para Chesnut (1997:148-149), isso se deveu ao acirramento dos ânimos entre o regime militar e a Igreja Católica na Amazônia a partir desse ano. Foi quando um grupo de 36 padres da região norte pediram atuação mais forte da Igreja em relação aos mais vulneráveis e aos projetos de desenvolvimento agressivos para a região. Religiosos emitiram denúncia da violência estatal e privada contra os camponeses, e bispos divulgaram uma declaração pedindo reforma agrária. O regime respondeu violentamente. Sacerdotes que trabalhavam com pobres na região do Araguaia foram espancados. Ainda de acordo com o autor, ao “defender a causa da reforma agrária e do socialismo, a CNBB Regional Norte 1 e 2 transformou a antiga Amazônia marginal no ponto focal do conflito entre a Igreja e o Estado”.15 15 A tensão entre os bispos das regiões Norte e Nordeste e o governo seguiram tensas. Em 1970, bispos da Regional Norte II emitiram declaração em que rompiam com o desenvolvimentismo dos governantes e pregavam “uma autêntica reforma das estruturas e da política agrária” (Gomes 2014:53).

Quando, nas palavras de Chesnut (1997:149-152), a Igreja Católica passou a pedir a destruição do capitalismo autoritário, quem iria abençoar a inauguração de projetos governamentais e conferir legitimidade religiosa em cerimônias oficiais? Tanto o governador do Pará à época, Alacid Nunes, quanto Jarbas Passarinho, paraense, Ministro da Educação e cabeça do comando militar na região, substituíram os católicos por “aqueles que compartilhavam a mesma visão de mundo”. A Assembleia de Deus em Belém passou então a receber “substancial ajuda financeira, favores políticos e o prestígio social de servir como principal cliente religioso do regime”. Em troca, a denominação, “profundamente politizada”, “entregou votos, apoio ideológico e legitimação divina do projeto autoritário”.

Para Cowan (2014COWAN, Benjamin Arthur. (2014), “‘Nosso Terreno’ crise moral, política evangélica e a formação da ‘Nova Direita’ brasileira”. Varia Historia, 30: 101-125.:112, 113, 119), é da época do regime militar que a direita cristã brasileira, então embrionária, passou a gravitar em torno de dois termas: o de que haveria uma crise no “nosso terreno” - ou seja, os campos da moralidade, da espiritualidade e da sexualidade privadas -; e de que o comunismo e o ecumenismo constituiriam ameaças. Essas questões é que, de acordo com o autor, desenharam as divisões que separaram os evangélicos em círculos eleitorais de esquerda e de direita, sendo o último triunfante, embora o primeiro tenha sempre e até hoje existido e persistido.

Evangélicos contra a ditadura

Como registra a Comissão Nacional da Verdade em seu relatório final, a resistência existiu entre protestantes, mas não de forma oficial; foi assumida por indivíduos e grupos vinculados ao movimento ecumênico ou que tinham, no seu histórico, uma formação teológica que levava a uma prática de engajamento social. Muitos ingressaram em organizações de oposição à ditadura, atuaram até mesmo na clandestinidade e pagaram o preço por esse compromisso (CNV 2014:177).

Em outras palavras, no caso dos evangélicos, com o avanço do regime, fiéis, clérigos e iniciativas que defendiam o evangelho social tenderam a ficar isolados, como já dito, tornando-se hegemônica ali uma visão teológica que primava pela preocupação com conversão e salvação da alma (Vilela; Porfírio; Barros 2015VILELA, Márcio Ananias Ferreira; PORFÍRIO, Pablo Francisco de Andrade; BARROS, Arthur Victor Gonçalves Gomes de. (2015), “A trajetória de João Dias de Araújo em tempo de Ditadura: do Seminário Presbiteriano do Norte à Justiça do Trabalho”. Paralellus, 6, nº 12: 14.:245). Os irmãos Paulo e Jaime Wright, filhos de missionários presbiterianos dos Estados Unidos, são casos emblemáticos - o primeiro, um dos fundadores da Ação Popular, e o segundo idealizador do livro Brasil Nunca Mais (Freston 1993:159). Ocorre que Paulo Wright fora expulso da Igreja Presbiteriana de Florianópolis, onde antes tinha sido presbítero (Campos 2014b:182).

Outro caso de destaque, que mostra a diferença entre fiéis e lideranças, é o corrido em 1967, quando formandos da Faculdade de Teologia de São Bernardo do Campo convidaram para paraninfo o bispo D. Helder Câmara, ícone da Teologia da Libertação; houve conflito com a direção, ameaça de greve de fome. Tudo isso resultou no fechamento da escola e o reinício no ano posterior com novos alunos e professores. No mesmo ano, conflito semelhante ocorreu na Faculdade de Teologia da Igreja Presbiteriana Independente (Campos 2014a:108).

A Conferência do Nordeste Jesus Cristo e o Processo Revolucionário, citada anteriormente, teve resistência de presbiterianos de Recife, que reagiram à instalação delatando seus participantes, em especial o reverendo João Dias de Araújo (Campos 2014b:184). Araújo, entre as décadas de 1960 e 1970, era docente do Seminário Presbiteriano do Norte, na cidade do Recife e, em 1962, propôs uma mudança no conteúdo teológico dos currículos, para desenvolver uma teologia que conhecesse as lutas e o sofrimento do povo. Araújo chegou a elaborar discursos de Francisco Julião, líder das Ligas Camponesas, e tinha publicações como O jovem cristão e o jovem comunista e Como o cristão deve encarar o comunismo?. Logo após o golpe de 1964, passou a ser alvo de ataques de lideranças evangélicas, o que levou à sua expulsão do Seminário em 1970 (Vilela; Porfírio; Barros 2015).

