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Sintomas psicopatológicos e situação laboral da enfermagem do Sudeste brasileiro no contexto da COVID-19

Resumo

Objetivo

avaliar a relação entre sintomas psicopatológicos e a situação laboral de profissionais de enfermagem da Região Sudeste do Brasil, no contexto da pandemia da COVID-19.

Método

estudo observacional e transversal com coleta de dados virtual e por meio de snowball nos meses de abril a julho de 2020. Aplicou-se um questionário contendo dados sociodemográficos, laborais e a escala de avaliação de sintomas psicopatológicos (psicoticismo, obsessividade/compulsividade, somatização e ansiedade). Foram utilizadas estatísticas descritivas e inferenciais para a análise dos dados.

Resultados

entre os 532 participantes, verificou-se relação entre carga horária de trabalho semanal e psicoticismo. Todos os domínios da escala associaram-se ao constrangimento e/ou violência no percurso de trabalho e recebimento de suporte psicológico/emocional da instituição onde o indivíduo trabalha/estuda.

Conclusão

a faixa etária, carga horária elevada, violência vivenciada e falta de suporte psicológico durante a pandemia associaram-se com o aumento dos sintomas psicopatológicos entre os profissionais de enfermagem. Sugere-se a criação de diretrizes institucionais voltadas ao acolhimento e acompanhamento dessas demandas.

Descritores:
Profissionais de Enfermagem; COVID-19; Saúde Mental; Psicopatologia; Transtornos Mentais; Pandemias

Abstract

Objective

to evaluate the relationship between psychopathological symptoms and the work situation of nursing professionals in the Southeast Region, Brazil, in the context of the COVID-19 pandemic.

Method

an observational and cross-sectional study with virtual and snowball data collection from April to July 2020. A questionnaire containing socio-demographic and labor data and the psychopathological symptoms assessment scale (psychoticism, obsessiveness/compulsivity, somatization, and anxiety) were applied. Descriptive and inferential statistics were used to analyze the data.

Results

among the 532 participants, there was a relationship between weekly workload and psychoticism. All domains of the scale were associated with embarrassment and/or violence in the course of work and receiving psychological/emotional support from the institution where the individual works/studies.

Conclusion

the age group, heavy workload, experienced violence and lack of psychological support during the pandemic were associated with increased psychopathological symptoms among nursing professionals. It is suggested the creation of institutional guidelines aimed at the reception and follow-up of these demands.

Descriptors:
Nurse Practitioners; COVID-19; Mental Health; Psychopathology; Mental Disorders; Pandemics

Resumen

Objetivo

evaluar la relación entre síntomas psicopatológicos y la situación laboral de profesionales de enfermería de la Región Sureste de Brasil, en el contexto de la pandemia de la COVID-19.

Método

estudio observacional y transversal con recolección de datos virtual y por medio de snowball en los meses de abril a julio de 2020. Se aplicó un cuestionario que contenía datos sociodemográficos, laborales y la escala de evaluación de síntomas psicopatológicos (psicoticismo, obsesión/compulsión, somatización y ansiedad). Fueron utilizadas estadísticas descriptivas y de inferencia para el análisis de los datos.

Resultados

entre los 532 participantes, se verificó una relación entre la carga horaria de trabajo semanal y el psicoticismo. Todos los dominios de la escala se asociaron con incomodidad y/o violencia, en el transcurso del trabajo y el recibimiento de soporte psicológico/emocional de la institución, en donde el individuo trabaja/estudia.

Conclusión

el intervalo etario, la carga horaria elevada, la violencia experimentada y la falta de soporte psicológico, durante la pandemia se asociaron con el aumento de los síntomas psicopatológicos entre los profesionales de enfermería. Se sugiere la creación de directrices institucionales dirigidas al acogimiento y acompañamiento de esas demandas.

Descriptores:
Enfermeras Practicantes; COVID-19; Salud Mental; Psicopatología; Trastornos Mentales; Pandemias

Destaques:

(1) Resultados significativos entre sintomas psicopatológicos e fatores laborais.

(2) Carga horária de trabalho da equipe de Enfermagem relacionou-se com psicoticismo.

(3) Todos os sintomas mentais investigados relacionaram-se com idade e constrangimento.

(4) Sexo associou-se com psicoticismo e obsessividade/compulsividade.

