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Modulando o tempo pandêmico: a ciência e a urgência da Covid-19

Shaping pandemic time: science and the urgency of Covid-19

Resumo:

O artigo analisa o papel central da ciência no ordenamento da experiência disruptiva de tempo produzida pela Covid-19 a partir de janeiro de 2020. São examinadas as estratégias discursivas de atores-chave da Fundação Oswaldo Cruz, instituição que assumiu protagonismo no enfrentamento da doença, em sua comunicação com o público por meio da imprensa durante o primeiro ano pandêmico. Argumentamos que a ciência atuou como instância de modulação do tempo presente, a conferir-lhe direção em um momento em que a temporalidade do vírus perturbava rotinas e cercava o futuro de dúvidas. Evocando seu passado de respostas a outras emergências como referência de estabilidade, a Fiocruz colocou-se como expressão de uma ciência que, sujeita ao imperativo da aceleração e lidando com incertezas a “céu aberto”, buscou equilibrar a velocidade imposta pela urgência e a cautela exigida pela temporalidade dos protocolos científicos.

Palavras-chave:
Tempo presente; Ciência; Fundação Oswaldo Cruz; Pandemia de Covid-19

Abstract:

The article analyzes how science played a central role in shaping our experience of time during Covid-19 by examining the discursive strategies displayed in the media by key representatives of Oswaldo Cruz Foundation (Fiocruz) during the first pandemic year. Seen in Brazil as the embodiment of a longstanding scientific tradition, Fiocruz stood out in the fight against the disease outbreak. In a present filled with uncertainty, its past seemed to offer a solid reference. While reckoning the urgent need for the scientific community to speed up in the race against the virus, Fiocruz representatives argued that this could not be done to the point of undermining science specific processes, based on cautious experimentation and testing.

Keywords:
Present time; Science; Fundação Oswaldo Cruz; Covid-19 pandemic

Introdução1 1 Este artigo é resultado do projeto de pesquisa “O tempo presente na Fiocruz: ciência e saúde no enfrentamento da pandemia de Covid-19”, coordenado por Simone P. Kropf e desenvolvido no Departamento de Pesquisa em História das Ciências e da Saúde (Casa de Oswaldo Cruz/Fiocruz), com apoio do CNPq, no âmbito do Programa de Excelência em Pesquisa da Casa de Oswaldo Cruz (Proep-COC-CNPq, 2021).

A pandemia de Covid-19 lançou enormes desafios aos historiadores, ao irromper abruptamente como ameaça global no início de 2020, perturbando os fluxos acelerados de pessoas e mercadorias da vida social contemporânea. Num cenário percebido como desnorteante e incerto, eles foram instados a elaborar interpretações capazes de dotar de sentido o presente imediato. Ainda que o interesse pela história partisse em grande medida da crença de que esta se constituía em repositório de “lições do passado”, os historiadores trataram de problematizar tal visão (Armus, 2020ARMUS, Diego. Narrar la pandemia de Covid-19: historia, incertidumbres, vaticinios. In: SÁ, Dominichi Miranda de et al. (eds.). Diário da pandemia: o olhar dos historiadores. São Paulo: Hucitec, 2020. p. 91-110.). Buscaram indicar como o presente era passível de ser historicizado, com base no exame tanto das tendências estruturais, de longa duração, que lhe dão forma para além da conjuntura imediata da emergência, quanto das modalidades de percepção do tempo vigentes neste início de século XXI. Reunidas por alguns autores sob a rubrica do presentismo (Hartog, 2013HARTOG, François. Regimes de historicidade: presentismo e experiências do tempo. Belo Horizonte: Autêntica, 2013.), essas modalidades contribuíram para conformar a experiência da crise sanitária ao mesmo tempo em que foram por ela impactadas. A pandemia, ao se constituir como evento disruptivo na experiência histórica, contribuiu, como outros antes dela, para pôr em evidência a relevância de uma história do tempo presente na compreensão das sociedades contemporâneas, para além do registro noticioso do imediato e do efêmero (Pereira, Araújo, 2019PEREIRA, Mateus H. F.; ARAÚJO, Valdei L. Atualismo 1.0: como a ideia de atualização mudou o século XXI. Vitória: Milfontes, 2019.).

Tal foi a centralidade que a ciência e a saúde assumiram durante a crise que os historiadores dedicados a esses temas se viram particularmente compelidos a se envolver com o estudo do presente (Sá, Sanglard, Hochman, Kodama, 2020SÁ, Dominichi Miranda de; SANGLARD, Gisele; HOCHMAN, Gilberto; KODAMA, Kaori (eds.). Diário da pandemia: o olhar dos historiadores. São Paulo: Hucitec , 2020.; Marques, Silveira, Pimenta, 2020MARQUES, Rita de Cassia; SILVEIRA, Anny Jackeline Torres; PIMENTA, Denise Nacif. A pandemia de Covid-19: intersecções e desafios para a história da saúde e do tempo presente. In: REIS, Tiago Siqueira et al. (eds.) História do tempo presente, v. III. Boa Vista: Editora da UFRR, 2020. p. 225-249.). Afeitos a estudar a ciência como empreendimento coletivo e a explorar os nexos que a ligam invariavelmente a uma sociedade e a uma época determinadas (Lightman, 2016LIGHTMAN, Bernard (ed.). A companion to the history of science. Nova Jersey: Wiley-Blackwell, 2016.), eles se defrontaram com um contexto político eivado de negacionismos, desconfianças e questionamentos à autoridade dos atores e instituições científicas. Pôr em relevo, nessa conjuntura, os aspectos contingentes da atividade científica e as condições sociais e históricas que presidem a construção de seus enunciados - sem, contudo, oferecer munição àqueles empenhados em desacreditá-los - constitui um desafio a um só tempo político e metodológico.

A questão aproxima os historiadores da ciência dos problemas comumente enfrentados pela história do tempo presente, em que a narrativa histórica, voltando-se muitas vezes para processos em curso e sem um desfecho conhecido, acaba tendo lugar em meio às disputas em torno da memória e do significado dos acontecimentos travadas pelos atores, vivos e atuantes, que toma como objeto.2 2 Trata-se de questão constitutiva do campo, como indicam estudiosos que a ele têm se dedicado (Ferreira, 2002; Rousso, 2016; Müller, Iegelski, 2022). Além disso, as crises do presente oferecem a oportunidade para se examinar a “ciência em ação” (Latour, 2000LATOUR, Bruno. A ciência em ação. São Paulo: Unesp, 2000.) e os modos como suas asserções são produzidas, circulam e conquistam legitimidade.3 3 Esses problemas têm conformado parte importante da agenda investigativa da história e dos chamados estudos sociais da ciência (Felt et al., 2016). Sendo a ciência elemento constitutivo de como as sociedades contemporâneas se organizam, seu estudo pode contribuir para o esclarecimento das dinâmicas que lhes são próprias, incluindo a forma como se relacionam com o tempo.

Neste artigo, analisamos as estratégias discursivas de atores-chave da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) na comunicação com a sociedade brasileira durante o primeiro ano da pandemia.4 4 A demarcação temporal do surgimento e encerramento de epidemias segue dinâmicas complexas, referidas aos processos de enquadramento das doenças como entidades a um só tempo biológicas e sociais historicamente constituídas. Tal demarcação está referida a critérios epidemiológicos estabelecidos por agências de saúde, mas também a vários outros parâmetros e elementos de sentido, como a política e a experiência e percepção coletivas (e mesmo individual) do tempo. No caso da Covid-19, a doença foi oficialmente considerada uma pandemia pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em 11 de março de 2020. Já em 31 de dezembro de 2019, a agência havia sido alertada sobre casos de uma misteriosa pneumonia na cidade de Wuhan, China. Em 7 de janeiro de 2020, os chineses confirmaram tratar-se de um novo tipo de coronavírus. Em 11 de fevereiro, ele foi nomeado SARS-CoV-2, sendo a doença por ele causada batizada de Covid-19. Quanto ao seu curso temporal, o início da vacinação, em dezembro de 2020, é um marcador razoavelmente consensual do que foi considerado uma “nova fase” da doença (a coincidir com o tempo cronológico do “primeiro ano”). No que diz respeito a seu “encerramento”, os marcos são particularmente fluidos. Em 5 de maio de 2023, a OMS anunciou que, ainda que o SARS-CoV-2 continuasse circulando, a Covid-19 não era mais uma “Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional (ESPII)”. Entretanto, a percepção social desse tempo foi (como sempre havia sido) extremamente heterogênea e incontornavelmente referida a marcadores sociais diversos. Para isso, foram analisadas matérias na imprensa, principalmente dos jornais O Globo e Folha de S. Paulo e do portal de notícias G1, que veicularam, entre janeiro de 2020SÁ, Dominichi Miranda de; SANGLARD, Gisele; HOCHMAN, Gilberto; KODAMA, Kaori (eds.). Diário da pandemia: o olhar dos historiadores. São Paulo: Hucitec , 2020. e janeiro de 2021, enunciados de importantes nomes da instituição, como Marco Aurelio Krieger, vice-presidente de Produção e Inovação em Saúde; Mauricio Zuma Medeiros, diretor do Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos (Bio-Manguinhos), unidade da Fiocruz responsável pela produção de vacinas, kits para diagnóstico e biofármacos; a médica e pesquisadora Margareth Dalcolmo, que teve grande visibilidade nos meios de comunicação ao longo da pandemia; e Nísia Trindade Lima, presidente da instituição.

Nosso objetivo é compreender como a ciência se apresentou como apta a conferir direção e sentido à experiência perturbadora e disruptiva do tempo introduzida pela Covid-19. Instituição de ciência, tecnologia e inovação em saúde com longa tradição e amplo reconhecimento no país e no exterior, a Fiocruz foi referência fundamental de uma ciência que se colocou publicamente como fonte de certezas muito além do sentido estrito da produção de conhecimentos e ações necessários ao equacionamento da crise. Conforme argumentamos, a ciência foi acionada como instância de ancoragem e modulação da própria ideia de tempo, com vistas a imprimir-lhe ordenamento e estabilidade. Por vezes, seu passado de feitos em prol da saúde pública foi mobilizado a fim de que o presente incerto pudesse ser acomodado em uma narrativa histórica mais ampla, de uma ciência que marchava segura, no longo prazo, a despeito dos problemas conjunturais. Da mesma forma, os representantes da instituição buscaram um ponto de equilíbrio possível entre o tempo da aceleração, inerente à experiência de emergência e urgência, e o tempo da cautela, atributo da própria atividade científica enquanto prática que experimenta, testa, calcula, prevê e, consequentemente, projeta possibilidades de futuro como tempo estruturado.

