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Qualidade de vida e pessoas vivendo com AIDS: relação com aspectos sociodemográficos e de saúde1 1 Artigo extraído da tese de doutorado "Representações Sociais do HIV/Aids e da Qualidade de Vida: um estudo entre pessoas que vivem com o agravo em contexto de interiorização", apresentada ao Instituto de Psicologia, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, RJ, Brasil

Resumos

OBJETIVO:

analisar a relação de dimensões sociodemográficas e de saúde com a qualidade de vida de pessoas vivendo com vírus da imunodeficiência humana.

MÉTODO:

estudo descritivo e quantitativo. Os sujeitos foram 131 pessoas soropositivas acompanhadas em centro especializado de município norte-fluminense, Brasil. Empregou-se formulário com dados sociodemográficos e de saúde, bem como instrumento da Organização Mundial de Saúde para avaliação da qualidade de vida de pessoas com vírus da imunodeficiência humana.

RESULTADOS:

na análise estatística, evidenciaram-se diferenças significantes na avaliação da qualidade de vida pelos sujeitos entre suas diversas dimensões para o sexo, escolaridade, trabalho, renda pessoal, condição clínica, percepção sobre estar ou não doente, histórico de internações e alterações orgânicas pelos antirretrovirais.

CONCLUSÃO:

o cuidado profissional em enfermagem e saúde, bem como as políticas públicas na área, deve valorizar a abordagem da qualidade de vida, considerando as condições relacionadas na configuração da mesma.

Síndrome da Imunodeficiência Adquirida; Qualidade de Vida; Enfermagem


OBJECTIVE:

to analyze the relationship of sociodemographic and health dimensions with the quality of life of people living with the human immunodeficiency virus.

METHOD:

descriptive and quantitative study. The subjects were 131 seropositive people treated in a specialized center of the Norte-Fluminense municipality, Brazil. A form with sociodemographic and health data was applied, as well as the World Health Organization instrument for the assessment of the quality of life of people with the human immunodeficiency virus.

RESULTS:

the statistical analysis revealed a significant difference in the assessment of the various dimensions of quality of life by the subjects for gender, education, employment, personal income, medical condition, self-perception of sickness, history of hospitalizations, and bodily alterations due to the antiretroviral drugs.

CONCLUSION:

professional nursing and health care, as well as public policies in the area, should valorize the quality of life approach, considering the conditions related to its configuration.

Acquired Immunodeficiency Syndrome; Quality of Life; Nursing


OBJETIVO:

analizar la relación de dimensiones sociodemográficas y de salud con la calidad de vida de personas viviendo con el virus de la inmunodeficiencia humana.

MÉTODO:

estudio descriptivo y cuantitativo. Los sujetos fueron 131 personas seropositivas acompañadas en centro especializado de municipio en el norte fluminense, Brasil. Se empleó formulario con datos sociodemográficos y de salud, así como un instrumento de la Organización Mundial de la Salud para evaluación de la calidad de vida de personas con virus de la inmunodeficiencia humana.

RESULTADOS:

en el análisis estadístico se evidenció diferencias significativas en la evaluación de la calidad de vida por los sujetos entre sus diversas dimensiones para el sexo, escolaridad, trabajo, renta personal, condición clínica, percepción sobre estar o no enfermo, historial de internaciones y alteraciones orgánicas por los antirretrovirales.

CONCLUSIÓN:

el cuidado profesional en enfermería y salud, así como las políticas públicas en el área deben valorizar el abordaje de la calidad de vida, considerando las condiciones relacionadas en la configuración de la misma.

Síndrome de Inmunodeficiencia Adquirida; Calidad de Vida; Enfermería


Introdução

A Qualidade de Vida (QV) consiste em campo de progressivo interesse acadêmico, dadas suas potencialidades. O seu desenvolvimento e a incorporação do conceito no setor saúde se deram, basicamente, devido a: estudos epidemiológicos envolvendo felicidade e bem-estar; busca por novos indicadores sociais de saúde; insuficiência das medidas objetivas dos resultados das biotecnologias; movimento da psicologia positiva; valorização da satisfação do cliente e necessidade de humanização na programação e atenção à saúde( 11. Fleck MPA. Problemas conceituais em qualidade de vida. In: Fleck MPA, editor. A avaliação da qualidade de vida: guia para profissionais da saúde. Porto Alegre (RS): Artmed; 2008. p. 19-28. ).

O constructo da QV tem contribuído, também, para a compreensão dos fatores intervenientes na convivência das pessoas com a infecção pelo Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV) e com a doença que esse causa, a Síndrome de Imunodeficiência Adquirida (AIDS)( 22. Rai Y, Dutta T, Gulati AK. Quality of Life of HIV-Infected People Across Different Stages of Infection. J Happiness Stud. 2010;11(1):61-9. ). Isso se deve ao fato de que, não obstante o aumento no tempo de vida, após a infecção pelo HIV, em decorrência do desenvolvimento da Terapia Antirretroviral de Alta Atividade (HAART), muitas questões de natureza clínica e, especialmente, psicossociais ainda são obstáculos para a melhoria da QV( 33. Anis AH, Nosyk B, Sun H, Guh DP, Bansback N, Li X, et al. Quality of Life of Patients with advanced HIV/Aids: measuring the impact of both aids-defining events and non-aids serious adverse events. J Acquir Immune Defic Syndr. 2009;51(5):631-9. - 44. Gomes AMT, Silva EMP, Oliveira DC. Social representations of AIDS and their quotidian interfaces for people living with HIV. Rev. Latino-am. Enfermagem. 2011;19(3):485-92. ).

