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Necropolítica animal: mortandade de animais em situação de rua por ações do Poder Público

Animal necropolitics: the killing of homeless animals by Public Authorities

Resumo

Noções teóricas da concepção de necropolítica podem ser aplicadas sob o enfoque dos animais na condição de sujeitos de direitos à vida, cuja dignidade tem sido ameaçada por reiteradas ações do Poder Público que, a pretexto de atender interesses humanos, têm avocado uma autoridade para sacrificar animais em situação de rua apontados como vetores de ameaça à saúde humana local. A partir de um diálogo com as teorias de Necropolítica de Mbembe, Biopoder de Foucault e Homo Sacer de Agamben, este trabalho tem por objetivo descrever como os animais vêm sendo objeto da mesma gravidade de política de morte, exercida pelo soberano do poder estatal, contra os cidadãos de segmentos de vulnerabilidade social. Adotar-se-á a metodologia de pesquisa documental, com técnica de análise de conteúdo, tendo por objetos decisões judiciais, atos administrativos e legislativos, que possuem como mérito a regulação de ações estatais promotoras de sacrifício de animais. Concluir-se-á que o respeito à dignidade da vida deve ser igual a animais e humanos, reprovando-se toda política que vise acarretar-lhes morte.

Palavras-Chave:
Necropolítica; Animais; Poder Público; Vida

Abstract

Theoretical notions of the concept of necropolitics can be applied under the focus of animals as subjects of rights to life, whose dignity has been threatened by repeated actions of the government that, under the pretext of serving human interests, have avocated an authority to sacrifice animals on the streets pointed as vectors of threat to local human health. From a dialogue with the theories of Mbembe’s Necropolitics, Foucault’s Biopower and Agamben’s Homo Sacer, this paper aims to describe how animals have been subjected to the same severity of death policy, exercised by the sovereign of the state power, against citizens from socially vulnerable segments. The methodology of documentary research will be adopted, with content analysis technique, having as objects judicial decisions, administrative and legislative acts, which have as merit the regulation of state actions that promote the sacrifice of animals. It will be concluded that respect for the dignity of life must be equal to animals and humans, disapproving of any policy that seeks to entail

Keywords:
Necropolitics; Animals; Actions of the Government; Life

INTRODUÇÃO

O sacrifício de animais tem sido uma prática humana cometida há muitos séculos e por diferentes razões na História, entre elas, a de satisfazer alguma necessidade humana. Embora o estágio atual e predominante de ordenamentos jurídicos em Estados Democráticos de Direito permitam concluir pela inviolabilidade da vida humana, a vida animal ainda não apresenta patamar similar de intangibilidade para muitas sociedades.

Um desses problemas contemporâneos se apresenta em núcleos urbanos com a concentração populacional de animais abandonados que passam a residir em vias públicas, causando para a administração pública municipal, e sob sua perspectiva, impasses sanitários e de segurança. A alegação de potencial transmissão de zoonoses e risco à integridade humana são elementos postos em análise pelo ente público para promover medidas que atinjam esses sujeitos não-humanos viventes das cidades.

Sob tais fundamentos, ações estatais vêm sendo promovidas a pretexto de salvaguardar a ordem pública urbana: remoções de animais, esterilização forçada e sacrifícios. Todas essas ações demandariam um vasto estudo à parte. Para fins deste trabalho, entretanto, delimitar-se-á a discussão acerca do sacrifício. A escolha se deu por considerar-se a primazia do direito à vida e, consequentemente, mais graves as ações que a violam; em cotejo com as demais medidas, reconhecendo-se também nessas a ofensa de outros direitos.

A partir de um diálogo com as teorias de Necropolítica de Mbembe, Biopoder de Foucault e Homo Sacer de Agamben, este trabalho tem por objetivo descrever como os animais vêm sendo objeto da mesma gravidade de política de morte, exercida pelo soberano do poder estatal, contra os cidadãos de segmentos de vulnerabilidade social.

Objetiva-se, assim, a partir da compreensão das teorias retromencionadas, incluir os animais como sujeitos igualmente submetidos a ações estatais que menosprezam o direito à vida e impõem a morte como mecanismo de poder político das autoridades.

Considerar-se-á aqui como ação estatal não somente aquela tomada como política estatal, mas também os atos humanos individuais, cometidos por agentes públicos, ainda que sem amparo legal ou permissão do ente a que estejam subordinados, desde que tomados no exercício da função pública e a pretexto de promover uma ação pública de resultado social. Assim, condutas consideradas judicialmente como criminosas em decisões judiciais por terem sido executadas por agentes públicos sem observância de fundamento jurídico também serão objetos de análise.

Para fins metodológicos, esta pesquisa será documental, usando como técnica a análise de conteúdo. Os objetos de análise serão decisões, judiciais, administrativas e legislativas, que possuem como mérito de discussão e regulação a existência de ações estatais promotoras de sacrifício de animais viventes em núcleos urbanos. As decisões judiciais aqui analisadas julgaram a conduta humana de agentes públicos ao sacrificar animais como forma de controle populacional deles. As decisões administrativas serão os comandos exarados pelos agentes públicos, considerados atos administrativos no sentido jurídico. Já as decisões legislativas serão eventuais decretos e leis que tenham buscado inovar no ordenamento jurídico municipal na intenção de servirem como fundamento jurídico de sacrifício de animais.

Para fins de delimitação qualitativa de análise, optou-se pela escolha de três casos paradigmáticos ao assunto de morte animal promovida pelo Poder Público: 1) o primeiro, o caso de Belo Horizonte/MG, em que a secretaria de saúde, editando a Portaria n.º 025/03, determinou que animais sem dono encontrados nas ruas fossem aprendidos e mortos em câmaras de gás no centro de zoonoses municipal; 2) o segundo caso é do município de Santa Cruz do Arari/PA, onde, por ordem do Prefeito Municipal, cidadãos foram pagos para capturarem animais em condição de rua, os quais eram imobilizados por cordas, arrastados ao chão por longa distância enquanto agonizavam, até finalmente serem atirados vivos ao rio para afogamento; 3) o terceiro caso é do município de Brejo do Cruz, que através do decreto do executivo n.º 1187/2021BREJO DO CRUZ (PB). Decreto n.º 1.187/2021 de 18 de janeiro de 2021. Brejo do Cruz: Prefeitura municipal, 2021. Disponível em: https://brejodocruz.pb.gov.br/wp-content/uploads/2021/01/1187-DECRETO-APREENSAO-ANIMAIS-ABANDONADOS.pdf. Acesso em: 10 mai. 2021.
https://brejodocruz.pb.gov.br/wp-content...
, determinou o sacrifício de animais apreendidos que não encontrassem interessados para doação ou compra em leilão.

Logo no início deste trabalho, em seu segundo capítulo, discorrer-se-á sobre os conceitos de necropolítica e biopoder, partindo das concepções dos seus teóricos originários, Achile Mbembe e Michel Foucault, respectivamente. A ideia é compreender referidos conceitos a fim de transportá-los para a abordagem de novos sujeitos de direitos, inicialmente não pensados na criação dessas teorias: os animais não-humanos. Para tanto, parte-se da premissa de que se tais teorias foram criadas para compreender como o poder político pode ser manejado para, através do fomento e imposição da morte, violar direitos, não deve haver distinção à defesa de sujeitos violados por essa política, sejam humanos ou não.