A pandemia de Covid-19 agravou o sentido de crise que caracteriza o tempo presente.5 5 Para uma análise de percepções/vivências do tempo pandêmico relatadas em entrevistas de história oral, ver Rodeguero, Weimer (2021). Conforme observou Hartog (3 fev. 2021HARTOG, François. A Covid e o tempo: “Who is in the driver’s seat”? HHMagazine: Humanidades em Rede, 3 fev. 2021.), o tempo introduzido pelo SARS-CoV-2, contra o qual as sociedades humanas logo se viram obrigadas a travar uma corrida a fim de recuperarem seu próprio ordenamento temporal, provocou perturbações nas temporalidades do regime presentista, produzindo impasses e contradições.6 6 Hartog argumenta que, a partir do final do século XX, sociedades como a europeia e a norte-americana passaram a se relacionar com o tempo a partir da perspectiva de um presente expandido, que tenderia a se sobrepor a outras temporalidades, em uma diluição de passado e futuro. Nas palavras do autor, estaríamos diante de um “presente único: o da tirania do instante e da estagnação de um presente perpétuo”, marcado por crescente e incessante aceleração e pelo sentido de urgência (Hartog, 2013, p. 11). Atravessado por múltiplas crises (econômica, política, climática), esse presente seria pautado por respostas imediatas e pontuais, sendo incapaz de se articular a perspectivas otimistas quanto ao futuro, à maneira das chaves de leitura do tempo características do início da era contemporânea. O sentido de urgência característico desse regime se viu acentuado em face da emergência sanitária. À medida que o vírus se espraiava e, no seu tempo próprio, dava origem a novas linhagens e variantes genéticas que amplificavam incertezas e dúvidas, aumentava-se a sensação de atraso e mais premente se fazia a necessidade de respostas rápidas que pudessem conter sua marcha. Instaurou-se então, como assinalou Hartog, uma situação tensa, uma vez que a aceleração não poderia ser tal que atropelasse as temporalidades próprias aos procedimentos de validação e certificação dos instrumentos de combate à pandemia vindos das agências reguladoras e das instituições científicas.

A ciência esteve envolvida nos entrechoques de temporalidades produzidos pela emergência sanitária, sendo tensionada pelo agravamento da lógica do tempo presente das respostas rápidas. No mundo contemporâneo, a comunidade científica tem lançado mão, cada vez mais, de novos formatos de comunicação de seus achados, como os preprints, que se prendem ao imperativo da aceleração da própria dinâmica de produção e circulação do conhecimento. Esse novo arranjo do tempo da ciência - tradicionalmente visto como se desenrolando na perspectiva da longa duração e não na conjuntura imediata de demandas práticas urgentes - pode provocar ruídos na esfera pública, expondo ao público leigo incertezas que tendem a presidir, no interior da comunidade científica, o estabelecimento de seus enunciados e o consenso em torno deles. Assim, dúvidas em relação às afirmações dos estudiosos acabam sendo impulsionadas, por vezes, pela divulgação de resultados de pesquisa que, antecipando-se aos processos de revisão e validação por pares, vêm a ser posteriormente descartados.

A pandemia de Covid-19 acentuou as tensões próprias a esse regime de produção de certezas provisórias. Se, por um lado, ele atendia à gestão imediata das incertezas, por outro, abria espaço para a desconfiança e o descrédito. A perspectiva de estabilização de diretrizes de saúde para um público ávido por orientações seguras se pôs em conflito particularmente com a tendência “atualista”, conforme a qualificam Mateus Pereira e Valdei Araújo (2021PEREIRA, Mateus H. F.; ARAÚJO, Valdei L. Atualismo: pandemia e historicidades no interminável 2020. Estudos Ibero-Americanos, v. 47, n. 1, p. 1-16, 2021.), de publicação de notícias em fluxo contínuo. Tal dinâmica comunicacional, agindo sobre um cenário já dramático de emergência global, contribuiu sobremaneira para a enxurrada vertiginosa de informações, nem sempre certificadas, observada na pandemia. A busca incessante por informações novas e o receio, tipicamente contemporâneo, de se estar desatualizado, ao mesmo tempo que se agudizavam em meio às incertezas acabavam por alimentá-las. Presos ao torvelinho das atualizações constantes, os conhecimentos sobre o vírus veiculados pela imprensa em um dia davam lugar à publicização, dias depois, de novos e diferentes achados. Desse modo, o “valor de novidade” de um enunciado passava, muitas vezes, a ser confundido com seu “valor de verdade” (Pereira, Araújo, 2021PEREIRA, Mateus H. F.; ARAÚJO, Valdei L. Atualismo: pandemia e historicidades no interminável 2020. Estudos Ibero-Americanos, v. 47, n. 1, p. 1-16, 2021.).7 7 É possível aproximar a perspectiva de Hartog sobre o tempo presente e aquela desenvolvida por Pereira e Araújo (2019), na medida em que igualmente identificam, no mundo contemporâneo, a captura de outras temporalidades pela lógica de um presente autorreferente, que pretende se esgotar em si mesmo. Note-se, todavia, que os dois últimos autores estabelecem um diálogo crítico com a hipótese do presentismo, enxergando na forma de historicidade vigente não uma negação ou anulação do futuro, mas uma maneira específica, atualista, de afirmá-lo, isto é, como uma reiteração, em “versão atualizada”, do presente, o que ajudaria a explicar, conforme observam, o “paradoxo de um presente ao mesmo tempo cheio de novidades e quase sempre vazio de eventos” (p. 223).

Ainda que tenham se tornado salientes durante a emergência sanitária, tais tensionamentos que atravessam a ciência, como observa Gil Eyal (2019EYAL, Gil. The crisis of expertise. Cambridge: Polity Press, 2019.), dizem respeito à conformação mesma da noção de expertise ao longo do século XX. Ela se refere a situações em que cientistas são chamados a produzir recomendações para a tomada de decisões e a definição de políticas públicas sobre temas relacionados às suas áreas de conhecimento, assumindo, desse modo, o papel de experts. Como nos lembra o autor, retomando a definição do sociólogo Niklas Luhmann, o expert ocupa uma posição intrinsecamente tensa e paradoxal. Embora sobre ele recaia a expectativa (socialmente legítima, dadas as suas credenciais científicas) de que seja capaz de contribuir para a resolução de problemas práticos que afligem o mundo social, estes, por sua própria natureza, com frequência extrapolam as capacidades preditivas e os conhecimentos certificados de que é portador, exigindo o desenvolvimento de novos saberes (Eyal, 2019EYAL, Gil. The crisis of expertise. Cambridge: Polity Press, 2019., p. 25).8 8 Luhmann observa, não sem ironia, que o expert é um “especialista a quem se pode fazer perguntas que ele não está apto a responder”, o que não implica a desqualificação da ciência que representa, mas o reconhecimento das tensões inerentes à sua posição: embora suas atividades de aconselhamento junto à tomada de decisões tenham se tornado imprescindíveis nas sociedades contemporâneas, estas são invariavelmente marcadas por limitações e contingências em relação aos desafios, sempre novos e complexos, do mundo real, muitas vezes a demandar respostas rápidas e imediatas que desafiam o tempo da ciência. Sobre a questão, ver Eyal (2019), capítulo 2. Isto é, o expert se encontra a meio caminho entre duas temporalidades. Como cientista, é regido pelo tempo próprio da ciência, que, por um lado, aspira à produção de consensos no longo prazo e, por outro, se estabelece como “tempo reversível”, em que qualquer enunciado está necessariamente sujeito à revisão a partir de novas pesquisas e achados. Ao mesmo tempo, ele se vê confrontado com o tempo imediato e urgente da política, a exigir decisões aqui e agora em cenários sempre complexos, permeados por contingências e imponderáveis que contrastam com a ideia de controle típica do experimento laboratorial. Desse modo, os fatos produzidos por essa “ciência regulatória”, como a denomina Eyal (2019EYAL, Gil. The crisis of expertise. Cambridge: Polity Press, 2019.), seriam necessariamente mais abertos ao questionamento, apoiando-se em cálculos probabilísticos, estimativas, projeções e modos convencionalizados de administração da incerteza e do risco.

A pandemia de Covid-19 evidenciou os desafios que os experts devem enfrentar no delicado trabalho de traduzir achados científicos em recomendações práticas. À medida que a própria noção de emergência reforçava a perspectiva do urgente, cresciam os desafios para gerir o descompasso entre o tempo da ciência e o tempo da tomada de decisões (tanto na esfera pública, quanto no âmbito individual). Nesse contexto, os cientistas se viram instados a calibrar essas temporalidades díspares não apenas na produção de respostas à crise, mas também, como examinaremos a seguir, na comunicação dessas respostas junto ao público.9 9 Sobre as respostas dos sistemas de ciência e tecnologia de diversos países, incluindo o Brasil, à pandemia de Covid-19, ver Neves e Sobral (2021). Para um amplo panorama das inúmeras questões que a pandemia trouxe ao campo da saúde coletiva, ver Sousa (2022).

Este artigo analisa a fala de atores da Fiocruz que se pronunciaram, nos veículos de comunicação, sobre as ações de enfrentamento à crise durante o primeiro ano da pandemia. Abordaremos, inicialmente, a maneira como a ciência, no intuito de fazer frente às demandas da emergência, apresentou-se publicamente como apta a intervir sobre o presente ditado pelo vírus. O apelo ao passado da instituição, que completava 120 anos precisamente em 2020, serviu, nesse caso, à busca por dar lastro a um empreendimento que se desenrolava em um contexto marcado por dúvidas e incertezas. Em seguida, nos deteremos na forma como expectativas de futuro, capazes de fornecer enquadramentos temporais para os acontecimentos que se sucediam de modo mais ou menos imprevisível, foram produzidas a partir de esforços para conciliar o tempo da aceleração e as exigências de cautela postas pelo tempo próprio da ciência. Buscamos assim compreender como a ciência, ao apresentar-se à sociedade como apta a enfrentar a emergência sem abrir mão dos atributos que a distinguem, ofereceu parâmetros para a organização do tempo em um momento de crise aguda, em que as incertezas sobre o porvir se amplificavam à medida que atores políticos aos quais caberia a tomada de decisões contribuíam, eles próprios, para acirrar a crise.