Desse modo, as Pessoas que Vivem com AIDS (PVHA) ainda se deparam com significativas dificuldades como: estigma e preconceito( 55. Sayles JN, Wong MD, Kinsler JJ, Martins D, Cunningham WE. The Association of Stigma with Self-Reported Access to Medical Care and Antiretroviral Therapy Adherence in Persons Living with HIV/Aids. J Gen Intern Med. 2009; 24(10):1101-8. ); acesso à assistência em saúde( 66. Oliveira IBN. Acesso universal? Obstáculos ao acesso, continuidade do uso e gênero em um serviço especializado em HIV/Aids em Salvador, Bahia, Brasil. Cad. Saúde Pública. 2009;25 suppl 2:259-68. ); vínculos empregatícios( 77. Rueda S, Raboud J, Mustard C, Bayoumi A, Lavis JN, Rourke SB. Employment status is associated with both physical and mental health quality of life in people living with HIV. AIDS Care. 2011; 23(4):435-43. ); relações com profissionais de saúde( 88. Formozo GA, Oliveira DC. Auto-proteção profissional e cuidado de enfermagem ao paciente soropositivo ao HIV: duas facetas de uma representação. Acta Paul Enferm. 2009;22(4):392-8. ); vivência da sexualidade( 99. Skevington SM, Norweg S, Standage M, The WHOQoL HIV Group. Predicting quality of life for people living with HIV: international evidence from seven cultures. AIDS Care. 2010;22(5):614-22. ); suporte social ampliado( 99. Skevington SM, Norweg S, Standage M, The WHOQoL HIV Group. Predicting quality of life for people living with HIV: international evidence from seven cultures. AIDS Care. 2010;22(5):614-22. - 1010. Yadav S. Perceived social support, hope, and quality of life of persons living with HIV/Aids: a case study from Nepal. Qual Life Res. 2010; 19(2):157-66. ); relações familiares( 44. Gomes AMT, Silva EMP, Oliveira DC. Social representations of AIDS and their quotidian interfaces for people living with HIV. Rev. Latino-am. Enfermagem. 2011;19(3):485-92. , 1010. Yadav S. Perceived social support, hope, and quality of life of persons living with HIV/Aids: a case study from Nepal. Qual Life Res. 2010; 19(2):157-66. ) e alterações corporais e percepção da autoimagem( 44. Gomes AMT, Silva EMP, Oliveira DC. Social representations of AIDS and their quotidian interfaces for people living with HIV. Rev. Latino-am. Enfermagem. 2011;19(3):485-92. ).

A Organização Mundial de Saúde (OMS), por sua vez, tem investido na abordagem da QV, tendo constituído para tal o Grupo de Avaliação da Qualidade de Vida (The WHOQoL Group). Essa iniciativa culminou com a criação de um instrumento genérico de avaliação da QV denominado WHOQoL-100, desenvolvido de maneira multicêntrica, com potencial transcultural. E, tendo em vista as peculiaridades do viver com AIDS, criou-se o dispositivo WHOQoL-HIV, baseado no primeiro instrumento citado( 1111. The WHOQoL HIV Group. Initial steps to developing the World health Organization's Quality of Life Instrument (WHOQoL) module for international assessment in HIV/Aids. AIDS Care. 2003;15(3):347-57. ).

Considerando a complexidade na conceituação da QV, a OMS a define como "a percepção do indivíduo de sua posição na vida, no contexto da cultura e sistema de valores nos quais ele vive e em relação aos seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações"( 1111. The WHOQoL HIV Group. Initial steps to developing the World health Organization's Quality of Life Instrument (WHOQoL) module for international assessment in HIV/Aids. AIDS Care. 2003;15(3):347-57. ). Envolve ampla avaliação da percepção dos sujeitos sobre um conjunto de dimensões, quais sejam no caso do WHOQoL-HIV: física, psicológica, nível de independência, relações sociais, meio ambiente e Espiritualidade, Religião e Crenças Pessoais (ERCP)( 1111. The WHOQoL HIV Group. Initial steps to developing the World health Organization's Quality of Life Instrument (WHOQoL) module for international assessment in HIV/Aids. AIDS Care. 2003;15(3):347-57. ).