Redemocratização: ainda o anticomunismo

A eleição de 1986 para a Assembleia Nacional Constituinte é o marco da participação dos evangélicos na política institucional. Foram eleitos 33 ou 34 membros protestantes; na legislatura anterior havia apenas entre 10 e 14 - os números variam conforme o autor. Os pentecostais foram a grande novidade. De dois, passaram a ser 18, 14 deles da Assembleia de Deus. A partir de 1987, a Assembleia de Deus conta com 26 mandatos - contra quatro da Igreja Universal do Reino de Deus e três da Igreja do Evangelho Quadrangular. O Brasil se torna, então, o primeiro caso de presença parlamentar significativa por parte de minoria protestante num país de tradição católica (Freston 1993:1-2, 197; Mariano; Pierucci, 1992MARIANO, Ricardo; PIERUCCI, Antônio Flávio. (1992), “O envolvimento dos pentecostais na eleição de Collor”. Novos Estudos Cebrap, 34: 92-106.:93; Pierucci, 1989PIERUCCI, Antonio Flávio. (1989), “Representantes de Deus em Brasília: a bancada evangélica na Constituinte”. In: ANPOCS, A. N. d. P.-G. e. P. e. C. S. (ed.). Ciências Sociais Hoje. São Paulo: Vértice/Editora Revista dos Tribunais, :104-132.:105-109).

Para Pierucci (1989:105-106, 108), a virada ocorrida na Assembleia Nacional Constituinte celebra uma passagem de busca, por parte do evangelismo conservador, de espaço e de publicidade, em dois sentidos: visibilidade para si diante da opinião pública e presença ativa na esfera pública propriamente dita. Os evangélicos constituíram o primeiro grupo suprapartidário de constituintes, unidos por um tema e não em torno de uma sigla. A meta geral do apostolado parlamentar era, para o autor, de que a Constituição da República se baseasse na Bíblia. Para Chesnut (1997:155), a agenda conservadora da bancada evangélica da ANC seria a mesma daquela da direita cristã norte-americana: combate à homossexualidade, ao aborto e ao comunismo. Ele relata entrevista que fez com o deputado bispo Rodrigues, “firme defensor dos militares brasileiros”:

Durante nossa entrevista de quatro horas, Rodrigues lançou uma tirada contra a deputada federal Benedita da Silva quando solicitei sua opinião de sua irmã petista na fé. Ele a considerava mais comunista do que crente por se recusar a assinar sua proposta condenando a perseguição dos cristãos no bloco soviético e por sua defesa dos direitos homossexuais. (Chesnut 1997:155)

Ainda sobre o contexto da redemocratização, André Singer (2000SINGER, André. (2000), Esquerda e Direita no eleitorado brasileiro: a identificação ideológica nas disputas presidenciais de 1989 e 1994. São Paulo: Edusp; Fapesp.) registra que, nas primeiras eleições diretas em 1989, quando se esperava deixar a era da direita no poder, elegeu-se Presidente da República outro quadro originário da Arena, Fernando Collor. Por isso, para o autor, o ciclo conservador de longa duração iniciado durante a ditadura terminou apenas com o impeachment do político de origem alagoana. A direita voltaria ao centro da administração nacional 26 anos depois, com Bolsonaro.

Ambos, Collor e Bolsonaro, prossegue Singer, eram outsiders que tomaram quase inesperadamente o núcleo da política no Brasil. Como argumenta o autor, o que os dois políticos fizeram foi ativar o direitismo, um no contexto do retorno da democracia, e outro no contexto de derrocada da esquerda. Semelhante a Bolsonaro, Collor venceu o PT articulando denúncias de corrupção e anticomunismo - “mix típico de 1964” (Singer 2020:3). Ambos os líderes conservadores, ainda de acordo com Singer, procedem a uma permanente agitação, voltada para manter a centro-direita soldada ao bloco da direita. Fizeram-no com a lógica de construção do inimigo. Daí, em 1989, ter-se espalhado que Lula obrigaria famílias ao compartilhamento de moradias e, em 2018, que o PT promoveria a “venezuelização” do Brasil (Singer 2020SINGER, André. (2020), “A reativação da direita no Brasil”. Manuscrito submetido à publicação.:14).

Contudo não é só isso. Em 1989, as preferências dos pentecostais inclinaram-se fortemente para a direita, representada por Collor. As causas do apoio foram o anticomunismo dos pastores, o medo da perda do direito ao culto e a aliança do Partido dos Trabalhadores com setores progressistas da Igreja Católica. De acordo com levantamento de Chesnut (1997) na Assembleia de Deus em Belém, 83% apoiaram o candidato eleito, e apenas 4% Lula. Uma fiel assembleiana descreveu as razões:

Muitas pessoas, tanto na igreja quanto no exterior, dizem que Lula é comunista, o pastor nos aconselhou a votar em Collor por causa daquela coisa comunista. Em tempos de eleição, o dirigente sempre diz na igreja que temos que votar pela pessoa certa. A verdade, eu não sei o que é o comunismo, sei que ele sempre falou sobre o comunismo, que devíamos ter cuidado, não sei o que é o comunismo, mas votei por Collor. (Chesnut 1997:160)

Pesquisa de campo de Mariano e Pierucci (1992:96) revelou que a polaridade ideológica dos candidatos finalistas, Lula à esquerda e Collor à direita, “praticamente não deixava outra opção à quase totalidade dos pastores pentecostais, fobicamente anticomunistas”, de modo que optaram por Collor, envolvendo-se “em sua campanha até a medula, não poupando esforços e argumentos para promovê-lo entre os fiéis e satanizar seu concorrente”. As inúmeras divisões denominacionais e teológicas, as rivalidades históricas, a ferrenha concorrência diária por fiéis não impediram o consenso a que chegaram quase todas as igrejas pentecostais naquele momento. “Elas colloriram.”

Os autores explicam que, para que os eleitores crentes votassem em Collor, “as lideranças pentecostais usaram o argumento da ameaça: votar no Partido dos Trabalhadores (PT) seria o mesmo que entregar o futuro de suas igrejas a uma tenebrosa aliança católico-comunista” - a proximidade do PT com a Igreja Católica era uma desqualificação a mais para um partido já estigmatizado por ser de esquerda. “Comunismo com catolicismo: a liberdade religiosa dos evangélicos estava duplamente ameaçada” (Mariano; Pierucci 1992:92, 104).