Segurança do passado, incertezas do presente

Junto a outras instituições científicas, a Fiocruz engajou-se prontamente no enfrentamento da pandemia de Covid-19 no Brasil.10 10 Vinculada ao Ministério da Saúde, a Fiocruz é uma instituição de ciência, tecnologia e inovação em saúde que desenvolve atividades nas áreas de pesquisa e ensino (em diversos campos do conhecimento, desde as ciências biomédicas e da saúde, até as ciências humanas e sociais); desenvolvimento tecnológico e produção de imunobiológicos, kits para diagnósticos, biofármacos e medicamentos; vigilância, assistência e promoção à saúde; informação e comunicação; educação e divulgação científica; preservação da memória e história das ciências e da saúde no Brasil. Presente em dez estados brasileiros, reúne cerca de 12 mil trabalhadores (dados de 2021) com a missão institucional de produzir, disseminar e compartilhar conhecimentos e tecnologias voltados ao fortalecimento e à consolidação do Sistema Único de Saúde (SUS). Suas origens remontam ao Instituto Soroterápico Federal, também conhecido como Instituto de Manguinhos, criado em 1900, na cidade do Rio de Janeiro, para produzir vacinas e outros imunobiológicos para enfrentamento de epidemias e outros problemas de saúde pública do país, e que, desde os primeiros anos, constituiu-se como importante centro de pesquisa, produção e ensino. A instituição teve presença destacada nos debates públicos e projetos para a nação em diversos momentos históricos, a exemplo de sua participação ativa no movimento da Reforma Sanitária que levou à criação do SUS e à concepção de saúde como direito de todos e dever do Estado, garantida pela Constituição Federal de 1988 (Kropf, Sá, 2020). Além de gerar conhecimentos sobre os diversos aspectos (biológicos, médicos e sociais) da doença e de prover meios para dimensioná-la, combatê-la e preveni-la, a instituição se tornou referência para a divulgação, junto a diferentes públicos, de informações e orientações cientificamente embasadas sobre como lidar com a crise. Sua presença nos meios de comunicação contribuiu para reforçar a confiança na ciência num contexto em que as incertezas próprias à emergência se somavam às dúvidas lançadas pelos que negavam ou minimizavam sua gravidade, motivados por claros interesses políticos e ideológicos.11 11 Estudo sobre a percepção pública da Fiocruz realizado entre maio e junho de 2020 mostrou que 97,3% dos entrevistados estavam confiantes de que a ciência daria respostas efetivas à pandemia (Massarani et al., set. 2020, p. 9).

A primeira frente de atuação da Fiocruz para o enfrentamento imediato da pandemia foi identificar sua propagação pelo país. A partir de sua inserção no Sistema Global de Vigilância e Resposta à Influenza da OMS, a instituição se mobilizou, em janeiro de 2020, para o sequenciamento do novo vírus, capacitando os laboratórios de saúde pública do país (e alguns da América Latina) a fazer o diagnóstico, e para a produção de kits para viabilizar a testagem da população.12 12 Para um panorama das ações da Fiocruz no enfrentamento da pandemia, ver: Kropf et al. (2021); Lima, Medeiros, Santos (2022). A resposta da Fiocruz aos desafios da testagem é reveladora de como, desde o primeiro momento, a ciência procurou ajustar sua temporalidade ao sentido da urgência associado à demanda por respostas rápidas. Como indicaremos, esse salto vertiginoso para o presente não se fez sem referências ao passado e à tradição da instituição no enfrentamento de desafios postos à saúde pública, categorias temporais importantes utilizadas por seus representantes na busca por conferir alguma estabilidade à experiência desnorteante da aceleração em um cenário de dúvidas e incertezas.

Um dos especialistas da Fiocruz a vir a público prestar informações sobre a testagem foi Marco Aurelio Krieger. Pesquisador com experiência em genética e biologia molecular, Krieger exercia a vice-presidência de Produção e Inovação em Saúde da fundaçao. Suas declarações sobre o compromisso da instituição em atender às demandas sem precedentes da testagem são um exemplo de como a ciência se viu imersa no processo social mais amplo de corrida contra o vírus.

Em abril de 2020, quando a imprensa cobrava do Ministério da Saúde providências para viabilizar a testagem na escala demandada pela pandemia, ao mesmo tempo em que veiculava imagens de hospitais e cemitérios de Manaus lotados, Krieger falou à Folha de S. Paulo sobre os esforços da Fiocruz para ampliar sua capacidade de fabricação de kits moleculares para distribuição na rede pública. A reportagem sintetizou:

Em menos de dois meses, a produção da Fiocruz, por exemplo, foi de 30 mil - valor inicialmente calculado para um impacto tido como limitado da epidemia, quando ainda não havia mais informações sobre o comportamento do vírus - para 1,2 milhão, volume ainda insuficiente para o panorama atual. Já a partir de maio, a produção deverá chegar a 2 milhões de testes, o que representa quase o dobro da produção anual de testes para algumas doenças (Cancian, 21 abr. 2020CANCIAN, Natália. Fiocruz quer pedir registro de vacina de Oxford contra Covid à Anvisa até 15 de janeiro. Folha de S. Paulo, São Paulo, 28 dez. 2020.; grifos nossos).

Se a progressão exponencial dos números sugeria um cenário positivo, registrava-se que, ainda assim, o ritmo não atendia às expectativas impostas pela urgência. Krieger indicou que a “logística da coleta e o processamento [das amostras]” eram um “gargalo” fundamental para a “testagem massiva” (Cancian, 21 abr. 2020CANCIAN, Natália. Fiocruz quer pedir registro de vacina de Oxford contra Covid à Anvisa até 15 de janeiro. Folha de S. Paulo, São Paulo, 28 dez. 2020.). Além das restrições decorrentes da dependência do país em relação à importação de insumos disputados ferrenhamente no mercado internacional (entre os quais o cotonete nasal para coleta da amostra), “outro impasse”, sinalizava a jornalista, era “o tempo de análise”. Krieger explicou: “São testes sofisticados que precisam de três etapas de reações. É um processo que demora em torno de quatro horas, e é difícil trabalhar com grandes números ao mesmo tempo” (Cancian, 21 abr. 2020CANCIAN, Natália. Fiocruz quer pedir registro de vacina de Oxford contra Covid à Anvisa até 15 de janeiro. Folha de S. Paulo, São Paulo, 28 dez. 2020.).

Reconhecendo os obstáculos, ele afirmava a capacidade da ciência de, apesar de tudo, vencê-los. Como destacou a jornalista:

Na tentativa de acelerar a análise, a Fiocruz e o IBMP [Instituto de Biologia Molecular do Paraná] começaram na semana passada a usar máquinas automatizadas em cinco unidades. O modelo permite analisar um volume maior de amostras de forma conjunta. Com isso, as análises deverão chegar a 550 amostras por dia por unidade (Cancian, 21 abr. 2020CANCIAN, Natália. Fiocruz quer pedir registro de vacina de Oxford contra Covid à Anvisa até 15 de janeiro. Folha de S. Paulo, São Paulo, 28 dez. 2020.).13 13 A realização dos testes de RT-PCR nas amostras coletadas em todo o país era atribuição dos Laboratórios Centrais de Saúde Pública (Lacen) de cada estado, mas estes não davam conta, naquele momento, da escala e da velocidade exigidas pela pandemia. Em face desses “gargalos”, a Fiocruz, que produzia os kits para o diagnóstico molecular, passou também a atuar no processamento das amostras. Ver Lima, Medeiros, Santos (2022).

Multiplicando as associações no interior de suas redes, como diria Bruno Latour (2000LATOUR, Bruno. A ciência em ação. São Paulo: Unesp, 2000.), por meio de dispositivos técnicos que conferiam nova escala aos processos, e em trabalho conjunto com os Laboratórios Centrais de Saúde Pública (Lacen) do país, a ciência demonstrava ser capaz de acelerar ainda mais sua marcha. Numa conjuntura marcada pelo acirramento da crise política, visível nos embates em torno das medidas de isolamento que culminaram com a exoneração do ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta em 16 de abril de 2020, a Fiocruz assumia responsabilidades que iam além do que lhe caberia em “tempos normais”. Seu raio de atuação se ampliava ainda mais à medida que a política do governo Bolsonaro passava a ser fator de desorganização de um presente pressionado pela urgência.14 14 Como afirmam Kiss, Paiva e Teixeira (2023) em sua análise do sistema nacional de vigilância epidemiológica brasileiro durante a pandemia de Covid-19, as tensões entre a condução política do governo federal e as diretrizes técnicas formuladas pelas instituições de saúde colocaram em xeque a própria capacidade do Estado brasileiro de planejar e coordenar as ações de enfrentamento da doença. O artigo integra dossiê dedicado ao tema da Covid-19 na revista História, Ciências, Saúde - Manguinhos (https://www.scielo.br/j/hcsm/i/2023.v30suppl1/).

A cobertura jornalística da época destacou outra frente de ação pela qual a Fiocruz afirmava sua capacidade de dar respostas velozes aos primeiros desafios do tempo pandêmico: a assistência médica. Em maio de 2020, quando havia fila de espera para internação de pacientes com a doença nos hospitais públicos no estado do Rio de Janeiro, o Jornal Nacional noticiou a inauguração do Centro Hospitalar para a Pandemia de Covid-19 (Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas/Fiocruz). Instalado na sede da instituição na cidade do Rio de Janeiro, a unidade disponibilizou à rede pública 195 leitos de terapia intensiva para casos graves da doença. A celeridade que todos esperavam da ciência foi representada por imagens eloquentes: a reprodução de um vídeo em time-lapse produzido pela instituição para registrar as obras de construção do hospital, concluídas em apenas dois meses. Numa conjugação singular entre a aceleração para o presente e o legado para o futuro, a ideia do “tempo recorde” vinha acompanhada da informação de que, diferente de outras iniciativas do momento, não se tratava de um “hospital de campanha”: “vai continuar funcionando depois da pandemia”, dizia a reportagem, posteriormente veiculada pelo G1 (Fiocruz inaugura..., 20 maio 2020).

