Percepções de crianças e pais sobre trajes médicos: uma revisão sistemática

RESUMO

Objetivo:

Revisar a literatura sobre as percepções de crianças e seus pais a respeito de trajes médicos.

Fontes de dados:

Buscas sistemáticas foram conduzidas nas bases de dados EMBASE, Literatura Latino-americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS), PubMed, PsycINFO, Scopus e Web of Science. A literatura cinzenta foi pesquisada no Google Scholar, Open Grey e ProQuest Dissertations e Theses Database.

Síntese dos dados:

Foram identificadas 2.567 publicações e, após uma seleção de duas fases, foram incluídos 15 estudos na síntese qualitativa. As crianças tinham preferência pelo uso de jaleco branco em cinco dos nove estudos incluídos (55,5% [IC95% 48,3-62,7]; p=1,00). Em 11 dos 15 estudos incluídos, os pais tinham preferência pelos médicos que utilizavam jaleco (73,3% [IC95% 67,9-78,6]; p=0,11).

Conclusões:

Com uma qualidade baixa de evidência, crianças e pais preferem os médicos que usam jaleco branco.

Palavras-chave:
Criança; Pais; Percepção; Médicos

ABSTRACT

Objective:

To review the literature about children’s and parent’s perceptions on surgical attire.

Data source:

A systematic search was conducted in the databases EMBASE, Latin American and Caribbean Health Sciences (LILACS), PubMed, PsycINFO, Scopus and Web of Science. Grey literature was searched on Google Scholar, Open Grey and ProQuest Dissertations, and Theses Database.

Data synthesis:

A total of 2,567 papers were identified. After a two-phase selection, 15 studies were included in narrative synthesis. Children favored wearing white coats in five of the nine included studies (55.5% [95%CI 48.3-62.7]; p=1.00). With respect to parents’ preferences, results of vote counting showed that in 11 of 15 included studies, they favored physicians wearing white coats (73.3% [95%CI 67.9-78.6]; p=0.11).

Conclusions:

Children and parents have preferred physicians to wear a white coat with a very low certainty of evidence.

Keywords:
Child; Parents; Perception; Physicians

INTRODUÇÃO

O traje desempenha um papel importante em muitas profissões. Em populações pediátricas, a aparência do médico pediatra tem sido considerada um elemento crucial que pode afetar a confiança e o conforto de crianças e pais. Alguns estudos investigaram o impacto da vestimenta dos médicos na confiança dos pacientes. ^1,2,3,4 Estudos anteriores também avaliaram a percepção/preferências dos pais e seus filhos, e os resultados foram conflitantes.^5,6

A vestimenta dos médicos pode ser considerada um indicador de profissionalismo, o que pode impactar a relação médico-paciente.⁷ No entanto, as crianças podem perceber a vestimenta cirúrgica de forma diferente de seus pais.⁵ Na verdade, o fato de os pediatras usarem jaleco branco durante o atendimento de crianças é considerado um dilema, frequentemente debatido, já que um jaleco branco pode ser intimidante para essa população.^8,9 Um estudo anterior mostrou que a maioria das crianças não acha protetores faciais ou máscaras cirúrgicas assustadoras, no entanto, elas preferem médicos com protetores faciais de plástico transparente, para que possam ver o rosto de seus médicos. Os pais previram mal o que seus filhos prefeririam em estudos que exploraram o uso de protetores faciais em vez de máscaras.¹⁰ Além das preferências dos pacientes, é importante considerar o risco de contaminação bacteriana e o risco de transmissão infecciosa ao se avaliarem as escolhas de vestimentas. O uso de jalecos brancos pelos médicos é geralmente aceito e adotado na rotina diária. No entanto, hoje em dia já se sabe que o vestuário médico pode ter um papel essencial na transmissão de infecções dentro e fora dos ambientes hospitalares.⁶

A pandemia da COVID-19 alterou o equipamento de proteção individual (EPI) necessário para cuidados médicos de rotina. Atualmente, protetor facial, máscara, aventais e proteção para os olhos costumam estar entre os acessórios que os médicos devem usar. Um estudo sobre a síndrome respiratória aguda grave (SARS) constatou que 17,5% das 174 crianças e 0,0% dos pais apreciavam os profissionais que usavam equipamentos de proteção em comparação com médicos vestidos com trajes formais, como jaleco branco.¹¹ Até o momento, nenhum estudo investigou as percepções de pais e filhos sobre os diferentes trajes relacionado à COVID-19 em comparação com o equipamento de proteção individual padrão.

