CONSTRUÇÃO E VALIDAÇÃO DE CARTILHA EDUCATIVA MULTIPROFISSIONAL PARA CUIDADORES DE PACIENTES EM TERAPIA NUTRICIONAL ENTERAL DOMICILIAR

RESUMO

Objetivo:

construir e validar a aparência e conteúdo de uma cartilha educativa multiprofissional para educação de cuidadores de pacientes em uso de Terapia Nutricional Enteral Domiciliar.

Método:

estudo metodológico, desenvolvido em duas etapas: (1) construção da cartilha educativa, dividida em quatro fases; (2) validação do material educativo por 12 experts. Considerou-se o índice de concordância de, no mínimo, 80% para se garantir a validação do material.

Resultados:

o material está constituído em 16 itens que foram considerados pertinentes pelos experts. A avaliação de conteúdo pelos especialistas mostrou Índice de Validação de Conteúdo global de 0,87. O nível de concordância das categorias avaliadas variou de 83 a 90%. As sugestões com relação ao conteúdo, clareza, pertinência e relevância, foram atacadas e modificadas para versão final do material.

Conclusão:

a cartilha educativa é considerada válida quanto ao conteúdo. Sugere-se que possa contribuir para a compreensão na educação em saúde de cuidadores e familiares de pacientes em uso de terapia nutricional enteral.

DESCRITORES:
Educação em saúde; Nutrição enteral; Equipe multiprofissional; Cuidadores; Cuidado domiciliar

ABSTRACT

Objective:

to elaborate and validate face and content of a multi-professional educational booklet for the education of caregivers of patients in use of Home Enteral Nutrition Therapy.

Method:

a methodological study, conducted in two stages: (1) elaboration of the educational booklet, divided in four phases; and (2) validation of the educational material by 12 experts. A minimum agreement rate of 80% was considered to ensure validation of the material.

Results:

the material is structured in 16 items that were considered pertinent by the experts. Content assessment by the experts presented a global Content Validity Index of 0.87. The agreement level of the categories assessed varied from 83% to 90%. The suggestions in relation to content, clarity, pertinence and relevance were addressed and modified for the final version of the material.

Conclusion:

the educational booklet is considered valid regarding content. It is suggested that it may contribute to the understanding in health education in caregivers and family members of patients in use of enteral nutrition therapy.

DESCRIPTORS:
Education in health; Enteral nutrition; Multi-professional team; Caregivers; Home care

RESUMEN

Objetivo:

elaborar y validar el aspecto y el contenido de una cartilla educativa multiprofesional para educar a cuidadores de pacientes en Terapia Nutricional Enteral Domiciliaria.

Método:

estudio metodológico, desarrollado en dos etapas: (1) elaboración de la cartilla educativa, dividida en cuatro fases; (2) validación del material educativo a cargo de 12 expertos. Se consideró un índice de concordancia mínimo del 80% para garantizar la validación del material.

Resultados:

el material está estructurado en 16 ítems que fueron considerados pertinentes por los expertos. En la evaluación del contenido a cargo de los especialistas se obtuvo un Índice de Validación de Contenido global de 0,87. El nivel de concordancia de las categorías evaluadas varió entre 83% y 90%. Las sugerencias en relación con el contenido, la claridad, la pertinencia y la relevancia fueron abordadas y modificadas para la versión final del material.

Conclusión:

la cartilla educativa se considera válida en relación al contenido. Se sugiere que podrá contribuir al entendimiento en la educación en salud de cuidadores y familiares de pacientes e terapia nutricional enteral.

DESCRIPTORES:
Educación en salud; Nutrición enteral; Equipo multiprofesional; Cuidadores; Atención domiciliaria

INTRODUÇÃO

A Terapia Nutricional Enteral (TNE) é um conjunto de procedimentos terapêuticos para manutenção ou recuperação do estado nutricional do paciente por meio da nutrição enteral (NE), indicada para pacientes impossibilitados ou comprometidos de realizarem uma ingestão oral adequada de alimentos ou suplementos nutricionais em âmbito hospitalar ou em cuidado domiciliar. A NE pode ser administrada por sonda ou ostomia, localizada no trato gastrointestinal.1^-2

A Terapia Nutricional Domiciliar (TND) apresenta vantagens na assistência nutricional, já que tem como objetivo recuperar ou manter o nível máximo de saúde, funcionalidade e comodidade do paciente, minimizando o agravo do estado de nutrição associado à redução dos custos assistenciais em decorrência da desospitalização e humanização do cuidado.3

Segundo estudo,4 a alimentação adequada e saudável requer um diálogo entre a Política Nacional de Alimentação e Nutrição (PNAN) e a Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (PNSAN), como também entre o Sistema Único de Saúde (SUS) e o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (SISAN). Nos casos de pacientes funcionalmente dependentes, as atividades de higienização, preparo e administração das NE são realizadas pelo cuidador,5 sendo que a literatura revela que, apesar das vantagens da TND, complicações podem ocorrer se os cuidados não forem orientados adequadamente.