No terceiro capítulo serão analisados casos concretos de violação aos direitos dos animais promovidos pelo Poder Público através de decretos ou atos dos gestores municipais. A maioria desses casos foi sindicada pelo Poder Judiciário, sendo julgada pelos respectivos tribunais com jurisdição sobre os entes municipais. As situações aqui ilustradas denotam práticas diversas para o mesmo fim: matar animais viventes nas cidades e eliminar uma situação apontada como problema sanitário urbano.

Por fim, no quarto capítulo deste trabalho, propõe-se a noção de governança de holocausto como uma forma de entender as escolhas do Poder Público pelo desprezo à vida animal, a pretexto de promover ações que visem resguardar a ordem pública ou a saúde humana. Conclui-se pela tese de que animais e pessoas são igualmente dignos de respeito à vida, bem como toda política que vise acarretar-lhes morte é reprovável do ponto de vista ético-jurídico.

2 NECROPOLÍTICA ANIMAL E BIOPODER URBANO: ADEQUANDO CLÁSSICAS TEORIAS A NOVOS SUJEITOS

As concepções de necropolítica e biopoder, embora originadas à luz da defesa de seres humanos, podem, também, adaptar-se ao contexto fático de violação à vida de outros seres, como os animais; podendo falar-se de uma necropolítica animal, como se verá a seguir.

2.1 Necropolítica e biopoder: concepções originárias

No Brasil, a cidadania de determinados segmentos sociais vem sendo negada mediante a afronta dos mais valiosos direitos básicos de subsistência, configuram o que Giorgio Agamben (2002AGAMBEN, Giorgio. Homo Sacer - O poder soberano e a vida nua. Vol. I. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2002., p. 102) denomina como a sujeição do “corpo matável”, cuja existência se soma indistintamente à sociedade, sem qualquer peculiaridade significativa identitária, em nada acrescendo senão para a estatística banalizada do flagelo humano.

Nessa sociedade de estigmatização de sujeitos despossuídos do direito a ter direitos, a sociedade brasileira se estratifica socialmente em fossos de vulnerabilidade; não é uma conformação dual clássica dos que têm direitos e os que não têm, mas uma forma mais plural e fragmentada onde “uns tem mais direitos do que os outros, enquanto outros ainda começam a habitar o espaço do não-direito” (Nascimento, 2000NASCIMENTO, Elimar Pinheiro. Hipóteses sobre a nova exclusão social: dos excluídos necessários aos excluídos desnecessários. Caderno CRH, v. 7, n. 21, 1994., p. 11).

Não pode ser ignorada a convergência do status dos violados, a qual aponta outra face da violação: a do paralelismo entre hipossuficiência socioeconômica e a vulnerabilidade. A vulnerabilidade socioeconômica brasileira está atrelada, especificamente, à condição de raça e estudos comprovam que quanto mais escura a cor da pele, mais isso significará “em geral status social mais baixo” (Souza, 2010, p. 118).

Exemplo disso são os altos índices de mortes violentas que abrangem o perfil do jovem negro e morador das periferias urbanas, tornando essas mortes prematuras a representação simbólica da “face mais visível e mais cruel do racismo” (Feffermann, 2013FEFFERMANN, Marisa. A luta contra o genocídio da juventude negra: reflexões sobre a realidade brasileira. In: CRISIS Y Emergencias Sociales, 2013, Santiago. Anais do 1807-0310, 2013., p. 1).

Assim, não é uma coincidência que o jovem negro da periferia urbana, enquanto sujeito mais desprovido das políticas sociais de promoção de direitos seja também o mais vitimado pela “violência do poder ou violência de cima” (Michaud, 1986MICHAUD, Yves. A violência. Trad. L. Garcia. São Paulo: Editora Ática, 1989., p. 29). A relação entre o agravamento da violação de direitos e a identidade racial dos violados, com resultado massivo de morte desses sujeitos em virtude de ação ou omissão estatal, tem sido discutida por Achile Mbembe como “necropolítica”, para quem o racismo é o motor de sua concepção (Mbembe, 2017MBEMBE,Achille. Políticas da Inimizade. Lisboa: Antígona, 2017., p. 65).

A necropolítica, portanto, está intrinsecamente vinculada à qualidade do sujeito, a quem ele é e a qual posição ocupa na estratificação social, por suas circunstâncias biotípicas raciais, as quais, por um contexto de alijamento histórico, diferenciam-no dos demais indivíduos (Mbembe, 2016MBEMBE,Achille. “Necropolítica”. Arte & Ensaios, PPGAV, EBA, UFRJ, n. 32, dez. 2016., p. 129). Criam-se novos espaços sociais para deixar morrer os que nele vivem, submetendo sujeitos “a condições de vida que lhes conferem o status de ‘mortos-vivos’”. (Mbembe, 2016, p. 146)1 1 Cabe lembrar ainda a concepção de mistanásia quando falamos da morte de pacientes pelo desamparo de uma política de saúde, cuja inefetividade decorre da falta de um atendimento médico adequado, carência social ou, ainda, ausência de condições e de oportunidades econômicas e políticas. A mistanásia revela uma sociedade de desigualdades e o estado de abandono de parcela da população, na medida em que a morte lenta e sofrível é relegada àqueles que já estão, ainda quando sadios, em condições de violação de dignidade, seja porque lhes faltem saneamento básico, educação, acesso à Justiça, ou qualquer outro direito inerente ao exercício pleno da cidadania. A mistanásia revela, portanto, uma morte seletiva (VILLAS-BÔAS, 2005, p. 45). . O Estado, a partir dessa noção, abstém-se de exercer seu poder de formular políticas ou ignora as premissas básicas do seu dever de proteção social e implementação de direitos, negando a dignidade de cidadãos que padecem da carência de recursos de subsistência, ou, ainda, veicula o monopólio da violência para submeter sujeitos portadores de características previamente selecionadas pelo Estado (raça, padrão econômico etc.) a espaços de controle (jurisdicional, administrativo etc.), tornando-os alvos da segurança pública.

Essa necropolítica que consolida o direito estatal de matar e deixar morrer tem suas raízes na concepção clássica do poder soberano, delineada por Foucault, como biopoder, onde o governante detém como prerrogativa de sua função de governar escolher quem deve viver e quem deve morrer. Esse mesmo biopoder nasce com respaldo na concepção de diferenciação social em categorias, entre as quais, a raça.

A invenção da raça converge com o surgimento do Estado-Nação, e é um dos princípios norteadores deste (Foucault, 2002FOUCAULT, Michel. Em Defesa da Sociedade: Curso no Collège de France (1975-1976), São Paulo: Martins Fontes, 2002., p. 304). A construção do que é uma nação partia da premissa do que ela se compunha, de qual povo e com qual características, de modo que a população de uma nação era compreendida como uma massa homogênea cultural, criando-se a raça desta nação, enquanto mecanismo de identidade para ascensão, obtenção e desenvolvimento do Estado. Segundo Foucault (2002, p. 304), “foi nesse momento que o racismo se inseriu como mecanismo fundamental do poder [...]”.

