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Parada cardiorrespiratória obstétrica: construção e validação de instrumento para avaliar o conhecimento da enfermagem

RESUMO

Objetivo

Construir e validar instrumento para avaliar o conhecimento da enfermagem sobre parada cardiorrespiratória obstétrica.

Métodos

Estudo metodológico composto pela construção do instrumento, validação de conteúdo por 23 especialistas e validação da consistência interna com 74 profissionais da enfermagem e 99 estudantes de enfermagem. Foram considerados válidos os itens com concordância mínima de 90%, verificada a partir do Índice de Validação de Conteúdo, Razão de Validade de Conteúdo e teste binomial. O alpha de Cronbach foi utilizado para verificar a consistência interna e o valor superior a 0,6 classificado como aceitável.

Resultados

O instrumento foi composto por16 questões de múltipla escolha, dos 16 itens avaliados, oito possuíram concordância de 100% e seis 95%. A menor razão de validade de conteúdo foi de 0,82 e o alpha de Cronbach foi de 0,694.

Conclusões

O instrumento foi construído e validado, recomendando-se sua utilização para avaliação do conhecimento em parada cardiorrespiratória obstétrica.

Palavras-chave
Ensino; Avaliação educacional; Educação em enfermagem; Reanimação cardiopulmonar; Obstetrícia

ABSTRACT

Objective

To build and validate an instrument to assess nursing knowledge about obstetric cardiopulmonary arrest.

Methods

A methodological study consisting of the construction of the instrument, content validation by 23 experts and validation of internal consistency with 74 nursing professionals and 99 nursing students. Items with a minimum agreement of 90%, verified from the Content Validation Index, Content Validity Ratio and binomial test were considered valid. Cronbach’s alpha was used to verify internal consistencyand a value greater than 0.6 was classified as acceptable.

Results

The instrument consisted of 16 multiple-choice questions, from the 16 items evaluated, eight had 100% agreement by the experts and six had 95%. The lowest content validity ratio was 0.82 and Cronbach’s alpha was 0.694.

Conclusions

The instrument was constructed and validated, and its use is recommended to assess knowledge in obstetric cardiopulmonary arrest.

Keywords
Teaching; Educational measurement; Education, nursing; Cardiopulmonary resuscitation; Obstetrics

RESUMEN

Objetivo

Construir y validar un instrumento para evaluar el conocimiento de enfermería sobre parada cardiorrespiratoria obstétrica.

Métodos

Estudio metodológico que comprendió la construcción del instrumento, validación de contenido por 23 especialistas en parada cardiorrespiratoria obstétrica y validación de la consistencia interna con 74 profesionales de enfermería y 99 estudiantes de enfermería. Se consideraron válidos los ítems con una concordancia mínima del 90%, verificados a partir del Índice de Validación de Contenido, Índice de Validez de Contenido y prueba binomial. Se utilizó el alfa de Cronbach para verificar la consistencia interna.

Resultados

El instrumento constó de 16 preguntas de opción múltiple. De los 16 ítems evaluados, ocho tuvieron 100% de acuerdo por los expertos y seis 95%. La razón de validez de contenido más baja fue de 0,82 y el alfa de Cronbach fue de 0,694.

Conclusiones

El instrumento fue construido y validado, para que tenga un uso viable en la práctica de docentes e investigadores.

Palabras clave
Enseñanza; Evaluación educacional; Educación en enfermería; Reanimación cardiopulmonar; Obstetricia