Uma revisão sistemática anterior¹² examinou a influência da vestimenta do médico nas percepções do paciente, incluindo confiança/segurança e satisfação. No entanto, em tais pesquisas, estudos envolvendo pacientes pediátricos foram excluídos. Assim, esta revisão sistemática objetivou responder à pergunta: “Quais são as percepções das crianças e dos pais em relação às vestimentas dos médicos?

MÉTODO

Esta revisão foi registrada no The Open Science Framework (OSF) sob DOI 10.17605/OSF.IO/MK8U9,¹³ e seguiu o PRISMA Statement, um conjunto mínimo de itens para reportar revisões sistemáticas.¹⁴ A SWiM, uma diretriz de relatórios para síntese sem meta-análise, também foi adotada.¹⁵

Esta revisão sistemática foi guiada pela pergunta focada: “Quais são as percepções das crianças e dos pais sobre as vestimentas dos médicos?” Para serem incluídos, os estudos descritivos deveriam avaliar as preferências (ou percepções) das crianças em relação às vestimentas dos médicos. Qualquer tipo de método usado para avaliar a preferência ou percepção das crianças quanto à vestimenta do médico (por exemplo: questionário, imagens) foi incluído. Estudos com objetivos diferentes foram excluídos. Também foram excluídos estudos secundários (revisão de artigos, cartas ao editor, livros, capítulos de livros etc.) e aqueles cuja população era adulta.

Um bibliotecário de ciências da saúde experiente ajudou com a estratégia de busca e com a modificação apropriada para cada banco de dados. As bases de dados EMBASE, Latin American and Caribbean Health Sciences (LILACS), PubMed, PsycINFO, Scopus e Web of Science foram pesquisadas desde o início até 1º de junho de 2019 e atualizadas em 28 de maio de 2020. A literatura cinza foi pesquisada no Google Scholar, limitada aos 100 primeiros artigos mais relevantes, e na base de dados System for Information on Grey Literature in Europe (OpenGrey). A base de dados de dissertações e teses da ProQuest também foi utilizada.

As listas de referência dos estudos incluídos também foram checadas para identificar estudos adicionais. Os programas EndNote® X7 (Thomson Reuters, Nova York, EUA) e Rayyan¹⁶ (http://rayyan.qcri.org/) foram usados para gerenciar referências e identificar e remover ocorrências duplicadas.

Dois revisores independentes (CM, LB) realizaram a seleção em duas fases. Primeiro, eles avaliaram todos os títulos e resumos selecionados para elegibilidade. Depois, os artigos completos foram obtidos e avaliados nos casos em que ambos os revisores consideraram os resumos potencialmente relevantes. Discordâncias foram resolvidas por discussão envolvendo um terceiro revisor (MB).

Para a extração de dados, dois revisores (CM, LB) coletaram dados independentemente em formulários pré-pilotos e seus achados foram comparados. Qualquer discordância foi resolvida por acordo mútuo entre os autores.¹⁷ Os seguintes dados foram extraídos dos estudos escolhidos: autores, ano, país, características da amostra (tamanho, sexo, idade), objetivos, características do estudo (cenário) e características do desfecho (análise de dados, resultados, direção do efeito e conclusão principal).

Dois revisores (CM, LB) avaliaram independentemente a qualidade metodológica dos estudos usando a lista de verificação do Instituto Joanna Briggs.¹⁸ O questionário para Estudos Analíticos Transversais foi aplicado e todos os seus domínios foram considerados.

