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Modernismos alternativos, preto no branco

Alternate modernisms in black and white

RESUMO

Resenha crítica da obra “Modernidade em preto e branco: arte e imagem, raça e identidade no Brasil, 1890-1945”, de autoria de Rafael Cardoso, publicada pela Companhia das Letras em 2022. São apresentados os principais objetivos do livro, as fontes utilizadas e teses defendidas, inserindo autor e obra nos debates historiográficos. Na resenha, especial atenção é dedicada às noções de modernidade e modernismo desenvolvidas por Cardoso.

PALAVRAS-CHAVE
Rafael Cardoso; modernidade; modernismo

ABSTRACT

Critical review of the work “Modernidade em preto e branco: arte e imagem, raça e identidade no Brasil, 1890-1945”, by Rafael Cardoso, published by Companhia das Letras in 2022. The main objectives of the book, the sources used, and theses defended are presented, inserting author and work in the historiographical debates. In the review, special attention is devoted to the notions of modernity and modernism developed by Cardoso.

KEYWORDS
Rafael Cardoso; modernity; modernism

Publicado originalmente em 2021 pela Cambridge University Press (CARDOSO, 2021CARDOSO, Rafael. Modernity in Black and White: Art and Image, Race and Identity in Brazil, 1890-1945. Cambridge: Cambridge University Press, 2021. 282 p. DOI: https://doi.org/10.1017/9781108680356.
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), o novo livro do historiador da arte Rafael Cardoso veio à lume no Brasil no início deste ano pela Companhia das Letras, sob o título: Modernidade em preto e branco: arte e imagem, raça e identidade no Brasil, 1890-1945. Seja na versão inglesa, seja na versão brasileira – que o autor frisa tratar-se mais de uma segunda edição que uma tradução –, o trabalho editorial é impecável e farto em ilustrações (essenciais para a boa compreensão da obra), valendo a pena, por si só, a preferência pelas publicações impressas às digitais. A linguagem clara e elegante do autor torna o livro acessível a diversos gêneros de leitores interessados no tema, sem perda do rigor acadêmico. Os objetivos de cada capítulo são introduzidos nas primeiras páginas e as referências de fontes e bibliografia são generosas e precisas, exatamente como se deve ser.

Como o autor revela em seus agradecimentos, o trabalho de pesquisa teve início em 2007 e contou com o apoio da Fundação Biblioteca Nacional (Brasil), do Getty Research Institute (EUA) e do Institut National d’Histoire de l’Art (França). Àqueles que acompanham as publicações de Cardoso, não é difícil encontrar, em sua produção acadêmica recente, indícios do livro então em andamento. Os interesses perseguidos estão presentes em The Problem of Race in Brazilian Painting, c. 1850-1920 (2015), Forging the Myth of Brazilian Modernism (2019a), White Skins, Black Masks: Antropofagia and the Reversal of Primitivism (2019b), dentre outros. Igualmente, o livro possui claras afinidades com as publicações anteriores que fizeram do seu autor um nome fundamental aos que estudam a História da Arte e História do Design no Brasil durante a primeira metade do século XX.

Sucintamente, Modernidade em preto e branco aborda a construção de um ideário moderno na cultura brasileira em suas inextricáveis relações com a atualização da identidade nacional, tomando por recorte privilegiado a cultura visual entre os séculos XIX e XX. Essa definição genérica de seu conteúdo aqui apresentada, todavia, faz pouco jus à riqueza e abordagem do tema – que possui sem dúvidas uma das mais extensivas bibliografias na tradição intelectual brasileira –, merecendo maiores aprofundamentos. A localização da obra no cenário historiográfico permite-nos essa entrada.