Jairo Nicolau (2020NICOLAU, Jairo. (2020), O Brasil dobrou à direita: uma radiografia da eleição de Bolsonaro em 2018. [Kindle Edition]. Rio de Janeiro: Ed. Zahar.:824-950) compara a eleição de Bolsonaro com a eleição de Collor, no sentido de que ambas foram aquelas que tiveram grande mobilização de evangélicos, sendo que, agora, o grupo religioso representa um contingente muito maior do eleitorado. O que parece é que a reativação da direita, promovida em 1989 e em 2018, na expressão de André Singer, contou em ambos os casos com a militância evangélica contra a esquerda ou o comunismo.

Hipótese do pragmatismo: os evangélicos teriam apoiado o regime militar por tenderem a apoiar qualquer governo?

Mencionou-se que foram duas as causas do apoio dos evangélicos ao regime militar: a pragmática, relacionada às vantagens de estar ao lado dos detentores do poder, e a ideológica, resultante do anticomunismo. Haveria uma preponderância do primeiro fator? Em outras palavras; os líderes evangélicos apoiaram o regime militar devido sobretudo a uma tendência de apoiar qualquer governo?

Essa pergunta é feita porque grupos evangélicos, liderados pela Iurd, foram aliados de primeira hora de Lula e de Dilma em suas duas campanhas vitoriosas e em seus mandatos. A Iurd inclusive travou “duros embates” no campo pentecostal para “desconstruir a associação da candidata Dilma com os temas polêmicos da descriminalização do aborto e da união civil de pessoas do mesmo sexo”, em 2010 (Machado 2012MACHADO, Maria das Dores Campos. (2012), “Aborto e ativismo religioso nas eleições de 2010”. Revista Brasileira de Ciência Política. : 25-54.:27). A Universal, para apoiar Lula a partir de 2002, passou por uma “autotransformação acelerada”, já que, até então, nas eleições presidenciais de 1989 e 1994, era opositora ferrenha do Partido dos Trabalhadores (Baptista 2007:229).

Alexandre Brasil Fonseca (2008FONSECA, Alexandre Brasil. (2008), “Religion and Democracy in Brazil: A Study of the Leading Evangelical Politicians”. In: P. Freston. (ed.). Evangelical Christianity and Democracy in Latin America. New York: Oxford University Press. [Kildle Edition].:pos. 4433, 4518, 4546) explora as possíveis causas na mudança da postura da Iurd, apoiando um governo de esquerda ou centro-esquerda. Ele elenca a preocupação da denominação de realizar-se bem politicamente para pôr fim à imagem difundida de exploração dos pobres na cobrança de dízimos; a mudança de percepção a respeito do Partido dos Trabalhadores, que não estaria mais contra a religião; e a percepção de que uma postura de subordinação aos partidos conservadores não garantiu os benefícios almejados pela Igreja. Além disso, como o autor pondera, a “liderança da Iurd não podia ignorar o grande desejo de mudança entre a maioria da população após oito anos do governo Cardoso”.

No entanto a postura de apoio que a Iurd foi repetida pela outra principal denominação, a Assembleia de Deus?16 16 Sublinhe-se a mudança ocorrida dentro do campo evangélico, com crescimento da relevância dos pentecostais e neopentecostais. Se, em 1980, 3,4% dos brasileiros eram evangélicos não pentecostais e 3,2 eram pentecostais (Bohn 2004), em 2010, 4% se declararam evangélicos de missão, 13,3% pentecostais e 4,8% de denominações evangélicas não determinadas (IBGE 2010). Para o ano de 2016, estimou-se que a Assembleia de Deus conte com o maior número de membros em todo o Brasil, representando 34% do total. Ela é seguida pela Igreja Batista, com 11% dos fiéis, e pela Igreja Universal do Reino de Deus, com 8% (Datafolha 2016). No caso das campanhas de Lula de 2002, apenas alguns pastores assembleianos apoiaram-no, enquanto a postura oficial da AD foi de ser contrária a ele. Em 2006, novamente, Lula teve apoio de alguns líderes da Assembleia, enquanto a Convenção Geral das AD apoiou Alckmin (Rafael Bruno 2010GONÇALVES, Rafael Bruno. (2010), “Religião e representação política: a presença evangélica na disputa eleitoral brasileira”. Revista Espaço Acadêmico, 10, nº 116.:17, 19). Em 2010, a Assembleia dividiu-se entre Marina Silva (PV), Dilma Rousseff (PT) e José Serra (PSDB) (Machado 2012:27). Na campanha de 2014, a Assembleia fez campanha para o Pastor Everaldo (PSC) e Marina Silva (PV) (Viegas 2014VIEGAS, Nonato. (2014), “Assembleia de Deus troca pastor Everaldo por Marina Silva”. O Dia. Disponível em: Disponível em: http://odia.ig.com.br/eleicoes2014/2014-09-14/assembleia-de-deus-troca-pastor-everaldo-por-marina-silva.html . Acesso em 17 de novembro de 2020.
http://odia.ig.com.br/eleicoes2014/2014-...
). Ou seja, a Assembleia, apesar de seu histórico conservador, conferiu algum apoio ao PT até 2010 - provavelmente contaram, para a postura dividida, o aspecto pragmático, de um lado, mas a oposição ideológica, de outro.