Os dados baseados na contagem de votos foram resumidos levando-se em consideração a direção do efeito.^14,17 O desfecho primário foi a proporção de pais e filhos favoráveis a médicos de jaleco branco. Cada estudo incluído foi categorizado de acordo com as variáveis “a favor do médico de jaleco branco” ou “não a favor do médico de jaleco branco”. A probabilidade de observar preferência pela vestimenta branca por pais e filhos foi calculada por meio de um teste de probabilidade binomial com intervalo de confiança de 95% (IC95%). Pais e filhos foram considerados separadamente.

O teste do sinal foi utilizado para comparar o número de estudos realizados com pais e filhos que preferiam o uso de jaleco branco com o número de estudos com pais e filhos que não aprovavam o uso de jaleco branco, independentemente de os achados serem estatisticamente significativos, como sugerido por Borenstein et al.¹⁸ No teste, espera-se que metade dos estudos seja posicionada de cada lado da linha de não efeito. Portanto, o número de estudos, o número de efeitos que favorecem o avental branco e o valor nulo de 0,5 foram inseridos em uma planilha do Excel. Os resultados são listados em uma tabela organizada pelas características das populações dos estudos (ou seja, país e participantes, ou seja, se os estudos abordaram pais, filhos ou ambos).

Um gráfico também foi construído para comparar visualmente os resultados,¹⁹ apresentando a avaliação de qualidade, com as barras mais altas representando baixo risco de viés e as barras mais baixas indicando risco moderado de viés. Não foi realizada meta-análise devido à heterogeneidade clínica (clínicas, hospitais, diferenças culturais entre as populações) e metodológica (baseado em imagens, questionários) entre os estudos incluídos.

Dois revisores (LBO e CM) analisaram independentemente a qualidade das evidências usando os critérios de Classificação de recomendações, análises, desenvolvimento e avaliações (GRADE).²⁰ Em estudos observacionais, este sistema começa com uma nota baixa e pode ser aumentado ou rebaixado. Aspectos como risco de viés, inconsistência, dados indiretos, imprecisão e viés de publicação são motivos para rebaixar a classificação da evidência e a presença de um grande efeito. O gradiente de resposta à dose e o controle de fatores de confusão plausíveis são as causas do aumento dessa classificação em estudos observacionais. Importante observar que, devido à natureza da análise deste estudo, não foi possível avaliar a consistência dos efeitos.¹⁵

Materiais adicionais sobre estratégias de busca usadas em bancos de dados, artigos excluídos e os motivos para exclusão, bem como as informações detalhadas sobre avaliação de risco de viés estão disponíveis com o autor correspondente.

RESULTADOS

Durante a pesquisa inicial (Fase 1), 2.567 estudos diferentes foram identificados nas seis bases de dados eletrônicas depois de removidas as duplicatas. Após uma avaliação abrangente dos resumos, 73 artigos foram considerados potencialmente relevantes e selecionados para a avaliação da Fase 2. Não houve citações adicionais identificadas na pesquisa da literatura cinza. Dentre esses 73 estudos restantes, 58 foram posteriormente excluídos. Assim, 15 estudos^{5,6,11,21,22,23,24,25,26,27,28,29,30,31,32} foram incluídos na análise narrativa. Nenhum estudo adicional que poderia ter sido inadvertidamente perdido pelos procedimentos de pesquisa foi identificado após uma revisão adicional das listas de referência dos 15 estudos incluídos. Um fluxograma do processo de identificação, inclusão e exclusão de estudos é apresentado na Figura 1.

Figura 1
Fluxograma de pesquisa da literatura e critérios de seleção.

Todos os estudos selecionados eram descritivos. A localização geográfica das equipes de pesquisa que publicaram os estudos foram as seguintes: dois da Arábia Saudita,^5,6 dois da Índia,^31,32 sete dos EUA,^{22,24,25,27,28,29,30} dois do Canadá,^11,33 um da Áustria,²³ e um da França.²⁶

O tamanho da amostra variou bastante, de 40³³ a 450 indivíduos.³⁰ Seis estudos adotaram uma pesquisa baseada em imagens e um questionário.^{5,6,22,23,25,27}. Cinco estudos adotaram questionário,^{24,29,30,31,32} e quatro foram baseados em imagens.^11,26,28,33