As complicações relacionadas à administração da TNE são comuns e podem ser classificadas, conforme sua natureza, em mecânicas, devido à manipulação direta da sonda nasoentérica (SNE), como os deslocamentos, a retirada acidental e as obstruções da SNE; metabólicas, relacionadas à falta ou excesso de administração de NE, como hipoglicemia ou hiperglicemia, desidratação, desequilíbrio eletrolítico; gastrointestinais, como náusea e vômito, diarreia ou constipação; respiratórias ou infecciosas, como a pneumonia por aspiração ou contaminação da NE; e ainda, psicológicas.1^,5

Para minimizar o risco das complicações e favorecer a continuidade da assistência nutricional adequada e segura em domicílio, é fundamental a capacitação dos cuidadores de pacientes em uso de TNE. De acordo com a literatura, quando o cuidador participa dos cuidados durante a internação hospitalar e, oportunamente, é treinado por equipe multiprofissional, a adesão à TND é maior associada à redução dos riscos de complicação.

Dessa forma, para melhor preparar os cuidadores tanto para os cuidados na administração, aquisição de alimentos e equipamentos quanto na solução de problemas, como o deslocamento e obstrução da sonda, a capacitação destes deve iniciar no hospital durante o período de internação e continuar no domicílio por meio de intervenções multiprofissionais com informações objetivas, claras e adequadas à escolaridade dos familiares e cuidadores.1

No entanto, o que vivenciamos é que a maior parte das orientações relacionadas à TND é oferecida aos familiares e/ou cuidadores em um momento pontual, próximo à alta hospitalar, o que dificulta a compreensão e a assimilação dos conteúdos. Para parte dos cuidadores, as orientações são de grande complexidade, especialmente quando a estratégia educativa é vertical e muitas vezes subjetiva. O estudo6 refere que, frequentemente, o familiar ao cuidar de alguém com sonda de alimentação enteral desperta sensações como insegurança, medo e nervosismo devido às responsabilidades enfrentadas, necessitando, assim, de uma capacitação.

Torna-se evidente a necessidade de elaborar ferramentas e estratégias, bem como desenvolver métodos de educação em saúde em um contexto multiprofissional, a fim de formar cuidadores mais ativos, empenhados, estáveis e preparados emocionalmente em prol de um desempenho autônomo no cuidado do paciente em uso de TND, na resolução e análise de problemas, com a tomada de decisões críticas da prática e redução da ocorrência de complicações decorrentes do uso desse dispositivo.7

Nesse contexto, o uso de materiais educativos impressos nas diferentes áreas de educação em saúde é uma prática habitual no SUS e tem sido utilizada como ferramenta por profissionais de saúde como reforço das orientações realizadas verbalmente a pacientes, cuidadores e familiares a fim de colaborar com o conhecimento, com a adesão e satisfação ao tratamento, e o autocuidado. O material de ensino pode impactar positivamente na educação destes, sendo capaz de ajudá-los a responder às dúvidas que podem ocorrer quando não estão próximos aos profissionais de saúde.7

Considerando a importância desses aspectos com vistas a minimizar tal situação e propor estratégias multiprofissionais de ensino-aprendizagem, promover uma melhor qualidade na educação em saúde, dada a relevância da participação do cuidador no processo saúde-doença, objetivou-se construir e validar a aparência e conteúdo de uma cartilha educativa multiprofissional para educação de cuidadores de pacientes em uso de TND.

MÉTODO

Trata-se de um estudo do tipo metodológico construído em duas fases, sendo a primeira a construção de uma cartilha educativa e segunda fase a validação do material educativo (Figura 1). Adotaram-se os pressupostos de Echer,8 que tratam das etapas do processo de construção de materiais didáticos para o cuidado em saúde.

Figura 1 -
O processo de construção e validação da cartilha. São Carlos, SP, Brasil. (2020).

