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Mapa de conversação: estratégia educativa no cuidado ao idoso com diabetes mellitus

RESUMO

Objetivo:

Relatar a experiência da utilização de mapas de conversação em diabetes como estratégia educativa ao idoso diabético.

Método:

Relato de experiência, desenvolvido de julho a dezembro de 2016, realizado em ambulatório especializado no atendimento de diabéticos, em Fortaleza, Ceará, Brasil. Participaram 72 usuários, entre diabéticos e acompanhantes.

Resultados:

Os participantes discorreram sobre assuntos que não são relatados nas consultas individuais, pois o participante se vê por meio do relato do outro e, quando se expressa, percebe que não está sozinho, outros também passam pelas mesmas dificuldades. Mediante a empatia e a fala do outro, o participante constrói saberes e práticas para o próprio cotidiano.

Considerações Finais:

O mapa de conversação permite ao profissional realizar o empoderamento do paciente com diabetes, promovendo o autocuidado e garantindo melhor controle da doença, de forma a prevenir ou retardar o surgimento de complicações relacionadas.

Descritores:
Diabetes Mellitus; Educação em Saúde; Aceitação pelo Paciente de Cuidados de Saúde; Saúde do Idoso; Enfermagem

ABSTRACT

Objective:

To report the experience of using diabetes conversation maps as an educational strategy for diabetic elderly people.

Method:

Experience report, conducted from July to December 2016 in a specialized outpatient clinic for diabetics, in Fortaleza, Ceará, Brazil. A total of 72 users participated, between diabetics and those accompanying them.

Results:

The participants talked about issues that were not addressed in personal consultations, and could see themselves through the stories of others, thus realizing they were not alone and that others also experienced the same difficulties as them. Through empathy and the accounts of others, participants built knowledge and practices for their own daily lives.

Final Considerations:

The conversation map enables professionals to empower patients with diabetes, promoting self-care and ensuring better control over the disease, in order to prevent or delay the onset of related complications.

Descriptors:
Diabetes Mellitus; Health Education; Patient Acceptance of Health Care; Health of the Elderly; Nursing

RESUMEN

Objetivo:

Relatar la experiencia de utilización de mapas de conversación sobre diabetes como estrategia educativa para el anciano diabético.

Método:

Relato de experiencia desarrollado de julio a diciembre de 2016, realizado en servicio ambulatorio de atención de diabéticos, en Fortaleza, Ceará, Brasil. Participaron 72 pacientes, entre diabéticos y acompañantes.

Resultados:

Los participantes conversaron sobre temas no informados en las consultas individuales, pues el participante se observa en el relato del otro y, cuando se expresa, percibe que no está solo; otros también pasan por las mismas dificultades. Mediante la empatía y el discurso del otro, el participante construye saberes y prácticas para su propio día a día.

Consideraciones Finales:

El mapa de conversación permite que el profesional realice el empoderamiento del paciente con diabetes, promoviendo el autocuidado y garantizando mejor el control de la enfermedad, de modo tal de prevenir o retardar el surgimiento de complicaciones relacionadas.

Descriptores:
Diabetes Mellitus; Educación en Salud; Aceptación de la Atención en Salud; Salud del Anciano; Enfermería

INTRODUÇÃO

O envelhecimento populacional trouxe consigo a elevação do acometimento por Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNTs), dentre elas o diabetes mellitus (DM), já que essas condições tendem a se manifestar de forma mais expressiva na população idosa. As DCNTs podem gerar um processo incapacitante e, desse modo, afetar a funcionalidade de idosos, ou seja, dificultar ou impedir o desempenho de atividades cotidianas de forma independente. Ainda que não sejam fatais, essas condições geralmente tendem a comprometer de forma significativa a qualidade de vida dos idosos(11 Stopa SR, César CLG, Segri NJ, Goldbaum M, Guimarães VMV, Alves MCGP, et al. Self-reported diabetes in older people: comparison of prevalence and control measures. Rev Saude Publica [Internet]. 2014[cited 2017 Jan 03];48(4):554-662. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4181106/
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/article...
).

Em idosos entre 65 e 79 anos, o DM acomete mundialmente 94,2 milhões, com projeções para 200,5 milhões, em 2040. O Brasil ocupa a quarta posição do ranking mundial no que se refere ao número de pessoas que convivem com DM, com 14,3 milhões de indivíduos entre 20 e 79 anos. A cada ano, cresce o número de pessoas com DM, o que implica mudanças de vida decorrentes do tratamento e/ou das complicações da doença(22 International Diabetes Federation. IDF. Diabetes Atlas [Internet]. Brussels, Belgium: International Diabetes Federation. 17a. ed. 2015[cited 2017 Jan 03]. Available from: https://www.idf.org/e-library/epidemiology-research/diabetes-atlas/13-diabetes-atlas-seventh-edition.html
https://www.idf.org/e-library/epidemiolo...
).

O aumento na prevalência do DM deve-se a fatores como o crescimento e envelhecimento populacional, o processo de urbanização, a globalização de hábitos não saudáveis, a crescente prevalência de obesidade e sedentarismo, bem como a maior sobrevida de pacientes com DM. Além disso, os custos associados ao DM incluem a intensificação do uso dos serviços de saúde, a perda da produtividade funcional e a deficiência. Como resultado, o DM impõe uma carga onerosa sobre os indivíduos, famílias e sistemas de saúde, constituindo significativo obstáculo ao desenvolvimento econômico sustentável(33 Sociedade Brasileira de Diabetes. SBD. Diretrizes da Sociedade Brasileira de Diabetes: 2015-2016. [Internet]. São Paulo: AC Farmacêutica. 2016[cited 2017 Jan 03]. Available from: http://www.diabetes.org.br/profissionais/images/pdf/DIRETRIZES-SBD-2015-2016.pdf
http://www.diabetes.org.br/profissionais...
).