A maioria dos estudos incluídos foram conduzidos em hospitais,^{6,22,23,25,26,27,28,31,32,33}, enquanto outros ocorreram em clínicas,^11,24,29 ou ambiente universitário.⁵

Nove estudos tinham amostras incluindo pais e filhos,^{5,11,23,24,25,26,27,28,29} e seis tinham amostras incluindo apenas pais.^{6,22,30,31,32,33} Dos 15 estudos selecionados, 11 revelaram que os pais preferem que os médicos usem jaleco branco.^{5,6,11,22,25,26,27,29,31,32,33} Cinco estudos sugeriram que as crianças preferiam que seus médicos usassem jaleco branco.^{26,27,28,29,33} Além disso, quatro estudos avaliaram as percepções tanto das crianças quanto dos pais sobre as vestimentas dos médicos e ambos preferiam que eles usassem jaleco branco.^26,27,29,33 Um resumo das características descritivas e dos principais resultados dos 15 estudos incluídos pode ser encontrado na Tabela 1.

Tabela 1
Resumo das características descritivas dos artigos de países asiáticos que avaliaram a percepção das vestimentas dos médicos pediatras por pais, crianças e adolescentes (n=4).

Autor(es), ano, país, local	Amostra do estudo (n), sexo e idade (anos)	Objetivos	Resultados gerais Preferência pelo jaleco branco (+) Sem preferência pelo jaleco branco (-)
a) Alnasser et al.,5 2016, Arábia Saudita, Universidade	Pais e crianças 99 pais; 91 do sexo feminino, <20 >40 anos 33 crianças, 11 do sexo feminino, 22 do sexo masculino, 6-12 anos	Avaliar as percepções das crianças e pais sauditas em relação às vestimentas dos médicos em ambientes de pediatria geral.	Pais (+) Crianças (-)
b) Aldrees et al.,6 2017, Arábia Saudita, Hospital	Apenas pais 259; todos do sexo feminino, 32 anos ou menos	Avaliar as preferências de mães sauditas em relação às vestimentas dos médicos de crianças sauditas e sua influência no nível de confiança e segurança dos pais.	Pais (+)
c) Raichur et al.,31 2001, Índia, Hospital	Apenas pais 210; sexo e idade não identificados.	Avaliar as opiniões dos pais sobre os trajes e a aparência de pediatras.	Pais (+)
d) Solanki et al.,32 2015, Índia, Hospital	Apenas pais 400; sexo e idade não informados.	Estudar as percepções dos pais sobre as vestimentas do pediatra.	Pais (+)

A maioria dos estudos (n=8) foi considerada de baixo risco de viés; os sete restantes apresentaram risco moderado. Embora os estudos tenham sido todos conduzidos com o mesmo desenho, a principal questão metodológica identificada dizia respeito às suas amostras. A maioria dos estudos utilizou amostra de conveniência, com alto risco de não ser verdadeiramente representativa da população geral. As principais falhas identificadas nos estudos foram relacionadas à falta de critérios claramente delimitados para inclusão na amostra, problemas com a identificação de fatores confundidores e, se presentes, descrição de estratégias para lidar com tais fatores. Mais informações sobre o risco de viés desses estudos podem ser vistas na Figura 2.

Figura 2
Gráfico de risco de viés: análise dos julgamentos dos autores quanto a cada item de risco de viés, apresentado em porcentagens, em todos os estudos incluídos.

As estimativas de efeito disponíveis estão listadas nas Tabelas 1, 2, 3 e 4 (coluna 4). Com relação às preferências dos pais, em 11 dos 15 estudos eles eram favoráveis aos médicos que vestiam jalecos brancos (73,3% [IC95% 67,9-78,6]; p=0,11) (Figura 3A). As crianças tinham preferência pelo jaleco branco em cinco dos nove estudos incluídos (55,5% [IC95% 48,3-62,7]; p=1,00) (Figura 3B).

Tabela 2
Resumo das características descritivas dos artigos dos Estados Unidos que avaliaram a percepção das vestimentas dos médicos pediatras por pais, crianças e adolescentes (n=7).