O que parece, sim, é que o apoio mais duradouro da Iurd ao governo PT é que se constituiu uma exceção na tendência hegemônica - mas não homogênea - entre os evangélicos. Praticamente todo o campo evangélico, porém, já havia abandonado o PT quando da votação do impeachment de Dilma (Braga; Ventura 2016BRAGA, Isabel; VENTURA, Manoel. (s. d.), “Bancada evangélica anuncia apoio ao impeachment de Dilma”. O Globo. Disponível em: Disponível em: https://oglobo.globo.com/brasil/bancada-evangelica-anuncia-apoio-ao-impeachment-de-dilma-19032782 . Acesso em 17 de dezembro de 2020.
https://oglobo.globo.com/brasil/bancada-...
), comprovando que nunca houve aproximação ideológica, ou que a aproximação programática sempre foi muito fraca. Embora exista versatilidade política no campo evangélico (Guadalupe 2020GUADALUPE, José Luis Pérez. (2020), “Brasil e os novos atores religiosos da política latino-americana”. In: J. L. P. Guadalupe; B. Carranza. (ed.). Novo ativismo político no Brasil: os evangélicos do século XXI. Rio de Janeiro: Konrad Adenauer Stiftung . : 117-110.:23), como pontua Kourliandsky (2019:141), as alianças entre pentecostais e partidos de esquerda são de natureza excepcional, sendo a norma as alianças com a direita.

Conclusão: paralelos

Com base no exposto, é possível afirmar que o apoio majoritário (portanto, não integral) dos líderes evangélicos ao regime militar foi decisivo para a formação da aliança entre parlamentares evangélicos e da segurança pública no século XX? É possível concluir que esse apoio foi determinante para que a maior parte dos líderes evangélicos de projeção nacional tenham apoiado Jair Bolsonaro, um defensor explícito da ditadura, à Presidência da República? Não, não é possível firmar essas assertivas contundentemente. Em parte, porque as organizações religiosas, como sujeitos históricos, não são estanques nem se desenvolvem de maneira linear ao longo do tempo. Em parte, porque essas conclusões, com os dados atuais, seriam precipitadas, sendo necessárias mais pesquisas sobre o assunto. No momento, porém, é possível identificar uma semelhança marcante entre o processo iniciado em 1964 e o atual: a retórica anticomunista, associada à ideia de que não há luta de classes, mas luta entre o bem e o mal. E que o mal está à esquerda.

Desde a Assembleia Constituinte, quando os evangélicos ingressaram com mais força no parlamento brasileiro, apesar de tensões internas, a maioria desses religiosos decidiu por atuar em temas morais, como combate ao aborto, às reivindicações dos homossexuais e às drogas (Chesnut 1997:155; Pierucci 1989:102-106). Sobre a política contemporânea, Vital e Lopes (2013VITAL, Christina; LOPES, Paulo Victor Leite. (2013), Religião e política: Uma análise da atuação de parlamentares evangélicos sobre direitos das mulheres e LGBTs no Brasil. Rio de Janeiro: Fundação Heinrich Böll; Instituto de Estudos da Religião.:22-24, 178) identificam como central à atuação da bancada evangélica seu ativismo em relação aos costumes. Dantas (2011DANTAS, Bruna Suruagy do Amaral. (2011), Religião e Política: ideologia e ação da “Bancada Evangélica” na Câmara Federal. São Paulo: Tese de doutorado em Psicologia Social, Pontifícia Universidade Católica.:174-194) argumenta que o trabalho da frente parlamentar evangélica é um trabalho de “resistência aos avanços sociais, às reivindicações dos movimentos progressistas e à transformação da sociedade” no sentido de combater a “liberalização da vida social”.

Entretanto esse não é seu único tema de atuação. Dos 13 deputados evangélicos mais ativos, desde 2013, em defesa da família patriarcal, 12 deles se manifestaram contra a alguma expressão do socialismo do século XXI,17 17 O bolivarianismo venezuelano se coloca como equivalente contemporâneo do comunismo. Essa é a expressão do próprio líder da Revolução Bolivariana. Hugo Chávez declarou, ao ser reeleito em 2006, que assumia “o compromisso de dirigir a Revolução Bolivariana até o socialismo do século XXI” (Capital 2013). seja contra o bolivarianismo, seja contra os exemplos de Cuba, Bolívia e Venezuela. Os argumentos são variados: às vezes em nome do cristianismo, às vezes por razões econômicas, às vezes porque o bolivarianismo (assim como o petismo) seria, em si, um mal (Lacerda 2019LACERDA, Marina Basso. (2019), O novo conservadorismo brasileiro: de Reagan a Bolsonaro. Porto Aegre: Zouk.:146-156).

As conclusões de Cowan (2014:112, 121) vão ao encontro desse raciocínio. Para o autor, as divisões que apareceram no campo evangélico entre as décadas de 1960 e 1970, a respeito dos temas morais do “nosso terreno”, mas também sobre comunismo e ecumenismo, são “indicadores bastante precisos das maneiras pelas quais esses grupos se dividiriam durante a posterior ascensão da direita evangélica”. De acordo com ele, de modo geral, esses religiosos, que viriam a formar a âncora de direita da bancada evangélica, tendiam a manter, além do conservadorismo nos costumes, forte anticomunismo, críticas à guerrilha e “uma negligência relativa sobre as questões da justiça social”, ao passo que o oposto caracterizaria grupos evangélicos minoritários na bancada.18 18 O expoente desse grupo minoritário mais persistente ao longo das legislaturas é Benedita da Silva - a respeito, ver Baptista (2007:231); Chesnut (1997:155); Freston (1993:207).

O que ocorre é que, na década de 1980, os inimigos comuns mais visíveis eram os socialistas; hoje, o inimigo mais evidente dos evangélicos é a “ideologia de gênero” (Guadalupe 2020:20, 41). Seria de se supor que, com a queda do Muro de Berlim, o tema do comunismo e o maniqueísmo de Guerra Fria teriam também desfalecido. Mas não é isso que se passa. Ainda que menos evidente do que a pauta moral, a atualização da pauta soviética é relevante para o grupo religioso.