Esse mecanismo do droit de glaive, o direito soberano de matar (Foucault, 2002FOUCAULT, Michel. Em Defesa da Sociedade: Curso no Collège de France (1975-1976), São Paulo: Martins Fontes, 2002., p. 305), esteve presente na formação do Estado moderno, não necessariamente atrelado a regimes de opressão. Ao contrário disso: inclusive, é possível constatá-lo nascendo em episódios clássicos de revolução contra regimes absolutistas, a exemplo da guilhotina na Revolução Francesa. Logo, é falso imaginar que a necropolítica foi gestada em regimes déspotas (Mbembe, 2016MBEMBE,Achille. “Necropolítica”. Arte & Ensaios, PPGAV, EBA, UFRJ, n. 32, dez. 2016., p. 146). Ela é própria de uma expressão de governo intergeracional e de diferentes regimes, seja de participação democrática intensa ou frágil.

2.2 Repensando teorias para novos sujeitos

A criação da categoria da raça tanto para a formação do Estado quanto ao funcionamento do biopoder, apresenta-se como um critério diferenciador dos cidadãos, selecionando aqueles que seriam privilegiados, e até concitados, à participação pública, daqueles para quem é negado o direito de acesso às mesmas políticas.

Assim como em outras comunidades, essa estratificação social se serve para definir quem pode compor o seleto grupo do poder e quem está predestinado ao espaço da subordinação e negação. Seja através de castas, gênero, raça ou etnia, são categorias manejadas pelo biopoder para medir e quantificar a distribuição de poder nas relações sociais (Ianni, 2004IANNI, Octavio. Dialética das relações raciais. Estud. av. , São Paulo, v. 18, n. 50, pág. 21-30, abril de 2004. Disponível em http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-40142004000100003&lng=en&nrm=iso. acesso em: 02 mar. 2021.
http://www.scielo.br/scielo.php?script=s...
, p. 23).

A partir da estratificação social e partindo da premissa de que os cidadãos podem ser categorizados, portanto, diferentes entre si, inclusive com gradações de direitos, teses como da necropolítica encontram solo fértil para proliferar. Nela, o Estado seleciona seus inimigos, sujeitos que podem ser descartados, ou necessitam sê-los, para o regular funcionamento da sociedade e reafirmação do status de poder pelo soberano.

Este exercício da biopolítica que conclama, periodicamente, estratégias similares ao genocídio das guerras situa seu poder ao nível da vida, da espécie, da raça e de outros fenômenos da população (Foucault, 2002FOUCAULT, Michel. Em Defesa da Sociedade: Curso no Collège de France (1975-1976), São Paulo: Martins Fontes, 2002., p. 305), usando de critérios biológicos para justificar um direito do que governa de causar a morte ou deixar viver.

Até aqui, contudo, o contexto é eminentemente humano. As teorias e compreensões desenvolvidas foram arquitetadas para compreender as relações intersubjetivas humanas, defender direitos humanos, reformular concepções e aprimorar o bem estar do sujeito humano. A própria noção biopolítica de poder ou o conceito de necropolítica são esboçados sob a perspectiva social das interações entre humanos.

Todavia, vive na urbis mais do que apenas humanos. O cotidiano dos espaços de vida humana possui a presença permanente de outros seres não iguais em termos biológicos - animais não humanos. Mesmo pensar a cidade - essa concentração de atividades socioeconômicas humanas - atualmente, exige uma visão ecossistêmica, considerando a biodiversidade urbana e incluindo animais nos estudos de urbanização.

Essa nova perspectiva tem proporcionado que geógrafos ecologistas (Coltro, 2016COLTRO, Fábio Luiz Zanardi. “Animal Geographies”: Reflexões sobre o não-humano no pensamento geográfico anglo saxão contemporâneo. Tese (Doutorado em Geografia) - Universidade Estadual de Londrina, Centro de Ciências Exatas, Programa de Pós-Graduação em Geografia. Londrina, 2016. 152 f., p. 64) proponham uma nova geografia animal a partir das interações humanas e animais nas cidades, entendendo que, mesmo que as cidades tenham sido concebidas para a aglomeração humana, não se pode fechar os olhos para a retenção de grande população não-humana residente nelas. Pensar a cidade como espaço de interação, seja por residência ou por passagem, dessas vidas não-humanas é também valorizar uma urbanização atenta para as necessidades biodiversificadas.

Tratar-se-ia da compreensão de uma prática urbana trans-espécie (Coltro, 2016COLTRO, Fábio Luiz Zanardi. “Animal Geographies”: Reflexões sobre o não-humano no pensamento geográfico anglo saxão contemporâneo. Tese (Doutorado em Geografia) - Universidade Estadual de Londrina, Centro de Ciências Exatas, Programa de Pós-Graduação em Geografia. Londrina, 2016. 152 f., p. 94): a capacidade de pensar o espaço urbano não somente sob uma perspectiva de atendimento às necessidades humanas, mas compreender que esse ambiente repercute em outros espaços de vivência, como as florestas, rios e outros espaços naturais; não está isolado do resto do mundo, mas inserido em um ecossistema onde vivem, para além dos humanos, outros seres vivos que podem ser atingidos pelas consequências das ações urbanas; e, por fim, compreender que os moradores das cidades necessitam incorporar os animais às suas práticas cotidianas, “respeitando sua dignidade e seu valor, aceitando o dever de conhecer seus modos de vida e enfrentando o desafio e os riscos associados a compartilhar a Terra com outras formas de vida” (Coltro, 2016COLTRO, Fábio Luiz Zanardi. “Animal Geographies”: Reflexões sobre o não-humano no pensamento geográfico anglo saxão contemporâneo. Tese (Doutorado em Geografia) - Universidade Estadual de Londrina, Centro de Ciências Exatas, Programa de Pós-Graduação em Geografia. Londrina, 2016. 152 f., p. 101).

Tais reflexões têm conduzido a pensar o planejamento urbano e sua estrutura numa proposta de reestruturação futura denominada por Wolch, West e Gaines de “zoópolis” (Coltro, 2016COLTRO, Fábio Luiz Zanardi. “Animal Geographies”: Reflexões sobre o não-humano no pensamento geográfico anglo saxão contemporâneo. Tese (Doutorado em Geografia) - Universidade Estadual de Londrina, Centro de Ciências Exatas, Programa de Pós-Graduação em Geografia. Londrina, 2016. 152 f., p. 102), uma reintegração das pessoas com animais e natureza, no ambiente de cidades diferente do atual, com implementação de políticas que proporcionem a interação de humanos e não-humanos, respeitando a autonomia desses sujeitos e seus espaços de vida.

Inobstante, a zoópolis ainda é uma proposição concretizável distante. Nas cidades contemporâneas, o contato entre pessoas e animais têm repercutido tensões de múltiplas áreas: saúde pública, arquitetura, economia, entre outras. O avanço da urbanização sobre espaços naturais afeta, drasticamente, o ambiente natural ao redor. A degradação desse e a ausência de recursos naturais de subsistência acarreta uma fuga dos animais sobreviventes, os quais, acuados pela escassez até de territórios, acessam ao local urbanizado. As reações de pavor das populações residentes nesses locais, bem como o desconhecimento de como responder a essa interação inesperada, resulta em episódios de mortalidade para animais, atacados e repelidos pelos humanos. Podemos denominar esse cenário de problema centrífugo, pois as atividades ocorridas na cidade se irradiam para espaços além dos seus limites urbanos e causam as tensões interespécies.