INTRODUÇÃO

Estima-se que, anualmente, no Brasil, ocorrem aproximadamente 200 mil paradas cardiorrespiratórias (PCR) das quais, 50% acontecem em ambiente hospitalar11. Silva AKB, Silva AVB, Sousa RM, Feitosa SSM, Muniz JM, Rosa JMS, et al. Prevalence and factors associated with the development of cardiorespiratory arrest in pregnant women. Res Soc Develop. 2021;10(9):e9110914913. doi: https://doi.org/10.33448/rsd-v10i9.14913.
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. A sobrevivência é encontrada em cerca de 10,4% dos pacientes, de forma que esse agravo consiste em emergência cardiovascular de maior prioridade22. Panchal AR, Bartos JA, Cabañas JG, Donnino MW, Drennan IR, Hirsch KG, et al. Part 3: adult basic and advanced life support: 2020 american heart association guidelines for cardiopulmonary resuscitation and emergency cardiovascular care. Circulation. 2020;142(16 Supl. 2):S366-S468. doi: https://doi.org/10.1161/CIR.0000000000000916.
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No público obstétrico, a PCR é considerada como evento raro, uma vez que acomete uma a cada 12 mil gestantes, porém, sua gravidade culmina em elevado risco materno e fetal22. Panchal AR, Bartos JA, Cabañas JG, Donnino MW, Drennan IR, Hirsch KG, et al. Part 3: adult basic and advanced life support: 2020 american heart association guidelines for cardiopulmonary resuscitation and emergency cardiovascular care. Circulation. 2020;142(16 Supl. 2):S366-S468. doi: https://doi.org/10.1161/CIR.0000000000000916.
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. As emergências obstétricas, como agravos hemorrágicos, hipertensivos, embolia por líquido amniótico e complicações anestésicas contribuem para o acometimento de gestantes pela PCR33. Fardelmann KL, Alian AA. Anesthesia for obstetric disasters. Adv Anesth. 2020;38:229-50. doi: https://doi.org/10.1016/j.aan.2020.09.001.
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. Em casos de gestação múltiplas, associadas à comorbidades, os riscos tendem a ser mais elevados, devido às mudanças fisiológicas da gestação que implicam em alteração da sobrecarga cardiovascular materna44. Tambawala ZY, Cherawala M, Maqbool S, Hamza LK. Resuscitative hysterotomy for maternal collapse in a triplet pregnancy. BMJ Case Rep. 2020;13(7):e235328. doi: http://doi.org/10.1136/bcr-2020-235328.
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Na assistência à PCR em gestantes é necessário que a equipe multiprofissional inicie as intervenções de forma rápida e correta para elevar as chances de sobrevida e reduzir possíveis sequelas. O contexto obstétrico atribui particularidades à Ressuscitação Cardiopulmonar (RCP) em gestantes que divergem do atendimento padrão ofertado ao adulto não grávido. Deste modo, o atendimento exige conhecimento da equipe, no intuito de fornecer assistência adequada para a obtenção do retorno da Circulação Espontânea (RCE) materna22. Panchal AR, Bartos JA, Cabañas JG, Donnino MW, Drennan IR, Hirsch KG, et al. Part 3: adult basic and advanced life support: 2020 american heart association guidelines for cardiopulmonary resuscitation and emergency cardiovascular care. Circulation. 2020;142(16 Supl. 2):S366-S468. doi: https://doi.org/10.1161/CIR.0000000000000916.
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O treinamento dos profissionais sobre a PCR obstétrica deve ser realizado de forma direcionada à lacuna de conhecimento existente, assim, é relevante que o conhecimento prévio seja verificado e que ocorra autoavaliação, para contribuir com a conscientização acerca da necessidade de capacitação55. Leonardsen ACL, Svendsen EJ, Heitmann GB, Dhayyat A, Morris A, Sjøborg KD, et al. Development and validation of a questionnaire to assess healthcare personnel competence in cardiac arrest and resuscitation in pregnancy. PLoS One. 2020;15(5):e0232984. doi: https://doi.org/10.1371/journal.pone.0232984.
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. Estudos sobre a efetividade de estratégias pedagógicas para o ensino da RCP em gestantes também precisam ocorrer, para subsidiar a escolha do melhor recurso didático a ser utilizado no processo de ensino-aprendizagem. Aponta-se relevância de existência de instrumento compreensível e válido quanto ao conteúdo, que possa ser utilizado na avaliação do conhecimento sobre RCP obstétrica.

Dentre os profissionais que atuam na assistência à PCR, a enfermagem consiste na categoria com maior quantitativo de profissionais presentes nos serviços de saúde, de forma que, diante do contato direto e por mais tempo com o paciente, possui maior chance de presenciar o colapso cardíaco, sobre o qual precisará de conhecimento para agir corretamente66. Galindo-Neto NM, Alexandre ACS, Barros LM, Sá GGM, Carvalho KM, Caetano JA. Creation and validation of an educational video for deaf people about cardiopulmonary resuscitation. Rev Latino-Am Enfermagem. 2019;27:e3130. doi: https://doi.org/10.1590/1518-8345.2765.3130.
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. Aponta-se a pertinência e relevância de construção de instrumento que possa ser utilizado para avaliar o conhecimento dessa categoria profissional, acerca da PCR em gestantes.

A pergunta norteadora do estudo foi: instrumento para avaliar o conhecimento da enfermagem sobre parada cardiorrespiratória obstétrica é válido quanto ao conteúdo, conforme avaliação de experts e possui consistência interna aceitável? O estudo teve como objetivo construir e validar instrumento para avaliar o conhecimento da enfermagem sobre parada cardiorrespiratória em gestantes.

MÉTODO

Estudo metodológico realizado conforme recomendações para desenvolvimento de instrumentos de medida na área da saúde77. Coluci MZO, Alexandre NMC, Milani D. Construção de instrumentos de medida na área da saúde. Ciênc Saúde Coletiva. 2015;20(3):925-36. doi: https://doi.org/10.1590/1413-81232015203.04332013.
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. Dessa forma, de maio a novembro de 2019, foram realizadas três etapas: a primeira para construção do instrumento, na qual a estrutura conceitual foi estabelecida, os objetivos do instrumento e a população alvo foram definidos, os itens e as respostas foram construídos, os itens foram selecionados e organizados e o instrumento foi estruturado. Na segunda etapa ocorreu a validação de conteúdo e na terceira, mediante aplicação do instrumento com quatro públicos (estudantes de cursos técnico e superior, enfermeiros e técnicos em enfermagem atuantes nos setores de emergência e obstetrícia) foi realizada a verificação da consistência interna77. Coluci MZO, Alexandre NMC, Milani D. Construção de instrumentos de medida na área da saúde. Ciênc Saúde Coletiva. 2015;20(3):925-36. doi: https://doi.org/10.1590/1413-81232015203.04332013.
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.

A primeira etapa, de construção do instrumento, ocorreu no laboratório de enfermagem do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Pernambuco (IFPE) Campus Pesqueira. Foram utilizados os conteúdos dos seguintes documentos de domínio público: Advanced Life Support in Obstretrics (ALSO), American Heart Association (AHA), Conselho Europeu de Reanimação, Sociedade Brasileira de Cardiologia e o Conselho Asiático de Reanimação, que são referência na temática. As questões dos instrumentos possuíram conteúdo referente à identificação da PCR, conduta adequada para acionamento de ajuda e a realização de RCP, com as especificidades do contexto obstétrico.