De um lado, podemos aproximar o trabalho de Rafael Cardoso às dinâmicas próprias da renovação historiográfica sobre a modernidade e o modernismo decorrentes da virada pós-moderna. Nos anos 1990, uma série de obras detendo-se nos domínios da história da cultura no Rio de Janeiro durante o período republicano foi publicada, renovando as percepções da historiografia sobre aquela conjuntura conhecida como Belle Époque carioca. Nomes como Monica Pimenta Velloso, Angela de Castro Gomes e Vera Lins buscavam compreender a produção cultural da época, sobretudo a imprensa e a literatura, para além da alcunha de “pré-modernos” que a essa geração foi insistentemente apregoada. Tratava-se de estudar a dimensão boêmia da sociabilidade carioca, a ilustração e textos cômicos da imprensa ou a literatura parnasiana e simbolista como parte da modernidade, e por isso produções também modernas, modernistas, embora não ligadas à definição hegemônica do modernismo paulista (LINS, 1991LINS, Vera. Gonzaga Duque: e a estratégia do franco-atirador. Rio de Janeiro: Tempo brasileiro, 1991.; VELLOSO, 1996VELLOSO, Mônica Pimenta. Modernismo no Rio de Janeiro: Turunas e quixotes. Rio de Janeiro, Editora da Fundação Getúlio Vargas, 1996.; GOMES, 1999GOMES, Angela Maria de Castro. Essa gente do Rio...: modernismo e nacionalismo. Rio de Janeiro: Editora da Fundação Getúlio Vargas, 1999.). Hoje referências bibliográficas incontornáveis, permitiram a valorização e o estímulo ao estudo do período, deixando um frutífero legado acadêmico.

Similar processo ocorreu no interior da História da Arte. Ao longo dos anos 1980 e 1990, em um fluxo historiográfico internacional, a produção não identificada como moderna finalmente começou a receber a atenção merecida dos especialistas, distanciando-se dos pressupostos e apreciações da vanguarda. Interessava compreender a vasta produção artística entre os séculos XIX e XX para além das diminutas fronteiras que, a rigor, representavam as vanguardas históricas no panorama europeu. Jorge Coli, Sonia Gomes Pereira, Annateresa Fabris e Tadeu Chiarelli estão entre os principais nomes que abriram caminho para esses estudos no Brasil, reavaliando criticamente o modernismo brasileiro e/ou ajustando as lentes históricas para um balanço daquela arte que era considerada simplesmente “acadêmica”, convencional e ultrapassada pela historiografia, comprometida que estava com os juízos modernistas (FABRIS, 1994FABRIS, Annateresa. Modernismo: nacionalismo e engajamento. In: AGUILAR, Nelson. (Org.). Bienal Brasil século XX. São Paulo: Fundação Bienal de São Paulo, 1994.; COLI, 2005COLI, Jorge. Como estudar a arte brasileira do século XIX? São Paulo: Senac, 2005.; CHIARELLI, 2010CHIARELLI, Tadeu. De Anita à academia: para repensar a história da arte no Brasil. Novos estudos CEBRAP, n. 88, 2010, p. 113-132.; PEREIRA, 2016PEREIRA, Sonia Gomes. Arte, ensino e Academia: estudos e ensaios sobre a Academia de Belas Artes do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Mauad/Faperj, 2016.).

Logo na introdução, Cardoso posiciona-se em relação às disputas sobre o “moderno” na historiografia da arte e cultura brasileiras, operando com o conceito de “modernidades alternativas”. O autor alinha-se aos anteriores e outros, como Perry Anderson, na validação de múltiplos modernismos ao redor do globo, “[...] que se entrecruzam e se sobrepõem a partir da década de 1890, se não antes, para constituírem juntos um campo ampliado de trocas modernistas” (CARDOSO, 2022CARDOSO, Rafael. Modernidade em preto e branco: arte e imagem, raça e identidade no Brasil, 1890-1945. 1. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2022. 372 p., p. 17). Isto significa afirmar que a experiência modernista hegemônica, ou seja, aquela que internacionalmente é vinculada às vanguardas históricas e que no Brasil associou-se ao grupo de Mário e Oswald de Andrade, é apenas uma dentre outras. Foi por meio de uma operação historiográfica, contudo, que essa experiência singular foi construída (e sobrevalorizada) em relação às demais – conforme demonstraram não apenas Cardoso, mas também Ana Paula Simioni (2013)SIMIONI, Ana Paula Cavalcanti. Modernismo brasileiro: entre a consagração e a contestação. Perspective, n. 2, 2013, p. 1-17. DOI: https://doi.org/10.4000/perspective.5539.
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em outros trabalhos. É contra a narrativa única do modernismo que o autor se posiciona, essa que pressupõe uma dura lógica formal, autorreferencial e evolutiva nas artes.