Introdução

A rápida transmissão do vírus SARS-COV-2 a partir de sua disseminação nos grandes centros urbanos, as altas taxas de ataque (proporção entre o total de casos e o total de expostos) e a mortalidade por COVID-19 nas diversas regiões do Brasil11. Buss LF, Prete CA, Abrahim CM, Mendrone A, Salomon T, Almeida-Neto C, et al. Three-quarters attack rate of SARS-CoV-2 in the Brazilian Amazon during a largely unmitigated epidemic. Science. 2021;371:e6526:288-92. doi: https://doi.org/10.1126/science.abe9728
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-22. Cândido DS, Claro IM, De Jesus JG, Souza WM, Moreira FR, Dellicour S, et al. Evolution and epidemic spread of SARS-CoV-2 in Brazil. Science. 2020;369:e6508:1255-60. doi: https://doi.org/10.1126/science.abd2161
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exigiram a adaptação dos sistemas públicos e privados, bem como dos recursos humanos em saúde, para atender às demandas emergenciais33. Croda J, Oliveira WK, Frutuoso RL, Mandetta LH, Baia-da-Silva DC, Brito-Sousa JD, et al. COVID-19 in Brazil: Advantages of a socialized unified health system and preparation contain cases. Rev Soc Bras Med Trop. 2020;53:e20200167. doi: https://doi.org/10.1590/0037-8682-0167-2020
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. No Estado de São Paulo foram confirmados os primeiros casos de COVID-19 em fevereiro de 202011. Buss LF, Prete CA, Abrahim CM, Mendrone A, Salomon T, Almeida-Neto C, et al. Three-quarters attack rate of SARS-CoV-2 in the Brazilian Amazon during a largely unmitigated epidemic. Science. 2021;371:e6526:288-92. doi: https://doi.org/10.1126/science.abe9728
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-22. Cândido DS, Claro IM, De Jesus JG, Souza WM, Moreira FR, Dellicour S, et al. Evolution and epidemic spread of SARS-CoV-2 in Brazil. Science. 2020;369:e6508:1255-60. doi: https://doi.org/10.1126/science.abd2161
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. Desse modo, a partir de então, estabeleceu-se uma nova rotina de trabalho para os profissionais de saúde.

Evidência aponta que profissionais de saúde nomeadamente enfermeiros(as), em atividades laborais na linha de frente de atendimento às pessoas com COVID-19, expunham-se a um alto risco de infecção pelo vírus e apresentaram graus severos de sofrimento psíquico44. Moreira WC, Sousa AR, Nóbrega MPSS. Mental illness in the general population and health professionals during COVID-19: a scoping review. Texto Contexto Enferm. 2020;29:e20200215. doi: https://doi.org/10.1590/1980-265X-TCE-2020-0215
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. No Brasil, mapeamento sobre o índice desse risco no início da pandemia mostrou a alarmante cifra de 97 a 100% de infecção55. Barroso BIDL, Souza MBCAD, Bregalda MM, Lancman S, Costa VBBD. Worker health in COVID-19 times: reflections on health, safety, and occupational therapy. Cad Bras Ter Ocup. 2020;28:1093-102. doi: https://doi.org/10.4322/2526-8910.ctoARF2091
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. Do ponto de vista laboral, o país responde por expressivo total de óbitos entre os profissionais de Enfermagem, sendo a Região Sudeste a de maior número (n=838, em julho de 2021) e o Estado de São Paulo, o mais letal66. Conselho Federal de Enfermagem (BR). Profissionais infectados com COVID-19 informado pelos enfermeiros responsáveis técnicos/coordenadores. [Internet]. 2020 [cited 2021 Sep 6]. Available from: http://observatoriodaenfermagem.cofen.gov.br/
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.

A nova realidade de trabalho imposta, provavelmente acentuou, ainda mais, os significativos riscos de adoecimento físico e mental já inerentes ao desempenho do trabalho em Enfermagem na realidade nacional77. Sampaio F, Sequeira C, Teixeira L. Nurses' Mental Health During the Covid-19 Outbreak. J Occup Environ Med. 2020;62:e10.783-7. doi: https://doi.org/10.1097/JOM.0000000000001987
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-88. Góes FGB, Silva ACSSD, Santos ASTD, Pereira-Ávila FMV, Silva LJD, Silva LFD, et al. Challenges faced by pediatric nursing workers in the face of the COVID-19 pandemic. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2020;28:e3367. doi: https://doi.org/10.1590/1518-8345.4550.3367
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. Em relação à saúde mental, constatou-se que o trabalho no contexto da COVID-19 tem o potencial para afetar a atenção, a compreensão e a capacidade de tomada de decisão dos trabalhadores da saúde e gerar impactos duradouros em seu bem-estar geral99. Kang L, Li Y, Hu S, Chen M, Yang C, Yang BX, et al. The mental health of medical workers in Wuhan, China dealing with the 2019 novel coronavirus. Lancet Psychiatry. 2020;7:7-14. doi: https://doi.org/10.1016/S2215-0366(20)30047-X
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. Especificamente, quadros de depressão, ansiedade e estresse têm aumentado, não apenas na população em geral, mas especialmente entre os profissionais da saúde44. Moreira WC, Sousa AR, Nóbrega MPSS. Mental illness in the general population and health professionals during COVID-19: a scoping review. Texto Contexto Enferm. 2020;29:e20200215. doi: https://doi.org/10.1590/1980-265X-TCE-2020-0215
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.