O instrumento construído foi composto por 16 perguntas objetivas, de múltipla escolha, cada uma com cinco alternativas: uma alternativa com o conteúdo correto (gabarito), três com situações possíveis, porém não corretas e a última alternativa consistia na opção “não sei”. Cabe destacar que as possíveis situações das alternativas foram elaboradas a partir do conhecimento dos autores e de mitos e verdades observados na prática profissional dos mesmos.

A segunda etapa, de validação do conteúdo, foi realizada de forma eletrônica, mediante contato via e-mail. A população dessa etapa foi composta por enfermeiros experts em parada cardiorrespiratória obstétrica, pertencentes à rede de contato de seis docentes dos componentes curriculares de Emergência e Obstetrícia, do curso de bacharelado em enfermagem do IFPE. Tais enfermeiros experts totalizaram 64 profissionais, que exerciam função docente e assistencial nas cinco regiões do país, dos quais 23 enviaram resposta, de forma que constituíram a amostra do estudo.

Os critérios de inclusão adotados para os docentes foram possuir expertise/experiência docente ou assistencial nas áreas de obstetrícia ou parada cardiorrespiratória. Foram excluídos da amostra aqueles profissionais que, durante o período de coleta de dados, encontrava-se em afastamento de qualquer natureza das suas atividades laborais.

Os profissionais foram contatados via correio eletrônico (e-mail) no qual foi enviado link de acesso ao Formulário Google que continha carta convite, Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), instrumento para caracterização, que contemplou a especialidade do profissional, sua titulação e experiência em docência e assistência, e o instrumento em processo de validação e o instrumento para coleta de dados. O instrumento de coleta de dados utilizado, no qual os profissionais registraram sua avaliação foi adaptado de estudo anterior e contemplou aspectos referentes ao conteúdo, linguagem e layout, distribuídos em 14 questões, nas quais os avaliadores poderiam preencher seus níveis de concordância em escala do tipo Likert88. Galindo-Neto NM, Lima MB, Barros LM, Santos SC dos, Caetano JÁ. Sign language instrument for assessing the knowledge of deaf people about cardiopulmonary resuscitation. Rev Latino-Am Enfermagem. 2020;28:e3283. doi: https://doi.org/10.1590/1518-8345.3535.3283.
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A terceira etapa, de avaliação da consistência interna, ocorreu em quatro cenários: a aplicação do instrumento com estudantes de curso superior de enfermagem foi realizada no Campus Pesqueira do IFPE, a aplicação com estudantes de curso técnico em Enfermagem ocorreu no Campus Belo Jardim do IFPE, enquanto a aplicação com os profissionais ocorreu em dois hospitais do Sistema Único de Saúde (SUS), um hospital geral e um regional, localizados nos municípios de Pesqueira e Garanhuns, respectivamente, ambos em Pernambuco.

Referente à etapa de aplicação do instrumento com os estudantes, a população foi composta pelos 150 discentes matriculados no curso de bacharelado em enfermagem do Campus Pesqueira do IFPE e os 90 discentes matriculados no curso técnico em Enfermagem do Campus Belo Jardim do IFPE. Foram incluídos todos os que possuíam matrícula ativa nos cursos técnico e superior em enfermagem dos campus. Foram excluídos todos os estudantes que não estavam presentes no momento da aplicação do instrumento para coleta de dados da pesquisa e a amostragem foi consecutiva por conveniência.

A aplicação do instrumento com os estudantes de curso superior ocorreu em duas turmas, uma de primeiro e outra de terceiro módulo do curso de bacharelado em enfermagem, o que totalizou 57 estudantes para a amostra. Destaca-se que tais turmas foram alvo do recrutamento por indicação de viabilidade de coleta apontada pelo coordenador do curso. No curso técnico em enfermagem o instrumento também foi aplicado em duas turmas, uma de segundo e a outra de quarto módulo do curso, também apontadas como viáveis de ser alvo da coleta pela coordenação do curso, que totalizaram 42 participantes.

Para coleta dos dados foi utilizado o instrumento composto por 16 questões acerca do conhecimento em PCR obstétrica. A coleta em cada curso, técnico e superior, respectivamente, ocorreu mediante agendamento prévio com as coordenações dos cursos, em horário de aula, sob autorização do docente do dia agendado e na presença de três pesquisadores e dos participantes em sala de aula. Com os discentes acomodados nas cadeiras escolares, o estudo foi explicado, ocorreu assinatura do TCLE e foi distribuído o instrumento a ser respondido sem consulta ou conversa paralela. Não foi estabelecido tempo limite para o preenchimento, que foi finalizado por todos os discentes em 40 minutos. Ao finalizar a coleta em uma turma o mesmo procedimento foi realizado na segunda turma do curso.

Na aplicação com os profissionais, a população foi composta pelos enfermeiros e técnicos de enfermagem que atuavam nos setores de emergência e obstetrícia dos dois hospitais nos quais ocorreu a coleta de dados e a amostragem foi por conveniência.