Restaria definir então o que a rigor constitui uma experiência modernista nesse contexto, ponto em que o autor é bastante sucinto, embora parta de uma ampla e renomada bibliografia. Dada a relevância do livro e das teses apresentadas para o debate historiográfico atual, contudo, acreditamos que os leitores poderiam ter se beneficiado de uma maior explanação conceitual sobre a questão, permitindo desenvolvê-la em novas pesquisas. Do que podemos depreender da introdução, (Cardoso 2022CARDOSO, Rafael. Modernidade em preto e branco: arte e imagem, raça e identidade no Brasil, 1890-1945. 1. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2022. 372 p., p. 20) concebe o modernismo artístico como um fenômeno capaz de “desenvolver um programa estético a partir da consciência da modernidade”, isto é, da capacidade de “contemplar essas experiências [de desenvolvimento tecnológico e industrial, de novos hábitos políticos e sociais] como fruto de uma condição histórica”.

Seja como for, no decorrer do livro Rafael Cardoso apresenta-nos muito bem experiências modernistas alternativas. Nos capítulos 2 e 3, o autor delineia os contornos de um modernismo carioca, germinado de maneira própria e difusa da cultura midiática (CARDOSO, 2022CARDOSO, Rafael. Modernidade em preto e branco: arte e imagem, raça e identidade no Brasil, 1890-1945. 1. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2022. 372 p., p. 146). Sem dúvidas, é o trabalho que mais avança nos domínios da visualidade desde as proposições de Monica Velloso sobre a questão. Para a sua identificação, a pesquisa na imprensa ilustrada da época mostrou-se fulcral. Rompendo as barreiras entre high e low art, entre pintura de cavalete e ilustração de revistas – o que também diz muito sobre o seu alinhamento aos Estudos da Cultura Visual –, Cardoso nos apresenta uma experiência modernista constituída a partir de um núcleo social particular, bem representado no retrato de grupo pintado por Helios Seelinger intitulado Boemia (1903), interpretado como um “manifesto visual” (CARDOSO, 2022CARDOSO, Rafael. Modernidade em preto e branco: arte e imagem, raça e identidade no Brasil, 1890-1945. 1. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2022. 372 p., p. 103).

Se “[...] a existência de redes e tendências modernizadoras [foco do capítulo 2] não chega a constituir, por si só, um reconhecimento do modernismo como conceito e categoria” (CARDOSO, 2022CARDOSO, Rafael. Modernidade em preto e branco: arte e imagem, raça e identidade no Brasil, 1890-1945. 1. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2022. 372 p., p. 145), esse grupo teria demonstrado um apurado senso de modernidade, seja em termos de consciência e postura, seja nas ações e obras empreendidas (dentre as personalidades citadas no capítulo, destaca-se de longe o ilustrador absolutamente performático Calixto Cordeiro). Além disso, o grupo boêmio carioca teria frequentemente dado mostras de sua relação com as tradições populares cariocas, em especial o samba, o maxixe e o carnaval, muito antes dos modernistas consagrados. Na verdade, se aqui podemos acrescentar, o mais importante artista modernista que pintaria tais tradições, Di Cavalcanti, foi criado exatamente nas rodas desse grupo mais velho. Conforme é desenvolvido no capítulo 3, também partiria dessa rede outras iniciativas de cunho moderno, como as revistas Atheneida (1903), Kosmos (1904-9) e Renascença (1904-8), que apresentariam um design absolutamente art nouveau quando o estilo era debatido na imprensa como um critério de modernidade do início do século. O olhar exclusivo para revistas “vanguardistas” como a Klaxon ou a Revista de Antropofagia revelaria o grau de seletividade obtusa com que a historiografia examinou a questão da gráfica no Brasil.