Assim, haja vista que características sociodemográficas e de saúde podem impactar na avaliação da QV( 22. Rai Y, Dutta T, Gulati AK. Quality of Life of HIV-Infected People Across Different Stages of Infection. J Happiness Stud. 2010;11(1):61-9. , 55. Sayles JN, Wong MD, Kinsler JJ, Martins D, Cunningham WE. The Association of Stigma with Self-Reported Access to Medical Care and Antiretroviral Therapy Adherence in Persons Living with HIV/Aids. J Gen Intern Med. 2009; 24(10):1101-8. , 77. Rueda S, Raboud J, Mustard C, Bayoumi A, Lavis JN, Rourke SB. Employment status is associated with both physical and mental health quality of life in people living with HIV. AIDS Care. 2011; 23(4):435-43. , 99. Skevington SM, Norweg S, Standage M, The WHOQoL HIV Group. Predicting quality of life for people living with HIV: international evidence from seven cultures. AIDS Care. 2010;22(5):614-22. - 1010. Yadav S. Perceived social support, hope, and quality of life of persons living with HIV/Aids: a case study from Nepal. Qual Life Res. 2010; 19(2):157-66. ), este trabalho teve por objetivo: analisar a relação de dimensões sociodemográficas e de saúde com a avaliação da QV de pessoas vivendo com AIDS. Não obstante a existência de estudos de avaliação da QV de PVHA, ainda são poucas as pesquisas empregando o constructo com facetas de abordagem específica do WHOQoL-HIV. Isso, especialmente, para municípios brasileiros de médio e pequeno porte, circunscrição espacial deste estudo.

Além disso, a análise da qualidade de vida faz-se fundamental no âmbito das políticas e serviços de saúde voltados às PVHA, uma vez que tal indicador valoriza a percepção das pessoas quanto à sua própria vida e saúde. Serve, assim, de base para direcionar os investimentos programáticos e profissionais em saúde(1). Por sua vez, contribui para o delineamento do cuidado de enfermagem a esse grupo, ao sinalizar dimensões para abordagens coletivas e individuais pelo enfermeiro.

Método

Trata-se de estudo descritivo, de abordagem quantitativa, tendo como sujeitos PVHA. A coleta de dados ocorreu em Serviço de Atenção Especializada (SAE) em HIV/AIDS de município com médio porte da região norte do Estado do Rio de Janeiro.

Os critérios para inclusão dos sujeitos na pesquisa foram: estar no SAE no momento das entrevistas, idade maior ou igual a 18 anos, soropositividade ao HIV e estar em condições mentais que viabilizassem a participação. Houve aprovação do projeto pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, sob Registro nº017.3.2011, com disponibilização de Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). O período de coleta de dados foi entre os meses de maio e outubro de 2011.

A amostragem foi não probabilística, sendo a seleção dos sujeitos por conveniência, obedecendo-se aos critérios de inclusão referidos anteriormente. Para o cálculo amostral, teve-se por base informação do SAE de possuir 979 pacientes em seguimento. Efetivou-se o cálculo de amostra finita, a partir de piloto com 45 sujeitos. Com prevalência obtida do piloto de 11%, nível de confiança de 95% e erro de 5%, delimitou-se amostra com 131 participantes.

Na coleta de dados foram utilizados dois instrumentos específicos, sendo um elaborado para o presente estudo, contendo dados sociodemográficos e de saúde; o segundo foi desenvolvido pela OMS para avaliação das dimensões relacionadas à qualidade de vida: o WHOQoL-HIV, em sua versão abreviada (Bref). O instrumento WHOQoL-HIV-Bref possui 31 questões/facetas distribuídas entre um componente de percepção global e seis domínios de avaliação da QV, sendo os mesmos: físico, psicológico, nível de independência, relações sociais, meio ambiente e ERCP( 1212. Organização Mundial da Saúde (OMS). Departamento de Saúde Mental e Dependência Química. WHOQoL-HIV Bref: versão em Português. Genebra: OMS; 2002. ). Esse instrumento foi traduzido e validado, no Brasil, com confiabilidade e consistência adequadas para a escala e seus domínios( 1313. Zimpel R, Fleck MPA. Qualidade de vida em pacientes com HIV/Aids: conceitos gerais e resultados de um estudo brasileiro. In: Fleck MPA, editor. A avaliação da qualidade de vida: guia para profissionais da saúde. Porto Alegre (RS): Artmed; 2008. p. 157-67. ).

As questões do WHOQoL-HIV-Bref são estruturadas em escala tipo Likert, com cinco gradações, conforme a natureza dos domínios e facetas. Ocorreu preenchimento pelos próprios sujeitos da pesquisa, exceto quando impossibilitados devido a dificuldades na leitura( 1313. Zimpel R, Fleck MPA. Qualidade de vida em pacientes com HIV/Aids: conceitos gerais e resultados de um estudo brasileiro. In: Fleck MPA, editor. A avaliação da qualidade de vida: guia para profissionais da saúde. Porto Alegre (RS): Artmed; 2008. p. 157-67. ).

Por sua vez, as variáveis sociodemográficas e de saúde coletadas foram: sexo, faixa etária, grau de instrução, trabalho, renda pessoal, orientação sexual, parceiro afetivo/sexual, número de filhos, município de residência, número de pessoas com as quais reside, uso de preservativo, principal fonte de informação sobre AIDS, categorizada, dicotomicamente, em profissionais/serviço de saúde e outros meios, tempo de diagnóstico de soropositividade ao HIV, condição clínica (assintomáticos/sintomáticos), considerar-se doente; internações, uso de HAART, tempo de uso de HAART, estágio da infecção pelo HIV e carga viral.