Mas há também o cenário centrípeto. Nele, o problema irradia da cidade para suas relações internas, envolvendo sujeitos já componentes do seu cotidiano. O que se tem aqui é o surgimento de um problema interno e de fluxo “para dentro”. Um exemplo é o abandono de animais às ruas. Com o excessivo número de animais domesticáveis, ou antes domesticados, abandonados às vias públicas, a população inicia uma reação aos problemas sanitários ou estéticos decorrentes do aparecimento de sujidades e zoonoses. Como consequência, a presença do animal, muitas vezes, além de alvo de ojeriza é sujeitada a ações estatais de perseguição, aprisionamento e morte.

Em ambos os cenários o que se extrai é também um exercício do biopoder político que condena à morte seres que merecem a qualidade de sujeitos da cidade. É, também, evidente manejo da necropolítica. Não aquela que conhecemos nos primórdios de sua tese, mas aplicada a outros sujeitos que, por iguais condições de seleção biológica de suas identidades, são eleitos pelas ações estatais como inimigos da ordem pública e condenados ao ostracismo e indignidade da vida. Não há diferença razoável das consequências letais sob o fundamento de discriminação racial ou de espécie, mormente porque o especismo é tão indefensável e repudiável quanto o racismo (Noirtin, 2010NOIRTIN, Célia Regina Ferrari Fraganello. Animais não humanos: sujeitos de direitos despersonificados. Revista Brasileira de Direito Animal, v. 5, n. 6, 2010, pp. 133-152., p. 136).

E se a essência da bio-necropolítica é expressa pelo pensamento do soberano de deter o poder de quem pode viver e quem deve morrer (Mbembe, 2017MBEMBE,Achille. Políticas da Inimizade. Lisboa: Antígona, 2017., p. 5), quando animais são mortos pelo exercício do poder político de ordenação urbana, não se estaria diante de uma necropolítica animal?

3 UM RECORTE DE CASOS CONTEMPORÂNEOS

Atualmente, têm se proliferado no país casos em que o Poder Público, a pretexto de desenvolver uma política pública, toma ações que implicam na morte dos animais viventes no perímetro urbano das cidades. Alguns casos foram objeto de discussão em precedentes judiciais, como analisados a seguir.

3.1 Anima sacer - o animal sacrificável

Em recente episódio na Europa, decorrente do temor contemporâneo do vírus Sars-Cov-2, a primeira-ministra da Dinamarca determinou o sacrifício de 2,4 milhões de visons (Nunes, 2020NUNES, Bethânia. Após matar 2,4 milhões de animais, Dinamarca suspende sacrifício de visions. Metrópolis, 10/11/2020. Disponível em: https://www.metropoles.com/saude/apos-matar-24-milhoes-de-animais-dinamarca-suspende-sacrificio-de-visons. Acesso em: 07 nov. 2020.
https://www.metropoles.com/saude/apos-ma...
, p. 1), sob o argumento de que estes animais estariam sendo responsáveis pela transmissão de uma variante do vírus aos humanos, cuja mutação supostamente causaria redução de eficácia de vacinas. A Dinamarca não foi o único país a tomar essa medida de sacrifício em massa de animais potencialmente transmissores do vírus COVID-19, sendo seguida por países como a Espanha (Presse, 2020PRESSE, France. Espanha sacrificará quase cem mil visons por causa do coronavírus. G1.globo, 16/07/2020. Disponível em: https://g1.globo.com/mundo/noticia/2020/07/16/espanha-sacrificara-quase-100-mil-visons-compor-causa-do-coronavirus.ghtml. Acesso em: 07 nov. 2020.
https://g1.globo.com/mundo/noticia/2020/...
, p. 1).

O ataque a animais acusados de transmitirem doenças a humanos é documentado em outros episódios de zoonoses, como no Brasil. Em 2017, diversos macacos foram apedrejados e envenenados pelo receio e desinformação dos seus algozes de que seriam animais responsáveis pela proliferação da febre amarela. Somente no Rio de Janeiro quase 70% dos animais mortos (Rodrigues, 2018RODRIGUES, Léo. Rio já tem 131 macacos mortos em todo o estado; 69% foram vítimas de ação humana. Rio de Janeiro: AgênciaBrasil, 25/01/2018. Disponível em: https://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2018-01/rio-ja-tem-131-macacos-mortos-em-todo-o-estado-69-foram-vitimas-de-acao-humana. Acesso em: 08 fev. 2021.
https://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/n...
, p. 1) no período tinham sido alvo de ação humana assassina.

Na literatura médica, doenças originárias do contato ou consumo animal costumam ser apelidadas de forma a associá-las ao respectivo vetor da transmissão - gripe suína, gripe aviária etc. Tal circunstância cria, para a sociedade, uma estigmatização sobre o animal durante o período de proliferação da doença, ameaçando sua integridade, mesmo no habitat natural, onde pessoas desinformadas e sob o pretexto de colaborar no “combate” ao fim da zoonose, creem que matando os animais estariam criando um “efeito cascata”, em que. por consequência. a proliferação da doença a qual associam ao animal será extirpada. Nesses casos, a ausência de campanhas educativas informando melhor os cidadãos sobre a zoonose, seu ciclo de transmissão e a participação dos animais envolvidos, põe a sociedade em um clima de pânico e caos social, incutindo a premissa de que precisam salvar-se por si próprios, ainda que para tanto demande o uso particular da violência.

No Brasil, a educação ambiental é matéria normativa da lei n. 9.795 de 1999, tendo como um dos seus objetivos, de acordo com o seu artigo 5º, inciso I, o desenvolvimento de uma compreensão integrada do meio ambiente em suas múltiplas e complexas relações, envolvendo aspectos ecológicos, psicológicos, legais, políticos, sociais, econômicos, científicos, culturais e éticos.

Infelizmente, a lei esqueceu o aspecto sanitário e sua correlação com o meio ambiente natural. Não obstante, é relevante associar a questão da saúde pública com a vida animal. Estudos científicos vêm religando as áreas da medicina humana e animal, compreendendo a necessidade de integração entre a medicina veterinária e a política de saúde pública humana como forma de tratar doenças infecciosas de maneira tripartida - com fatores de saúde humana, animal e ambiental. A esse pensamento, teóricos (Mwangi et al, 2016MWANGI, W; FIGUEIREDO, P; CRISCITIELLO M.F. One Health: Addressing Global Challenges at the Nexus of Human, Animal, and Environmental Health. PLoS Pathog, 2016, v. 12 (9), pp; 1-8. Publicado em 15 de setembro de 2016, p. 1. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC5025119/#ppat.1005731.ref009. Acesso em: 05 dez. 2020.
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/article...
, p. 2) têm chamado de One Health (Saúde Única), uma iniciativa interdisciplinar que considera a interdependência em gestão do bem-estar humano, animal e ambiental.

A ausência de uma promoção de políticas para conscientização educacional da relação entre meio ambiente e saúde resvala na falta de informação sobre zoonoses que surgem e atemorizam sociedades com seu grau de letalidade. Por sua vez, o pânico da mortalidade e a estigmatização de animais como responsáveis pelo surgimento de doenças cria uma zona de guerra entre pessoas e animais, atribuindo-se a esses o status de vilões, inimigos declarados pelo estereótipo de causadores de doenças. Nesse contexto, surtos de violências são replicados como reação social e motivados pela falsa sensação de que a morte de determinados animais equivalerá como uma vitória sobre os inimigos na pseudobatalha pelo retorno da saúde pública.