A entrevista do então deputado (hoje senador) Marcos Rogério (PDT/RO) - relator da PEC da redução da maioridade penal e militante das agendas pró-família patriarcal, membro da Assembleia de Deus, da Frente Parlamentar Evangélica e da Bancada da Assembleia de Deus na Câmara dos Deputados - ao portal da Casa Publicadora da Assembleia de Deus é expressiva da oposição dos parlamentares dessas religiões ao que seria a agenda socialista contemporânea. Ele afirma que o “Brasil nunca esteve tão ameaçado por um regime socialista” como estava em 2014 - a entrevista foi realizada em agosto daquele ano, durante a campanha presidencial que, ao final, apresentou Dilma Rousseff reeleita. Ele evoca então a Marcha da Família com Deus pela Liberdade realizada pouco antes do Golpe de 1964, para dizer que há cinquenta anos a população estava mais alerta quanto à ameaça do socialismo do que contemporaneamente. Ele invoca a mesma retórica de associar o regime soviético ao demônio:

O socialismo, onde foi implantado, causou morte e sofrimento. Mais de 100 milhões de pessoas morreram sob este regime demoníaco no século 20, na antiga União Soviética de Lênin e Stalin, na China de Mao, no Camboja de Pol Pot, na Cuba de Fidel e Che Guevara, ícones dessa turma, e na Coreia do Norte. Não queremos o socialismo versão século 21 no Brasil. (Rogério 2014ROGÉRIO, Deputado Marcos. (2014), Entrevista com o Deputado Marcos Rogério. Mensageiro da Paz. : CPAD News 2014., sem grifo no original)

O deputado Takayama (PSC/PR), então Presidente da Frente Parlamentar Evangélica, nos debates a respeito do processo por crime de responsabilidade de Dilma Rousseff, argumentou ser a favor do impeachment, entre outros motivos, porque a Presidenta “queria transformar esta Nação cristã numa república bolivariana” (Takayama 2016TAKAYAMA, Deputado Hidekazu. (2016), Discurso em Plenário em 15/04/2016.). Em abril de 2015, por sua vez, durante o transcurso do 367º aniversário do Exército Brasileiro, o deputado Pastor Eurico (PSC/RJ), um dos expoentes da direita cristã, homenageou a instituição, inclusive negando que o período do regime militar tenha sido uma ditadura, e afirmando que se não fosse a intervenção militar a partir de 1964 o Brasil seria outra Cuba:

Nesses 367 anos, ninguém tem o que dizer contra o nosso Exército, mesmo no momento que alguns apelidam de ditadura - eu não aceito esse tipo de tratamento; o governo militar foi necessário para que o Brasil tivesse ordem e hoje tivesse a democracia. Se não fossem os militares, nós seríamos hoje uma Cuba piorada no planeta Terra! (Eurico 2015EURICO, Deputado Pastor. (2015), Discurso em Plenário em 27/04/2015. Disponível em: Disponível em: https://www.camara.leg.br/internet/sitaqweb/TextoHTML.asp?etapa=5&nuSessao=084.1.55.O&nuQuarto=115&nuOrador=3&nuInsercao=0&dtHorarioQuarto=17:52&sgFaseSessao=CP&Data=27/04/2015&txApelido=PASTOR%20EURICO,%20PSB-PE&txFaseSessao=Comunica%C3%A7%C3%B5es%20Parlamentares&txTipoSessao=N%C3%A3o%20Deliberativa%20de%20Debates%20-%20CD&dtHoraQuarto=17:52&txEtapa= . Acesso em 30 de novembro de 2017.
https://www.camara.leg.br/internet/sitaq...
)

Outro destaque da bancada evangélica, o deputado Marco Feliciano (PSC/SP) escreveu que as teorias de Marx e Engels são contrárias à paz, porque promovem “a guerra entre irmãos com ênfase na luta de classes”. Para o parlamentar, embora a União Soviética tenha sido derrocada, o socialismo é um “cadáver insepulto, que ainda se manifesta como verdadeiro zumbi em Cuba e Venezuela, e pior, entre nossas esquerdas radicais que ainda teimam em tomar o poder através de eleições livres” e que por isso estão atentos, “na Câmara dos Deputados, com as tentativas das esquerdas doentes de desconstrução da família e do homem através da ideologia de gênero”19 19 O próprio conceito de “ideologia de gênero” traz em si o binômio família/anticomunismo, pois é tida como uma ideologia neomarxista para destruir os sexos naturais e a família (O’leary 1997:97-116). (Feliciano 2017FELICIANO, Marco. (s. d.), “Luta pelos ideais cristãos - parte 2”. Plano.News. Disponível em: Disponível em: https://pleno.news/opiniao/marco-feliciano/luta-pelos-ideias-cristaos-parte-2.html . Acesso em 17 de dezembro de 2020.
https://pleno.news/opiniao/marco-felicia...
). Para Feliciano (2018FELICIANO, Marco. (2018), “Marco Feliciano diz que não houve ditadura no Brasil: ‘Quer ver ditadura, eleja Haddad’”. Jovem Pan. Disponível em: Disponível em: https://jovempan.com.br/noticias/brasil/marco-feliciano-diz-que-nao-houve-ditadura-no-brasil-quer-ver-ditadura-eleja-haddad.html . Acesso em 17 de dezembro de 2020.
https://jovempan.com.br/noticias/brasil/...
), não houve ditadura no Brasil no período iniciado em 1964; ele entende que ditadura “aconteceu na União Soviética, na China”. A primeira ditadura brasileira ocorreria, sim, se Fernando Haddad fosse eleito: “Quer ditadura, eleja o Haddad. Ele sai do Brasil e fica a Manuela [D’Ávila, vice na chapa do petista, filiada ao PCdoB] como presidente, uma comunista.”

Durante a ditadura de 1964-1985, o campo evangélico, em sua maioria, endossou um governo autoritário. Isso se deveu a razões pragmáticas - uma via de mão dupla, na qual os evangélicos eram sequiosos por apoio governamental e os militares buscavam respaldo religioso do grupo que crescia fortemente desde a década de 1930. Deveu-se, sobretudo, a razões ideológicas, centradas no combate aos regimes ligados pela URSS, no anticomunismo, na ideologia moral de livre mercado e na visão de o capitalismo seria um projeto divino. Esse imaginário relaciona-se à origem estadunidense de religiosos naquele contexto de Guerra Fria: o Brasil era o país que mais tinha missionários protestantes, sendo que o efetivo desses clérigos triplicou entre 1960 e 1970.