A costura de temporalidades nas falas públicas dos especialistas da Fiocruz também envolveu, de modo reiterado, a referência ao passado da instituição como elemento de credibilidade e da confiança de que a ciência teria condições para conferir um norte seguro ao tempo, a despeito da aceleração vertiginosa. O momento era particularmente propício a essa valorização da memória institucional. Criada em 1900 para combater epidemias de febre amarela, peste bubônica e varíola na capital federal, e tendo enfrentado, ao longo de sua história, diversas outras emergências sanitárias, como gripe espanhola, meningite, HIV-Aids, zika, dengue e chikungunya, a Fiocruz completou 120 anos em maio de 2020 (Kropf, Sá, 2020SÁ, Dominichi Miranda de; SANGLARD, Gisele; HOCHMAN, Gilberto; KODAMA, Kaori (eds.). Diário da pandemia: o olhar dos historiadores. São Paulo: Hucitec , 2020.).

Além da referência ao fato de que a instituição havia incorporado, em 1937, a tecnologia para a fabricação da vacina contra a febre amarela (da qual é, atualmente, a maior produtora mundial), outro exemplo recorrente dos usos do passado na conformação narrativa sobre o presente foi a comparação com a pandemia de gripe espanhola de 1918. A presidente da Fiocruz Nísia Trindade Lima se referiu a ela em várias ocasiões, lembrando a atuação de cientistas da instituição, como Carlos Chagas, no seu enfrentamento. Em entrevista à Ciência Hoje no mês em que a Fiocruz completava seus 120 anos, afirmou: “é uma tradição que se atualiza hoje” (Daher, 11 maio 2020DAHER, Valquíria. A Fiocruz diante da Covid-19. (Entrevista com Nísia Trindade Lima). Ciência Hoje, 11 maio 2020., p. 2).

A referência às “lições da história” (incluindo a história da própria pandemia em curso) foi expediente discursivo também para qualificar o futuro que se pretendia alcançar. Na mesma entrevista, Trindade (ela própria socióloga e historiadora da ciência) salientou: “esses são os principais aprendizados: a importância de se investir em ciência e tecnologia e associá-las ao que chamamos de Complexo Econômico e Industrial da Saúde. O SUS requer inovação e tecnologia, requer uma base produtiva” (Daher, 11 maio 2020SÁ, Dominichi Miranda de; SANGLARD, Gisele; HOCHMAN, Gilberto; KODAMA, Kaori (eds.). Diário da pandemia: o olhar dos historiadores. São Paulo: Hucitec , 2020., p. 2).15 15 Sobre o conceito de Complexo Econômico e Industrial da Saúde, ver Gadelha (2022).

A história da Fiocruz e sua identidade como instituição de Estado com longa tradição de respeitabilidade foram acionadas, inclusive, para protegê-la de tensionamentos políticos. Em abril de 2020, quando pesquisadores da fundação foram alvo do ataque de bolsonaristas em virtude de estudos que demonstravam a ineficácia e os efeitos adversos da administração de cloroquina em pacientes graves de Covid-19, Trindade declarou em entrevista ao portal UOL: “Estamos cumprindo nosso destino histórico” (Alves, 21 abr. 2020ALVES, Chico. Ataques ameaçam trabalho científico, diz presidente da Fiocruz. (Entrevista com Nísia Trindade Lima). UOL Notícias, 21 abr. 2020.).16 16 Para o posicionamento público da Fiocruz em defesa dos pesquisadores responsáveis pelo estudo, ver Fiocruz (17 abr. 2020). A ideia de tradição, nesse caso, tornava-se um recurso não apenas de legitimação, mas também de posicionamento no debate público com vistas a tratar tais tensões como elementos circunstanciais que não abalariam a instituição em sua marcha. Ligados ambos a um percurso apresentado como inexorável, o passado se constituía como fiador do presente.

Projeções para o futuro

A construção de futuros possíveis foi uma das principais estratégias discursivas pelas quais a Fiocruz afirmou o papel da ciência como fonte de ordenamento e estabilização das temporalidades perturbadas pela pandemia. Operação recorrente nesse sentido foi a combinação (muitas vezes difícil) entre a velocidade que a sociedade esperava dos especialistas e a cautela imposta pelas dinâmicas da ciência, sem a qual eles afirmavam ser impossível atingir, de modo seguro, a velocidade desejada.

A combinação não era trivial. A própria temporalidade da expertise científica estava em regime de aceleração. A urgência do momento fez com que as publicações em formato de preprint, que já vinham marcando os processos de produção da ciência, passassem a circular “a céu aberto” no espaço público, antes de seguirem seu curso de validação por meio da revisão por pares. Além disso, o tempo da emergência também impactava as lógicas de organização de um ator social decisivo da rede pela qual esses enunciados e dados da ciência circulavam no espaço público. O jornalismo, que já vinha sendo pautado por uma nova forma de produção de notícias, em que a medida do tempo deixava de ser diária para ser a do “tempo contínuo”, também se viu desafiado a noticiar um presente incontornavelmente marcado pela fluidez, provisoriedade e imprevisibilidade (Massarani, Neves, Silva, 2022MASSARANI, Luisa Medeiros; NEVES, Luiz Felipe Fernandes; SILVA, Carla Maria da. Excesso e alta velocidade das informações científicas: impactos da Covid-19 no trabalho de jornalistas. E-Compós, n. 25, 2022.).

Como indicado anteriormente, foram paradoxais os efeitos dessa “temporalidade atualista” (Pereira, Araújo, 2019PEREIRA, Mateus H. F.; ARAÚJO, Valdei L. Atualismo 1.0: como a ideia de atualização mudou o século XXI. Vitória: Milfontes, 2019.) sobre os circuitos epistêmicos e sociais da ciência. Por um lado, garantia-se maior agilidade para a tomada de decisões. Por outro lado, a provisoriedade de enunciados e achados científicos, explicitada no fluxo contínuo das notícias, gerava muitas vezes a percepção de que as diretrizes sobre o que fazer em cada momento poderiam estar desatualizadas no instante seguinte (Watson, 2022WATSON, Clare. Rise of the preprint: how rapid data sharing during Covid-19 has changed science forever. Nature Medicine, v. 28, n. 1, p. 2-5, 2022.). Ao condicionar a velocidade à prudência, os especialistas buscavam manejar as incertezas não só quanto ao vírus, mas quanto às condições pelas quais eles poderiam contê-lo.

Expediente central na modelagem do tempo foi o recurso à previsão, atributo epistemológico tradicionalmente identificado à ciência e credencial decisiva para sua legitimidade social. Durante a pandemia, tal expediente assumiu grande visibilidade no espaço público, tanto por meio de números, curvas, percentuais e outras “inscrições” técnicas típicas dos enunciados científicos (Latour, 2000LATOUR, Bruno. A ciência em ação. São Paulo: Unesp, 2000.), quanto através de recomendações qualificadas extraídas desses dados.

Um dos principais porta-vozes da Fiocruz a representar essa dimensão preditiva da ciência foi o Observatório Covid-19, plataforma digital criada pela instituição em abril de 2020 com o objetivo de produzir e divulgar informações e orientações tecnicamente embasadas que pudessem nortear as decisões por parte dos gestores e da sociedade de modo geral. Seus boletins apresentavam, a cada 15 dias, o quadro epidemiológico no país e nos estados com base nos seguintes indicadores: taxas de incidência (casos por 100 mil habitantes) e mortalidade (óbitos por 100 mil habitantes), níveis de crescimento ou queda de casos de Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) e taxa de ocupação de leitos de UTI por Covid-19. A composição dessa sequência temporal com base em dados quantificáveis, pela qual se tornava possível estabelecer padrões e tendências, era uma forma persuasiva de dar materialidade ao tempo do vírus e embasar tecnicamente recomendações para contê-lo. Amplamente utilizado como fonte pelos veículos de comunicação, o Observatório se tornou uma das principais faces públicas da instituição, atuando como importante instância de percepção e ordenamento da fluidez e das incertezas do tempo pandêmico (Lima, Medeiros, Santos, 2022MEDEIROS, Mauricio Zuma et al. (eds.). A primeira vacina 100% brasileira contra a Covid-19: a conquista de Bio-Manguinhos/Fiocruz. Rio de Janeiro: Fiocruz/Bio-Manguinhos, 2022. Disponível em: Disponível em: https://www.arca.fiocruz.br/handle/icict/52830 . Acesso em: 22 fev. 2024.
https://www.arca.fiocruz.br/handle/icict...
; Freitas et al., 2023FREITAS, Carlos Machado de et al. Observatório Covid-19 Fiocruz: uma análise da evolução da pandemia de fevereiro de 2020 a abril de 2022. Ciência & Saúde Coletiva, v. 28, n. 10, p. 2845-2854, 2023.).17 17 Nos primeiros meses de 2021, quando ocorreu a crise por falta de insumos como oxigênio hospitalar e pela superlotação dos leitos de UTI para adultos acometidos pela doença, o Observatório Covid-19 da Fiocruz lançou boletins extraordinários, publicados a partir de março, com dados e recomendações para a população e gestores públicos sobre como lidar com o iminente colapso nacional do sistema de saúde. Esses boletins tiveram grande repercussão nas mídias jornalísticas, sobretudo quando da publicação, nas edições de 9 e 16 de março, de uma sequência de mapas do Brasil com dados de ocupação de leitos de UTI por estado, entre julho de 2020 e março de 2021. A situação em cada “semana epidemiológica” foi representada por cores, conforme padrão da OMS: verde (fora de zona de alerta, com taxas inferiores a 60%), amarelo (zona de alerta intermediária, com taxas iguais ou superiores a 60%) e vermelho (zona de alerta crítico, com taxas iguais ou superiores a 80%). Colocando os mapas lado a lado, a “série histórica” dava a ver, de modo claro, o agravamento acelerado e dramático da pandemia, ao mostrar o país tornando-se, progressivamente, vermelho (Fiocruz, 16 mar. 2021; Fiocruz diz..., 16 mar. 2021).