Em relação à coleta de dados, salienta-se, ainda, que ocorreu em espaço reservado cedido pelo SAE em que se deu a pesquisa, com ida ao referido serviço para aplicação dos instrumentos em todos os dias da semana. O convite aos sujeitos para a participação se deu segundo a posição na ordem de espera para consulta médica, sendo substituídos os que não manifestavam interesse em integrar-se o estudo.

Foi realizada análise estatística descritiva dos dados do questionário sociodemográfico e de saúde com o auxílio do software Statistical Package for the Social Sciences (SPSS), versão 17.0. Para a análise dos dados oriundos do WHOQoL-HIV-Bref, incialmente, seguiram-se as orientações da OMS, em sua sintaxe. Os escores das questões dentro de cada domínio de QV são usados para calcular o escore do domínio, sendo esse a média dos escores das questões. As médias dos escores dos domínios foram, então, multiplicadas por 4 para fazer com que os escores resultantes fossem comparáveis com aqueles usados no WHOQoL-100, com oscilação dos valores entre o mínimo de 4 e máximo de 20( 1414. Organização Mundial da Saúde (OMS). Departamento de Saúde Mental e Dependência Química. Instrumento WHOQoL-HIV: sintaxe. Genebra: OMS; 2002. ).

Para o cruzamento estatístico entre os dados sociodemográficos, de saúde e os da avaliação da QV efetivou-se, primeiramente, teste de normalidade das distribuições das variáveis dos seis domínios do WHOQoL-HIV-Bref. Isso se deu pelo teste Kolmogorov-Smirnov, por meio do SPSS, 17.0.

Considerando os resultados do referido teste, foi necessária a adoção de testes estatísticos comparativos paramétricos teste t de Student (comparação entre dois subgrupos) e Análise de Variância (ANOVA) (comparação entre três ou mais subgrupos), para os domínios com distribuições normais: físico, psicológico, nível de independência, relações sociais e meio ambiente e testes não paramétricos de Mann-Whitney (comparação entre dois grupos) e Kruskall-Wallis (comparação envolvendo três ou mais grupos), para a distribuição não normal no domínio ERCP. Foi empregado, também, quando da efetivação do teste t de Student e da ANOVA, o teste de Levene, para o exame da homogeneidade das variâncias. Em caso de heterogeneidade das variâncias, empregavam-se os testes não paramétricos.

As comparações múltiplas de médias pós-teste foram realizadas por meio do teste Tukey-Honest Significant Differences (HSD) para a ANOVA e pela comparação entre cada par de categoria de variável pelo teste de Mann-Whitney, no caso do teste Kruskall-Wallis. Em todas as comparações, adotou-se nível de significância p<0,05.

Resultados

No que tange à caracterização dos sujeitos, seguem os dados dispostos na Tabela 1, a seguir.

Tabela 1
Distribuição das pessoas que vivem com HIV/ AIDS, segundo variáveis sociodemográficas e de saúde. Município norte-fluminense, RJ, Brasil, 2011

Considerando a análise comparativa entre a avaliação da QV e os dados sociodemográficos e de saúde, não houve diferença estatisticamente significante (p<0,05), em nenhum dos domínios para as seguintes variáveis: orientação sexual, estado marital, uso de preservativo, faixa etária, município de residência, número de filhos, número de pessoas com as quais reside, fonte de informação sobre AIDS, tempo de diagnóstico, uso de HAART, tempo de uso de HAART, estágio da infecção e carga viral.

Considerando as variáveis sociodemográficas com diferença estatisticamente significante, houve distinção para os sexos masculino e feminino em três domínios: psicológico, meio ambiente e ERCP, todos com maior escore entre os homens (Tabela 2).

Tabela 2
Distribuição dos domínios de avaliação da qualidade de vida, de acordo com as variáveis sociodemográficas. Município norte-fluminense, RJ, Brasil, 2011

Quanto ao grau de instrução, identificou-se diferença estatisticamente significante apenas no domínio nível de independência. O teste post hoc Tukey evidenciou que esse efeito ocorreu, mais especificamente, entre pessoas com nível fundamental incompleto e nível superior. Não obstante, notou-se aumento nos escores médios à medida que se elevou a escolaridade (Tabela 2). Cabe destacar que foi excluído da comparação o subgrupo que referiu não ter estudado, por estar representado por apenas dois sujeitos.

Em relação à atividade laboral dos sujeitos, observou-se diferença estatisticamente significante em todos os seis domínios do WHOQoL-HIV-Bref. Assim, identificaram-se valores maiores nos escores entre aqueles que se encontravam inseridos, de algum modo, no mercado de trabalho (Tabela 2).

Para a variável renda pessoal, incialmente, ressalta-se que se considerou o valor de referência do salário-mínimo de R$565,00, à época da coleta de dados. Assim, foram identificadas diferenças estatisticamente significantes em quatro domínios: físico, nível de independência, meio ambiente e ERCP. Observou-se aumento no valor dos escores nos domínios referidos à medida que era mais elevada a faixa de salários-mínimos correspondentes. Entretanto, a comparação múltipla de médias Tukey apontou diferenças estatisticamente significantes no domínio físico apenas entre aqueles sem renda e os sujeitos com 1,1 a 3 salários-mínimos (Tabela 2).