Essa culpabilização de animais pelo aparecimento de determinadas doenças provoca uma chacina de animais específicos conforme cada zoonose, tendo grande influência do papel do Estado, cujas ações, a pretexto de higienização ou concretização de políticas sanitárias, avocam para si a legitimidade de matar animais como meio de resolução dos problemas por ele constatados.

No passado, a estigmatização dos animais foi também responsável por matanças. Na Idade Média, a Igreja, instituição de grande poder político e influência nas ações dos soberanos, propagava que gatos eram animais associados às bruxas e necromantes, objetos de rituais satânicos, além das formas preferidas de transfiguração que assumiam esses agentes para praticar malevolências (Serpell, 2000SERPELL, James A. Domestication and history of the cat.In: TURNER, D.C.; BATESON, P. The domestic cat: The biology of its behaviour, v. 2, p. 180-192, 2000., p. 94). É relevante notar que, nesse contexto, os gatos não eram odiados por sua condição animal ou por qualquer motivo biológico, mas por uma questão cultural a partir da qual eram representantes de personagens considerados inimigos do poder soberano da época. Transferia-se a esses animais o ódio, a ojeriza e dever de punição dos sujeitos considerados subversivos pela Igreja, simbolizados nesta figura animal. Em épocas de epidemias e zoonoses, essa transferência de ódio também é procedida. Odeia-se a doença, mas as ações recaem àqueles animais que a simbolizam. Se considerarmos que, no mundo moderno ocidental, toda vida tem o direito de ser mantida e respeitada sob os padrões de dignidade, a que se deve essa prerrogativa que o Estado se arroga em poder sacrificar vidas em nome da ordem pública?

A Constituição Federal protege a vida e sua dignidade, assim como veda a pena de morte, garantias essas que expressam o desiderato do legislador constituinte em elevar esse direito a patamares de primazia na proteção estatal. Mas é preciso salientar aqui qual vida é essa a que a norma, prima facie, refere-se.

O ordenamento jurídico brasileiro confere aos animais status de coisas, bens palpáveis e portadores de uma finalidade destinada ao atendimento das necessidades humanas (Oliveira, 2007OLIVEIRA, Tiago Pires. Redefinindo o Status jurídico dos animais. Revista Brasileira de Direito Animal . Salvador: UFBA, v. 2, n. 3, 2007., p. 200). Embora seja uma visão antropocêntrica interpretar que o animal exista no mundo em função de sua utilidade a uma pessoa, para a legislação civil, a proteção jurídica sobre a vida dos animais ainda é tutelada não pelo exercício de suas autonomias ou pela vida em si dos animais, mas por alguma serventia que aquela existência tenha para outro sujeito humano. Thiago Oliveira (2007, p. 200) comenta ainda a doutrina ambiental que disciplina uma espécie distinta da concepção de bem, onde os animais seriam bem de interesse difuso, que poderiam ser de propriedade pública ou privada.

Assim, o animal não teria direitos de per si, mas alguém teria direitos sobre o animal, tuteláveis no plano jurídico. Todavia, haveria uma distinção entre objetos e os animais no que tange à possibilidade desses sentirem - senciência. A consideração de que animais sentem e, por isso, devem ser melhor tratados em suas relações humanas falha por ser uma visão restritiva que não pensa o animal enquanto sujeito por si mesmo, mas de acordo com sua finalidade e interesse humano (Silva, 2011SILVA, Tagore Trajano de Almeida. Introdução aos direitos dos animais. In: LECEY, Eladio; CAPPELLI, Silvia. Revista de Direito Ambiental: Editora RT, ano 16, v. 62, abr-jun, 2011, p. 141-168., 153-154).

Mas, se é possível pensar em associar direitos da preservação e dignidade da vida aos animais, porque ainda são eles objetos de ações letais por políticas públicas, sempre que há suspeita de que sua presença ou interação com humanos causa danos à coletividade? Ações estatais que determinam a morte de animais pela justificativa de restabelecer a ordem pública fazem um claro juízo de valor: a vida dos animais é menos importante em relação às vidas humanas. Essa ponderação estatal fere razões éticas, segundo as quais não é razoável “considerar os meus interesses pelo fato de apenas serem meus ou de minha própria espécie” (Silva, 2011SILVA, Tagore Trajano de Almeida. Direito Animal e Pós-Humanismo: Formação e Autonomia de um Saber Pós-Humanista (Animal Law and Legal Education: Rising and Autonomy of a Posthumanist Knowledge). Revista Brasileira de Direito Animal , Salvador, v. 14, pp. 161-262, 2013., p. 154).

3.2 O caso das câmaras de gás em Minas Gerais

Em Belo Horizonte/MG, a secretaria de saúde municipal, no ano de 2003, expediu a portaria n.º 025, que determinava, entre outras medidas, o sacrifício de animais em situação de rua apreendidos pelo Poder Público (TJMG, 2006). A medida tomada pelo Poder Público teve como pretexto a necessidade de controlar o aumento populacional dos animais em situação de rua, como uma forma de salvaguardar a população humana de cidadãos do risco de contaminação com zoonoses (Gomes, 2010GOMES, Nathalie Santos Caldeira. Ética e dignidade animal: uma abordagem da constituição brasileira, da lei de crimes contra a natureza e do decreto de proteção aos animais sob a ótica da declaração universal dos direitos dos animais. XIX Encontro Nacional do CONPEDI. Anais-Fortaleza, CE, p. 645-655, 2010., p. 651).

O Ministério Público Estadual (MPE) moveu uma ação civil pública objetivando a declaração de ilegalidade do ato municipal, alegando a violação do direito à dignidade dos animais e a vedação ao tratamento cruel empreendido pela municipalidade, que em seu ato normativo determinava a morte dos animais sem sedação e com gás asfixiante, no centro de controle de zoonoses.

Somente em segunda instância judicial2 2 Apelação n.º 0384416-11.2003.8.13.0024, da relatoria do Desembargador Caetano Levi Lopes. , o pleito ministerial para obstar a morte dos animais apreendidos com o uso de gás letal foi atendido. A decisão recursal não se deu de forma unânime entre os julgadores. Tal fato que indica a ausência de uniformidade sobre a noção do que seria um ato cruel em relação aos animais3 3 O uso das câmaras de gás como pena de morte rememora o fatídico contexto do nazismo e seu extermínio de judeus em campos de concentração. A ideia do uso do gás letal se deu não como uma forma de amenizar o sofrimento dos apenados ou por compaixão contra métodos mais dolorosos, mas como um meio de garantir que os extermínios continuassem a ser procedidos pelos executores com estrita obediência e sem efeitos colaterais à saúde desses, pois se identificava que participar do ato do extermínio e assistir ao sofrimento dos apenados vinha produzindo consequências deletérias à saúde dos soldados nazistas (BITTENCOURT; BITTENCOURT, 2021, p. 215). . O voto do relator do recurso divergiu dos demais membros da turma julgadora ao considerar como legítima a ação municipal de determinar a morte dos animais, inclusive com o uso do gás de monóxido de carbono (Gomes, 2010GOMES, Nathalie Santos Caldeira. Ética e dignidade animal: uma abordagem da constituição brasileira, da lei de crimes contra a natureza e do decreto de proteção aos animais sob a ótica da declaração universal dos direitos dos animais. XIX Encontro Nacional do CONPEDI. Anais-Fortaleza, CE, p. 645-655, 2010., p. 651). Apesar da divergência da maioria dos julgadores do recurso, a conclusão do Tribunal de Justiça mineiro foi pela permissividade da morte dos animais apreendidos, limitando-se a divergência quanto ao método da morte, concluindo a maioria pela impossibilidade do uso de gás letal (Gomes, 2010GOMES, Nathalie Santos Caldeira. Ética e dignidade animal: uma abordagem da constituição brasileira, da lei de crimes contra a natureza e do decreto de proteção aos animais sob a ótica da declaração universal dos direitos dos animais. XIX Encontro Nacional do CONPEDI. Anais-Fortaleza, CE, p. 645-655, 2010., p. 652).