A primeira fase ocorreu em quatro etapas: a primeira foi a revisão da narrativa da literatura para identificar publicações que se relacionavam à temática, seguindo a questão norteadora: “quais são as orientações disponíveis na literatura científica sobre os cuidados adequados com a Terapia Nutricional Enteral, multiprofissional para cuidadores em ambiente domiciliar?”. Nessa etapa, o levantamento permitiu encontrar manuais hospitalares, legislações, protocolos e artigos científicos sobre a temática. Além disso, considerou-se a participação da equipe multiprofissional do Hospital Universitário de referência, composta por três nutricionistas, três fonoaudiólogos, um farmacêutico e um enfermeiro, responsáveis pela orientação de cuidadores dos pacientes em uso de TND antes da alta hospitalar, sendo essa colaboração fundamental, possibilitando o compartilhamento de conhecimento, informações e dúvidas comuns ao prestar assistência a essa população-alvo. Esse processo ocorreu em diferentes momentos por meio de reuniões presenciais com pelo menos um profissional de cada categoria da equipe de saúde.

A segunda etapa, de elaboração textual, baseou-se na literatura científica4^-6^;9^-12 para garantir a fidedignidade. As orientações relacionadas aos cuidados com uso da sonda para nutrição enteral no domicílio foram transcritas para o material educativo, no momento de sua elaboração. Para estabelecer quais informações seriam inseridas, realizou-se leitura das publicações e, assim, desenrolou-se a triagem de títulos e informações pertinentes mediante o fichamento de ideias. Nessa fase, os profissionais de Nutrição, Fonoaudiologia, Farmácia e Enfermagem apoiaram o processo de revisão e discussão do conteúdo elaborado. Na terceira etapa, imagens didáticas foram selecionadas e usadas como base para a elaboração da sessão de fotos com uma paciente simulada para diagramação do material. O trabalho de design e diagramação das imagens para ilustrar o material foi realizado em conjunto com um acadêmico do curso Imagem e Som do Campus Universitário.

Por fim, na quarta etapa, o conteúdo produzido foi revisto com diligência às informações consideradas essenciais pela equipe multiprofissional, buscando priorizar principalmente a facilidade de leitura e clareza de conteúdo para o público-alvo.

A segunda fase foi desenvolvida por meio da validação de aparência e conteúdo do material. Nessa fase, conforme a literatura, é recomendado que a avaliação seja feita por profissionais especializados na área temática (experts).8 Para a seleção dos experts, utilizou-se a técnica “bola de neve” (snowball technique),13^-14 na qual os pesquisadores solicitaram a um profissional (informante-chave) a indicação do nome e endereço eletrônico de outros profissionais que atenderiam aos critérios de inclusão do estudo. Por meio desses dados, os convites foram encaminhados por e-mail esclarecendo o objetivo da pesquisa a cada um deles. Os profissionais foram incluídos para participarem de acordo com o referencial adaptado de Fehring (1987),15 sendo identificados como experts.

Para a seleção dos mesmos, considerou-se a necessidade de serem profissionais enfermeiros, fonoaudiólogos, farmacêuticos ou nutricionistas, que devem estar envolvidos na assistência clínica, com pelo menos um ano de experiência, com especialização (certificado de prática clínica) na área do estudo ou titulação de mestre ou doutor com dissertação na área de interesse deste estudo ou, ainda, publicação de pesquisas relevantes para área abordada e de artigos sobre o tema em periódicos de referência. Para ser considerado expert, o participante necessitou apresentar pelo menos um dos itens mencionados acima.

Nesse contexto, identificaram-se 59 profissionais por meio da técnica “bola de neve” 14^,16 que responderam aos critérios adaptados.15 Os possíveis experts receberam um convite para participação na pesquisa via correio eletrônico com um link de acesso da web, por meio do qual, ao clicar, eram direcionados ao formulário eletrônico, disponibilizado pelo Google Docs Offline,^® com abertura imediata do Termo de Consentimento Livre Esclarecido (TCLE) para preenchimento, sendo condição obrigatória para abertura das páginas seguintes, que apresentavam o formulário de caracterização biográfica e profissional, bem como o material a ser validado em aparência e conteúdo.

Durante o processo de validação, apresentaram-se ao expert a cartilha educativa e uma escala de concordância, construída pelos pesquisadores, com informações sobre a aparência e conteúdo do material, relacionadas à adequação das informações, linguagem e ilustrações, seguindo o referencial denominado Suitability Assessment of Materials (SAM).17 Para cada tópico da cartilha, apenas profissionais avaliaram a adequação e a apresentação das informações, considerando a perspectiva dos leitores. Esse método empregou uma escala tipo Likert com pontuação de um a cinco de acordo com as respostas dos experts com relação ao grau de concordância em cada item. Assim sendo, a resposta poderia ser classificada em: (1) discordo totalmente, (2) discordo, (3) indiferente, (4) concordo, (5) concordo totalmente. Nessa fase de validação de aparência e conteúdo, utilizou-se a Técnica Delphi18 cujo objetivo é obter um máximo de concordância de um grupo de especialistas sobre um determinado tema.