Medidas para mitigar os impactos do sofrimento mental em decorrência da pandemia da COVID-19 não podem ser desprezadas1010. Honein MA, Christie A, Rose DA, Brooks JT, Meaney-Delman D, Cohn A, et al. Summary of guidance for public health strategies to address high levels of community transmission of SARS-CoV-2 and related deaths, December 2020. Morb Mortal Wkly Rep. 2020;69(49):e491860. doi: http:/doi.org/10.15585/mmwr.mm6949e2
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-1111. Xiao C. A novel approach of consultation on 2019 novel coronavirus (COVID-19)-related psychological and mental problems: Structured letter therapy. Psychiatry Investig. 2020;17(2):175-6. doi: http://doi.org/10.30773/pi.2020.0047
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, visto que experiências anteriores demonstraram que estes podem durar mais tempo e ter maior prevalência que a própria epidemia tendo, portanto, desdobramentos psicossociais incalculáveis1212. Ornell F, Schuch JB, Sordi AO, Henrique F, Kesseler P. Pandemic fear and COVID-19: mental health burden and strategies. Braz J Psychiatry. 2020;42(3):232-5. doi: http://doi.org/10.1590/1516-4446-2020-0008
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-1313. Shigemura J, Ursano RJ, Morganstein JC, Kurosawa M, Benedek DM. Public responses to the novel 2019 coronavirus (2019-nCoV) in Japan: Mental health consequences and target populations. Psychiatry Clin Neurosci. 2020;74(4):281. doi: http://doi.org/10.1111/pcn.12988
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Ante o exposto e à lacuna referente ao rastreamento de sintomas psicopatológicos apresentados por profissionais de enfermagem que atuam na região brasileira mais populosa e de maior densidade tecnológica, investigar aspectos da saúde mental pode ser útil para gerar métricas relativas aos transtornos mentais, que surgiram no contexto de trabalho da maior força de trabalhadores em saúde durante a pandemia da COVID-19. Desse modo, essa pesquisa teve como objetivo avaliar a relação entre sintomas psicopatológicos e a situação laboral de profissionais de enfermagem da região Sudeste do Brasil no contexto da pandemia COVID-19.

Método

Delineamento do estudo

Estudo observacional e transversal, norteado pela ferramenta STROBE (Strengthening the Reporting of Observational Studies in Epidemiology)1414. Cheng A, Kessler D, Mackinnon R, Chang TP, Nadkarni VM, Hunt EA, et al. Reporting Guidelines for Health Care Simulation Research. Simul Healthc J Soc Simul Healthc. 2016;11(4):238-48. https://doi.org/10.1097/SIH.0000000000000150
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.

Amostra

Amostra não probabilística, por meio da técnica snowball, composta de profissionais de enfermagem (enfermeiros, técnicos, auxiliares de enfermagem e obstetrizes) da Região Sudeste do Brasil que atendiam aos seguintes critérios de elegibilidade: exercer atividades em qualquer nível de atenção à saúde, independentemente da atuação (assistência direta e/ou administrativa/gerencial) ou que atuavam no ensino e pesquisa durante a pandemia da COVID-19, residentes da Região Sudeste do Brasil. Optou-se por amostra heterogênea na perspectiva de mostrar a predisposição à traumatização secundária dos profissionais de enfermagem em função da identificação com o sofrimento dos pares em atuação na linha de frente1212. Ornell F, Schuch JB, Sordi AO, Henrique F, Kesseler P. Pandemic fear and COVID-19: mental health burden and strategies. Braz J Psychiatry. 2020;42(3):232-5. doi: http://doi.org/10.1590/1516-4446-2020-0008
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e, também, porque em março de 2020 foi instituída a Ação Estratégica “O Brasil conta comigo1515. Ministério da Saúde (BR). Portaria 580 de 27 de março de 2020. Dispõe sobre a Ação Estratégica "O Brasil Conta Comigo - Residentes na área de Saúde", para o enfrentamento à pandemia do coronavírus (COVID-19). [Internet]. Brasília, Diário Oficial da União, 30 mar 2020 [cited 2021 Oct 10]. Available from: https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/portaria-n-580-de-27-de-marco-de-2020-250191376
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e com ela muitos trabalhadores de enfermagem do ensino estiveram supervisionando a assistência, no sentido de ampliar a cobertura na assistência à população em todos os níveis de atenção.