A legalidade desse ato normativo chegou à discussão jurídica dos integrantes do Superior Tribunal de Justiça (STJ)4 4 Recurso Especial n.º 1.115.916/MG, da relatoria do Ministro Humberto Martins. , devido ao recurso interposto pela municipalidade, insistindo no uso do gás. O STJ, entretanto, confirmou o uso do referido método:

Ao arrepio de toda essa legislação protetiva, é comum nos Centro de Controle de Zoonose, e o presente caso é uma prova disso, o uso de procedimentos cruéis para o extermínio de animais, tal como morte por asfixia, transformando esses centros em verdadeiros “campos de concentração”, quando deveriam ser um espaço para promoção da saúde dos animais, com programas de controle de doenças. Não se pode esquecer que a meta principal e prioritária dos centros de controles de zoonose é erradicar as doenças que podem ser transmitidas dos animais aos seres humanos, tais quais a raiva, a leishmaniose etc. Esse é o objetivo a ser perseguido. Sem adentrar no campo discricionário do Poder Executivo, é até duvidoso que os métodos empregados pelo recorrido sejam dotados de eficiência. Muitos municípios pretendem controlar as zoonoses e a população de animais, adotando, para tal, o método da captura, seguido da eliminação de animais encontrados em vias públicas (STJ, 2009STJ - SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Recurso Especial n. 1115916. Relator: Ministro Humberto Martins. Diário de Justiça da União, Brasília, 18 set. 2009., p. 12).

Apesar do repúdio quanto ao método da câmara de gás, o desfecho do caso não salvaguardou o direito à vida dos animais, admitindo em todas as instâncias a possibilidade que o Poder Público faça controle populacional dos animais em situação de rua aplicando ações que ocasionem a morte desses sujeitos. Um dos argumentos centrais para consolidar a permissão da mortandade de animais foi a escassez de recursos financeiros públicos para custear programas de castração, vermifugação, vacinação e de posterior adoção, de modo que se entendeu ser demasiadamente custoso retirar os animais das vias públicas, inseri-los em locais onde fossem assegurados cuidados da sua saúde para posterior campanha de fomento a adoção dos animais sadios (Gomes, 2010GOMES, Nathalie Santos Caldeira. Ética e dignidade animal: uma abordagem da constituição brasileira, da lei de crimes contra a natureza e do decreto de proteção aos animais sob a ótica da declaração universal dos direitos dos animais. XIX Encontro Nacional do CONPEDI. Anais-Fortaleza, CE, p. 645-655, 2010., p. 651), tal como foi defendido pelas associações protetoras de animais, intervenientes processuais nos autos desse processo judicial.

A permissividade do uso de ferramentas letais como higienização da cidade não é discutida à luz do direito à vida ou dignidade dos animais, mas somente sob uma ótica de custo-benefício do Poder Público. A preservação da vida como pressuposto do respeito à dignidade de uma existência não se opera como pauta das decisões colegiadas aqui apontadas.

Embora compreendida como uma resposta razoável ao problema sanitário da cidade, situação similar de apreender para matar, porém em relação a humanos, foi promovida pelos poderes públicos na época da vinda da Família Real para o Brasil, fato que ficou conhecido como “Operação mata-mendigo” (Alves, 2013ALVES, Eliete Gonçalves Rodrigues. Política Nacional para Inclusão Social da População em Situação de Rua: Uma história dos conceitos vadiagem, mendicância e situação de rua. 2013. 140 f. Dissertação (Mestrado em Ciência Política) - Programa de Pós Graduação em Ciência Política, Instituto Euro-Americano de Educação, Ciência e Tecnologia, UNIEURO, Brasília, DF., p. 77). Atualmente, políticas públicas similares que apreendem pessoas e as enclausuram para a morte são compreendidas sob a ótica jurídica como violadoras à dignidade da pessoa humana. Nota-se, portanto, que há um fosso de distância sobre a concepção de respeito à dignidade, ainda que a partir de uma mesma situação, quando se está em comparação o tratamento de humanos e animais (Noirtin, 2010NOIRTIN, Célia Regina Ferrari Fraganello. Animais não humanos: sujeitos de direitos despersonificados. Revista Brasileira de Direito Animal, v. 5, n. 6, 2010, pp. 133-152., 142).

Um traço identificador do pensamento antropocêntrico que hierarquiza humanos e animais (Noirtin, 2010NOIRTIN, Célia Regina Ferrari Fraganello. Animais não humanos: sujeitos de direitos despersonificados. Revista Brasileira de Direito Animal, v. 5, n. 6, 2010, pp. 133-152., p. 144), colocando aqueles como sujeitos cujos interesses são superiores e esses como aqueles que devem sempre ceder frente às vontades humanas, pode ser percebido pela fundamentação do voto do relator no julgamento, em segunda instância. A justificativa colocada expressamente considera como razoável o fato de não existirem políticas públicas adequadas aos animais, visto que sequer para humanos ela é concretizável com eficiência. A fundamentação deixa clara, assim, que deve haver no planejamento público uma preferência, atendendo primeiro as necessidades humanas, e só depois, as das demais e eventuais espécies.

[...] praticamente a única medida oportunizada à Administração, para controle da quantidade de cães e gatos vadios - ante a difícil situação financeira na qual se encontram os entes públicos, sendo que não possuindo verba sequer para zelar por setores fundamentais, como a saúde, educação e segurança - consubstancia-se no abate dos animais apreendidos. As medidas reivindicadas pela Sociedade Mineira Protetora dos Animais, tanto para prevenção de doenças como para a contenção da população dos aludidos animais - vermifugação, vacinação e esterilização - apesar de indicarem novas formas de se combater os males produzidos pela população de animais vadios, à primeira vista, de maneira a se evitar os malfadados sacrifícios, implicariam alto investimento público no setor, o que, como se sabe, seria dificílimo, dada a dificuldade de o Poder Público alocar recursos para setores que não são tão importantes quanto os de saúde, educação, segurança pública, etc (TJMG, 2006TJMG - TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE MINAS GERAIS. Embargos Infringentes na Apelação n.º 0384416-11.2003.8.13.0024. Relator: Desembargador Caetano Levi Lopes. Diário de Justiça do Estado de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2006., p. 2).