No que concerne à linguagem, eles avaliaram a facilidade de compreensão, a importância dos conceitos abordados, a conveniência com vocabulário claro e objetivo, indicando os possíveis erros conceituais. Levando em consideração as imagens, ponderou-se a adequação da composição visual, organização e atratividade. No final da validação, solicitou-se a esses profissionais uma opinião geral do material e suas recomendações foram aceitas e incorporadas. Posteriormente, a nova versão da cartilha foi submetida a outro processo de edição e ajuste de diagramação.

Nas contribuições descritivas pelos experts, realizou-se a análise de conteúdo14 e calculou-se seguindo três abordagens o Índice de Validação de Conteúdo (IVC) para verificar a concordância dos experts quanto à representatividade de cada item: 1) I-CVI (Level Content Validity Index), sendo computado para cada item o número de experts que avaliaram como relevante ou muito relevante; 2) S-CVI/Ave (Scale-Level Content Validity Index Average Calculation Method), consistindo na proporção dos índices de validação de cada critério; e 3) S-CVI (Scale-Level Content Validity Index), refere-se à média da proporção dos I-CVI. Para este estudo, o IVC considerado aceitável para validação de conteúdo foi um índice igual ou superior a 0,80 para cada item do quadro.13^,19^-20

Na primeira série da Técnica de Delphi, houve a concordância pelos experts do material apresentado. A coleta de dados com eles foi realizada no período de dezembro de 2019 a março de 2020, após a autorização ética.

Os dados foram organizados em planilha eletrônica de dados. Depois de tabulados, foram analisados por meio de estatística descritiva. O material foi reformulado de acordo com as sugestões dos experts, que são apresentadas na discussão dos resultados.

RESULTADOS

Como resultado das etapas descritas acima, obteve-se uma cartilha educativa multiprofissional para educação em saúde de cuidadores de pacientes em uso de Terapia Nutricional Enteral Domiciliar. A construção da cartilha teve apoio de profissionais das áreas de Nutrição, Enfermagem, Fonoaudiologia, Farmácia e estudantes dos cursos de graduação em Enfermagem e Curso de Imagem e Som de uma Universidade Federal.

A elaboração textual foi desenvolvida por meio de um roteiro com conteúdo de texto multiprofissional. A cartilha educativa foi intitulada “Manual de Orientações para uso de Nutrição Enteral Domiciliar para Adultos”.

Seguiu-se também um roteiro de imagens para conduzir a sessão de fotos de uma voluntária que fez o papel de paciente simulada do material, assinando um termo de consentimento do uso da sua imagem, com o objetivo de promover a aproximação da realidade da maioria dos familiares e cuidadores no cenário domiciliar. As fotos foram editadas e adicionadas na diagramação da cartilha.

A versão final da cartilha educativa multiprofissional tem na sua dimensão A5, com orientação paisagem (14,8cm x 21cm) e manuseio tipo livreto, com texto disposto na horizontal, justificado ou alinhado à esquerda. A cor predominante utilizada no layout do material foi a branca ao fundo, texto preto e para as imagens múltiplas cores. A cartilha possui 40 páginas frente e verso, contendo capa, contracapa, sumário e, ao final, uma tabela resumo com espaços para preencher e linhas para anotações. Foi impressa com tinta colorida e encadernada no formato tipo brochura grampeado.

A fonte utilizada nos textos foi “Calibri” por ser uma fonte arredondada e de fácil leitura com o objetivo de amenizar as dificuldades de leitura do público-alvo, com número 15 e espaçamento entre linha de 18 pt. Já para títulos foi “Gill Sans Ultra Bol” n. 18, espaçamento 20 pt, já que o material se destina ao público adulto. O negrito foi empregado nos títulos, subtítulos ou destaques, elegendo cores com sensibilidade e cautela para não deixar o material visualmente poluído, colorindo demais. Priorizaram-se as imagens aos textos, em vista que nem todos os leitores terão a capacidade de ler e interpretar apenas as palavras.

Procurou-se apresentar ideias completas, nos dois lados da folha, sem que fosse necessário virar a página e romper a mensagem ao mudar de página e esquecê-la. Ideias e/ou frases-chaves importantes foram destacadas com ênfase para que o leitor possa retomar aquela informação relevante com mais facilidade.

As informações apresentadas no manual de orientações foram apresentadas pensando em uma ordem lógica de compreensão do conteúdo. Iniciou-se explicando o que é a SNE, apresentando seus materiais, acompanhados de fotos, o que facilita o entendimento no decorrer do processo; em seguida, apresentaram-se os modos/manejos e administração, seguidos das recomendações e, por fim, o que fazer caso ocorra alguma complicação com o uso da SNE. Optou-se por empregar na redação da cartilha uma linguagem popular e quando necessário aplicar termos técnicos. Todos foram conceituados em sua inserção textual.