Coleta de dados

Os dados foram coletados, virtualmente, no período de abril a julho de 2020 por meio de Questionários Google®, disponibilizado em redes sociais através de um link com convite para a participação na pesquisa, contendo: a) Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE); b) informações sociodemográficas e laborais (idade, sexo, raça, ocupação, estado civil, nacionalidade, estado de residência, renda, atuação profissional, natureza da instituição de trabalho, tempo de formação, tempo de atuação, situação de trabalho, atuação como profissional de enfermagem no momento, carga horária semanal, atuação direta na assistência, serviço de atuação, nível de satisfação no desenvolvimento das atividades de trabalho, sofrimento devido a constrangimentos e/ou violências durante o percurso do trabalho desde o início da pandemia, natureza dos casos de COVID-19 no local de trabalho/estudo, natureza dos pacientes em relação à COVID-19 no local de trabalho/estudo, recebimento de suporte/apoio psicológico/emocional da instituição de trabalho/estudo no contexto da COVID-19 e tipo de suporte recebido); c) Escala de Avaliação de Sintomas-40 (EAS-40), derivada da Symptom Checklist-90-R (SCL-90-R)1616. Derogatis LR. Symptom Checklist-90-R (SCL-90-R) Administration, Scoring, and Procedures Manual. Mineapolis: National Computer Systems; 1994. que foi adaptada e validada para o Brasil em 20011717. Laloni DT. Escala de Avaliação de Sintomas-90-R SCL-90-R: adaptação, precisão e validade. [Dissertation]. Campinas: Pontifícia Universidade Católica de Campinas; 2001 [cited 2021 Oct 10]. Available from: http://tede.bibliotecadigital.puc-campinas.edu.br:8080/jspui/handle/tede/389
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. Neste estudo, utilizou-se a versão de 40 itens (EAS-40); trata-se de uma escala de rastreamento por autorrelato de sintomas psicopatológicos com base nos últimos quatorze dias. Foi validada para população não clínica no Brasil e é constituída por quatro subescalas, com 10 itens em cada uma: 1. Psicoticismo: avalia psicoses, depressão, sintomas de hostilidade e ideias paranoides; 2. Obsessividade/Compulsividade: avalia sintomas de pensamentos e ações repetidos, acompanhados de desconforto nas relações interpessoais; 3. Somatização: compreende sintomas comuns aos transtornos somáticos e somatoformes e 4. Ansiedade: compreende sintomas de ansiedade generalizada, ansiedade fóbica relacionada com objetos ou situações. A EAS-40 é autoaplicável e o padrão de resposta consiste em escala do tipo Likert com três níveis de intensidade: 0 = nenhum sintoma; 1 = pouco sintoma e 2 = muito sintoma. O cálculo do escore bruto é feito somando-se os valores de 0 a 2 para cada item respondido em cada uma das dimensões e dividido pelo número de itens de cada dimensão. Caso o entrevistado não responda a algum item da escala, a divisão é feita sobre o número de itens respondidos1818. Yoshida EMP, Silva FRCS. Escala de Avaliação de Sintomas-40 (EAS-40): Validade e precisão em amostra não clínica. Psicol Esc Educ. [Internet]. 2007 [cited 2021 Oct 10];11(1):89-99. Available from: https://www.scielo.br/j/pee/a/kSJQKP9FYpmgB6zjHMCf5fP/?format=pdf⟨=pt
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Tratamento e análise dos dados

As informações foram registradas em planilhas do Excel e após dupla checagem exportadas para o programa estatístico SPSS, versão 22, para processamento das análises estatísticas. A caracterização da amostra foi realizada por meio de estatísticas descritivas, utilizando-se medidas de tendência central (média, moda, medianas) e medidas de dispersão (mínimos, máximos e desvios padrão). Para verificar a normalidade dos dados, utilizou-se o teste Kolmogorov-Smirnov; para análise das variáveis binárias, o teste U de Mann Whitney e para a análise de variáveis múltiplas, o teste de Kruskal-Wallis (KW). O intervalo de confiança foi de 95% e o nível de significância adotado foi de 5% para todos os testes (p ≤ 0,05).

Aspectos éticos

A pesquisa atendeu às normas da Resolução nº:466/2012, do Conselho Nacional de Saúde, aprovada pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (parecer n.º 3.954.557 e CAAE: 30359220.4.0000.0008 de 2020). O TCLE foi inserido no Questionários Google® de modo que o participante pudesse aceitar ou recusar/interromper a participação antes de ter acesso às perguntas. O participante prosseguia na etapa referente aos instrumentos de coleta quando selecionava a opção aceite no TCLE e inseria e-mail para envio de cópia. Foi dada a opção de direcionamento relativa à impressão do TCLE caso o participante desejasse. Todos os participantes aceitaram o TCLE antes de responder aos instrumentos de coleta de dados.

Resultados

Participaram do estudo 532 profissionais de enfermagem com idade entre 20 e 87 anos (média de idade de 37 anos, com desvio-padrão de ±10,72). Destes, 474 (89,1%) eram do sexo feminino, a maioria vivia com companheiro, sendo 210 (39,5%) casados e 70 (13,2%) em união estável. Os solteiros totalizaram 211 (39,7%), 39 (7,3%) divorciados ou separados e 2 viúvos (0,4%). A religião católica foi predominante com 186 (35,7%) dos participantes. Na Tabela 1, são apresentadas a caracterização sociodemográfica, clínica e do contexto pandêmico, referentes aos profissionais de enfermagem que participaram do estudo.

Tabela 1
Perfil dos profissionais de enfermagem (n=532) da Região Sudeste. Brasil, 2020

Em relação à caracterização do perfil profissional dos participantes do estudo, a média de tempo de formação foi de 16,31 anos (desvio-padrão de ±87,25) e a média do tempo de atuação foi de 11,59 (desvio padrão de ±9,35). No que diz respeito à atividade laboral, 56% são enfermeiros, seguido de técnicos de enfermagem (14,7%). A maioria, 54,6%, trabalha em instituições públicas e recebe entre 1 a 3 salários mínimos. Foi observado o tempo médio de formação de 16,31 anos e o tempo médio de atuação de 11,59 anos.