O termo “vadios” para se referir a animais que não estão ali por mera condição de ócio, deleite ou escolha, mas, por vezes, pelo abandono de humanos, ratifica uma justificativa de descaso e discriminação especista (Noirtin, 2010NOIRTIN, Célia Regina Ferrari Fraganello. Animais não humanos: sujeitos de direitos despersonificados. Revista Brasileira de Direito Animal, v. 5, n. 6, 2010, pp. 133-152., 136) que inferioriza a condição animal. Esse mesmo termo não é mais usado para se referir à população humana em situação de rua, pela carga histórica e semântica do termo, designado para relegar ao outro o desprezo e aponta-lo como digno de reprovação e culpa por sua condição (Alves, 2013ALVES, Eliete Gonçalves Rodrigues. Política Nacional para Inclusão Social da População em Situação de Rua: Uma história dos conceitos vadiagem, mendicância e situação de rua. 2013. 140 f. Dissertação (Mestrado em Ciência Política) - Programa de Pós Graduação em Ciência Política, Instituto Euro-Americano de Educação, Ciência e Tecnologia, UNIEURO, Brasília, DF., p. 117).

3.3 O caso da ordem de “limpeza” no pará

No município de Santa Cruz do Arari/PA, em 2016, cidadãos incentivados pelo Prefeito Municipal, mediante promessa de pagamento de R$ 5,00 (cinco reais) por cada cão macho e R$ 10,00 (dez reais) por fêmea, capturavam, prendiam, amordaçavam os cães e os arrastavam pelas ruas, levando-os até uma embarcação pertencente ao município para lançá-los no rio próximo à cidade. A brutalidade acarretava danos graves aos animais. Segundo consta na denúncia do MPE, “os animais, depois de laçados, eram arrastados pelas ruas, o que causava a perda de pedaços de pele e fratura de ossos” (TJPA, 2019, p. 6). A propaganda do Prefeito Municipal era de fazer uma “limpeza” na cidade e, assim, controlar o aumento populacional de cães em situação de rua (TJPA, 2019TJPA - TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO PARÁ. Apelação criminal n.º 00043870520168140011. Relator: Desembargador Leonam Gondim da Cruz Jr. Diário de Justiça do Estado do Pará, Belém, 2019.).

O caso aqui relatado se diferencia do anterior porque não se trata de uma ação formalmente adotada pela Administração Pública municipal, como ficou provado durante o processo judicial, mas perpetrado de modo irregular, não materializado em ato administrativo solene, cometido pela pessoa do gestor público, aproveitando-se de sua condição para dissuadir os munícipes a adotarem as ações de captura dos animais. Apesar de se tratar de uma ideia pessoal, não formalmente avalizada pelo município, consta no processo judicial que os cidadãos capturadores eram pagos com recursos públicos e os animais eram levados em transporte público para serem mortos.

(...) o transporte dos animais até o rio Mocoões foi realizado em dois “cascos”, sendo que um deles era de propriedade do município de Santa Cruz do Arari, conforme também se pode depreender das imagens juntadas. (...).Todos os depoimentos prestados à autoridade policial, bem como os colhidos pelo Ministério Público, confirmam a prática da captura de cães ocorridas na cidade de Santa Cruz do Arari, nos dias 28 e 29 de maio de 2013 e por determinação do Prefeito municipal, com a participação de outros servidores públicos, sendo que toda a ação foi facilitada pelo uso dos bens e outros recursos públicos - fragmento da denúncia (TJPA, 2019, p. 6).

A promessa de pagamento promovida pelo gestor municipal levou à adesão massiva da população, interessada pela obtenção de renda com as capturas. A ânsia por auferir o pagamento levou pessoas, inclusive, a perpetrarem outros delitos, invadindo propriedades particulares para sequestrar animais domésticos de terceiros e levá-los à morte, dissimulando que fossem animais abandonados.

As imagens gravadas e anexas ao procedimento investigatório demonstram a situação de avidez a que foi levada a população local - inclusive de crianças e adolescentes - na ação de prender os cães com laços, incentivados pela promessa de pagamento e facilitada pela participação de servidores públicos que auxiliavam na atividade de captura dos animais, todos sabedores do “destino” que seria dado aos cachorros aprisionados. Ressalte-se que as práticas abusivas não ocorreram somente pela captura dos cães, mas pela invasão de imóveis e pela retirada dos animais que se encontravam guardados em seu interior, a revelia de seus proprietários. - fragmento da denúncia (TJPA, 2019, p. 7).

Uma das testemunhas do processo revela ter sido vítima da ação pelo sequestro de cachorros que se encontravam em sua propriedade, sob sua tutela. Em seu depoimento, a testemunha afirma ainda que não se tratava de um feito inédito, pois ações similares de captura e morte de animais na cidade já haviam sido perpetradas por gestores de mandatos anteriores:

[...] que cerca de 04 (quatro) anos antes houve um episódio parecido, mas que não sabe dizer se houve pagamento pelos cães, em que os cachorros foram levados para uma cavagem chamada tartaruga (rio tartaruga); que na época muitas pessoas não reclamaram pois havia um excesso de cães na cidade; que na segunda vez, ou seja, do ano de 2013, as pessoas reclamaram porque foram levados seus cães particulares” (TJPA, 2019, p. 8).

Fato merecedor de registro é a concepção da comunidade de normalidade acerca de tais práticas, como aponta a testemunha ao afirmar que as reclamações surgiram em relação aos tutores de animais que foram vítimas de sequestro. Tal contexto evidencia que a irresignação das pessoas não era sobre o destino dos animais, a forma como eram tratados ou o desrespeito à sua dignidade pela ação de “higienização” tomada pelo gestor, mas tão somente uma irresignação patrimonial pela perda dos animais, os quais consideram suas propriedades.

Além das provas testemunhais, laudos periciais produzidos constataram que cachorros “foram encontrados boiando nas águas do rio Mocoões, dois cães mortos e 15 cães vivos com sinais de maus tratos, os quais chegaram até as residências dos ribeirinhos” (TJPA, 2019, p. 9).

É, ainda, possível concluir que a passividade da comunidade e sua adesão à ação do gestor público está enraizada na concepção objetificante que animais têm na sociedade brasileira, ainda de visão majoritariamente antropocêntrica, para quem os animais são objetos pertencentes ao patrimônio das pessoas (NOIRTIN, 2010NOIRTIN, Célia Regina Ferrari Fraganello. Animais não humanos: sujeitos de direitos despersonificados. Revista Brasileira de Direito Animal, v. 5, n. 6, 2010, pp. 133-152., p. 138).

3.4 O caso do édito da morte na Paraíba

No município de Brejo do Cruz/PB foi publicado o decreto do executivo n.º 1187/2021, que determinou o sacrifício de animais apreendidos quando não se encontrassem interessados para doação ou compra em leilão. Entre as justificativas declaradas no decreto, há argumentos de controle populacional aliados à prevenção de zoonoses e acidentes de trânsito:

CONSIDERANDO o crescente número de acidentes de trânsito e doenças por conta de animais soltos ou abandonados e a sua permanência nas vias públicas e logradouros públicos do município;

CONSIDERANDO a necessidade de regulamentar os procedimentos adotados, bem como os prazos e medidas a serem observados pelos proprietários de animais apreendidos e pela própria Administração Pública (Brejo do Cruz (PB), 2021, p. 1).