Em alguns momentos, entretanto, as previsões e recomendações dos especialistas entravam em choque com outras lógicas de intervenção sobre o presente, como a ditada pelo governo de extrema direita de Jair Bolsonaro que, em março de 2020, minimizou o tempo do vírus, associando-o a uma “gripezinha” que não justificaria que o país ficasse “parado”. Em entrevista à agência Reuters, em 3 de junho de 2020, o pesquisador da Fiocruz Marcelo Gomes, coordenador do InfoGripe/Fiocruz, responsável pelo monitoramento dos casos de SRAG, alertou sobre os riscos da flexibilização das medidas de distanciamento, demandada por alguns atores políticos e iniciada num momento em que os dados epidemiológicos indicavam a tendência de se chegar, nas palavras dos jornalistas, a “um pico elevado e bastante acelerado da Covid-19 no país”. “Muito preocupante”, afirmou Gomes. Num momento em que a velocidade do vírus batia recordes diários, a desorientação produzida pelo desencontro entre ciência e política foi expressa na dúvida de um banhista que tomava sol em Copacabana, entrevistado pela reportagem: “Não pode? Pensei que estava liberado. Está meio confuso, hoje é uma regra, amanhã outra” (Fonseca, Simões, 3 jun. 2020FONSECA, Pedro; SIMÕES, Eduardo. Reabertura com casos de Covid-19 em alta pode agravar pico da pandemia, dizem especialistas. Reuters, 3 jun. 2020.).

Às pressões por respostas rápidas para a crise, os especialistas procuraram contrapor uma temporalidade que, embora veloz, não poderia nem deveria deixar de ser pautada pela lógica da ciência. O esforço de calibrar perspectivas de futuro com a cautela exigida pela ciência ficava evidente nas falas da pneumologista Margareth Dalcolmo. A “doutora da Fiocruz”, como muitos a chamavam, conquistou grande visibilidade nas mídias, dirigindo-se ao público a partir da autoridade e do prestígio de sua identidade socioprofissional de médica. Seus conselhos pareciam tornar o futuro mais palpável do que os enunciados “frios” sobre como “achatar a curva”. Em 21 de abril de 2020, em sua coluna no jornal O Globo intitulada “A hora da ciência”, Dalcolmo afirmou que, naquele momento em que muitos se perguntavam sobre “o que seria a nova normalidade após a pandemia do coronavírus”, o tempo ainda estava pautado “por esse desconhecido ‘novo’, pelo desafio ainda longe de solução”. Aos que queriam apressar o passo para o futuro, a ciência recomendava manter o compasso da espera. Em suma: “fique em casa” (Dalcolmo, 21 abr. 2020).18 18 Dalcolmo (2021) reuniria os textos publicados em suas colunas em livro intitulado Um tempo para não esquecer.

Sob o tom pessoal da médica que “diz a verdade” a seus pacientes, Dalcolmo vocalizou, em muitos momentos, a crítica quanto aos tensionamentos sobre a ciência produzidos por membros ou admiradores do governo Bolsonaro, como no caso da defesa da cloroquina mesmo depois de comprovada sua ineficácia como recurso terapêutico para a Covid-19. Em entrevista ao jornal O Globo em 25 de maio de 2020, compartilhando sua experiência pessoal com a doença, da qual estava se recuperando, ela foi incisiva ao condenar a aprovação, no dia 20, pelo então ministro da Saúde Eduardo Pazuello, de protocolo ampliando o uso da cloroquina e da hidroxicloroquina:

É muito sério, terrível, o que o ministério fez, porque essas drogas podem causar efeitos colaterais severos, principalmente arritmias. Eu jamais receitaria essas drogas para qualquer paciente de Covid-19, não importa se caso leve, moderado ou grave (Azevedo, 25 maio 2020AZEVEDO, Ana Lúcia. Tempo da ciência não é o da pressão política para a aprovação de uma vacina, destacam cientistas. O Globo, Rio de Janeiro, 10 set. 2020.).

A própria perspectiva de se responder “de modo definitivo sobre a utilidade ou não de vários fármacos candidatos ao tratamento da Covid-19”, afirmava ela, dependia do “tempo necessário à geração das chamadas evidências de boa qualidade”. Caso contrário, a expectativa legítima quanto a “fármacos da esperança” seria apropriada pelos interesses da política (Dalcolmo, 15 set. 2020DALCOLMO, Margareth. Covid-19 e seus enigmas. O Globo, Rio de Janeiro, 15 set. 2020.).19 19 Sobre os usos políticos da cloroquina, ver Rodrigues (2020).

Em meados de 2020, o principal vetor das projeções de futuro passou a ser a expectativa da imunização. Se, em tempos normais, o desenvolvimento de vacinas consumia vários anos, o regime de temporalidade imposto pela pandemia mobilizou cientistas e empresas farmacêuticas de todo o mundo para uma corrida sem precedentes em busca de um imunizante que pudesse interromper a disseminação do vírus.20 20 Sobre o recurso à metáfora da “corrida” no tratamento jornalístico conferido às vacinas, ver Massarani e Neves (abr. 2021). Se, por um lado, a ideia de avanços da ciência “em tempo recorde” alimentava a confiança, por outro, ela era utilizada por grupos empenhados na disseminação de teorias conspiratórias sobre as vacinas a fim de amplificar os temores quanto aos riscos supostamente envolvidos em um processo tão veloz.

Falando à Folha deS. Paulo, em junho de 2020SÁ, Dominichi Miranda de; SANGLARD, Gisele; HOCHMAN, Gilberto; KODAMA, Kaori (eds.). Diário da pandemia: o olhar dos historiadores. São Paulo: Hucitec , 2020., sobre o início das tratativas que permitiriam à Fiocruz incorporar a tecnologia de produção da vacina desenvolvida pela Universidade de Oxford e licenciada para a farmacêutica AstraZeneca, Krieger apresentou o otimismo cauteloso que passaria a marcar as falas dos especialistas sobre a tão aguardada fase decisiva da batalha contra o vírus: “Acreditamos que, no Brasil, ainda no primeiro semestre do ano que vem [2021] podemos ter a vacina. Vamos tentar acelerar ao máximo, mas com toda segurança” (Cancian, 29 jun. 2020CANCIAN, Natália. Fiocruz quer pedir registro de vacina de Oxford contra Covid à Anvisa até 15 de janeiro. Folha de S. Paulo, São Paulo, 28 dez. 2020.).

A partir de então, as atenções estariam voltadas para os resultados dos estudos clínicos que, esperava-se, iriam atestar a segurança e a eficácia dos imunizantes então desenvolvidos e balizar os cronogramas para o início da vacinação. A ideia de fases ou etapas a serem cumpridas segundo os protocolos científicos, recorrente em várias frentes de ação para controlar a pandemia, tornou-se, sobretudo nesse momento de ansiedade pela vacina, um recurso fundamental para manejar as expectativas de futuro.

No caso das vacinas que se mostravam promissoras para o Brasil, como a CoronaVac, desenvolvida pela farmacêutica chinesa Sinovac Biotech e que seria fabricada pelo Instituto Butantan, e a vacina Oxford/AstraZeneca, a ser produzida pela Fiocruz, o fato mesmo de estarem na última etapa (fase 3) dos estudos clínicos já gerava confiança. Entretanto, ainda havia muitas dúvidas sobre “o que viria depois” dos testes, ou seja, se elas se mostrariam efetivas no “mundo real”. Era uma promessa de futuro que intensificava, portanto, as cobranças à ciência e aos especialistas.

Ao referir-se, em julho de 2020, ao desafio de “comunicar a incerteza”, Nísia Trindade Lima sintetizou, em entrevista ao portal UOL, o expediente discursivo dos cientistas e da instituição por ela presidida, que associava otimismo e prudência:

Em momentos de emergência, como o que estamos vivendo, a atenção se volta para a ciência, com uma certa ansiedade compreensível. Os cientistas estão trabalhando para dar as respostas necessárias, mas a ciência tem seu tempo e precisamos ter calma para que o rigor ético não se perca. Vemos que, em momentos assim, a confiança na ciência aumenta. Mas é natural também a busca por respostas rápidas (Ribeiro, 6 jul. 2020RIBEIRO, Eduardo. “A pandemia não é a mesma para todos”, diz a presidente da Fiocruz. (Entrevista com Nísia Trindade Lima). UOL, Ecoa, 6 jul. 2020.; grifos nossos).

Em agosto daquele ano, quando ainda não haviam sido divulgados os resultados dos testes de segurança e eficácia da vacina que a Fiocruz viria a produzir, declarações de Krieger reproduzidas em reportagem de O Globo apresentavam como tônica a recomendação que seria recorrente na fala dos cientistas: paciência. A necessidade da cautela conferia à vacina o duplo e paradoxal sentido de algo possível, mas, apesar das expectativas positivas, ainda incerto naquele momento.

A vacina hoje [agosto de 2020] tem de ser encarada como um plano B. No melhor cenário, chegará daqui a alguns meses. É preciso ter um pouco de paciência. Até lá, o enfrentamento à pandemia precisa ser feito com testagem, uso de máscara e dinâmica de distanciamento - diz o representante da Fiocruz ao GLOBO. [...] Krieger afirma que o processo em curso busca ‘antecipar o máximo possível a produção da vacina, mas sem ‘queimar etapas’ (Sassine, 28 ago. 2020SASSINE, Vinícius. “Vacina ainda deve ser encarada como plano B”, diz vice-presidente da Fiocruz. O Globo, Rio de Janeiro, 28 ago. 2020.; grifos nossos).

Chegando mesmo a admitir que a vacina de Oxford/AstraZeneca (assim como outras) poderia não se mostrar viável, Krieger explicitou a lógica que presidia o cálculo por meio de sentenças costuradas por um adversativo: “Esse risco foi assumido. Mas o risco maior era, sem a parceria [com a AstraZeneca], não ter a vacina para o ano que vem” (Sassine, 28 ago. 2020SASSINE, Vinícius. “Vacina ainda deve ser encarada como plano B”, diz vice-presidente da Fiocruz. O Globo, Rio de Janeiro, 28 ago. 2020.).