Os critérios de inclusão foram possuir vínculo empregatício na instituição de saúde e atuar regularmente nas áreas de emergência e obstetrícia. O critério de exclusão foi encontrar-se em afastamento (férias, licença, atestado) no período em que foram coletados os dados. Em um dos hospitais houve a participação de 16 enfermeiros e 37 técnicos de enfermagem, dos setores de emergência e obstetrícia. No segundo hospital houve a participação de 13 enfermeiros e 8 técnicos de enfermagem, também dos setores de emergência e obstetrícia.

A coleta em cada hospital foi realizada em sala de reunião, na presença de três pesquisadores e dos participantes, ocorreu a explicação do estudo, a assinatura do TCLE e distribuição do instrumento a ser respondido. Sem definição de tempo limite para a conclusão do preenchimento, esta foi finalizada por todos os profissionais em 50 minutos. Com os profissionais foi utilizado o mesmo instrumento utilizado com os estudantes.

Assim, a análise de consistência interna ocorreu a partir da aplicação do instrumento com 173 participantes, dos quais 74 eram profissionais (29 enfermeiros e 45 técnicos de enfermagem) e 99 estudantes de enfermagem (57 de curso superior e 42 de curso técnico). Destaca-se que esse quantitativo possui compatibilidade para verificação da consistência interna, uma vez que esta deve ocorrer com amostra composta de cinco a dez participantes por item existente no instrumento99. Cunha CM, Almeida Neto OP, Stackfleth R. Principais métodos de avaliação psicométrica da confiabilidade de instrumentos de medida. Rev Aten Saúde. 2016;14(49):98-103. doi: https://doi.org/10.13037/ras.vol14n49.3671.
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. Ao considerar a existência de 16 questões no instrumento, a amostra estimada seria de 80 a 160 participantes.

A análise dos dados se deu no software R. Para etapa de validação de conteúdo, foi calculado o Índice de Validação de Conteúdo (IVC), para cada item, que correspondeu à soma de concordâncias obtidas no item, dividido pelo total de avaliações/respostas atribuídas a aquele item. Foi calculado também o IVC global, que correspondeu à média dos IVCs de todos os itens. Além disso, para verificar se a concordância obtida foi igual ou superior ao valor estabelecido para considerar o item válido 0,90%1010. Polit DF, Beck CT, Owen SV. Is the CVI an acceptable indicator of content validity? Appraisal and recommendations. Res Nurs Health. 2007;30(4):459-67. doi: https://doi.org/10.1002/nur.20199.
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, foi utilizado o teste binomial, com nível de significância de 95%. A análise dos dados para verificação da confiabilidade do instrumento ocorreu mediante utilização do alpha de Cronbach. Este varia de 0 a 1 e, para o presente estudo, foi considerado aceitável valor superior a 0,61111. Taber KS. The use of Cronbach’s Alpha when developing and reporting research instruments. Res Sci Educ. 2018;48:1273-96. doi: https://doi.org/10.1007/s11165-016-9602-2.
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.

Como complementação do IVC foi realizado o cálculo de Content Validity Ratio (CVR), esse fornece a Razão de Validade de Conteúdo, corrigindo possíveis lacunas de concordância ao acaso oriundas do IVC. Nesse medido os juízes classificaram cada item do questionário como, essencial (1); útil, mas não essêncial (2) e não necessário (3).

Para o CVR foi utilizado a seguinte formula: CVR= ne - (N/2) / (N/2), onde “ne” é a quantidade de concordância 3 (itens essenciais) e “N” representa a quantidade total de participantes, onde os mesmo 23 juízes participaram da amostra. Salienta-se que, 0,6 é o menor valor aceitável a ser obtido por meio do CVR1212. Wilson FR, Pan W, Schumsky DA. Recalculation of the critical values for lawshe’s content validity ratio. Meas Eval Couns Dev. 2012;45(3):197-210. doi: https://doi.org/10.1177/0748175612440286.
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A pesquisa seguiu as diretrizes éticas determinadas pela Resolução 466/12 e obteve aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da Autarquia Educacional de Belo Jardim (parecer 3.150.606).

RESULTADOS

Referente aos juízes que participaram da validação de conteúdo, 12 (52,17%) era especialista em Urgência e Emergência e 11 (47,83%) em Obstetrícia. Quanto aos portadores de título de mestre e doutor, foram observados 11 (47,83%) e três (14,04%), respectivamente. Em relação à experiência profissional, sete (30,43%) já haviam exercido atividades assistenciais nos serviços de urgência e emergência pré-hospitalar, três (14,04%) na urgência e emergência hospitalar e nove (39,13%) na assistência obstétrica. Ademais, 17 (73,91%) desempenhavam atividade na docência.

Na validação de conteúdo, das 16 questões do instrumento, 11 (68,75%) possuíram concordância unânime. Entre todas as questões, a concordância mínima obtida foi de 91%, com o CVR mínimo de 0,82 de forma que todas foram consideradas validadas (Tabela 1).

Tabela 1 -
Concordância dos avaliadores referente à relevância, conteúdo e temática do instrumento de avaliação do conhecimento sobre ressuscitação cardiopulmonar obstétrica (n=23). Pesqueira, Pernambuco, Brasil, 2021

Em relação à clareza, objetividade, organização e compreensão, das 16 questões do instrumento, nove (56,3%) possuíram concordância unânime em todos os itens (IVC=1,0 e CVR= 1,0). Todas as questões que compõem o instrumento foram consideradas válidas com ICV e CVR acima de 0,91 e 0,82 respectivamente. (Tabela 2).