Autor(es), ano, país, local	Amostra do estudo (n), sexo e idade (anos)	Objetivos	Resultados gerais Preferência pelo jaleco branco (+) Sem preferência pelo jaleco branco (-)
e) Longmuir et al.,24 2010, Estados Unidos, clínica	Pais e crianças 227 no total, sexo e idade não informados.	Determinar se os pacientes e seus familiares têm preferências de trajes do médico e da equipe.	Pais (-) Crianças (-)
f) Marino et al.,25 1991, Estados Unidos, hospital	Pais e crianças 50 pais; 84% do sexo feminino; 25-35 anos. 50 crianças; 58% do sexo feminino; 5-8 anos.	Avaliar as percepções sobre as roupas de um pediatra.	Pais (+) Crianças (-)
g) Matsui et al.,27 1998, Estados Unidos, hospital	Pais e crianças 100 pais; 82.3% do sexo feminino; 24-46 anos. 100 crianças; sexo não informado; 4-8 anos.	Determinar se crianças pequenas têm preferência aos médicos utilizarem ou não jaleco branco.	Pais (+) Crianças (+)
h) McCarthy et al.,28 1999, Estados Unidos, hospital	Pais e crianças 50 pais, sexo e idade não informados. 50 crianças; 25 do sexo feminino; 5-15 anos.	Avaliar a percepção visual da criança e seus pais a respeito dos médicos.	Pais (-) Crianças (+)
i) Muran e Gold,29 1990, Estados Unidos, clínica	Pais e crianças 284 pais; sexo e idade não informados. 159 crianças, sexo não informado; 1-18 anos	Avaliar as expectativas dos pacientes e seus pais em relação às vestimentas dos médicos.	Pais (+) Crianças (+)
j) Gonzalez Del Rey e Paul 1995,22 Estados Unidos, hospital	Apenas pais 360; 252 do sexo feminino, 68% entre 19 e 40 anos.	Determinar a preferência dos pais sobre os trajes dos médicos na emergência pediátrica e investigar se variáveis como a gravidade da doença, sexo, raça, idade, status de seguro, tempo e tipo de visita ao departamento de emergência, influenciam as preferências.	Pais (+)
k) Nibhanipudi et al.,30 2013, Estados Unidos, não informado	Apenas pais 450; sexo e idade não informados.	Determinar a aceitação dos pais falantes de espanhol a respeito dos trajes utilizados pelo médico no departamento de emergência pediátrica.	Pais (-)

Tabela 3
Resumo das características descritivas dos artigos do Canadá que avaliaram a percepção das vestimentas dos médicos pediatras por pais e filhos (n=2).

Autor(es), ano, país, local	Amostra do estudo (n), sexo e idade (anos)	Objetivos	Resultados gerais Preferência pelo jaleco branco (+) Sem preferência pelo jaleco branco (-)
l) Truong et al.,11 2006, Canadá, Centro de cuidados terciários	Pais e crianças 174 pais; 72.4% do sexo feminino; 18-60 anos 197 crianças, sexo não informado; 4-8 anos	Determinar se crianças pequenas têm preferência por médicos que utilizam trajes de cuidados padrão.	Pais (+) Crianças (+)
m) Taylor,33 1987, Canadá, hospital	Pais e crianças 40; 72% do sexo feminino; 17-51 anos	Testar a hipótese de que os pais têm preferências em relação à vestimenta médica	Pais (+)

Tabela 4
Resumo das características descritivas dos artigos de países europeus que avaliaram a percepção das vestimentas dos médicos pediatras por pais, crianças e adolescentes (n=2).