O anúncio, pela AstraZeneca, em 8 de setembro, de que havia interrompido temporariamente os estudos clínicos para averiguar a suspeita (logo descartada) de um caso de “reação severa” no Reino Unido teve grande impacto na cobertura jornalística, como “anticlímax” da marcha ascendente da confiança no futuro. Reportagem de O Globo em 10 de setembro estampou no título as palavras com que Dalcolmo resumiu o esforço dos especialistas em mitigar os temores de que o caminho rumo à vacina tivesse engatado a marcha a ré: “Tempo da ciência não é o da pressão política para a aprovação de uma vacina, destacam cientistas”. A sociedade era conclamada a confiar nos cientistas. “Para isso servem testes. Suspensão não é reprovação. A interrupção é temporária. Estou confiante de que a vacina continuará a ser testada após a investigação”, enfatizou Dalcolmo (Azevedo, 10 set. 2020AZEVEDO, Ana Lúcia. Tempo da ciência não é o da pressão política para a aprovação de uma vacina, destacam cientistas. O Globo, Rio de Janeiro, 10 set. 2020.).

À medida que o tempo avançava, especialistas da Fiocruz e de outras instituições científicas eram cada vez mais cobrados pela imprensa a indicar prazos, datas, cronogramas. Essa gestão do tempo colocava um dilema: como assegurar que a ciência estava dando respostas sem comprometer-se com prazos cujo eventual não cumprimento poderia minar a confiança nela depositada? A possibilidade do atraso desafiava os especialistas em sua comunicação com o público, que esperava saber deles não apenas “se” as vacinas eram viáveis, mas “quando” elas viriam a ser uma realidade.

Numa estratégia para evitar que a ansiedade do momento produzisse ruídos e desencontros no fluxo de informações a ponto de fragilizar a rede sociotécnica (Latour, 2000LATOUR, Bruno. A ciência em ação. São Paulo: Unesp, 2000.) em que circulavam os enunciados e as práticas para a materialização do precioso produto, a Fiocruz buscou reforçar seus elos com a imprensa, aliado-chave para essa circulação. No dia 4 de novembro de 2020, quando todos aguardavam os resultados dos ensaios clínicos de fase 3 com a vacina da AstraZeneca (prometidos para dali a um mês), a instituição promoveu uma oficina com jornalistas para informá-los de suas projeções para a vacinação. Somando-se às falas de outros especialistas da instituição, o diretor de Bio-Manguinhos (fábrica de vacinas e imunobiológicos da Fiocruz) Mauricio Zuma Medeiros apresentou dados sobre a expectativa de produzir 210 milhões de doses até o final de 2021, mas foi prudente ao indicar o cronograma para o início da vacinação: “Temos datas planejadas, mas nunca sabemos se vai atrasar mais um pouquinho [...]. Há uma impossibilidade de prever com precisão. Estamos tentando acelerar o máximo possível” (Cancian, 4 nov. 2020CANCIAN, Natália. Fiocruz quer pedir registro de vacina de Oxford contra Covid à Anvisa até 15 de janeiro. Folha de S. Paulo, São Paulo, 28 dez. 2020.).

A gestão das incertezas é tema caro aos estudos sobre a comunicação pública da ciência. Se, por um lado, explicitar a provisoriedade dos consensos e os limites de sua capacidade preditiva pode prejudicar a confiança na ciência, por outro lado, desconsiderá-los pode produzir o mesmo efeito, caso os cenários delineados não venham a se confirmar (Kreps, Kriner, 2020KREPS, S. E.; KRINER, D. L. Model uncertainty, political contestation, and public trust in science: Evidence from the Covid-19 pandemic. Science Advances, n. 6, eabd4563, 2020.).21 21 As mudanças nas decisões do governo britânico quanto às medidas de isolamento nos primeiros meses da pandemia, a partir de projeções feitas pelo Imperial College, foram um bom exemplo dos desafios colocados aos modelos preditivos e do papel das mídias em sua divulgação. Ver Engelmann et al. (2023). A ideia de que planejar o futuro exigia considerar os limites da previsão, como reconheceu Zuma, constituiria a tônica das falas dos especialistas da Fiocruz, sobretudo dos que se dirigiam ao público a partir do lugar técnico e institucional da produção das vacinas.

O anúncio dos resultados positivos sobre a viabilidade da vacina de Oxford/AstraZeneca imprimiu ao discurso dos especialistas da Fiocruz uma clara ênfase otimista quanto às projeções que vinham sendo feitas. Em 28 de dezembro de 2020, reportagem da Folha de S. Paulo trouxe as declarações de Krieger sobre esses dados que, na passagem do ano, emprestavam ao momento um tom de mudança: “São vacinas que estão mostrando capacidade de proteção muito alta, o que supera nossas expectativas” (Cancian, 28 dez. 2020CANCIAN, Natália. Fiocruz quer pedir registro de vacina de Oxford contra Covid à Anvisa até 15 de janeiro. Folha de S. Paulo, São Paulo, 28 dez. 2020.). Em 30 de dezembro, matéria do G1 veiculou, em vídeo, o pronunciamento da presidente da Fiocruz, gravado à frente do castelo mourisco que constitui o emblema da instituição. Comemorando o anúncio da aprovação do uso da vacina de Oxford/AstraZeneca no Reino Unido, Trindade declarou: “esperança que vem da ciência e de uma visão de saúde pública” (Abreu, 30 dez. 2020ABREU, Ricardo. Fiocruz vai fazer entrega final de documentos para registro da vacina de Oxford até 15 de janeiro. G1: Portal de Notícias da Globo, 30 dez. 2020.).

O ano de 2021 nascia, assim, sob o entusiasmo da “virada” que a vacinação poderia conferir ao tempo pandêmico, dessa vez não mais como possibilidade, mas como futuro que já demonstrava condições de se materializar nas práticas e espaços concretos da saúde. Em 8 de janeiro, em entrevista ao jornal O Globo sobre os pedidos de autorização para uso emergencial das vacinas CoronaVac e AstraZeneca encaminhados à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) naquele dia, Trindade afirmou tratar-se de “momento histórico”, qualificando-o como um “passo importante para que possamos ter acessível, no Programa Nacional de Imunizações (PNI), uma vacina eficaz e segura para o Sistema Único de Saúde”. Reconhecendo, ao mesmo tempo, a dimensão trágica da conjuntura epidemiológica, ela destacou: “Num momento de tantas dificuldades, em que lamentamos a perda de tantas vidas no Brasil e no mundo, 2021 se inicia com a esperança de termos um caminho, ainda a ser trilhado, de superação dessa crise” (Ferreira, 8 jan. 2021FERREIRA, Paula. Butantan e Fiocruz pedem à Anvisa autorização para uso emergencial de vacinas. O Globo, Rio de Janeiro, 8 jan. 2021.).

O paradoxo daquele momento estava referido ao agravamento da pandemia no Brasil em virtude da alta contagiosidade da variante Gama (P1), que causou um aumento exponencial no número de casos e óbitos, levando, em janeiro, ao colapso do sistema de saúde no estado do Amazonas, com a falta de respiradores e leitos nos hospitais. O contraste entre o alívio com a chegada próxima da vacina e o pavor diante das imagens da crise do oxigênio de Manaus foi expresso por Dalcolmo, que inverteu o sentido usualmente atribuído à capacidade de predição dos especialistas. Em 7 de janeiro, dia em que o país registrou 200.011 mortos pela Covid-19, em entrevista ao jornal O Globo, ela lamentou: “Em dezembro, [eu] disse que este seria o janeiro mais triste de nossa história. Mas queria muito estar errada. Infelizmente, não está sendo assim. Esse número de mortos é brutal”. A crítica à gestão política da pandemia foi explícita: “o governo federal não planejou como deveria. [...] Poderíamos estar escrevendo uma história diferente”, disse Dalcolmo (Azevedo, 7 jan. 2021AZEVEDO, Ana Lúcia. Com 200 mil mortos pela Covid-19, Brasil é pária internacional de saúde pública. O Globo, Rio de Janeiro, 7 jan. 2021.).

Na corrida contra o tempo para concretizar a imunização, o Instituto Butantan saiu na frente, aplicando, em 17 de janeiro de 2021, a vacina CoronaVac na enfermeira Mônica Calazans, a primeira brasileira a receber um imunizante para a Covid-19 no país. No dia 23, a Fiocruz liberou ao Ministério da Saúde dois milhões de doses da vacina de Oxford/AstraZeneca recebidas da Índia. Em ato solene e simbólico, profissionais de saúde da instituição foram imunizados em sua sede no Rio de Janeiro, antes que dois caminhões levassem o precioso produto para ser distribuído aos estados pelo Ministério (Moehlecke, 25 jan. 2021MOEHLECKE, Renata. Vacina Covid-19: Fiocruz libera dois milhões de doses e imuniza profissionais de saúde. Portal Fiocruz/Notícia, 25 jan. 2021. Dispo­nível em: https://portal.fiocruz.br/noticia/vacina-covid-19-fiocruz-libera-dois-milhoes-de-doses-e-imuniza-profissionais-de-saude.
https://portal.fiocruz.br/noticia/vacina...
).

Entretanto, o tempo vivido como “divisor de águas” se desdobrava em novo horizonte a ser buscado. Dalcolmo, uma das pessoas vacinadas naquele dia, afirmou que era tempo de celebrar, mas sinalizou que o futuro tão aguardado não havia sido alcançado plenamente. Em entrevista ao jornal O Globo, em reportagem que estampava sua imagem sorridente (apesar da máscara) ao receber o imunizante, ela manifestou seu otimismo cauteloso: “Esse é um dia simbólico. Quando tivermos 70% da população vacinada, aí poderemos comemorar de verdade. Mas esse é um dia de esperança e traz uma sensação de confiança que gostaríamos de passar para todos” (Ramos, 23 jan. 2021RAMOS, Raphaela. Quando vacinarmos 70% da população poderemos comemorar, diz Margareth Dalcolmo após receber imunizante de Oxford. Rio de Janeiro: FGV Editora, Rio de Janeiro, 23 jan. 2021.).