A maioria dos participantes enquadrou-se na categoria de trabalhador formal com carga horária semanal de 40 horas (181-34%). Desses, 75,4% relataram não ter sofrido qualquer tipo de constrangimento e/ou violência no percurso de trabalho. Observou-se, naquele momento, que 338 (63,5%) estavam trabalhando na assistência direta (Tabela 2).

Tabela 2
Perfil laboral dos profissionais de enfermagem (n=532) da Região Sudeste. Brasil, 2020

A Tabela 3 apresenta os resultados referentes aos sintomas psicopatológicos de Psicoticismo e Obsessividade/Compulsividade avaliados pelos escores da SCL-40-R. Verificou-se associação significativa entre ambos os domínios e o perfil sócio laboral dos profissionais de enfermagem. Quanto ao Psicoticismo, a associação foi entre a faixa etária; o sofrimento de constrangimento e/ou violência no percurso de seu trabalho desde o início da pandemia (na Tabela 3, “Constrangimentos e/ou violências”); o recebimento de suporte psicológico/emocional da instituição em que trabalha/estuda no contexto da pandemia (“Suporte/apoio” na Tabela 3) e a carga horária de trabalho semanal. Quanto à Obsessividade/Compulsividade, encontrou-se associação entre o sofrimento de constrangimento e/ou violência no percurso do trabalho desde o início da pandemia e o recebimento de suporte psicológico/emocional da instituição em que trabalha/estuda no contexto da pandemia de COVID-19.

Tabela 3
Relação entre sintomas de psicoticismo e obsessividade/compulsividade e situação laboral dos profissionais de enfermagem (n=532) da Região Sudeste. Brasil, 2020

A Tabela 4 apresenta os resultados referentes aos sintomas psicopatológicos de Somatização e Ansiedade avaliados pelos domínios da EAS-40 e o perfil laboral dos profissionais de enfermagem. A Somatização mostrou associação significativa com a faixa etária; o sofrimento de constrangimentos e/ou violência no percurso do trabalho desde o início da pandemia (“Constrangimentos e/ou violências” na Tabela 4) com o recebimento de suporte ou apoio psicológico/emocional pela instituição em que trabalha/estuda no contexto da COVID-19 (“Suporte/apoio” na Tabela 4). Em relação à Ansiedade, encontrou-se, também associação ao sofrimento de constrangimento e/ou violência no percurso do trabalho desde o início da pandemia e o recebimento de suporte psicológico/emocional pela instituição em que trabalha/estuda no contexto da COVID-19.

Tabela 4
Análise de comparação entre somatização/ansiedade e situação laboral de profissionais de enfermagem (n=532) da Região Sudeste. Brasil, 2020

Discussão

Quanto à relação entre sintomas psicopatológicos e a situação laboral encontrou-se associação entre a faixa etária e todos os domínios do instrumento EAS-40. Essa associação, no contexto da pandemia instaurada pela COVID-19, pode ser atribuída à relação entre a idade acima de 60 anos, considerada como maior risco de infecção; estudo retrospectivo e comparativo entre pacientes chineses jovens e pacientes de meia-idade/idosos com COVID-19 constatou que a população com mais idade é mais suscetível à doença e possui maior probabilidade de ser internada em cuidados intensivos e com maior taxa de mortalidade1919. Liu J, Liao X, Qian S, Yuan J, Wang F, Liu Y, et al. Community transmission of severe acute respiratory syndrome coronavirus 2, Shenzhen, China, 2020. Emerg Infect Dis. 2020;26(6):1320. doi: http://doi.org/10.3201/eid2606.200239
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. Nessa perspectiva, aponta-se o fator alarmante que envolve o profissional de enfermagem cujo trabalho com pacientes contaminados pelo vírus soma-se ao fato de estar mais propenso às comorbidades apresentadas pela doença, caso possua idade superior a 60 anos, o que contribui para agravar a situação.

Os resultados clínicos e o tempo de internação correlacionaram-se diretamente com as condições subjacentes e a idade do paciente COVID-19. Achados semelhantes a estes foram encontrados em estudo realizado na China com 633 pacientes de COVID-19, o qual concluiu que aqueles idosos com mais de 60 anos são mais propensos a exibir uma forma mais grave da doença pois, durante o estudo, 25 pacientes com idade mediana de 69,3 anos morreram, inferindo uma taxa de mortalidade efetiva de 3,77%2020. Wang C, Pan R, Wan X, Tan Y, Xu L, Ho CS, et al. Immediate Psychologial Response and Associated Factors during the Initial Stage of the 2019 Coronavirus Disease (COVID-19) Epidemic among the General Population in China. Int J Environ Res Public Health. 2020;113(5):311-2. doi: http://doi.org/10.3390/ijerph17051729
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Ainda em relação à faixa etária, outro estudo chinês realizado com 606 profissionais de saúde com média de idade de 35,7 anos e que utilizou a escala SCL-90-R para investigar o surgimento de sintomas psicopatológicos no contexto da pandemia de COVID-19 identificou que o percentual de sintomas de ansiedade, somáticos e de insônia foi de 45,4%, 12,0% e 32%, respectivamente. A frequência de sintomas somáticos entre os participantes com sintomas de ansiedade foi de 22,9%. Diferentemente da presente pesquisa, não foram encontradas diferenças em relação às variáveis sociodemográficas e laborais entre participantes com e sem sintomas somáticos2121. Li H, Zhang Y, Wang H, Liang J, Zhou Y, Huang Y, et al. The relationship between symptoms of anxiety and somatic symptoms in health professionals during the coronavirus disease 2019 Pandemic. Neuropsychiatr Dis Treat. 2020;16:3153. doi: http://doi.org/10.2147/NDT.S282124
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.