Autor(es), ano, país, local	Amostra do estudo (n), sexo e idade (anos)	Objetivos	Resultados gerais Preferência pelo jaleco branco (+) Sem preferência pelo jaleco branco (-)
n) Hofmann et al,.23 2012, Áustria, hospital	Pais e crianças 72 pais; sexo e idade não informados. 55 crianças; 6-18 anos 40 crianças; 0-6 anos	Verificar se as diferentes vestimentas de um pediatra influenciam a opinião das crianças e dos pais sobre o médico.	Pais (-) Crianças (-)
o) Maruani et al.,26 2013, França, hospital	Pais e crianças Hospital: 50 pais; 46 do sexo feminino; 39.0±5.8 50 crianças; 20 do sexo feminino, 7-11 anos 50 adolescentes; 29 do sexo feminino; 11-17 anos Serviço privado: 24 pais; 20 do sexo feminino; 39.0±6.2 27 crianças; 16 do sexo feminino, 7-11 anos 30 adolescentes; 15 do sexo feminino; 11-17 anos	Determinar se o estilo da vestimenta (jaleco branco profissional ou traje formal, semiformal ou casual) influencia a confiança dos pacientes (crianças, adolescentes, adultos) no médico em consultas de queixas dermatológicas em hospital ou consultório particular.	Pais (+) Crianças (+)

Figura 3
Gráficos representando proporções de pais (A) e crianças (B) que preferiam o jaleco branco. As colunas representam estudos individuais com indicação de referências. A altura das colunas representa o julgamento geral da avaliação da qualidade (alto = baixo risco de viés; baixo = risco moderado de viés).

A confiança na evidência cumulativa, definida com base nos critérios GRADE,²⁰ foi avaliada como muito baixa, sugerindo que o risco de viés era uma preocupação séria. Além disso, foram identificadas algumas preocupações graves quanto à imprecisão devido ao pequeno número de eventos incluídos. Dados indiretos não foi uma preocupação, não se detectou viés de publicação porque não houve relato de um potencial conflito de interesses nos estudos e a estratégia de busca de revisão sistemática era ampla, incluindo literatura cinzenta. Não se avaliou inconsistência.

DISCUSSÃO

Até onde sabemos, esta é a primeira revisão sistemática que avaliou as preferências das crianças e de seus pais em relação às vestimentas dos médicos. Compreender essas preferências/percepções pode ser de grande importância para uma relação médico-paciente bem-sucedida. Além disso, a vestimenta dos médicos pode ser interpretada como um indicador de profissionalismo, o que pode impactar essa relação. Em geral, na maioria dos estudos incluídos nesta revisão sistemática, os pais tinham preferência pelos médicos que usassem jaleco branco.^{5,6,11,22,25,26,27,29,31,32,33}

Os estudos apresentaram resultados diversos. Pesquisas anteriores concluíram que a maioria das mães preferia que os médicos de seus filhos usassem seus trajes específicos, assim como a maioria dos cuidadores.⁶ Pediatras com vestimentas casuais eram de maior preferência e isso não alterou a percepção de confiabilidade dos pais nesses profissionais.²³ Por outro lado, alguns autores descobriram que os pais preferem médicos que usem vestimentas hospitalares e tênis.³⁰ Os pais de pacientes em emergências cirúrgicas tendem a preferir médicos que usem jalecos cirúrgicos.²² Em outro estudo, não houve preferência por nenhum estilo particular de vestimenta médica.²⁴

Além disso, é bom ressaltar que estudos anteriores concluíram que as crianças podem perceber a vestimenta do médico de maneira diferente da dos pais.^5,25,28 Diferentes variáveis e aspectos metodológicos podem ter influenciado esses resultados. Quanto às preferências e a possível associação com a idade da criança, verificou-se a probabilidade de crianças mais velhas preferirem jalecos brancos e as mais novas preferirem trajes informais.²⁹ Avaliar as preferências das crianças de acordo com seu nível de desenvolvimento é essencial. O ambiente da pesquisa também pode ter influenciado os achados. Descobriu-se que crianças em ambiente hospitalar têm preferência pelas imagens de médicos com jaleco branco. Digno de nota, descobriu-se que os adolescentes preferem, nessa ordem, trajes profissionais, semiformais, formais e, finalmente, trajes casuais.²⁶

Uma revisão sistemática anterior, conduzida com uma população adulta, identificou a influência da localização geográfica nas preferências de vestuário. Descobriu-se que a localização geográfica influenciava as percepções do traje, talvez demonstrando expectativas culturais, de moda ou étnicas.¹² O traje típico saudita (thobe e shemagh) foi um dos preferidos na pesquisa da Arábia Saudita.⁶ Um outro estudo concluiu que os resultados não diferiram significativamente quando ajustados por idade, sexo ou número de hospitalizações.²⁸ A gravidade da doença, o tipo de seguro saúde e a idade, raça e sexo dos responsáveis não afetaram suas preferências.²²