Na mesma reportagem, na sequência da fala de Dalcolmo, tom semelhante foi adotado pela presidente da Fiocruz. Nísia Trindade Lima reconhecia os impasses do tempo, que frustravam algumas expectativas. Se a vacina havia finalmente chegado, na forma de um quantitativo de doses prontas importadas do Instituto Sérum da Índia para “uso emergencial”, a data de entrega ao SUS das primeiras doses da vacina fabricadas no Brasil pela Fiocruz teve que ser adiada, em virtude do atraso no recebimento do principal insumo para sua produção, o Ingrediente Farmacêutico Ativo (IFA). Disse Trindade:

A perspectiva é de receber por volta do dia 8 de fevereiro, mas ainda não temos uma data definida. Essa questão passa por muitas etapas e não sabemos quanto tempo pode levar. A expectativa era que fosse um período mais curto (Ramos, 23 jan. 2021RAMOS, Raphaela. Quando vacinarmos 70% da população poderemos comemorar, diz Margareth Dalcolmo após receber imunizante de Oxford. Rio de Janeiro: FGV Editora, Rio de Janeiro, 23 jan. 2021.).22 22 O primeiro lote de IFA para a produção da vacina da AstraZeneca chegou da China ao Rio de Janeiro em 6 de fevereiro de 2021. A produção do IFA pela própria Fiocruz, completando o processo de transferência de tecnologia, ocorreria a partir de setembro de 2021 (Fiocruz, 28 set. 2021). O primeiro lote de doses da vacina integralmente produzidas no Brasil seria disponibilizado pela Fiocruz ao Ministério da Saúde em fevereiro de 2022 (Fiocruz, 22 fev. 2022). Sobre a história da vacina Oxford/AstraZeneca/Fiocruz, ver Medeiros et al. (2022).

Mais uma vez, os especialistas demonstravam, em operações discursivas de modelagem do tempo, seu empenho em acomodar incertezas e fazer o presente avançar. O trecho destacado logo em seguida na matéria sinalizava que, assim como em outros momentos, a ciência estava em ação para contornar os imprevistos, “para que esse gap seja superado”, como sinalizou a presidente da Fiocruz (Ramos, 23 jan. 2021RAMOS, Raphaela. Quando vacinarmos 70% da população poderemos comemorar, diz Margareth Dalcolmo após receber imunizante de Oxford. Rio de Janeiro: FGV Editora, Rio de Janeiro, 23 jan. 2021.). Mauricio Zuma corroborou a mobilização institucional para compensar o atraso:

Estamos discutindo a possibilidade de acelerar a chegada dos próximos lotes [de IFA] porque teremos mais capacidade de produção do que esse cronograma que está estabelecido. Se pudermos receber mais IFA vamos poder produzir vacinas mais rápido (Ramos, 23 jan. 2021RAMOS, Raphaela. Quando vacinarmos 70% da população poderemos comemorar, diz Margareth Dalcolmo após receber imunizante de Oxford. Rio de Janeiro: FGV Editora, Rio de Janeiro, 23 jan. 2021.).

A cobertura jornalística, apesar das ressalvas, comemorou a conquista. Naquele mesmo dia, a revista Exame destacou trechos do discurso da presidente da Fiocruz na cerimônia em que se iniciou a distribuição da vacina que, mediante incorporação da tecnologia, viria a ser a “vacina da Fiocruz”, produzida de modo autônomo com vistas a garantir autossuficiência ao país para a imunização de sua população por meio do SUS. A perspectiva de futuro celebrada naquele momento estava ancorada, conforme enfatizou Trindade, numa ciência que se mostrava capaz de responder ao presente a partir de sua tradição de compromisso com a saúde pública.

É uma esperança que vem da ciência, do esforço da tecnologia e da inovação do país. Sem o Sistema Único de Saúde (SUS) e o Programa Nacional de Imunizações (PNI) nada seria possível. É no conhecimento científico que se encontra o caminho de continuidade e sustentação da vacinação (Fiocruz..., 23 jan. 2021).

Se as vacinas foram vistas como o início de uma marcha progressiva em direção ao fim da pandemia, o tempo que se seguiu a este marco continuaria sua trajetória em zigue-zague, idas e vindas, modulado não apenas pelas ações da ciência, mas pelas dinâmicas da política e do próprio vírus. A experiência dramática da crise de Manaus, por exemplo, evidenciou que a omissão, a negação e a falta de coordenação do governo federal, bem como o surgimento das variantes do SARS-CoV-2, seriam elementos potencialmente disruptivos da rede sociotécnica que cientistas e outros grupos sociais construíam para superar o tempo pandêmico. Os esforços para manter essa rede coesa seriam desafiados por novas oscilações do tempo, impostas, por exemplo, pela variação nos calendários e regimes de vacinação e por mudanças no próprio comportamento do vírus.

Pouco mais de três anos após a decretação da pandemia, a OMS anunciou, em 5 de maio de 2023, que a Covid-19 não era mais uma “Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional”. A decisão foi baseada no que a agência considerou uma queda significativa do número de casos e óbitos pela doença e uma ampla vacinação da população - ainda que a cobertura vacinal tenha sido muito desigual em termos globais.23 23 Pelas estimativas da OMS naquela ocasião, a doença havia matado, desde 2020, mais de 7 milhões de pessoas em todo o mundo, número que, em virtude da subnotificação, certamente foi mais alto. Desse total, o Brasil contabilizou, segundo dados do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) no dia 2 de maio de 2023, 701.833 óbitos. O marco simbólico da superação do tempo pandêmico foi vivido e percebido com sentidos e sentimentos de ambiguidade: se, por um lado, a vida já vinha seguindo em larga medida seu fluxo de normalidade, por outro, vários especialistas vieram a público alertar que as incertezas quanto ao futuro não haviam se encerrado totalmente: “o vírus continua circulando”. De todo modo, ao se tornar, de certa forma, “passado”, a experiência da Covid-19 tornava-se exemplo para que, no futuro, novas emergências pudessem ser enfrentadas com base nos legados e aprendizados da história. Nesse sentido, ainda que o tempo fosse outro, a ciência deveria prover os meios de preparação, permanecendo no cumprimento de seu papel de ordenamento - simbólico e concreto - de diferentes temporalidades da vida biológica e social.

Considerações finais

A crise de múltiplas dimensões desencadeada pelo novo coronavírus acarretou fortes perturbações nas temporalidades do presente. Atravessada pelo imperativo da aceleração que caracteriza o regime presentista, a ciência, com a irrupção da pandemia, viu-se ainda mais pressionada pelo sentido de urgência. Não obstante, como pudemos observar ao analisar a fala de atores-chave da Fundação Oswaldo Cruz junto ao público leigo nessa conjuntura, os especialistas procuraram calibrar as elevadas expectativas que sobre eles recaíram evocando o tempo que seria próprio da ciência, o que os levou a defender a necessidade de aceleração com cautela. Embora parecendo, por vezes, incongruente com a velocidade do vírus e com a busca açodada por saídas para a crise, que marcou a política do governo Bolsonaro, a temporalidade particular reivindicada para a ciência seria, conforme argumentavam os representantes da instituição, a única forma de garantir respostas seguras e eficazes. Também nesse caso a preocupação com a legitimidade social da ciência se fazia presente na consideração dos especialistas, já que a rapidez dos processos não deveria atropelar a confiabilidade dos resultados.

Tensionada pelos tempos díspares da ciência, por um lado, e da necessidade premente de tomadas de decisão no presente, por outro, a expertise se caracteriza precisamente como instância das sociedades contemporâneas que deve lidar com as incertezas. No caso da pandemia, não apenas o sentido de urgência introduzido pela emergência sanitária como também os dissensos e conflitos existentes no interior da comunidade política tornaram particularmente desafiadora a gestão da dúvida e das lacunas no conhecimento por parte dos especialistas. As estratégias discursivas desenvolvidas pelos especialistas e representantes da Fiocruz para lidar com essa conjuntura, marcada pela ausência de uma resposta consistente e coordenada por parte do governo federal, acabaram contribuindo para que a instituição, ao lado de outros atores do mundo técnico-científico, viesse a se constituir como importante fonte de estabilização e ordenamento do tempo pandêmico e da vida social.

Com efeito, diante das rupturas nas rotinas e na experiência ordinária do tempo introduzidas pela doença, que provocou angústias e desorientação, as temporalidades da ciência a que a Fiocruz recorreu, estendendo-se para além da conjuntura imediata, também serviram como balizadores para a ancoragem do presente. O passado, representado pelos saberes e práticas rotinizadas da instituição e por sua tradição como instituição de ciência, tecnologia e inovação em saúde, tornou-se importante recurso na produção de enquadramentos temporais capazes de organizar, a partir de antecipações acerca do futuro, a caótica experiência do presente. As projeções epidemiológicas quanto à evolução da doença, bem como a elaboração de cronogramas sobre as diferentes fases envolvidas no processo de desenvolvimento e disponibilização das vacinas, acabaram por fornecer um norte, ou horizonte, a partir do qual as compreensões sociais acerca da experiência em curso poderiam ser estruturadas. Em meio a um presente percebido como vertiginoso e opaco, os procedimentos institucionalizados da ciência se tornaram parâmetros para a atribuição de sentido aos acontecimentos, influindo, assim, sobre a modelagem e a modulação do tempo e do que se poderia ou deveria esperar dele.