Com o objetivo de organizar melhor as orientações, o material foi dividido em 17 itens com os seguintes itens: capa, sumário; 1. O que é Nutrição enteral; 2. Materiais e equipamentos; 3. Tipos de dieta; 4. Higiene pessoal e do ambiente; 5. Receita e modo de preparo da nutrição enteral semiartesanal; 6. Lista de substituições dos ingredientes; 7. Modo de preparo da nutrição enteral semiartesanal; 8. Receita da nutrição enteral industrializada; 9. Modo de preparo da nutrição enteral industrializada; 10. Administração da nutrição enteral; 11. Água para hidratação; 12. Administração de medicamentos; 13. Recomendações; 14. Complicações; 15. Referências; 16. Administração de nutrição enteral e medicação pela sonda; e 17. Anotações. Posteriormente, identificaram-se as definições constitutivas sobre o conteúdo de cada categoria para o desenvolvimento da cartilha educativa. Abaixo (Figura 2), apresentam-se a capa e as páginas iniciais de cada capítulo da cartilha.

Figura 2 -
Representação ilustrativa da cartilha educativa apresentada aos experts. São Carlos, SP, Brasil. (2020).

Após a fase de construção, realizou-se a validação de aparência e conteúdo da cartilha educativa através dos experts. A seguir, na Tabela 1, estão apresentados os dados de caracterização dos experts participantes na validação do material.

Tabela 1 -
Caracterização dos experts participantes da validação da cartilha educativa. São Carlos, SP, Brasil, 2020 (n=12)

Variáveis	n*	f%†
Gênero
Masculino	0	0%
Feminino	12	100%
Formação Profissional
Enfermagem	2	16,7%
Fonoaudiologia	2	16,7%
Nutrição	6	50%
Farmácia	2	16,7%
Titulação acadêmica máxima
Especialização	3	25%
Mestrado	1	8,3%
Doutorado	8	66,7%
Área de atuação profissional atual‡
Assistencial	9	75%
Ensino	5	41,7%
Assistencial e ensino	2	16,7%
Publicações de pesquisas e/ou artigos sobre o tema	7	58,4%

• *n: número de participantes ^†f: frequência. ^‡Os experts informaram mais de uma área de atuação profissional atual.

Entre os experts da primeira fase, nenhum dos participantes referiu atuação no nível de atendimento de saúde primário, um (8,3%) no nível secundário e três (25,0%) no nível de atendimento terciário. Quanto ao tempo de formação, quatro (33,3%) experts referiram possuir de 5 a 15 anos, quatro (33,3%), 15 a 25 anos, e quatro (33,3%) de 25 a 35 anos de formação.

Sobre possuir experiência assistencial ou gerencial no atendimento a pacientes usuários de SNE, 11 (91,7%) dos experts afirmaram positivamente e 11 (91%) mencionaram experiência na capacitação de cuidadores ou familiares e/ou cuidados com a SNE e seus cuidados. A maior parte dos experts (n=11, 91,7%) relatou possuir experiência no desenvolvimento e avaliação de materiais educativos destinados a pacientes ou cuidadores. Do total de experts, três (25%) afirmaram possuir publicação de pesquisa científica sobre validação de materiais educativos.

No que concerne ao processo de validação de conteúdo, os experts desenvolveram avaliação positiva à cartilha e registraram o material como um excelente complemento às orientações práticas, principalmente pela aproximação como foi exposta ao cotidiano.

Para os 16 itens que compõem o material enviado, os experts realizaram 115 considerações, destas 88 foram acatadas, após revisão da equipe multiprofissional. Tais alterações estão relacionadas à ortografia correta, facilidade de compreensão do conteúdo, estruturação do discurso, concordância, uso da voz ativa com palavras, definições simples e familiares, ênfase nos pontos e ideias importantes do texto, paginação e layout das páginas, objetivando ser considerado adequado para o público-alvo.

A concordância entre os experts com relação ao material educativo foi calculada pela proporção de relevância S-CVI/AVE (média dos índices de validação de conteúdo para todos os índices da escala). Na Tabela 2 estão representados o I-CVI e o S-CVI/Ave de cada item validado quanto a sua clareza de linguagem, relevância e pertinência, obtendo S-CVI global de 0,87, sendo S-CVI de 1 para o domínio relevância, S-CVI de 0,83 para o domínio clareza de linguagem, S-CVI de 0,89 para a relevância e 0,90 para a pertinência do conteúdo. A concordância entre os experts quanto à aparência do material educativo obteve média do I-CVI de 0,90.