Esta revisão sistemática não confirmou o mito popular da “síndrome do avental branco”. Uma revisão sistemática anterior realizada com adultos reportou que, embora os pacientes geralmente prefiram trajes formais de médico (com ou sem jaleco branco), trata-se de uma percepção complexa e multifatorial.¹²

Apesar de esta revisão sistemática ter identificado que muitas pessoas, de todas as idades, podem preferir o jaleco branco, recomendações baseadas na legislação atual e biossegurança devem ser consideradas. Uma revisão sistemática recente comparou o nível de contaminação bacteriana entre jalecos brancos e aventais cirúrgicos. Jalecos e aventais são comumente colonizados por organismos multirresistentes. De acordo com os principais achados, os jalecos são lavados com muito menos frequência do que as vestes cirúrgicas e, portanto, têm maior risco de infecção. Os dados sobre contaminação com base no tipo de tecido variam. Além disso, as escovas de lavagem com substâncias antimicrobianas podem reduzir potencialmente a contaminação. As práticas de esterilização têm grau variável de eficácia na redução da contaminação.³⁴

A maioria dos estudos selecionados nesta revisão teve baixo risco de viés. No entanto, é importante destacar que a avaliação das vestimentas dos médicos variou consideravelmente entre os estudos. Houve, ainda, uma variação metodológica significativa entre os fatores, incluindo os ambientes de pesquisa (salas de espera de hospitais, universidades, clínicas médicas e serviços de emergência), faixas etárias das crianças e aspectos geográficos e culturais das amostras avaliadas. Múltiplas variáveis podem ter sido associadas às preferências das crianças e dos pais sobre as vestimentas dos médicos.

Algumas limitações desta revisão sistemática devem ser consideradas. Todos os estudos incluídos eram descritivos, realizados com amostras de conveniência. Mais estudos deveriam explorar sistematicamente o efeito dos níveis de desenvolvimento das crianças sobre tais preferências por trajes médicos. Além disso, outros fatores confundidores, como gênero, níveis de ansiedade, características de personalidade, experiências médicas anteriores e origens socioeconômicas devem ser considerados para uma melhor compreensão das preferências das crianças e dos pais. Fatores culturais também devem ser explorados em estudos futuros. Além disso, foi aplicada a contagem de votos para síntese dos dados. Embora esse método possa ser eficaz para avaliar a classificação dos resultados, não leva em consideração o tamanho da população.¹⁸ Além disso, a análise dos dados não permitiu o acesso adequado à certeza de evidência pelo GRADE, pois não foi possível avaliar a inconsistência.

Hoje em dia, devido à resposta à pandemia da COVID-19, os trajes médicos são cada vez mais obrigados a utilizar alguns ou quase todos os EPIs descartáveis disponíveis, incluindo gorros, óculos, protetores faciais, máscaras N95 (às vezes com uma máscara cirúrgica por cima), aventais e luvas.³⁵ Novos estudos deveriam abordar as percepções e respostas de pais e filhos ao equipamento de proteção individual padrão COVID-19. Os achados desta revisão sugerem que os sistemas de saúde devem considerar múltiplos fatores, como o contexto do cuidado, na definição de políticas relacionadas ao código de vestimenta.

Em conclusão, pais e crianças têm preferência por médicos que usam jaleco branco, com baixa certeza de evidência. Leis e regulamentos relativos ao uso de trajes adequados e roupas de proteção, bem como equipamentos, devem ser seguidos para proteger os pacientes e os profissionais de saúde de doenças infecciosas durante a realização dos cuidados médicos.

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Financiamento

• Este estudo foi parcialmente financiado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), Finance Code 001.

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  25 Out 2021
• Data do Fascículo
  2022

Histórico

• Recebido
  23 Set 2020
• Aceito
  19 Jan 2021