Estudo anterior à pandemia de COVID-19, porém, realizado no contexto do surto de síndrome aguda respiratória na China mostrou que a ocorrência de sintomas psiquiátricos entre enfermeiros foi relacionada com a idade mais jovem e o escasso apoio familiar2222. Su TP, Lien TC, Yang CY, Su YL, Wang JH, Tsai SL, et al. Prevalence of psychiatric morbidity and psychological adaptation of the nurses in a structured SARS caring unit during outbreak: a prospective and periodic assessment study in Taiwan. J Psychiatr Res. 2007;41(1-2):119-30. doi: https://doi.org/10.1016/j.jpsychires.2005.12.006
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Quanto ao sexo, houve associação aos domínios Psicoticismo e Obsessividade/Compulsividade. Estudo transversal realizado na China com 1.257 profissionais de saúde distribuídos em 34 hospitais equipados para atender pacientes com COVID-19 encontrou uma parcela considerável destes profissionais com sintomas de depressão, ansiedade, insônia e angústia. Mulheres, enfermeiras e pessoas que moravam em Wuhan, bem como profissionais de saúde envolvidos no diagnóstico, tratamento ou na prestação de cuidados de enfermagem a pacientes com suspeita ou confirmação de COVID-19, constituíam o grupo mais acometido pelos sintomas2323. Lai J, Ma S, Wang Y, Cai Z, Hu J, Wei N, et al. Factors Associated with Mental Health Outcomes Among Health Care Workers Exposed to Coronavirus Disease 2019. JAMA. 2020;3:e3. doi: http://doi.org/10.1001/jama.2020.2648
https://doi.org/10.1001/jama.2020.2648...
.

A carga horária de trabalho semanal teve associação ao domínio Psicoticismo. Quanto à carga horária de trabalho semanal, a maioria dos participantes 181 (34%) trabalha 40 horas por semana. Com a pandemia instaurada pela COVID-19, o sistema de saúde do país foi impactado, entre outros desafios, pela falta de profissionais de saúde e a necessidade de aumento de carga horária de trabalho, para a realização da assistência aos pacientes2424. Fehn A, Nunes L, Aguillar A, Dal Poz M. Vulnerabilidade e déficit de profissionais de saúde no enfrentamento da COVID-19. Nota técnica 10. [Internet]. 2020 [cited 2021 Oct 10]. Available from: https://ieps.org.br/wp-content/uploads/2020/05/NT10_IEPS.pdf
https://ieps.org.br/wp-content/uploads/2...
-2525. Vedovato TG, Andrade CB, Santos DL, Bitencourt SM, Almeida LPD, Sampaio JFDS. Health workers and COVID-19: flailing working conditions? Rev Bras Saúde Ocup. 2021;46. doi: https://doi.org/10.1590/2317-6369000028520
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.

Outro estudo realizado com profissionais de saúde da China mostra que eles realizavam longas jornadas de trabalho e executavam vários plantões consecutivos, fatos que impactavam diretamente na fadiga física e mental99. Kang L, Li Y, Hu S, Chen M, Yang C, Yang BX, et al. The mental health of medical workers in Wuhan, China dealing with the 2019 novel coronavirus. Lancet Psychiatry. 2020;7:7-14. doi: https://doi.org/10.1016/S2215-0366(20)30047-X
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. Dessa forma, é importante ressaltar que a situação sanitária aumentou tanto as condições de estresse mental como de cansaço físico, uma vez que os profissionais exerciam suas atividades em situações de sobrecarga de funções, carga horária extensa, situações de risco, estrutura física inadequada, escassez de recursos materiais e falta de capacitação profissional2626. Sousa KHJF, Zeitoune RCG, Portela LF, Tracera GMP, Moraes KG, Figueiró RFS. Factors related to the risk of illness of nursing staff at work in a psychiatric institution. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2020;28:e3235. doi: https://doi.org/10.1590/1518-8345.3454.3235
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. Vale lembrar, ainda, a importância do suporte social e das estratégias coletivas de enfrentamento como fator de proteção para os trabalhadores expostos à intensa sobrecarga de trabalho2727. Lima EP, Assunção AA. Prevalence and factors associated with Posttraumatic Stress Disorder (PTSD) in emergency workers: a systematic literature review. Rev Bras Epidemiol. 2011;14(2). doi: https://doi.org/10.1590/S1415-790X2011000200004
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.