Para o domínio nível de independência, o teste referido não precisou a diferença específica entre os subgrupos, porém, perceberam-se escores menores entre indivíduos sem renda ou inferior ou igual a 1 salário-mínimo diante dos demais com 1,1 salários ou mais (Tabela 2).

Para o domínio meio ambiente, o teste Tukey revelou diferença estatisticamente significante entre o subgrupo com 1 salário ou menos e aqueles com mais de 5 salários-mínimos. Por sua vez, para o domínio ERCP o procedimento post hoc par a par com o teste de Mann-Whitney caracterizou os indivíduos sem renda com escores significativamente inferiores ao demais (Tabela 2).

Quanto à variável condição clínica, tal como percebida pelos depoentes, pôde-se constatar diferença estatisticamente significante em todos os domínios do WHOQoL-HIV-Bref, exceto pela ERCP. Em todas as dimensões com diferença estatística, os sujeitos assintomáticos apresentaram escores superiores àqueles sintomáticos (Tabela 3).

Tabela 3
Distribuição dos domínios de avaliação da qualidade de vida, de acordo com as variáveis de saúde. Município norte-fluminense, RJ, Brasil, 2011

Em relação à percepção dos sujeitos quanto a estarem doentes, observou-se diferença estatisticamente significante em todos os seis domínios. Assim, os escores entre aqueles que não foram avaliados como doentes foi superior em todos os casos (Tabela 3).

Quanto às internações por AIDS, percebeu-se diferença estatisticamente significante apenas no domínio nível de independência, com escore mais elevado entre os sujeitos que não tiveram a experiência de hospitalização devido ao agravo (Tabela 3).

Finalmente, a variável sobre alterações físico-orgânicas, associadas ao uso da HAART, apresentou diferença estatística significante nos domínios físico e psicológico, com escores mais elevados entre as PVHA que não as perceberam. Observou-se, também, valor de p próximo a 0,05 na dimensão do nível de independência (Tabela 3).

Discussão

Considerando o cotejamento com outras pesquisas, observaram-se resultados distintos do presente trabalho para as variáveis: faixa etária, estando os melhores entre os mais jovens (20 a 39 anos)( 1515. Ferreira BE, Oliveira IM, Peniago AMM. Qualidade de vida de portadores de HIV/AIDS e sua relação com linfócitos CD4+, carga viral e tempo de diagnóstico. Rev Bras Epidemiol. 2012;15(1):75-84. - 1616. Gaspar J, Reis RK, Pereira FMV, Neves LAS, Castrighini CC, Gir E. Qualidade de vida de mulheres vivendo com o HIV/Aids de um município do interior paulista. Rev Esc Enferm USP. 2011;45(1):230-6. ), tempo de diagnóstico, com melhor escore no domínio ERCP entre 2 e 5 anos( 1515. Ferreira BE, Oliveira IM, Peniago AMM. Qualidade de vida de portadores de HIV/AIDS e sua relação com linfócitos CD4+, carga viral e tempo de diagnóstico. Rev Bras Epidemiol. 2012;15(1):75-84. ) e contagem de CD4+, com maior escore no domínio físico( 1717. Santos ECM, França Júnior I, Lopes F. Qualidade de vida de pessoas vivendo com HIV/Aids em São Paulo. Rev Saúde Pública. 2007;41 suppl 2:64-71. ) e no nível de independência( 1515. Ferreira BE, Oliveira IM, Peniago AMM. Qualidade de vida de portadores de HIV/AIDS e sua relação com linfócitos CD4+, carga viral e tempo de diagnóstico. Rev Bras Epidemiol. 2012;15(1):75-84. ) para valores celulares mais elevados.

Quanto à influência do uso da HAART, houve resultado distinto de pesquisas anteriores, o que pode advir de aspectos eventualmente referentes à adesão ao tratamento, não analisada neste estudo, ou de alterações orgânicas pelos fármacos, apontadas pela maioria dos sujeitos nesta pesquisa. Em outras investigações na área encontrou-se pior QV no domínio nível de independência entre os usuários desses fármacos( 1515. Ferreira BE, Oliveira IM, Peniago AMM. Qualidade de vida de portadores de HIV/AIDS e sua relação com linfócitos CD4+, carga viral e tempo de diagnóstico. Rev Bras Epidemiol. 2012;15(1):75-84. ). Em outras, identificou-se influência negativa dos antirretrovirais no domínio físico e social entre PVHA no primeiro ano de utilização, com melhor avaliação nos domínios ERCP e meio ambiente no segundo ano( 1818. Tran BX. Quality of life outcomes of antiretroviral treatment for HIV/Aids patients in Vietnam. Plos ONE [Internet]. 2012 [acesso 03 jun 2013];7(7):e41062. Disponível em: http://connection.ebscohost.com/c/articles/79785299/quality-life-outcomes-antiretroviral-treatment-hiv-aids-patients-vietnam
http://connection.ebscohost.com/c/articl...
). E estudo adicional constatou o uso de HAART como preditor de melhor QV. Isso, sobretudo, quando havia permanência de regime terapêutico e poucas reações adversas( 1919. Campos LN, César CC, Guimarães MDC. Quality of life among HIV-infected patients in Brazil after initiation of treatment. Clinics. 2009;64(9):867-75. ).