Mas para bem compreender tais experiências modernistas no Brasil, é necessário ter em mente o outro par conceitual operado pelo autor, a noção de “modernidades ambíguas”. Trata-se do descompasso entre o convencional conceito de modernidade na história ocidental e sua efetiva realização no Brasil. Aqui reside uma segunda linha teórica do trabalho do historiador, informado pelos Estudos Culturais e pelo pensamento pós-colonial, através de nomes como Nestor Canclini, Dipesh Chakrabarty e Gayatri Spivak, com os quais dialoga. Em termos estéticos, segundo Cardoso, o que se entende por modernismo no Brasil colide com o projeto de modernidade europeu, caracterizando-se mais por um “simulacro” moderno do que uma realidade social moderna – característica compartilhada com o contexto latino-americano (CARDOSO, 2022CARDOSO, Rafael. Modernidade em preto e branco: arte e imagem, raça e identidade no Brasil, 1890-1945. 1. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2022. 372 p., p. 28-29). Esse verniz de modernidade representado pelo modernismo apenas disfarçaria as condições nada modernas do país, corroborando “a tese de que o moderno e o arcaico não são opostos na cultura brasileira, mas antes se entrecruzam, se mesclam, se casam, de modo ativo e perturbador” (CARDOSO, 2022CARDOSO, Rafael. Modernidade em preto e branco: arte e imagem, raça e identidade no Brasil, 1890-1945. 1. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2022. 372 p., p. 28).

Abordando a questão anterior em sua resenha do livro, Ana Magalhães atenta a uma dimensão que consideramos fundamental: tais contradições não são exclusivas ao Brasil ou à América Latina, mas antes se encontram no seio dos agentes primeiros dessa modernidade, na Europa. A barbárie é “parte inerente da nossa modernidade”, adverte a historiadora da arte (MAGALHÃES, 2021MAGALHÃES, Ana Gonçalves. Modernismo e barbárie no Brasil. Figura: Studies on the Classical Tradition, v. 9, n. 1, 2021, p. 181-186. Disponível em: https://econtents.bc.unicamp.br/inpec/index.php/figura/article/view/15762. Acesso em: 21 abr. 2022.
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, p. 185-6). Inevitável aqui invocar Walter (Benjamin 1987BENJAMIN, Walter. Sobre o conceito de História. In: BENJAMIN, Walter. (Org.). Magia e técnica, arte e política: ensaios sobre literatura e história da cultura. 3. ed. São Paulo: Brasiliense, 1987., p. 225). Se considerarmos a modernidade mesma, enquanto conjuntura histórica e ideologia, como um grande “monumento da cultura” ocidental, ela também não deixa de ser um “monumento da barbárie”, expressa de inúmeras formas, como Magalhães bem aponta.

Uma das premissas centrais do livro de Cardoso em diálogo com o par moderno/arcaico nos é apresentada logo no primeiro capítulo: a construção de experiências modernistas no Brasil se efetivou frequentemente em relação àquilo que era percebido como a antimodernidade, “[...] conformando uma alteridade subalternizada contra a qual as aspirações modernizantes das elites puderam se plasmar” (CARDOSO, 2022CARDOSO, Rafael. Modernidade em preto e branco: arte e imagem, raça e identidade no Brasil, 1890-1945. 1. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2022. 372 p., p. 42). Disso não escapam nem o modernismo carioca, nem o modernismo paulista, como fica claro na representação das favelas no Rio de Janeiro durante a Primeira República, analisadas nesse capítulo, ou nas distintas noções de primitivismo empregadas pelo modernismo hegemônico, foco do capítulo 4. No plano visual, tal fabricação recorreu muitas vezes a “marcadores visuais” que tendiam à folclorização, à paródia, à totemização, incidindo na criação de estereótipos (racistas) que por fim “[...] logr[aram] excluir da modernidade, à qual aspiravam os agentes que conduziram esse processo, os objetos de suas incursões etnográficas” (CARDOSO, 2022CARDOSO, Rafael. Modernidade em preto e branco: arte e imagem, raça e identidade no Brasil, 1890-1945. 1. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2022. 372 p., p. 26)2 2 Esse é o caso das ilustrações de J. Carlos e Di Cavalcanti, mais tarde apropriadas em obras de Tarsila do Amaral. Mas Cardoso frisa que houve também experiências modernistas anteriores que trabalhavam em outras chaves, críticas à realidade social e às diferenças de classe no interior da cidade sem recurso aos estereótipos, como as pinturas pioneiras na representação das favelas feitas por Eliseu Visconti e Gustavo Dall’Ara (ver Capítulo 1). .