Em linha de continuidade, o campo evangélico, quase unanimemente, apoiou a eleição de Collor - ocorrida apenas seis dias depois da queda do Muro de Berlim -, com medo da tenebrosa ameaça católico-comunista. Perry Anderson, conforme dito na introdução deste artigo, trata 1964 e 2018 como uma parábola entre dois pontos de tomada do governo central pelos militares. Considerando os argumentos de Singer, porém, podemos dizer que são duas parábolas, formando um “M”, entre 1964-1989-2018, não de pontos de governo militar, mas de pontos de tomada ou retomada do poder pela direita no Brasil. Em todos os três, como podemos inferir do conjunto dos autores citados, o anticomunismo foi em alguma medida mobilizado, e nos três com militância evangélica.

Hoje estamos há mais de três décadas do fim da Guerra Fria. Mesmo assim, embora jamais se possa falar no grande ramo protestante como algo homogêneo, o que se mostra como continuidade é a reverberação, entre líderes evangélicos, de uma mentalidade de luta contra o comunismo e as derivações do projeto socialista, inclusive com expressões semelhantes como a alusão a forças demoníacas. No caso brasileiro, a derrocada do suposto projeto comunista ocorreu por via da ditadura implantada em 1964, que segue sendo objeto de louvor por alguns expoentes dessas religiões, como o deputado Pastor Eurico, ou de negação, como o deputado Pastor Marco Feliciano. E essa mesma retórica contra a ameaça comunista e de defesa do regime militar é central no repertório de Bolsonaro, que teve apoio massivo desses fiéis em sua eleição e que tem seu apoio durante sua gestão.