Em relação à influência da carga viral sobre a QV, os achados deste estudo se assemelham a outros na literatura( 1515. Ferreira BE, Oliveira IM, Peniago AMM. Qualidade de vida de portadores de HIV/AIDS e sua relação com linfócitos CD4+, carga viral e tempo de diagnóstico. Rev Bras Epidemiol. 2012;15(1):75-84. ), em que tal variável não gerou diferença estatisticamente significante em nenhum dos domínios de análise. Entretanto, tendo em vista que menores valores de CD4 e maiores de carga viral estão associados a sintomas da doença, é possível que existam suas expressões, mesmo indiretamente, em outras facetas da QV( 1515. Ferreira BE, Oliveira IM, Peniago AMM. Qualidade de vida de portadores de HIV/AIDS e sua relação com linfócitos CD4+, carga viral e tempo de diagnóstico. Rev Bras Epidemiol. 2012;15(1):75-84. ). No caso desta pesquisa, isso pode ocorrer com a variável condição clínica, com diferença estatística em cinco dos seis domínios.

Para a variável sexo, os resultados são semelhantes aos de outros estudos( 1313. Zimpel R, Fleck MPA. Qualidade de vida em pacientes com HIV/Aids: conceitos gerais e resultados de um estudo brasileiro. In: Fleck MPA, editor. A avaliação da qualidade de vida: guia para profissionais da saúde. Porto Alegre (RS): Artmed; 2008. p. 157-67. , 1515. Ferreira BE, Oliveira IM, Peniago AMM. Qualidade de vida de portadores de HIV/AIDS e sua relação com linfócitos CD4+, carga viral e tempo de diagnóstico. Rev Bras Epidemiol. 2012;15(1):75-84.

16. Gaspar J, Reis RK, Pereira FMV, Neves LAS, Castrighini CC, Gir E. Qualidade de vida de mulheres vivendo com o HIV/Aids de um município do interior paulista. Rev Esc Enferm USP. 2011;45(1):230-6.
- 1717. Santos ECM, França Júnior I, Lopes F. Qualidade de vida de pessoas vivendo com HIV/Aids em São Paulo. Rev Saúde Pública. 2007;41 suppl 2:64-71. ), com maiores escores nos domínios da QV entre homens. Nesse sentido, apesar de alguns autores questionarem se existiriam, de fato, diferenças na percepção da QV entre homens e mulheres, ou somente um modo diverso no estilo das respostas, sabe-se que a realidade socioeconômica e cultural, em geral, se mostra desfavorável ao gênero feminino( 1313. Zimpel R, Fleck MPA. Qualidade de vida em pacientes com HIV/Aids: conceitos gerais e resultados de um estudo brasileiro. In: Fleck MPA, editor. A avaliação da qualidade de vida: guia para profissionais da saúde. Porto Alegre (RS): Artmed; 2008. p. 157-67. ). Assim, seria necessário um olhar diferenciado para as mulheres que vivem com HIV/AIDS, considerando as suas vulnerabilidades, que se referem às importantes diferenças nos aspectos culturais, sociais e econômicos, as quais geram às mesmas oportunidades desiguais na proteção, promoção e manutenção à saúde( 1616. Gaspar J, Reis RK, Pereira FMV, Neves LAS, Castrighini CC, Gir E. Qualidade de vida de mulheres vivendo com o HIV/Aids de um município do interior paulista. Rev Esc Enferm USP. 2011;45(1):230-6. ).

Tendo em vista os resultados quanto à influência do nível de instrução para a QV, houve padrão semelhante a outras pesquisas( 1717. Santos ECM, França Júnior I, Lopes F. Qualidade de vida de pessoas vivendo com HIV/Aids em São Paulo. Rev Saúde Pública. 2007;41 suppl 2:64-71. , 2020. Reis RK, Santos CB, Dantas RAS, Gir E. Qualidade de vida, aspectos sociodemográficos e de sexualidade de pessoas vivendo com HIV/Aids. Texto Contexto Enferm. 2011;20(3):565-75. ), com maiores escores na percepção dos sujeitos para estratos mais elevados de escolaridade. Esse aspecto aponta o impacto de elementos sociais, como o padrão educacional, para a QV. Desse modo, concebe-se que o nível educacional poderia influenciar nas habilidades de autogerenciamento diante da doença e suas demandas diversas( 1313. Zimpel R, Fleck MPA. Qualidade de vida em pacientes com HIV/Aids: conceitos gerais e resultados de um estudo brasileiro. In: Fleck MPA, editor. A avaliação da qualidade de vida: guia para profissionais da saúde. Porto Alegre (RS): Artmed; 2008. p. 157-67. ). Pensa-se haver maior facilidade no acesso e na compreensão das informações sobre temáticas pertinentes ao agravo.