Tabela 2 -
Distribuição dos Índices de Validação de Conteúdo segundo avaliação dos experts dos critérios de Clareza de Linguagem (I-VCI (CL)), Relevância (I-VCI ®) e Pertinência (I-VCI (P)). São Carlos, SP, Brasil, 2020. (n=12)

Itens Avaliados	I-VCI* (CL)	I- VCI* I	I-VC* (P)	S-VCI
Capa: “Manual de Orientações para uso de Nutrição Enteral Domiciliar para Adultos”	0,83	0,91	0,91	0,89
Item 1: O que é nutrição enteral	0,75	0,91	0,91	0,86
Item 2: Materiais e equipamentos	0,83	0,83	0,91	0,86
Item 3: Tipos de nutrição enteral	0,83	0,75	0,75	0,77
Item 4: Higiene pessoal e do ambiente	0,91	0,91	0,91	0,91
Item 5: Receita e modo de preparo da nutrição enteral semiartesanal	0,83	0,83	0,83	0,83
Item 6: Lista de substituições dos ingredientes	0,83	0,91	0,83	0,86
Item 7: Modo de preparo da nutrição enteral semiartesanal	0,83	0,83	0,83	0,83
Item 8: Receita da nutrição enteral industrializada	0,75	0,91	0,91	0,86
Item 9: Modo de preparo da nutrição enteral industrializada	0,83	0,91	0,91	0,89
Item 10: Administração da nutrição enteral	0,75	0,91	0,91	0,86
Item 11: Água para hidratação	0,91	0,91	0,91	0,92
Item 12: Administração de medicamentos	0,83	1	1	0,94
Item 13: Recomendações	0,83	0,83	0,83	0,83
Item 14:Complicações	0,91	0,91	1	0,94
Item 15: Referências e Anotações	0,91	1	1	0,97
S-VCI/Ave‡	0,83	0,89	0,9	0,87

• *I-CVI: Validade de Conteúdo dos Itens Individuais; ^†S-VCI:Scale-Level Content Validity Index; ^‡:S-VCI/Ave: Scale-Level Content Validity Index/ Average Calculation Method.

O escore do índice foi calculado por meio da soma de concordância dos itens que foram marcados por "4" ou "5" pelos experts.21 Apesar de alguns itens serem bem avaliados pelos experts, como as ilustrações (91%), informações corretas no material (91%), clareza das informações (0,91), aparência (0,86) e linguagem (0,83), os autores optaram por acatar algumas das sugestões e realizar as devidas alterações.

No caso de o expert considerar a opção “indiferente”, considerou-se como discordante no cálculo. O número total de experts, para o cálculo do I-CVI, foi alterado nos itens que optaram pela opção “não sei avaliar”, possivelmente relacionado ao fato de ser um conteúdo multiprofissional. Verificaram-se itens com a proporção de concordância menor que 0,80, sendo I-CVI não atingido para clareza nos itens 1, 8 e 10; relevância e S-CVI no item 3, pelo fato de o expert considerar a opção “indiferente”, sendo necessário readequar os itens de acordo com as contribuições descritivas dos experts, mas não foi preciso eliminá-los.

Nesse sentido, a alteração realizada no item 1 relacionou-se à clareza da linguagem da sonda nasoenteral; no item 8 sobre a linguagem, detalhou-se quanto ao volume a ser administrado em 24 horas; já no item 10, alteraram-se os intervalos mínimos para a administração da nutrição enteral. O item 3 teve alterações realizadas conforme as sugestões dos experts sobre os tipos e definições de nutrição enteral e os suplementos descritos.

DISCUSSÃO

A escolha do tema para cartilha educativa surgiu a partir das necessidades relatadas pelos cuidadores de pacientes que participaram dos encontros multiprofissionais do Grupo de Orientação em Terapia Nutricional Enteral (GOTNE), desenvolvido no Hospital Universitário Prof. Dr. Horácio Carlos Panepucci - Universidade Federal de São Carlos. Esse grupo foi criado em 2016, no qual os profissionais semanalmente apresentavam as melhores práticas para o cuidado relacionado à TND, evitando-se a sobrecarga de informações em um único momento, antes da alta hospitalar. Desde o ano de sua criação, orientaram-se os familiares e/ou cuidadores de 231 pacientes.