Pesquisa chinesa que utilizou a SCL-90-R e comparou sintomas psicopatológicos entre profissionais médicos e não médicos verificou que os médicos tiveram maior prevalência de insônia, ansiedade, depressão, somatização e sintomas obsessivo-compulsivos2828. Zhang WR, Wang K, Yin L, Zhao WF, Xue Q, Peng M. Mental Health and Psychosocial Problems of Medical Health Workers during the COVID-19 Epidemic in China. Psychother Psychosom. 2020;1-9. doi: http://doi.org/10.1159/000507639
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. Embora a presente pesquisa não tenha focado nas prevalências, os resultados, também evidenciaram a presença de psicoticismo, obsessividade-compulsividade, somatização e ansiedade entre os profissionais de enfermagem do Sudeste brasileiro.

A variável sofrimento de constrangimentos e/ou violências no percurso do trabalho desde o início da pandemia COVID-19 foi associada a todos os domínios da escala utilizada neste estudo, que é derivada da supracitada. Os profissionais da saúde representam um quarto de todos os casos de violência perpetrados no trabalho; destes, os trabalhadores da enfermagem foram os mais atingidos2929. Silva IV, Aquino EML, Pinto ICM. Workplace violence in the healthcare sector: the experience of State health employees in Bahia State, Brazil. Cad Saúde Pública. 2014;30(10):2112-22. doi: https://doi.org/10.1590/0102-311X00146713
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-3030. Dal Pai D, Sturbelle ICS, Santos C, Tavares JP, Lautert L. Physical and psychological violence in the workplace of healthcare professionals. Texto Contexto Enferm. 2018;27:e1. doi: https://doi.org/10.1590/0104-07072018002420016
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A pesquisa “Perfil da Enfermagem no Brasil”, realizada em 2016 pelo Conselho Federal de Enfermagem (COFEN) e pelos Conselhos Regionais de Enfermagem [COREN(s)], em parceria com a Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ) e publicada em 2017, encontrou dados semelhantes aos do presente estudo no que tange ao constrangimento e/ou violência no percurso de trabalho. Na pesquisa, 28,7% dos profissionais afirmaram ter sido expostos à violência durante o trabalho. No presente estudo, 24,6% dos participantes afirmaram ter sofrido algum tipo de constrangimento e/ou violência no trabalho. Dados semelhantes, também foram encontrados em um estudo realizado em São Paulo3131. Da Silva ATC, Peres MFT, Lopes CS, Schraiber LB, Susser E, Menezes PR. Violence at work and depressive symptoms in primary health care teams: a cross-sectional study in Brazil. Soc Psychiatry Psychiatr Epidemiol. 2015;50(9):1347-55. doi: https://doi.org/10.1007/s00127-015-1039-9
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, onde 32,8% dos participantes referiram ter vivenciado, pelo menos, um episódio de violência no ano anterior à pesquisa.

Profissionais expostos às situações de violência no trabalho desenvolvem mais sintomas de sofrimento psicopatológico que os não expostos3232. Jaradat Y, Nilsen MB, Kristensen P, Nijem K, Bjertness E, Stigum H, et al. Workplace aggression, psychological distress, and job satisfaction among Palestinian nurses: A cross-sectional study. Appl Nurs Res. 2016;32:190-8. doi: https://doi.org/10.1016/j.apnr.2016.07.014
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. Essa violência, na maioria das vezes praticada pelos usuários, é apontada pelos próprios trabalhadores como impactante em sua saúde e associa-se aos Transtornos Mentais Menores, Síndrome de Burnout e redução do bem-estar laboral3030. Dal Pai D, Sturbelle ICS, Santos C, Tavares JP, Lautert L. Physical and psychological violence in the workplace of healthcare professionals. Texto Contexto Enferm. 2018;27:e1. doi: https://doi.org/10.1590/0104-07072018002420016
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,3333. Bernaldo-de-Quirós M, Labrador FJ, Piccino AT, Gómes MJC. Workplace violence in prehospital emergency care: A systematic review and outlines of psychological intervention: Second prize of the 20th "Rafael Burgaleta" Applied Psychology Awards 2013. Clin Salud. 2014;25(1):11-8. doi: https://doi.org/10.1016/S1130-5274(14)70023-4
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. Além de acarretar comprometimento na saúde mental e física dos profissionais, esses atos de violência refletem de forma negativa nos processos de trabalho dos serviços da saúde3434. Pousa PCP, Lucca SR. Psychosocial factors in nursing work and occupational risks: a systematic review. Rev Bras Enferm. 2021;74(supl.3):e20200198. https://doi.org/10.1590/0034-7167-2020-0198
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.

A maioria dos participantes da presente pesquisa, 391 (73,5%), afirmou não ter recebido suporte/apoio psicológico/emocional da instituição em que trabalha ou estuda e essa falta de suporte, também se associou a todos os domínios da escala EAS-40. Trata-se de um achado interessante, pois embora o Estado de São Paulo tenha sido pioneiro na detecção do SARS-CoV-2 no Brasil22. Cândido DS, Claro IM, De Jesus JG, Souza WM, Moreira FR, Dellicour S, et al. Evolution and epidemic spread of SARS-CoV-2 in Brazil. Science. 2020;369:e6508:1255-60. doi: https://doi.org/10.1126/science.abd2161
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não atentou, simultaneamente, para o sofrimento mental decorrente da COVID-19 nos diversos grupos populacionais.