No que concerne à inserção das PVHA no mundo do trabalho, os achados desta investigação se alinham e ampliam as perspectivas de outros estudos( 1616. Gaspar J, Reis RK, Pereira FMV, Neves LAS, Castrighini CC, Gir E. Qualidade de vida de mulheres vivendo com o HIV/Aids de um município do interior paulista. Rev Esc Enferm USP. 2011;45(1):230-6. , 2020. Reis RK, Santos CB, Dantas RAS, Gir E. Qualidade de vida, aspectos sociodemográficos e de sexualidade de pessoas vivendo com HIV/Aids. Texto Contexto Enferm. 2011;20(3):565-75. ), pois se constatou diferenças estatísticas significantes não em parcela, mas em todos os seis domínios da QV. Compreende-se que a saúde física e mental podem beneficiar-se da atividade laborativa em um processo interacional e de reforço mútuo( 77. Rueda S, Raboud J, Mustard C, Bayoumi A, Lavis JN, Rourke SB. Employment status is associated with both physical and mental health quality of life in people living with HIV. AIDS Care. 2011; 23(4):435-43. ). Isso, pois o trabalho pode ser fonte de sofrimento e estresse, mas, também, de prazer, autorrealização e formação de identidade( 2121. Ferreira RCM, Figueiredo MAC, Souza LB. Trabalho, HIV/Aids: enfrentamento e dificuldades relatadas por mulheres. Psicol Estud. 2011;16(2):259-67. ).

No caso das PVHA, o trabalho permite, além do acesso às condições materiais de existência, o desvio do pensamento das questões, muitas vezes, negativas da doença, gerando sentimento de utilidade e produtividade. Além disso, teria o potencial de ampliação dos contatos sociais, embora, não raro, se observem algumas barreiras impostas a esses sujeitos para a empregabilidade( 2121. Ferreira RCM, Figueiredo MAC, Souza LB. Trabalho, HIV/Aids: enfrentamento e dificuldades relatadas por mulheres. Psicol Estud. 2011;16(2):259-67. ).

Entretanto, pode ser fator adicional limitador ao acesso ao trabalho e melhores posições nesse campo o baixo nível de instrução, que foi predominante entre os participantes do estudo, apontando a importância de políticas específicas. E, embora o desenho desta pesquisa não permita afirmativa conclusiva a respeito, poderia ocorrer, também, possível influência da categoria gênero sobre essa dimensão, dado o padrão avaliativo inferior da QV observado entre as mulheres.

Quanto à variável renda pessoal, os resultados são similares aos de pesquisas efetivadas no Brasil, com a distinção de que nas mesmas não houve diferença significante no domínio ERCP, enquanto no domínio relações sociais essa diferença foi notada( 1616. Gaspar J, Reis RK, Pereira FMV, Neves LAS, Castrighini CC, Gir E. Qualidade de vida de mulheres vivendo com o HIV/Aids de um município do interior paulista. Rev Esc Enferm USP. 2011;45(1):230-6. - 1717. Santos ECM, França Júnior I, Lopes F. Qualidade de vida de pessoas vivendo com HIV/Aids em São Paulo. Rev Saúde Pública. 2007;41 suppl 2:64-71. ). Esses achados apontam, também, como ocorrido na variável trabalho, para o impacto dos níveis socioeconômicos para a QV desses sujeitos, compreendidos em conjunto com a escolaridade, pois são indicadores envolvidos na caracterização e implicações da tendência de pauperização da epidemia no país( 2222. Souza CC, Mata LRF, Azavedo C, Gomes CRG, Cruz GECP, Toffano SEM. Interiorização do HIV/Aids: um estudo epidemiológico. Rev Bras Ciênc Saúde. 2013;11(35):25-30. ).

Considerando a condição clínica das PVHA, há registros na literatura de diferenças na avaliação da QV entre assintomáticos e sintomáticos, com melhores escores para os primeiros, especialmente, no domínio físico( 1717. Santos ECM, França Júnior I, Lopes F. Qualidade de vida de pessoas vivendo com HIV/Aids em São Paulo. Rev Saúde Pública. 2007;41 suppl 2:64-71. ). No presente estudo, entretanto, como em outra pesquisa( 1313. Zimpel R, Fleck MPA. Qualidade de vida em pacientes com HIV/Aids: conceitos gerais e resultados de um estudo brasileiro. In: Fleck MPA, editor. A avaliação da qualidade de vida: guia para profissionais da saúde. Porto Alegre (RS): Artmed; 2008. p. 157-67. ), houve influência dessa variável em diversos outros domínios, além da dimensão física. Esse resultado reforça a perspectiva de relação potencial entre os aspectos biológicos e os de natureza psicossocial. A condição clínica percebida como sintomática, possibilitou avaliações mais negativas sobre os domínios físico e nível de independência, mas, também, no domínio psicológico e das relações sociais.

Em relação à variável sentir-se doente, pensou-se, inicialmente, que, no conjunto dos dados do estudo, pudesse ter redundância com a condição clínica. Entretanto, acredita-se que isso não ocorre, ao menos, de maneira completa, pois, nessa última, o domínio ERCP não foi implicado. Desse modo, pode-se pensar no reforço a estudos que evidenciem a incorporação da subjetividade na avaliação da QV, tendo em vista suas contribuições no contexto das ações e intervenções em saúde( 11. Fleck MPA. Problemas conceituais em qualidade de vida. In: Fleck MPA, editor. A avaliação da qualidade de vida: guia para profissionais da saúde. Porto Alegre (RS): Artmed; 2008. p. 19-28. ).