Tabela 2-
Concordância dos avaliadores referente à clareza, objetividade, organização e compreensão do instrumento de avaliação do conhecimento sobre ressuscitação cardiopulmonar obstétrica (n=23). Pesqueira, Pernambuco, Brasil, 2021

No tocante à confiabilidade do instrumento, esta foi observada a partir da aceitável consistência interna, ratificada pelo alpha de Cronbach obtido que foi de 0,694.

A versão final do instrumento foi composta por 16 questões de múltipla escolha que abordavam o reconhecimento da parada cardiorrespiratória, a cadeia de sobrevivência da PCR, as compressões efetivas e de qualidade, os cuidados específicos da PCR/RCP obstétrica, a relação compressão-ventilação com e sem via área avançada, o uso da desfibrilação em gestantes e a cesariana perimortem. As duas partes/páginas que compõem o instrumento, bem como o gabarito com as respostas corretas, podem ser observadas nas Figuras 1 e 2 .

Figura 1 -
Instrumento para avaliar o conhecimento da enfermagem sobre parada cardiorrespiratória em gestante - parte 1. Pesqueira, Pernambuco, Brasil, 2021

Figura 2 -
Instrumento para avaliar o conhecimento da enfermagem sobre parada cardiorrespiratória em gestante - parte 2. Pesqueira, Pernambuco, Brasil, 2021

DISCUSSÃO

As questões do instrumento abordaram três eixos temáticos: identificação correta da parada cardíaca na gestante, momento de chamar por ajuda e forma correta de realização de reanimação cardiopulmonar na gestante. Este achado é semelhante ao encontrado em pesquisa realizada na Noruega, que desenvolveu e validou instrumento para avaliar a competência dos profissionais de saúde frente a PCR obstétrica, e contemplou os mesmos eixos55. Leonardsen ACL, Svendsen EJ, Heitmann GB, Dhayyat A, Morris A, Sjøborg KD, et al. Development and validation of a questionnaire to assess healthcare personnel competence in cardiac arrest and resuscitation in pregnancy. PLoS One. 2020;15(5):e0232984. doi: https://doi.org/10.1371/journal.pone.0232984.
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. Assim, aponta-se relevância do instrumento contemplar a identificação do agravo e os componentes do suporte básico de vida, que consistem em etapas decisivas para sobrevida do binômio mãe-filho e, logo, precisam ser conhecidas pela enfermagem.

Quanto ao tema do primeiro eixo, voltado à checagem/confirmação da PCR, aponta-se que o reconhecimento rápido deve ser eficaz, pois quanto mais rápido ocorrer à identificação de que a gestante foi acometida por uma PCR, mais precocemente o profissional iniciará a RCP. Deste modo, o profissional deve realizar, simultaneamente, a inspeção toracoabdominal em busca de expansão torácica oriunda da respiração e palpação de arterial central (carotídea ou femoral). A ausência de pulso palpável somada à apneia ou a respiração agônica caracteriza o prejuízo de bombeamento cardíaco ocorrido na PCR22. Panchal AR, Bartos JA, Cabañas JG, Donnino MW, Drennan IR, Hirsch KG, et al. Part 3: adult basic and advanced life support: 2020 american heart association guidelines for cardiopulmonary resuscitation and emergency cardiovascular care. Circulation. 2020;142(16 Supl. 2):S366-S468. doi: https://doi.org/10.1161/CIR.0000000000000916.
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. A identificação correta foi apontada por revisão sistemática realizada por pesquisadores do Canadá como etapa crítica para o gerenciamento da PCR. A referida revisão destacou ainda a recomendação de que futuros estudos investiguem estratégias que culminem em maior preparo e sensibilidade para que o agravo seja reconhecido rápida e corretamente1313. Drennan IR, Geri G, Brooks S, Couper K, Hatanaka T, Kudenchuk P, et al. Diagnosis of out-hospital cardiac arrest by emergency medical dispatch: a diagnostic systematic review. Resuscitation, 2021;159:85-96. doi: https://doi.org/10.1016/j.resuscitation.2020.11.025.
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Referente às questões que abordaram o acionamento por ajuda, este deve ser realizado pelo profissional de saúde, imediatamente após constatar a PCR obstétrica22. Panchal AR, Bartos JA, Cabañas JG, Donnino MW, Drennan IR, Hirsch KG, et al. Part 3: adult basic and advanced life support: 2020 american heart association guidelines for cardiopulmonary resuscitation and emergency cardiovascular care. Circulation. 2020;142(16 Supl. 2):S366-S468. doi: https://doi.org/10.1161/CIR.0000000000000916.
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. A realização de tal etapa possibilitará o atendimento efetivo em equipe e permitirá que atribuições sejam delegadas a variados profissionais, como médicos, enfermeiros e técnicos de enfermagem. Esses achados corroboram relato de caso oriundo na Turquia, no qual observa-se relevância do acionamento precoce da equipe multiprofissional, para a sobrevida em PCR obstétrica1414. Caglar H, Bibata BB, Karakuzu S, Cetinkol AE, Atasoy N. Successful management of perimortem cesarian section with two types of pelvic packing; a case report. J Clin Invest Surg. 2021;6(1):68-70. doi: https://doi.org/10.25083/2559.5555/6.1.13.
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. Ao considerar que o rápido acionamento da equipe corrobora com a precoce ação efetiva da mesma, ratifica-se a importância da etapa de acionamento por ajuda constar no instrumento, de forma que poderão ser identificadas e avaliadas as lacunas acerca do conhecimento, o que tem potencial de direcionar treinamentos e capacitações dos profissionais.