Autores6^,22 referem a importância da orientação profissional para o cuidado adequado e prevenção de riscos para pacientes tratados em domicílio, como também ressaltam a importância dessa aproximação profissional durante o período de internação hospitalar visando atender às necessidades de educação individualizada, treinamento e outros tipos de apoio, em todo o período do atendimento, já que essas pessoas nem sempre possuem orientações ou estão vinculadas ao serviço de saúde para conhecer as práticas adequadas e os benefícios para quem é cuidado.

A construção de um material educativo é uma oportunidade de sumarizar, uniformizar e oficializar as diversas condutas em relação aos cuidados ao paciente com a saúde de diferentes profissionais envolvidos no tratamento de um paciente. Enquanto o processo de validação é a etapa de estabelecer o que não foi compreendido e a distância que existe entre o que escrevemos e o que é, e como é entendido, focalizando principalmente na educação em saúde para a família e cuidadores.7^-8

O processo de validação com experts contribuiu positivamente para a qualidade do produto final. A vivência e experiência de cada expert possibilitaram adequações ao material, já que, muitas vezes, involuntariamente, alguns aspectos podem passar despercebidos.

Os experts sugeriram substituição de termos classificados como técnicos ou confusos para o público-alvo. Muitas vezes, o acréscimo de informações importantes faz-se necessário, pois a linguagem profissional pode ser limitadora, e sabe-se que as orientações quando fornecidas à população devem ser transmitidas com clareza, não podem ser distorcidas, distintas ou conflitantes. Uma linguagem acessível é imprescindível, uma vez que uma leitura não compreendida pode prejudicar significativamente os objetivos do material educativo.8^,18

Nesse sentido, o item 3, que aborda sobre os tipos de dietas disponíveis e suas definições, atingiu S-CVI de 77%, abaixo da meta estabelecida.19 As considerações acerca destes feitas pelos experts estavam relacionadas às substituições de termos para tornar o material mais apropriado, sendo acatadas para alteração. Como exemplo dessas substituições, pode-se citar a revisão da definição de conceitos, em que se optou por utilizar o termo “nutrição enteral semiartesanal” ao invés de “nutrição enteral artesanal”, visto que essa última não necessariamente oferece a meta nutricional dos pacientes (E8); e neste caso como irão colocar suplemento, não pode ser considerada artesanal... (E2). Nesse mesmo item também foram reavaliados os suplementos descritos e inserida uma definição para este.23

A literatura9^-11 refere-se aos alimentos oferecidos pela sonda como ‘dietas’, nesse sentido um dos experts apresentou: Sugiro rever o termo ‘dieta enteral’, substituir por ‘nutrição enteral’ e padronizar... (E10). Dessa forma, acionou-se a equipe multiprofissional, sendo concordante com a alteração sugerida. No item que aborda as recomendações, realizou-se a substituição do termo “higiene bucal” por higiene oral (E6). Essa recomendação também foi válida para a substituição dos termos “passado pela sonda...” por administrado pela sonda... (E3) e do termo ‘medicação’ por ‘medicamento’... (E7).

Outras alterações realizadas, seguindo as recomendações dos experts, estão relacionadas à organização do texto, acréscimo de termos para facilitar a compreensão, como a inserção da palavra ‘Adultos’ na capa da cartilha para deixar claro o público, seria interessante deixar claro se essa cartilha é voltada para pacientes adultos (E4). A literatura8 aborda que para dar uma orientação significativa e de fácil compreensão deve-se atender às necessidades específicas, então, com a modificação, explicita-se o público-alvo da abordagem.

Todo o layout e as ilustrações foram desenvolvidos por um estudante da área de criação. As recomendações para serem feitas quanto à associação de textos às ilustrações foram acatadas, para tal, incluíram-se legendas destacadas nas fotos e sua indicação ao longo do conteúdo textual. Nessa categoria, os experts avaliaram ...o fato de ter fotos coloridas das colheres e dos alimentos utilizados na dieta artesanal colaboram para o momento do preparo na dosagem dos ingredientes... (E5).

A utilização de ilustrações em recursos educacionais impressos é considerada pertinente por torná-los mais atrativos, potencializando a compreensão do público-alvo, independentemente da sua escolaridade.24 Optou-se por utilizar fotos de boa qualidade e alta definição pela similitude com o ambiente domiciliar e perfil do público-alvo, utilizando uma paciente simulada em um ambiente domiciliar simulado de uma unidade de saúde do campus universitário para que pudesse se tornar o mais real e dentro do contexto possível do público-alvo, tentando apresentar mensagens fundamentais visualmente, sem nenhum tipo de distração.17 As fotos e legendas foram alocadas o mais próximo possível do texto ao qual fazem referência, facilitando o entendimento e a ligação do que está escrito com as imagens.