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  • EURICO, Deputado Pastor. (2015), Discurso em Plenário em 27/04/2015 Disponível em: Disponível em: https://www.camara.leg.br/internet/sitaqweb/TextoHTML.asp?etapa=5&nuSessao=084.1.55.O&nuQuarto=115&nuOrador=3&nuInsercao=0&dtHorarioQuarto=17:52&sgFaseSessao=CP&Data=27/04/2015&txApelido=PASTOR%20EURICO,%20PSB-PE&txFaseSessao=Comunica%C3%A7%C3%B5es%20Parlamentares&txTipoSessao=N%C3%A3o%20Deliberativa%20de%20Debates%20-%20CD&dtHoraQuarto=17:52&txEtapa= Acesso em 30 de novembro de 2017.
    » https://www.camara.leg.br/internet/sitaqweb/TextoHTML.asp?etapa=5&nuSessao=084.1.55.O&nuQuarto=115&nuOrador=3&nuInsercao=0&dtHorarioQuarto=17:52&sgFaseSessao=CP&Data=27/04/2015&txApelido=PASTOR%20EURICO,%20PSB-PE&txFaseSessao=Comunica%C3%A7%C3%B5es%20Parlamentares&txTipoSessao=N%C3%A3o%20Deliberativa%20de%20Debates%20-%20CD&dtHoraQuarto=17:52&txEtapa=
  • FELICIANO, Marco. (s. d.), “Luta pelos ideais cristãos - parte 2”. Plano.News Disponível em: Disponível em: https://pleno.news/opiniao/marco-feliciano/luta-pelos-ideias-cristaos-parte-2.html Acesso em 17 de dezembro de 2020.
    » https://pleno.news/opiniao/marco-feliciano/luta-pelos-ideias-cristaos-parte-2.html
  • FELICIANO, Marco. (2018), “Marco Feliciano diz que não houve ditadura no Brasil: ‘Quer ver ditadura, eleja Haddad’”. Jovem Pan Disponível em: Disponível em: https://jovempan.com.br/noticias/brasil/marco-feliciano-diz-que-nao-houve-ditadura-no-brasil-quer-ver-ditadura-eleja-haddad.html Acesso em 17 de dezembro de 2020.
    » https://jovempan.com.br/noticias/brasil/marco-feliciano-diz-que-nao-houve-ditadura-no-brasil-quer-ver-ditadura-eleja-haddad.html
  • IG. (2018), “Após ruralistas, bancadas evangélica e da bala sinalizam apoio a Bolsonaro”. IG Disponível em: Disponível em: https://ultimosegundo.ig.com.br/politica/2018-10-03/apoio-a-bolsonaro-deputados.html Acesso em 17 de dezembro de 2020.
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  • MEDEIROS, Étore; FONSECA, Bruno. (2018), Bíblia, boi e bala: um raio-x das bancadas da Câmara. Exame Disponível em: Disponível em: https://exame.com/brasil/biblia-boi-e-bala-um-raio-x-das-bancadas-da-camara/ Acesso em 17 de dezembro de 2020.
    » https://exame.com/brasil/biblia-boi-e-bala-um-raio-x-das-bancadas-da-camara/
  • SCHWARZ, Roberto. (2011), “Neoatraso bolsonarista repete clima de 1964, diz Roberto Schwarz”. Folha de S. Paulo , QUAL A DATA? Disponível em: Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/ilustrissima/2019/11/neoatraso-bolsonarista-repete-clima-de-1964-diz-roberto-schwarz.shtml Acesso em 17 de dezembro de 2020.
    » https://www1.folha.uol.com.br/ilustrissima/2019/11/neoatraso-bolsonarista-repete-clima-de-1964-diz-roberto-schwarz.shtml
  • VIEGAS, Nonato. (2014), “Assembleia de Deus troca pastor Everaldo por Marina Silva”. O Dia Disponível em: Disponível em: http://odia.ig.com.br/eleicoes2014/2014-09-14/assembleia-de-deus-troca-pastor-everaldo-por-marina-silva.html Acesso em 17 de novembro de 2020.
    » http://odia.ig.com.br/eleicoes2014/2014-09-14/assembleia-de-deus-troca-pastor-everaldo-por-marina-silva.html
  • VILELA, Márcio Ananias Ferreira. (s. d.), “‘Cristo e o processo revolucionário brasileiro’: a Conferência do Nordeste e a responsabilidade social da Igreja Presbiteriana do Brasil”. XI Encontro Nacional de História Oral - Memória, Democracia e Justiça, Disponível em: Disponível em: https://www.encontro2012.historiaoral.org.br/resources/anais/3/1338502095_ARQUIVO_CristoeProcessoRevolucionarioBrasileiro-aConferenciadoNordesteearesponsabilidadedesocialdaIPB.pdf Acesso em 17 de novembro de 2020.
    » https://www.encontro2012.historiaoral.org.br/resources/anais/3/1338502095_ARQUIVO_CristoeProcessoRevolucionarioBrasileiro-aConferenciadoNordesteearesponsabilidadedesocialdaIPB.pdf
  • 1
    A direita cristã é a resposta religiosa estadunidense às mudanças culturais trazidas pelo feminismo e pelo humanismo secular dos anos 1960, que teriam dissolvido os costumes e os valores sociais; conta com importante base eleitoral no Partido Republicano daquele país (Carranza 2020CARRANZA, Brenda. (2020), “Evangélicos: o novo ator político”. In: J. L. P. Guadalupe; B. Carranza. (ed.). Novo ativismo político no Brasil: os evangélicos do século XXI. Rio de Janeiro: Konrad Adenauer Stiftung .:179). No caso brasileiro, é composta majoritariamente por evangélicos, mas também por católicos, sobretudo os carismáticos, e, residualmente, por espíritas.
  • 2
    Dos 17 titulares, 9 eram evangélicos ou carismáticos e um era militar. Dos 15 suplentes, dois eram evangélicos e cinco eram policiais ou militares.
  • 3
    Reunião Ordinária da Comissão de Direitos Humanos e Minorias, em 15/04/2015, disponível em https://www.camara.leg.br/evento-legislativo/38613, acessado em 27/01/2018.
  • 4
    PEC 171/1993. Essa proposta não foi votada pelo Senado.
  • 5
    PL 3131/2008, transformado na Lei nº 13.142/2015.
  • 6
    No Brasil, entende-se que não há voto confessional, no sentido de que a religião de um candidato seja o fator determinante para o voto dos fiéis, pois existem vários critérios - não necessariamente religiosos - para a decisão do eleitor evangélico. No máximo, há uma tendência de que “irmão vota em irmão”, indicando um voto denominacional. Mesmo essa lógica seria válida apenas para o Legislativo, e não para o Executivo (Boas 2020BOAS, Taylor C. (2020), “A representação eleitoral dos evangélicos na América Latina”. In: J. L. P. Guadalupe , e B. Carranza (ed.). Novo ativismo político no Brasil: os evangélicos do século XXI. Rio de Janeiro: Konrad Adenauer Stiftung. :18-113.:125; Guadalupe 2020:63-77; Valle 2019VALLE, Vinicius do. (2019), Entre a religião e o lulismo: um estudo com pentecostais em São Paulo. São Paulo: Recriar.). Supõe-se que a eleição de Bolsonaro em 2018, porém, tenha sido uma exceção nessa tradição, ocorrendo, ali, para a Presidência da República, um voto confessional (Guadalupe 2020:77). Comprovam o argumento os dados relembrados por Nicolau (2020:846-868): Anthony Garotinho, evangélico, que concorreu pelo PSB nas eleições de 2002, foi o primeiro candidato competitivo à presidência que fez um apelo especial aos evangélicos, mas não o conseguiu - parte expressiva das lideranças apoiou Lula. Marina Silva, assembleiana, não conseguiu o apoio de lideranças das principais denominações evangélicas para suas campanhas em 2010 e 2014. Pastor Everaldo, candidato pelo PSC (partido ligado às Assembleias de Deus) em 2014, obteve apenas 2,6% dos votos válidos. Mas cerca de 70% dos evangélicos apoiaram Bolsonaro em 2018.
  • 7