Os resultados referentes à influência das hospitalizações pelo agravo sobre o domínio de nível de independência da QV podem estar relacionados ao fato de que a internação tenha ocorrido para tratamento de alguma condição clínica, a qual, provavelmente, gerou sequela e/ou passou a interferir, ainda que temporariamente, nas atividades de vida diária. Pode, outrossim, ter gerado a necessidade de ingestão de maior número de medicações ou a redução da percepção de condições físicas compatíveis com o trabalho( 2323. Ministério da Saúde (BR). Programa Nacional de DST e Aids. Recomendações para Terapia Antirretroviral em Adultos Infectados pelo HIV: 2013 - versão preliminar. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2013. ). Além disso, a maioria dos sujeitos da pesquisa encontra-se em uso de HAART e grande parte possui valor igual ou superior a 500CD4/mm3, reduzindo as chances de experiência e consequências negativas das internações.

No que diz respeito aos achados da influência das alterações orgânicas pela HAART sobre os domínios físico e psicológico da QV, pensa-se que ocorreram pelas reações adversas ocasionadas pelos medicamentos e pela dependência de tratamento contínuo no cotidiano. Assim, reforçam-se as recomendações sobre a importância da valorização desses aspectos no acompanhamento de clientes soropositivos ao HIV, haja vista seu impacto sobre a QV e, também, na adesão ao tratamento e no estado de saúde( 2323. Ministério da Saúde (BR). Programa Nacional de DST e Aids. Recomendações para Terapia Antirretroviral em Adultos Infectados pelo HIV: 2013 - versão preliminar. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2013. ).

Considerando os desdobramentos quanto às facetas programáticas imanentes ao conjunto de achados sobre QV de PVHA, reitera-se que importante componente do controle da epidemia, no país, diz respeito à garantia da oferta especializada de assistência em saúde a esse grupo. Entretanto, o acesso aos programas, serviços e intervenções em saúde diante do agravo ainda ocorre de maneira desigual, resultando na configuração de diferentes perfis de vulnerabilidade( 66. Oliveira IBN. Acesso universal? Obstáculos ao acesso, continuidade do uso e gênero em um serviço especializado em HIV/Aids em Salvador, Bahia, Brasil. Cad. Saúde Pública. 2009;25 suppl 2:259-68. ). Tal panorama, por sua vez, pode ser minorado ao se ter em perspectiva princípios orientadores para as políticas públicas e ações profissionais em saúde e enfermagem, baseados na lógica operativa da QV, a qual, neste estudo, aponta condicionantes sociais em consonância com os de saúde ora explorados.

Pensa-se que a enfermagem tem papel importante na avaliação e promoção da melhoria da QV das PVHA. Isso, pois possui entre seus metaparadigmas a pessoa, a saúde e o ambiente, em convergência com as concepções teóricas em torno do fenômeno multidimensional da QV.

Conclusões

Este estudo permitiu constatar a ocorrência de interferência das seguintes condições sobre os diversos domínios mensurados da QV: sexo, escolaridade, trabalho, renda pessoal, condição clínica, percepção sobre estar ou não doente, internações por AIDS e alterações orgânicas associados à HAART.

Dentre os aspectos com implicação para a QV, mereceu especial destaque o papel exercido pela inserção no mercado de trabalho e a percepção das PVHA sobre estarem ou não doentes. Tal consideração se deve ao fato de que essas condições impactaram significativamente em todos os seis domínios de avaliação da QV, ajustados a esse grupo pela OMS. Sinaliza-se, então, para a relevância dessas questões nas abordagens terapêuticas individuais ou coletivas ante a convivência com o agravo, haja vista os desafios relacionados ao mundo do trabalho pelos indivíduos soropositivos, bem como a necessidade da promoção de uma escuta ativa quanto à visão dos clientes sobre sua própria saúde.

A substantiva elevação no tempo de vida das pessoas que vivem com o agravo, observado na atualidade, trouxe à baila a necessidade de inclusão de outros aspectos além daqueles eminentemente biomédicos da relação dos sujeitos com o HIV/AIDS em seu cotidiano. Faz-se mister, assim, a assunção de perspectivas teóricas e atitudinais, incluindo amplamente as múltiplas facetas que configuram a vida com o agravo, sendo a QV um constructo com importante potencial de contribuição para a prática de cuidados em saúde e enfermagem a esse grupo, bem como para o delineamento de políticas públicas na área.

Finalmente, cabe apontar como limitações ao estudo: o uso da escala tipo Likert com autopreenchimento pelos sujeitos e a inclusão de participantes com ou sem uso de HAART, haja vista as possíveis consequências dessa na vida dos mesmos.

Agradecimentos

Ao professor e estatístico Cléber Nascimento do Carmo, pelo auxílio na realização dos cálculos de amostragem da pesquisa.

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    Artigo extraído da tese de doutorado "Representações Sociais do HIV/Aids e da Qualidade de Vida: um estudo entre pessoas que vivem com o agravo em contexto de interiorização", apresentada ao Instituto de Psicologia, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, RJ, Brasil

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Aug 2014

Histórico

  • Recebido
    19 Jun 2013
  • Aceito
    20 Maio 2014
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