O rápido acionamento do serviço de emergência culmina na chegada precoce do Desfibrilador Externo Automático (DEA). Esse achado repercute na mortalidade, como observado em estudo norte americano que encontrou sobrevivência igual entre de mulheres em PCR materna e não materna, de forma que ambos os grupos também tiveram semelhança nas taxas de desfibrilação1515. Thomas M, Hejjaji V, Tang Y, Kennedy K, Grodzinsky A, Chan PS, et al. Survival outcomes and resuscitation process measures in maternal in-hospital cardiac arrest. Am J Obst Gynecol. 2022;226(3):401.e1-401.e10. doi: https://doi.org/10.1016/j.ajog.2021.09.046.
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.

Em relação à ventilação das gestantes acometidas por PCR, em casos de ausência da via área avançada (intubação orotraqueal ou dispositivo extraglótico, como a máscara laríngea), a relação compressão/ventilação adotada pode ser de 30:2 ou as compressões podem ocorrer de forma ininterrupta, somadas às ventilações realizadas uma a cada seis segundos. Nos casos em que a gestante encontre-se com dispositivo de via área avança, o protocolo 30:2 não deve ser adotado, de forma que as compressões ininterruptas devem ser realizadas juntamente com uma ventilação a cada seis segundos22. Panchal AR, Bartos JA, Cabañas JG, Donnino MW, Drennan IR, Hirsch KG, et al. Part 3: adult basic and advanced life support: 2020 american heart association guidelines for cardiopulmonary resuscitation and emergency cardiovascular care. Circulation. 2020;142(16 Supl. 2):S366-S468. doi: https://doi.org/10.1161/CIR.0000000000000916.
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. Conforme pesquisadores da Índia, a hipóxia é mal tolerada por gestantes o que acentua a necessidade de ventilação efetiva para oferta de oxigênio para que se obtenha sucesso na desafiadora ressuscitação de pacientes obstétricos1616. Kulkarni S, Futane SS. Cardiopulmonary resuscitation in obstetric patient: special considerations. J Obstet Gynaecol India. 2022;72(3):192-200. doi: https://doi.org/10.1007/s13224-021-01568-w.
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. Essas informações precisam ser conhecidas pela enfermagem, uma vez que a ventilação da gestante em PCR, a partir da bolsa-válvula-máscara, pode ser realizada por esta categoria profissional. Logo, a presença de questões no instrumento que contemplam tais informações é relevante e pode contribuir para a correta prática profissional.

No tocante à RCP obstétrica, assim como realizado nos adultos não grávidos, as compressões devem ocorrer na frequência de 100 a 120 por minuto, com força que resulte em afundamento de 5 a 6 centímetros do tórax da gestante1717. Bernoche C, Timerman S, Polastri TF, Giannetti NS, Siqueira AWS, Piscopo A, et al. Atualização da diretriz de ressuscitação cardiopulmonar e cuidados cardiovasculares de emergência da sociedade brasileira de cardiologia - 2019. Arq Bras Cardiol. 2019;113(3):449-663. doi: https://doi.org/10.5935/abc.20190203.
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. Destaca-se que alterações gravídicas podem culminar em maior rigidez no tórax das gestantes, o que demandará a aplicação de maior força por parte do profissional que realiza a compressão. Outra especificidade da RCP em gestantes consiste na tração manual do útero para o lado esquerdo, que deve ser realizada nas mulheres que possuam idade gestacional a partir de 20 semanas. Caso os profissionais não possuam a informação da idade gestacional, a tração uterina deve ocorrer nas gestantes que apresentem o fundo uterino palpável a partir da cicatriz umbilical. Esse procedimento objetiva o alívio da compressão aortocava e, consequentemente, favorece o retorno venoso durante as manobras de RCP1818. Zelop CM, Einav S, Mhyre JM, Martin S. Cardiac arrest during pregnancy: ongoing clinical conundrum. Am J Obstet Gynecol 2018;219(1):52-61. doi: https://doi.org/10.1016/j.ajog.2017.12.232.
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,1919. Comito C, Bechi L, Serena C, Checcucci V, Mori E, Micaglio M, et al. Cardiac arrest in the delivery room after spinal anesthesia for cesarean section: a case report and review of literature. J Matern Fetal Neonatal Med. 2018;33(8):1456-8. doi: https://doi.org/10.1080/14767058.2018.1517321.
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. Tais especificidades também são contempladas nas questões do instrumento, de forma que viabilizam a avaliação e autoavaliação sobre esta relevante conduta correta a ser adotada pela enfermagem, durante a RCP em gestantes.