Nesse caminho, a Organização das Nações Unidas destaca que a preservação da saúde mental dos profissionais da saúde é um elemento fundamental nas ações de preparação, resposta e recuperação da pandemia instaurada pela COVID-193535. Fundação Oswaldo Cruz. Saúde Mental e Atenção Psicossocial na Pandemia COVID-19. Recomendações para Gestores. [Internet]. Rio de Janeiro: FIOCRUZ: 2020 [cited 2021 Oct 10]. Available from: https://www.fiocruzbrasilia.fiocruz.br/wp-content/uploads/2020/06/cartilha_trabalhadores_saude.pdf
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. E, aqueles que atuam na linha de frente do atendimento aos pacientes com COVID-19 podem desenvolver transtornos psíquicos e outros sintomas de saúde mental44. Moreira WC, Sousa AR, Nóbrega MPSS. Mental illness in the general population and health professionals during COVID-19: a scoping review. Texto Contexto Enferm. 2020;29:e20200215. doi: https://doi.org/10.1590/1980-265X-TCE-2020-0215
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Dessa forma, é de suma importância que os serviços de saúde visem à garantia de ações de biossegurança, proteção, organização e condições laborais apropriadas a todos os profissionais, independentemente da categoria ou vínculo institucional. Haja vista que os impactos na saúde mental, derivados do aumento dos níveis de estresse durante a vigência da epidemia, podem prejudicar a atenção e a tomada de decisão dos trabalhadores, o que impacta não somente no manejo das ações contra a COVID-19 como também possuem um efeito no bem-estar destes, posterior ao período epidêmico99. Kang L, Li Y, Hu S, Chen M, Yang C, Yang BX, et al. The mental health of medical workers in Wuhan, China dealing with the 2019 novel coronavirus. Lancet Psychiatry. 2020;7:7-14. doi: https://doi.org/10.1016/S2215-0366(20)30047-X
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Ao revelar um panorama sobre a sobrecarga física e psicológica dos profissionais de enfermagem que atuam na região mais populosa do país, que detém o maior número de trabalhadores da categoria e maior densidade tecnológica para a assistência aos pacientes acometidos com COVID-19, esse estudo subsidia o debate quanto às necessidades de saúde e as condições de enfrentamento dos desafios impostos pela pandemia hoje e no futuro para esse grupo de trabalhadores.

Como limitações do presente estudo que interferem na generalização dos resultados, destacam-se o recorte temporal e a amostra não probabilística. Mesmo com os esforços para acessar mais profissionais de enfermagem dos demais estados da Região Sudeste, não se conseguiu amostra similar ou próxima do Estado de São Paulo. Diante disso, sugere-se mais estudos a respeito dos sintomas psicopatológicos e da situação laboral de profissionais de enfermagem no contexto da pandemia da COVID-19 para ampliar o debate no âmbito da saúde do trabalhador.

Conclusão

Neste estudo, os fatores que mais se relacionaram com sintomas psicopatológicos no grupo atuante na Região Sudeste foram: faixa etária; carga horária de trabalho semanal e sofrimento de constrangimentos e/ou violências no percurso do trabalho, desde que decretado o estado de pandemia pela COVID-19.

Os referidos resultados apontaram a importância da realização de intervenções psicológicas cada vez mais precoces durante e após a pandemia. Sugere-se, desse modo, a criação de diretrizes voltadas para o acolhimento, adesão e acompanhamento dos profissionais de enfermagem por meio de propostas institucionais de suporte às demandas emocionais.

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    » https://www.fiocruzbrasilia.fiocruz.br/wp-content/uploads/2020/06/cartilha_trabalhadores_saude.pdf
  • Artigo extraído da dissertação de mestrado “Sintomas psicopatológicos e situação laboral de profissionais de enfermagem do sudeste brasileiro no contexto da pandemia de COVID-19”, apresentada à Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, SP.
  • Apoio financeiro

    Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) - Impacto da Pandemia COVID-19 na Saúde Mental de Profissionais de Enfermagem, Processo 4011002020, Brasil.
  • Errata

    No artigo “Sintomas psicopatológicos e situação laboral da enfermagem do Sudeste brasileiro no contexto da COVID-19”, con número DOI: http://dx.doi.org/10.1590/1518-8345.5768.3518 publicado en la Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2022;30:e3518, na página 1:
    Onde se lia:
    “Darcio Tadeu Mendes7 ORCID: 0000-0001-5180-1594
    Leia-se:
    “Darcio Tadeu Mendes7 ORCID: 0000-0001-6059-9308

Editado por

Editora Associada

Maria Lúcia do Carmo Cruz Robazzi

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    21 Mar 2022
  • Data do Fascículo
    Jan-Dec 2022

Histórico

  • Recebido
    15 Out 2021
  • Aceito
    23 Dez 2021
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