Os experts concordaram que a cartilha é um recurso relevante para que a equipe de saúde possa orientar pacientes e cuidadores e que permite a uniformização da conduta de orientação da equipe. Apresentaram considerações como Esse estudo será de grande valia para a área domiciliar (E2); Acredito que o material abrange as principais dúvidas dos cuidadores de pacientes em uso de SNE (E11); Material completo, contemplando os aspectos mais importantes para a terapia nutricional domiciliar (E5).

As orientações dos profissionais de saúde devem ser verbais e por escrito.9 Os estudos12^,22 afirmam que cuidadores que recebem cartilhas educativas com orientações profissionais atribuem de forma positiva o material didático disponibilizado, propondo o cuidado ao paciente que necessita de TN em seu domicílio, recuperando ou mantendo o nível máximo de saúde, funcionalidade e comodidade do paciente para promoção da qualidade de vida por meio da educação em saúde e dos seus contextos subjetivos. Os experts afeiçoam nesse sentido: Material abrangente, multiprofissional, bem explicativo, de forma a facilitar a compreensão pelo cuidador (E7); Material extremamente completo, de fácil entendimento e usa linguagem apropriada ao público ao qual se destina (E5).

Segundo as apreciações, Material está claro e aborda os pontos relevantes ao tema (E9; E12). A literatura ressalta que os materiais educativos são capazes de explorar recursos que vão ao encontro de significados reconhecidos e valorizados no contexto dos usuários e da comunidade, independente do meio cultural ou social ao qual o indivíduo pertence, principalmente se forem utilizados por pessoas idosas necessitam apresentar uma linguagem acessível, clara, objetiva e que propicie o entendimento e reflexão sobre o assunto.24^-25 Identifica-se esta como uma possível limitação deste estudo, no qual apenas profissionais participaram do processo de validação do material.

Com uma colaboração multiprofissional em saúde, não apenas durante o processo de criação, bem como na validação, este estudo representa uma importante contribuição social. O estudo norte-americano26 refere que a TND apresenta necessidades multidisciplinares, com profissionais de saúde, como enfermeiros, farmacêuticos, nutricionistas, médicos, assistentes sociais, entre outros, reconhecendo que as equipes multidisciplinares dedicadas e as famílias capacitadas e empoderadas são essenciais para otimizar os resultados nesse cenário.

CONCLUSÃO

A cartilha educativa foi construída e validada visando contribuições para os profissionais de saúde, pacientes e comunidade presentes nos serviços dos diferentes níveis de atenção à saúde.

Trabalhos educativos realizados na forma de cartilha têm benefícios significativos no contexto de política pública, facilitando o acesso à informação aos usuários de diferentes níveis socioeconômicos e culturais.

A versão online da cartilha está disponível no Sistema Interno do Hospital Universitário Prof. Dr. Horácio Carlos Panepucci - Universidade Federal de São Carlos. Além disso, a cartilha está disponível na versão impressa para ser distribuída aos participantes do GOTNE e esforços têm sido desenvolvidos para que seja disponibilizada para outras instituições públicas de saúde da cidade.

Ressalta-se que, apesar da exequibilidade dos resultados apresentados, encorajamos que outros estudos sejam realizados a fim de investigar a efetividade do material como recurso didático e a apreensão do conhecimento dos cuidadores a partir da sua utilização.

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NOTAS

• ORIGEM DO ARTIGO

  Extraído da Iniciação Científica (2019/15536-0); - Uso de diferentes estratégias de ensino e aprendizagem com equipe multiprofissional para pacientes em Terapia Nutricional Enteral domiciliar: ganhos de conhecimento percebidos por cuidadores, financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo, vinculada ao Departamento de Enfermagem, da Universidade Federal de São Carlos, em 2020.

• AGRADECIMENTO

  Hospital Universitário Profº. Dr. Horácio Carlos Panepucci: Universidade Federal de São Carlos (HUUFSCar); Laboratório de Habilidades do Departamento de Enfermagem da UFSCar (DEnf-UFSCar); Unidade Saúde Escola (USE) - UFSCar; Pró-Reitoria de Graduação – ProGrad UFSCar; Pró-Reitoria de Extensão – ProEx UFSCar.

• FINANCIAMENTO

  Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo, processo 2019/15536-0.

• APROVAÇÃO DE COMITÊ DE ÉTICA EM PESQUISA

  Aprovado no Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de São Carlos- UFSCar, parecer n. 3.556.901/2019, Certificado de Apresentação para Apreciação Ética 17428819.0.0000.5504.

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  26 Jul 2021
• Data do Fascículo
  2021

Histórico

• Recebido
  14 Maio 2020
• Aceito
  21 Out 2020