Na sequência do atendimento à PCR obstétrica, após cinco minutos de RCP sem retorno da circulação espontânea, é necessário considerar a realização da cesariana de emergência. Este procedimento é realizado não somente para tentativa de salvar a vida do feto, mas como componente da reanimação materna, uma vez que a descompressão da veia cava, causada pela saída do conteúdo intrauterino, tende a melhorar o retorno venoso da mãe22. Panchal AR, Bartos JA, Cabañas JG, Donnino MW, Drennan IR, Hirsch KG, et al. Part 3: adult basic and advanced life support: 2020 american heart association guidelines for cardiopulmonary resuscitation and emergency cardiovascular care. Circulation. 2020;142(16 Supl. 2):S366-S468. doi: https://doi.org/10.1161/CIR.0000000000000916.
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. Para isso, a cesariana deve acontecer no local da PCR, mesmo que fora do centro cirúrgico, uma vez que o ato de transportar a paciente para outro setor, mesmo que com mais recursos assistenciais, irá afetar diretamente a qualidade do fornecimento da RCP1919. Comito C, Bechi L, Serena C, Checcucci V, Mori E, Micaglio M, et al. Cardiac arrest in the delivery room after spinal anesthesia for cesarean section: a case report and review of literature. J Matern Fetal Neonatal Med. 2018;33(8):1456-8. doi: https://doi.org/10.1080/14767058.2018.1517321.
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,2020. Ghiringhelli JP, Lacassie HJ. Paro cardiorresoiratorio em la embarazada y cesárea perimortem. Rev Chil Obst Gonecol. 2021;86(4):410-24. doi: http://doi.org/10.24875/rechog.m21000021.
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. Conforme estudo que avaliou as PCR de gestantes no Reino Unido, a cesariana foi realizada em 74% dos casos atendidos, o que resultou em sobrevivência de 87,8% dos bebês e 21% das mães2121. Beckett VA, Knight M, Sharpe P. Tha CAPS study: incidence, management and outcomes of cardiac arrest in pregnancy in the UK: a prospective, descriptive study. BJOG. 2017;124(9):1374-81. doi: https://doi.org/10.1111/1471-0528.14521.
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. As informações referentes à cesariana de emergência na PCR obstétrica precisam ser conhecidas pela enfermagem, uma vez que essa categoria profissional é responsável pela provisão de materiais e auxílio ao profissional médico que executará o procedimento. Dessa forma, destaca-se relevância no fato do instrumento possuir questões acerca dessa informação.

Para que a assistência à gestante em PCR ocorra de forma efetiva, é necessário que as equipes que atuam nos diversos níveis de assistência sejam treinadas, pois esse agravo pode acometer gestantes em serviços de saúde de baixa complexidade, não especializados para atendimento obstétrico de emergência, de forma que o preparo da equipe será decisivo para sobrevida materna e fetal. Somado a isso, a relevância de treinamento ganha respaldo uma vez que a maior parte dos profissionais não encontram-se habituado a atender emergências de PCR obstétrica1717. Bernoche C, Timerman S, Polastri TF, Giannetti NS, Siqueira AWS, Piscopo A, et al. Atualização da diretriz de ressuscitação cardiopulmonar e cuidados cardiovasculares de emergência da sociedade brasileira de cardiologia - 2019. Arq Bras Cardiol. 2019;113(3):449-663. doi: https://doi.org/10.5935/abc.20190203.
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. Estudo realizado nos Estados Unidos destacou o baixo nível de conhecimento associado à baixa qualidade nas habilidades práticas, como obstáculos na realização da RCP materna. Essa situação é agravada ao considerar que muitos profissionais, mesmo os treinados para atuar em emergências obstétricas, tendem a apresentar declínio no conhecimento com o passar do tempo2222. Kikuchi J, Deering S. Cardiac arrest in pregnancy. Semin Perinatol. 2018;42(1):33-8. doi: https://doi.org/10.1053/j.semperi.2017.11.007.
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,2323. Dongarwar D, Taylor J, Ajewole V, Anene N, Omoyele O, Ogba C, et al. Trends in appendicitis among pregnant women, the risk for cardiac arrest, and maternal-fetal mortality. World J Surg. 2020;44(12):3999-4005. doi: https://doi.org/10.1007/s00268-020-05717-6.
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.

A validação do instrumento para avaliação do conhecimento dos estudantes e profissionais de enfermagem a acerca da parada cardiorrespiratória obstétrica obteve concordância e CVR superiores a 90% e 0,82, respectivamente. Tal fato é semelhante ao encontrado em estudo brasileiro que validou instrumento para avaliar o conhecimento da enfermagem acerca da terapia nutricional enteral2424. Carrasco V, Freitas MIP, Oliveira-Kumakura ARS, Almeida EWS. Development and validation of an instrument to assess the knowledge of nurses on enteral nutrition. Rev Esc Enferm USP. 2020;54:e03646. doi: https://doi.org/10.1590/S1980-220X2019024003646.
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. Assim, aponta-se necessidade e importância dos instrumentos utilizados pelos docentes da enfermagem apresentarem-se compreensíveis e com conteúdo correto, para que sua utilização seja viável no processo de avaliação.