Encerrando o livro, Rafael Cardoso discute no capítulo 5 os impasses na representação do “homem brasileiro” no Estado Novo em suas problemáticas com a questão racial. Em uma sugestiva tese, analisa o quanto o extermínio de Lampião no sertão, elemento típico da barbaridade que a modernidade desejava erradicar, coincide com a promoção pelas elites dirigentes de uma nova visualidade para o brasileiro (CARDOSO, 2022CARDOSO, Rafael. Modernidade em preto e branco: arte e imagem, raça e identidade no Brasil, 1890-1945. 1. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2022. 372 p., p. 248). Nada mais simbólico que isso para representar a ambiguidade da modernidade brasileira, que coopta identidades “distantes” para representar a nação – como o caipira e o sertanejo – e ao mesmo tempo as extermina. Como símbolos, elas só podem existir no plano abstrato, fora do mundo real. Para Cardoso, Lampião e o hábil controle de sua imagem na imprensa – capaz mesmo de antecipar as noções sobre a emergência de uma cultura de massa no Brasil por meio das imagens de jornais (CARDOSO, 2022CARDOSO, Rafael. Modernidade em preto e branco: arte e imagem, raça e identidade no Brasil, 1890-1945. 1. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2022. 372 p., p. 246-247) – representaria uma ameaça não apenas à ordem estatal, mas também à própria identidade brasileira, sempre em flerte com o “Brasil profundo”.

Em Modernidade em preto e branco, premissas historiográficas como a continuidade direta entre Semana de 1922 e Antropofagia ou a relação positiva entre esse modernismo e a questão racial são contestadas, afastando-o de seus mitos e reavaliando-o criticamente. Também cai por terra a tese de que a produção artística da Belle Époque carioca poderia ser reduzida a vocábulos como convencional, elitista e afrancesada, em contraste com uma produção posterior moderna, popular e nacional (CARDOSO, 2022CARDOSO, Rafael. Modernidade em preto e branco: arte e imagem, raça e identidade no Brasil, 1890-1945. 1. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2022. 372 p., p. 89-90). O que emerge é uma outra experiência modernista, que por vezes antecedeu o modernismo hegemônico e forneceu as bases para que pudesse se desenvolver, a despeito de toda a contrariedade do processo de modernização em curso.

Por todas as razões anteriormente enunciadas, não é difícil definir o livro como a obra capital de Rafael Cardoso e como uma das principais publicações no bojo das comemorações em torno do Centenário da Semana de Arte Moderna de 1922. Como leitura para os curiosos pelo assunto, o livro é sem dúvidas um imenso prazer. Como reflexão sobre o tema entre pares, indispensável.

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    Esse é o caso das ilustrações de J. Carlos e Di Cavalcanti, mais tarde apropriadas em obras de Tarsila do Amaral. Mas Cardoso frisa que houve também experiências modernistas anteriores que trabalhavam em outras chaves, críticas à realidade social e às diferenças de classe no interior da cidade sem recurso aos estereótipos, como as pinturas pioneiras na representação das favelas feitas por Eliseu Visconti e Gustavo Dall’Ara (ver Capítulo 1).

REFERÊNCIAS

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    » https://doi.org/10.1111/1467-8365.12134
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  • CARDOSO, Rafael. White Skins, Black Masks: Antropofagia and the Reversal of Primitivism. In: FLECK-NER, Uwe; TOLSTICHIN, Elena. (eds.). Das verirrte Kunstwerk: Bedeutung, Funktion und Manipulation von “Bilderfahrzeugen” in der Diaspora Berlin: De Gruyter, 2019b.
  • CARDOSO, Rafael. Modernity in Black and White: Art and Image, Race and Identity in Brazil, 1890-1945 Cambridge: Cambridge University Press, 2021. 282 p. DOI: https://doi.org/10.1017/9781108680356
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  • CARDOSO, Rafael. Modernidade em preto e branco: arte e imagem, raça e identidade no Brasil, 1890-1945 1. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2022. 372 p.
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    19 Set 2022
  • Data do Fascículo
    Ago 2022

Histórico

  • Recebido
    15 Abr 2022
  • Aceito
    05 Maio 2022
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