    Vital e Lopes (2013:16-118) demostram que há certa disputa pelo protagonismo em relação ao tema. Os autores resgatam pronunciamento de Bolsonaro no Plenário da Câmara, em 8 de dezembro de 2010, em que o então parlamentar alerta que, no ano seguinte, o Governo Federal deveria distribuir um “kit contra a homofobia” nas escolas, e apelado pela atenção da bancada religiosa para o assunto, pois, no seu entender, ela ainda não teria conhecimento sobre o caso. Os autores também apresentam entrevista com a então assessora da Bancada Evangélica, atualmente Ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves, que afirma que foi o ativismo cristão que chamou atenção de Bolsonaro para o tema, e não o contrário.
  • 8
    Não foram os evangélicos os únicos solicitados pelo regime. Paulo Maluf, por exemplo, procurou fortalecer os laços com a umbanda, e João Figueiredo, com os espíritas. Em 1980 foi criado o feriado pelo dia da Padroeira do Brasil, Nossa Senhora Aparecida, santa católica (Freston 1993FRESTON, Paul. (1993), Protestantes e Política no Brasil: da Constituinte ao Impeachment. Campinas: Tese de Doutorado - Ciências Sociais, Universidade Estadual de Campinas.:158).
  • 9
    Para as razões do crescimento protestante, ver Mariano (2008MARIANO, Ricardo. (2008), “Crescimento Pentecostal no Brasil: fatores internos”. Revista de Estudos da Religião. : 65-95.) e Mariano (2011MARIANO, Ricardo. (2011), “Sociologia do crescimento pentecostal no brasil: um balanço”. Perspectiva Teológica, 43: 11.).
  • 10
    Em 1970, os evangélicos representavam 5,2% da população brasileira; em 1980, 6,6%; em 1991, 9% (13,2 milhões) (Jacob 2003JACOB, Cesar Romero. et al. (2003), Atlas da filiação religiosa e indicadores sociais no Brasil. Rio de Janeiro; São Paulo: Ed. Puc-Rio, Loyola.:34). Em 2000, os evangélicos saltaram para 15,4% (26,2 milhões). Em 2010, 22,2% (42,3 milhões) (IBGE 2010IBGE, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. (2010), Censo Demográfico 2010: Características Gerais da População, Religião e Pessoas com Deficiência. [S. l.] IBGE.). Em 2019, estima-se que são 31% dos brasileiros (Datafolha 2020DATAFOLHA. (2020), “Cara típica do evangélico brasileiro é feminina e negra, aponta Datafolha”. Folha de São Paulo. Disponível em: Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/poder/2020/01/cara-tipica-do-evangelico-brasileiro-e-feminina-e-negra-aponta-datafolha.shtml . Acesso em 17 de dezembro de 2020.
    https://www1.folha.uol.com.br/poder/2020...
    ).
  • 11
    Em 1982, Nilson Fanini promoveu uma grande passeata chamada Deus Salve a Família, que encheu o Maracanã. Na ocasião, Presidente Figueiredo não só participou, como também foi até o pódio, de onde elogiou o império Reencontro, de Fanini. Em seu discurso, registrou que “no mundo tumultuado pela mudança constante,” o programa de Fanini “preserva os valores elementares da criatura humana, da sua dignidade e da sua espiritualidade” (Cowan 2014:124).
  • 12
    A vitória de Reagan é, em parte, tributária do crescimento da direita cristã nos Estados Unidos. Consolida esse processo a criação, em 1979, das organizações Voz Cristã e Maioria Moral. A primeira foi impulsionada por Robert Grant e Richard Zone. Seus membros pertenciam a 37 denominações, mas a maior parte dos ativistas vinha das igrejas Batista e Assembleias de Deus. A Maioria Moral, organização com 100 mil membros, foi fundada por Jerry Falwell. Chegou a ter mais de 300 estações de televisão e 280 de rádio, presente em 31 estados norte-americanos (Diamond 1995:174-175; Finguerut 2009FINGUERUT, Ariel. (2009), “Formação, crescimento e apogeu da direita cristã nos Estados Unidos”. In: C. E. L. D. Silva. (ed.). Uma nação com alma de igreja: religiosidade e políticas públicas nos EUA. São Paulo: Paz e Terra. : 113-156.:121-122; Flores 2020FLORES, Guillermo. (2020), “A construção de uma nação cristã na América Latina”. In: J. L. P. Guadalupe; e B. Carranza. (ed.). Novo ativismo político no Brasil: os evangélicos do século XXI. Rio de Janeiro: Konrad Adenauer Stiftung . : 113-156.; Guth 1983GUTH, James L. (1983), The New Christian Right. In: R. C. Liebman; R. Wuthnow. (ed.). The New Christian Right: Mobilization and Legitimation. Nova Iorque: Aldini Publishing. : 31-48.:37; Petchesky 1981PETCHESKY, Rosalind Pollack. (1981), “Antiabortion, Antifeminism, and the Rise of the New Right”. Feminist Studies, 7, nº 2: 206.:217).
  • 13
    Informações disponíveis em memoriadaditadura.org.
  • 14
    Para as teorias institucional, marxista e weberiana a respeito da postura de resistência, por parte da Igreja Católica, ao regime militar, ver Gomes (2014GOMES, Paulo Cesar. (2014), Os Bispos católicos e a Ditadura Militar brasileira: a visão da espionagem. São Paulo: Record.:16-20).
  • 15
    A tensão entre os bispos das regiões Norte e Nordeste e o governo seguiram tensas. Em 1970, bispos da Regional Norte II emitiram declaração em que rompiam com o desenvolvimentismo dos governantes e pregavam “uma autêntica reforma das estruturas e da política agrária” (Gomes 2014:53).
  • 16
    Sublinhe-se a mudança ocorrida dentro do campo evangélico, com crescimento da relevância dos pentecostais e neopentecostais. Se, em 1980, 3,4% dos brasileiros eram evangélicos não pentecostais e 3,2 eram pentecostais (Bohn 2004BOHN, Simone R. (2004), “Evangélicos no Brasil: perfil socioeconômico, afinidades ideológicas e determinantes do comportamento eleitoral”. Opinião Pública, 10: 288-338.), em 2010, 4% se declararam evangélicos de missão, 13,3% pentecostais e 4,8% de denominações evangélicas não determinadas (IBGE 2010). Para o ano de 2016, estimou-se que a Assembleia de Deus conte com o maior número de membros em todo o Brasil, representando 34% do total. Ela é seguida pela Igreja Batista, com 11% dos fiéis, e pela Igreja Universal do Reino de Deus, com 8% (Datafolha 2016DATAFOLHA. (2016), “44% dos evangélicos são ex-católicos”. Datafolha. Disponível em: Disponível em: https://datafolha.folha.uol.com.br/opiniaopublica/2016/12/1845231-44-dos-evangelicos-sao-ex-catolicos.shtml . Acesso em 17 de dezembro de 2020.
    https://datafolha.folha.uol.com.br/opini...
    ).
  • 17
    O bolivarianismo venezuelano se coloca como equivalente contemporâneo do comunismo. Essa é a expressão do próprio líder da Revolução Bolivariana. Hugo Chávez declarou, ao ser reeleito em 2006, que assumia “o compromisso de dirigir a Revolução Bolivariana até o socialismo do século XXI” (Capital 2013CARTA CAPITAL. (2013), Contra o capitalismo, pelo “socialismo do século XXI”. :São Paulo: Editora Confiança.).
  • 18
    O expoente desse grupo minoritário mais persistente ao longo das legislaturas é Benedita da Silva - a respeito, ver Baptista (2007:231); Chesnut (1997:155); Freston (1993:207).
  • 19
    O próprio conceito de “ideologia de gênero” traz em si o binômio família/anticomunismo, pois é tida como uma ideologia neomarxista para destruir os sexos naturais e a família (O’leary 1997O’LEARY, Dale. (1997), The Gender Agenda: Redefining Equality. Lafayette: Vital Issues Press.:97-116).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    06 Maio 2022
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2022

Histórico

  • Recebido
    07 Jan 2021
  • Aceito
    29 Mar 2021
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