A consistência interna obtida não possuiu valor superior a 0,7 e, mesmo assim, foi classificada como aceitável. Tal classificação é ratificada e corrobora estudo realizado por pesquisador do Reino Unido, que avaliou a utilização do Alpha de Cronbach em pesquisas científicas, cujos resultados mostram que os autores adotam valores distintos como aceitáveis para o Alpha de Cronbach, a depender das características do instrumento pesquisado1111. Taber KS. The use of Cronbach’s Alpha when developing and reporting research instruments. Res Sci Educ. 2018;48:1273-96. doi: https://doi.org/10.1007/s11165-016-9602-2.
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. O referido estudo aponta que, apesar de muitos autores seguirem a regra de que o alfa deve ser de, no mínimo, 0,7 para que a consistência interna seja aceitável, existem exceções para tal forma de raciocínio. Dentre elas, aponta-se que um instrumento que possua quantidade limitada de questões que avaliem ampla gama de conhecimentos a serem testados, não tende a apresentar equivalência de itens (consistência interna), diante dos diferentes conceitos que são explorados em cada questão, dentro do mesmo instrumento. Assim, valores a partir de 0,64 podem ser considerados adequados, e valores superiores a 0,6 podem ser classificados como satisfatórios e aceitáveis1111. Taber KS. The use of Cronbach’s Alpha when developing and reporting research instruments. Res Sci Educ. 2018;48:1273-96. doi: https://doi.org/10.1007/s11165-016-9602-2.
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.

Cabe destacar que o instrumento para avaliar o conhecimento da enfermagem sobre parada cardiorrespiratória obstétrica, validado no presente estudo, foi composto por 16 questões, que objetivam avaliar numerosa quantidade de constructos (reconhecimento da parada cardiorrespiratória, cadeia de sobrevivência da PCR, compressões efetivas e de qualidade, cuidados específicos da PCR/RCP obstétrica, relação compressão-ventilação com e sem via área avançada, o uso da desfibrilação em gestantes e a cesariana perimortem). Dessa forma, o instrumento enquadra-se no raciocínio do parágrafo retromencionado, no qual o valor mínimo conservador de 0,7 do Alpha de Cronbach para considerar a boa consistência interna não se aplica e, logo, o valor de 0,694 obtido pode ser considerado satisfatório1111. Taber KS. The use of Cronbach’s Alpha when developing and reporting research instruments. Res Sci Educ. 2018;48:1273-96. doi: https://doi.org/10.1007/s11165-016-9602-2.
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.

Como limitação do estudo aponta-se o fato da validação do instrumento ter ocorrido acerca do conteúdo com aceitável, porém não alta consistência interna, de forma que pesquisas posteriores necessitam avaliar a sua confiabilidade nos diversos contextos, que envolvem desde a formação técnica e superior até treinamento de profissionais, principalmente os que exercem atividade laboral nos setores de emergência e obstetrícia. Aponta-se necessidade de futuros estudos que apliquem o instrumento, separadamente, com amostra composta exclusivamente por cada subgrupo supracitado, de forma que a consistência interna seja avaliada em diferentes contextos. Outra limitação refere-se ao fato de o instrumento ter sido aplicado com estudantes que não tiveram contato prévio com componente curricular de obstetrícia, de forma que os achados do estudo podem diferir da realidade encontrada a partir da aplicação com estudantes que já tenham cursado disciplina referente à temática obstétrica.

A contribuição do presente estudo para a enfermagem e para a saúde decorre da disponibilização de instrumento com conteúdo correto e linguagem compreensível, viável de ser utilizado para avaliação do conhecimento dos profissionais e estudantes de enfermagem. Sua utilização viabilizará a identificação de lacunas de conhecimento de tal público, de forma a direcionar ações voltadas para o fornecimento de conhecimento e capacitação profissional sobre a temática. O instrumento pode ser utilizado no tripé ensino-pesquisa-extensão, em projetos acerca da PCR obstétrica que avaliem o conhecimento prévio ou que testem intervenções mediante utilização do instrumento.

O instrumento oriundo do presente estudo pode contribuir na translação do conhecimento e na formação em enfermagem de forma que, conforme estabelecido nas Diretrizes Curriculares Nacionais contribua para que os profissionais egressos possuam preparo para atuar de forma resolutiva frente às reais demandas existentes no mercado de trabalho. Diante do benefício para formação da enfermagem, a construção e validação do instrumento coadunam ainda com as Políticas de Atenção Integral à Saúde da Mulher e de Atenção às Urgências.

O instrumento poderá ser utilizado na análise do conhecimento prévio acerca da PCR obstétrica, de estudantes e profissionais da enfermagem, de forma que os resultados da sua utilização poderão direcionar treinamentos e ajustes de estratégias pedagógicas.

CONCLUSÃO

O instrumento para analisar o conhecimento dos estudantes e profissionais de enfermagem acerca da parada cardiorrespiratória obstétrica foi construído e validado. A versão final foi composta por 16 questões objetivas de múltipla escolha, que abordam o reconhecimento da parada cardiorrespiratória, cadeia de sobrevivência da PCR, a reanimação cardiorrespiratória, compressões efetivas e de qualidade, cuidados específicos da PCR/RCP obstétrica, relação compressão-ventilação com e sem via área avançada, uso da desfibrilação em gestantes e cesarianas perimortem.

Das 16 questões, nove possuíram concordância de 100% dos especialistas com CVR de 1,0; cinco possuíram 95% de concordância e CVR de 0,91, já as duas restantes a possuem de concordância mínima e CVR respectivamente 91% e 0,82. O instrumento possuiu aceitável confiabilidade, com alpha de Cronbach de 0,694.

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Editado por

Editor associado

Jéssica Teles Schlemmer

Editor-chefe

Maria da Graça Oliveira Crossetti

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    14 Nov 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    07 Mar 2022
  • Aceito
    03 Jun 2022
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