Similar ao primeiro caso desse trabalho, trata-se de ato administrativo formal instrumentalizado através de norma de competência privativa do Poder Executivo, na figura do prefeito da cidade.

Dois dispositivos do decreto estipulavam a morte de animais.

O primeiro era o artigo 5º, que estipula a morte do animal no local em que ele se encontrar, quando não for possível sua apreensão. Nesse caso, o pensamento da norma é de assegurar o cumprimento da obrigação administrativa de remoção do animal da via pública, ainda que isso custe a vida do próprio animal. Novamente, privilegia-se a vida das pessoas (saúde pública) em detrimento da vida animal, estipulando-se uma hierarquia de valores do direito à vida:

Art. 5º O animal cuja apreensão for impraticável poderá, a juízo da autoridade competente, ser sacrificado “in loco” caso seja diagnosticado com alguma moléstia que possa causar dano a saúde pública (Brejo do Cruz (PB), 2021, p. 2).

O segundo artigo com previsão permissiva de matar o animal é o art. 7º, que não descreve como o sacrifício do animal apreendido será feito, o método a ser adequado ou qualquer revelação pormenorizada do ato.

Art. 7º O animal apreendido, quando não reclamado junto ao Departamento de fiscalização de postura ou órgão que vier a substituí-lo, no prazo estabelecido pelo §1º do art. 3º deste Decreto, terá a seguinte destinação, a critério da autoridade sanitária:

I - doação;

II - sacrifício;

III - leilão em hasta pública (Brejo do Cruz (PB), 2021, p. 3).

Referido decreto teve curta vigência no mundo jurídico, sendo revogado pelo mesmo prefeito, dias depois, após intensa repercussão na mídia nacional (G1, 2021G1-PB. Decreto autoriza sacrifício de animais soltos ou abandonados em Brejo do Cruz, no sertão de PB. Portal G1, 21 jan. 2021., p.1) sobre o teor da norma. Ainda assim, a existência da norma foi o suficiente para revelar a forma antropocêntrica de pensar a solução de problemas apontados como sanitários, com total desprezo pela vida animal.

CONCLUSÃO

Animais têm povoado cidades, notadamente as vias públicas, construindo relações com os humanos, ora como domesticados, ora como vetores de zoonoses, ou, ainda apontados como obstáculos do perímetro urbano, envolvendo-se em acidentes. Entre benefícios e malefícios dessa convivência tão próxima, as cidades se tornaram espaços, embora construídos apenas por humanos, onde a diversidade de espécies ali compartilhando o cotidiano é evidente.

A mortandade de animais como medida de resolução aos problemas sociais, adotada pelo poder público, representa uma política de gestão da morte e seletividade de valores da vida, atribuindo aos animais o desprezo de sua existência, condicionando-os às escolhas sob o parâmetro de utilidade humana. A administração das cidades pelo poder público rememora à autoridade sobre a vida e a morte própria de regimes tirânicos, na história da Humanidade. Contudo, a evolução dos regimes de governo e do Estado de Direito não demonstra ter imposto os mesmos limites ao poder soberano, o qual ainda impera suas escolhas sobre os animais sob a mesma lógica de fazer morrer e deixar viver.

Esse contexto divergente do poder estatal que se exerce entre animais e humanos é construído a partir do paradigma da primazia dos interesses antropocêntricos, onde o homem é o centro das preocupações da máquina governamental e, em nome desse e para esse, mandatários do poder político perpetram atos em detrimento daqueles que elegem como obstáculos do bem-estar humano. Sem qualquer poder de representação política, os animais estão à mercê do êxito das causas de movimentos sociais animalistas e na intervenção perante a gestão pública.

Os conceitos de necropolítica e biopoder, partindo das concepções dos seus teóricos originários, Achile Mbembe e Michel Foucault, permitiram nesta pesquisa um diálogo sobre a compreensão da situação cruel vivenciada pelos animais em situação de rua, expostos às decisões públicas sobre suas vidas e à desconsideração de suas dignidades. Apesar de viverem nas cidades, aos animais não é dado viver a cidade, não é dado ser livre nelas, ser beneficiário de políticas públicas de promoção de bem-estar, ou mesmo, permanecer nelas.

O argumento de que existem segmentos humanos da sociedade também vulneráveis a uma gestão pública calcada na materialização da necropolítica não nos impede de pensar formas de defesa para espécies que, como a humana, padecem da mesma incompreensão sobre a dignidade da vida. Se a promoção do bem-estar e do respeito da existência não comporta hierarquias, esperar que um problema se resolva primeiro, para depois se preocupar com outro, é incorrer na discriminação que malfere o tratamento justo para todo aquele que vive, independente a qual espécie pertença. O direito de viver não deve conhecer fronteiras.

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  • VILLAS-BÔAS, Maria Elisa. Da Eutanásia ao Prolongamento Artificial: Aspectos polêmicos da disciplina jurídico-penal do final da vida. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2005.
  • 1
    Cabe lembrar ainda a concepção de mistanásia quando falamos da morte de pacientes pelo desamparo de uma política de saúde, cuja inefetividade decorre da falta de um atendimento médico adequado, carência social ou, ainda, ausência de condições e de oportunidades econômicas e políticas. A mistanásia revela uma sociedade de desigualdades e o estado de abandono de parcela da população, na medida em que a morte lenta e sofrível é relegada àqueles que já estão, ainda quando sadios, em condições de violação de dignidade, seja porque lhes faltem saneamento básico, educação, acesso à Justiça, ou qualquer outro direito inerente ao exercício pleno da cidadania. A mistanásia revela, portanto, uma morte seletiva (VILLAS-BÔAS, 2005VILLAS-BÔAS, Maria Elisa. Da Eutanásia ao Prolongamento Artificial: Aspectos polêmicos da disciplina jurídico-penal do final da vida. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2005., p. 45).
  • 2
    Apelação n.º 0384416-11.2003.8.13.0024, da relatoria do Desembargador Caetano Levi Lopes.
  • 3
    O uso das câmaras de gás como pena de morte rememora o fatídico contexto do nazismo e seu extermínio de judeus em campos de concentração. A ideia do uso do gás letal se deu não como uma forma de amenizar o sofrimento dos apenados ou por compaixão contra métodos mais dolorosos, mas como um meio de garantir que os extermínios continuassem a ser procedidos pelos executores com estrita obediência e sem efeitos colaterais à saúde desses, pois se identificava que participar do ato do extermínio e assistir ao sofrimento dos apenados vinha produzindo consequências deletérias à saúde dos soldados nazistas (BITTENCOURT; BITTENCOURT, 2021BITTENCOURT, Rodrigo do Prado; BITTENCOURT, José Raimundo. O voto de Lewandoski no HC 143.641 e a cultura do encarceramento. Lex Humana, http://seer.ucp.br/seer/index.php/LexHumana, v. 13, n. 1, p. 204-220, mai. 2021. ISSN 2175-0947. Disponível em: http://seer.ucp.br/seer/index.php/LexHumana/article/view/2052. Acesso em: 05 Jun. 2021.
    http://seer.ucp.br/seer/index.php/LexHum...
    , p. 215).
  • 4
    Recurso Especial n.º 1.115.916/MG, da relatoria do Ministro Humberto Martins.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Dez 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    27 Set 2021
  • Aceito
    24 Mar 2023
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