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  • 1
    Este artigo é resultado do projeto de pesquisa “O tempo presente na Fiocruz: ciência e saúde no enfrentamento da pandemia de Covid-19”, coordenado por Simone P. Kropf e desenvolvido no Departamento de Pesquisa em História das Ciências e da Saúde (Casa de Oswaldo Cruz/Fiocruz), com apoio do CNPq, no âmbito do Programa de Excelência em Pesquisa da Casa de Oswaldo Cruz (Proep-COC-CNPq, 2021).
  • 2
    Trata-se de questão constitutiva do campo, como indicam estudiosos que a ele têm se dedicado (Ferreira, 2002; Rousso, 2016; Müller, Iegelski, 2022).
  • 3
    Esses problemas têm conformado parte importante da agenda investigativa da história e dos chamados estudos sociais da ciência (Felt et al., 2016).
  • 4
    A demarcação temporal do surgimento e encerramento de epidemias segue dinâmicas complexas, referidas aos processos de enquadramento das doenças como entidades a um só tempo biológicas e sociais historicamente constituídas. Tal demarcação está referida a critérios epidemiológicos estabelecidos por agências de saúde, mas também a vários outros parâmetros e elementos de sentido, como a política e a experiência e percepção coletivas (e mesmo individual) do tempo. No caso da Covid-19, a doença foi oficialmente considerada uma pandemia pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em 11 de março de 2020. Já em 31 de dezembro de 2019, a agência havia sido alertada sobre casos de uma misteriosa pneumonia na cidade de Wuhan, China. Em 7 de janeiro de 2020, os chineses confirmaram tratar-se de um novo tipo de coronavírus. Em 11 de fevereiro, ele foi nomeado SARS-CoV-2, sendo a doença por ele causada batizada de Covid-19. Quanto ao seu curso temporal, o início da vacinação, em dezembro de 2020, é um marcador razoavelmente consensual do que foi considerado uma “nova fase” da doença (a coincidir com o tempo cronológico do “primeiro ano”). No que diz respeito a seu “encerramento”, os marcos são particularmente fluidos. Em 5 de maio de 2023, a OMS anunciou que, ainda que o SARS-CoV-2 continuasse circulando, a Covid-19 não era mais uma “Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional (ESPII)”. Entretanto, a percepção social desse tempo foi (como sempre havia sido) extremamente heterogênea e incontornavelmente referida a marcadores sociais diversos.
  • 5
    Para uma análise de percepções/vivências do tempo pandêmico relatadas em entrevistas de história oral, ver Rodeguero, Weimer (2021).
  • 6
    Hartog argumenta que, a partir do final do século XX, sociedades como a europeia e a norte-americana passaram a se relacionar com o tempo a partir da perspectiva de um presente expandido, que tenderia a se sobrepor a outras temporalidades, em uma diluição de passado e futuro. Nas palavras do autor, estaríamos diante de um “presente único: o da tirania do instante e da estagnação de um presente perpétuo”, marcado por crescente e incessante aceleração e pelo sentido de urgência (Hartog, 2013, p. 11). Atravessado por múltiplas crises (econômica, política, climática), esse presente seria pautado por respostas imediatas e pontuais, sendo incapaz de se articular a perspectivas otimistas quanto ao futuro, à maneira das chaves de leitura do tempo características do início da era contemporânea.
  • 7
    É possível aproximar a perspectiva de Hartog sobre o tempo presente e aquela desenvolvida por Pereira e Araújo (2019), na medida em que igualmente identificam, no mundo contemporâneo, a captura de outras temporalidades pela lógica de um presente autorreferente, que pretende se esgotar em si mesmo. Note-se, todavia, que os dois últimos autores estabelecem um diálogo crítico com a hipótese do presentismo, enxergando na forma de historicidade vigente não uma negação ou anulação do futuro, mas uma maneira específica, atualista, de afirmá-lo, isto é, como uma reiteração, em “versão atualizada”, do presente, o que ajudaria a explicar, conforme observam, o “paradoxo de um presente ao mesmo tempo cheio de novidades e quase sempre vazio de eventos” (p. 223).
  • 8
    Luhmann observa, não sem ironia, que o expert é um “especialista a quem se pode fazer perguntas que ele não está apto a responder”, o que não implica a desqualificação da ciência que representa, mas o reconhecimento das tensões inerentes à sua posição: embora suas atividades de aconselhamento junto à tomada de decisões tenham se tornado imprescindíveis nas sociedades contemporâneas, estas são invariavelmente marcadas por limitações e contingências em relação aos desafios, sempre novos e complexos, do mundo real, muitas vezes a demandar respostas rápidas e imediatas que desafiam o tempo da ciência. Sobre a questão, ver Eyal (2019), capítulo 2.
  • 9
    Sobre as respostas dos sistemas de ciência e tecnologia de diversos países, incluindo o Brasil, à pandemia de Covid-19, ver Neves e Sobral (2021). Para um amplo panorama das inúmeras questões que a pandemia trouxe ao campo da saúde coletiva, ver Sousa (2022).
  • 10
    Vinculada ao Ministério da Saúde, a Fiocruz é uma instituição de ciência, tecnologia e inovação em saúde que desenvolve atividades nas áreas de pesquisa e ensino (em diversos campos do conhecimento, desde as ciências biomédicas e da saúde, até as ciências humanas e sociais); desenvolvimento tecnológico e produção de imunobiológicos, kits para diagnósticos, biofármacos e medicamentos; vigilância, assistência e promoção à saúde; informação e comunicação; educação e divulgação científica; preservação da memória e história das ciências e da saúde no Brasil. Presente em dez estados brasileiros, reúne cerca de 12 mil trabalhadores (dados de 2021) com a missão institucional de produzir, disseminar e compartilhar conhecimentos e tecnologias voltados ao fortalecimento e à consolidação do Sistema Único de Saúde (SUS). Suas origens remontam ao Instituto Soroterápico Federal, também conhecido como Instituto de Manguinhos, criado em 1900, na cidade do Rio de Janeiro, para produzir vacinas e outros imunobiológicos para enfrentamento de epidemias e outros problemas de saúde pública do país, e que, desde os primeiros anos, constituiu-se como importante centro de pesquisa, produção e ensino. A instituição teve presença destacada nos debates públicos e projetos para a nação em diversos momentos históricos, a exemplo de sua participação ativa no movimento da Reforma Sanitária que levou à criação do SUS e à concepção de saúde como direito de todos e dever do Estado, garantida pela Constituição Federal de 1988 (Kropf, Sá, 2020).
  • 11
    Estudo sobre a percepção pública da Fiocruz realizado entre maio e junho de 2020 mostrou que 97,3% dos entrevistados estavam confiantes de que a ciência daria respostas efetivas à pandemia (Massarani et al., set. 2020, p. 9).
  • 12
    Para um panorama das ações da Fiocruz no enfrentamento da pandemia, ver: Kropf et al. (2021); Lima, Medeiros, Santos (2022).
  • 13
    A realização dos testes de RT-PCR nas amostras coletadas em todo o país era atribuição dos Laboratórios Centrais de Saúde Pública (Lacen) de cada estado, mas estes não davam conta, naquele momento, da escala e da velocidade exigidas pela pandemia. Em face desses “gargalos”, a Fiocruz, que produzia os kits para o diagnóstico molecular, passou também a atuar no processamento das amostras. Ver Lima, Medeiros, Santos (2022).
  • 14
    Como afirmam Kiss, Paiva e Teixeira (2023) em sua análise do sistema nacional de vigilância epidemiológica brasileiro durante a pandemia de Covid-19, as tensões entre a condução política do governo federal e as diretrizes técnicas formuladas pelas instituições de saúde colocaram em xeque a própria capacidade do Estado brasileiro de planejar e coordenar as ações de enfrentamento da doença. O artigo integra dossiê dedicado ao tema da Covid-19 na revista História, Ciências, Saúde - Manguinhos (https://www.scielo.br/j/hcsm/i/2023.v30suppl1/).
  • 15
    Sobre o conceito de Complexo Econômico e Industrial da Saúde, ver Gadelha (2022).
  • 16
    Para o posicionamento público da Fiocruz em defesa dos pesquisadores responsáveis pelo estudo, ver Fiocruz (17 abr. 2020).
  • 17
    Nos primeiros meses de 2021, quando ocorreu a crise por falta de insumos como oxigênio hospitalar e pela superlotação dos leitos de UTI para adultos acometidos pela doença, o Observatório Covid-19 da Fiocruz lançou boletins extraordinários, publicados a partir de março, com dados e recomendações para a população e gestores públicos sobre como lidar com o iminente colapso nacional do sistema de saúde. Esses boletins tiveram grande repercussão nas mídias jornalísticas, sobretudo quando da publicação, nas edições de 9 e 16 de março, de uma sequência de mapas do Brasil com dados de ocupação de leitos de UTI por estado, entre julho de 2020 e março de 2021. A situação em cada “semana epidemiológica” foi representada por cores, conforme padrão da OMS: verde (fora de zona de alerta, com taxas inferiores a 60%), amarelo (zona de alerta intermediária, com taxas iguais ou superiores a 60%) e vermelho (zona de alerta crítico, com taxas iguais ou superiores a 80%). Colocando os mapas lado a lado, a “série histórica” dava a ver, de modo claro, o agravamento acelerado e dramático da pandemia, ao mostrar o país tornando-se, progressivamente, vermelho (Fiocruz, 16 mar. 2021; Fiocruz diz..., 16 mar. 2021).
  • 18
    Dalcolmo (2021) reuniria os textos publicados em suas colunas em livro intitulado Um tempo para não esquecer.
  • 19
    Sobre os usos políticos da cloroquina, ver Rodrigues (2020).
  • 20
    Sobre o recurso à metáfora da “corrida” no tratamento jornalístico conferido às vacinas, ver Massarani e Neves (abr. 2021).
  • 21
    As mudanças nas decisões do governo britânico quanto às medidas de isolamento nos primeiros meses da pandemia, a partir de projeções feitas pelo Imperial College, foram um bom exemplo dos desafios colocados aos modelos preditivos e do papel das mídias em sua divulgação. Ver Engelmann et al. (2023).
  • 22
    O primeiro lote de IFA para a produção da vacina da AstraZeneca chegou da China ao Rio de Janeiro em 6 de fevereiro de 2021. A produção do IFA pela própria Fiocruz, completando o processo de transferência de tecnologia, ocorreria a partir de setembro de 2021 (Fiocruz, 28 set. 2021). O primeiro lote de doses da vacina integralmente produzidas no Brasil seria disponibilizado pela Fiocruz ao Ministério da Saúde em fevereiro de 2022 (Fiocruz, 22 fev. 2022). Sobre a história da vacina Oxford/AstraZeneca/Fiocruz, ver Medeiros et al. (2022).
  • 23
    Pelas estimativas da OMS naquela ocasião, a doença havia matado, desde 2020, mais de 7 milhões de pessoas em todo o mundo, número que, em virtude da subnotificação, certamente foi mais alto. Desse total, o Brasil contabilizou, segundo dados do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) no dia 2 de maio de 2023, 701.833 óbitos.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Abr 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    30 Maio 2023
  • Aceito
    19 Dez 2023
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