O diabetes mellitus tipo 2 (DM2) aumenta sua prevalência com a idade, sobretudo em indivíduos acima dos 65 anos. O idoso está sujeito exatamente às mesmas complicações relacionadas ao diabetes que o jovem, com uma diferença importante: o risco das complicações cardíacas e vasculares é muito maior, uma vez que a idade é um fator agravante. Tal fator justifica a necessidade de um cuidado diferenciado destinado a essa população. Ademais, o idoso diabético, quando comparado ao não diabético, está mais sujeito a ser polimedicado, a apresentar perdas funcionais, problemas cognitivos, depressão, quedas e fraturas, incontinência urinária e dores crônicas(44 Mello APA, Belo LAO, Pontes AEB, Pagotto V, Nakatani AYK, Martins KA. Estudo de base populacional sobre excesso de peso e diabetes mellitus em idosos na região metropolitana de Goiânia, Goiás. Geriatr Gerontol Aging [Internet]. 2016[cited 2017 Feb 03];10(3):151-7. Available from: http://ggaging.com/details/374/pt-BR/population-based-study-of-overweight-and-diabetes-mellitus-in-elderly-in-the-metropolitan-area-of-goiania--goias
http://ggaging.com/details/374/pt-BR/pop...
).

Diante de todas alterações fisiológicas inerentes ao processo de envelhecimento que podem interferir ao longo do autocuidado do idoso com diabetes mellitus, a educação em saúde surge como uma estratégia de promoção à saúde, na medida em que procura capacitar o idoso com DM a problematizar sobre sua condição, incentivando o autocuidado e desenvolvendo o sentimento de corresponsabilidade por sua saúde. O apoio educacional, por meio das tecnologias em saúde, pode produzir impacto positivo sobre o comportamento das pessoas com diabetes.

As tecnologias em saúde são divididas em leves, leves-duras e duras. As tecnologias leves compõem aquelas relacionadas ao acolhimento, à subjetividade e à empatia entre profissional e paciente, o que fortalece as relações e promove a confiança; as leves-duras referem-se à aplicação do conhecimento, ao uso de instrumentos de educação como cartazes, panfletos, álbuns seriados e mapas de conversação, os quais atuam como facilitador do ensino aprendizagem; as duras são os equipamentos, os exames, os medicamentos, a tecnologia digital, entre outros(55 Fernandes MTO, Silva LB, Soares SM. Utilização de tecnologias no trabalho com grupos de diabéticos e hipertensos na Saúde da Família. Ciênc Saúde Colet [Internet]. 2011[cited 2017 Feb 03];16(Suppl 1):1331-40. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csc/v16s1/a67v16s1.pdf
http://www.scielo.br/pdf/csc/v16s1/a67v1...
).

O mapa de conversação em diabetes é uma estratégia educativa criada pela Federação Internacional de Diabetes, desenvolvido a partir de ilustrações lúdicas e interativas, contendo metáforas sobre a condição crônica do diabetes e sobre as situações cotidianas vividas pelos usuários dos serviços de saúde. Pode ser utilizado por meio do compartilhamento de experiências pessoais e englobar sentimentos, redes de apoio e práticas saudáveis de vida(66 Salinero-Fort MA, Pau ECS, Arrieta-Blanco FJ, Abanades-Herranz JC, Martín-Madrazo C, Rodés-Soldevila B, et al. Effectiveness of PRECEDE model for health education on changes and level of control of HbA1c, blood pressure, lipids, and body mass index in patients with type 2 diabetes mellitus. BMC Public Health [Internet]. 2011[cited 2017 Jan 25];11:267. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC3098792/
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/article...
).

A ferramenta de mapa de conversação combina várias teorias educacionais e tem demonstrado ser uma tecnologia de educação em diabetes eficaz internacionalmente para autogestão do cuidado. Assim, questiona-se: O uso de mapas de conversação em diabetes pode melhorar o conhecimento, as atividades de autocuidado, a capacitação e o controle da glicemia em idosos? Tais programas de educação sobre diabetes têm o potencial de conduzir melhores resultados de saúde em curso para pessoas e devem reduzir internações hospitalares e complicações relacionadas ao diabetes(77 Kewming S, D’Amore A, Mitchell EKL. Conversation Maps and Diabetes Education Groups: An Evaluation at an Australian Rural Health Service. Diabetes Spectr [Internet]. 2016[cited 2017 Jan 25];29(1):32-6. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4755459/
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/article...
).

OBJETIVO

Diante do contexto, o presente estudo teve o objetivo de relatar a experiência da utilização de mapas de conversação em diabetes como uma estratégia educativa a idosos diabéticos.

MÉTODO

Trata-se de estudo qualitativo, descritivo, do tipo relato de experiência, realizado em uma unidade ambulatorial especializada em atendimento de diabéticos, em Fortaleza, Ceará, Brasil, no período de julho a dezembro de 2016.

Os pacientes foram selecionados previamente em dois momentos: no primeiro, foi realizada uma revisão do prontuário no dia anterior à consulta com endocrinologista, para avaliar as necessidades de atendimentos do paciente e buscando aqueles com diagnóstico superior a 10 anos, fatores de risco para desenvolvimento de complicações e/ou com controle glicêmico fora das metas preconizadas pela Sociedade Brasileira de Diabetes. O segundo momento foi a realização de uma triagem no dia da consulta, por meio da qual se buscaram pacientes com algum grau de descompensação ou presença de complicações.

Após seleção, os pacientes foram convidados a participar do grupo, juntamente com os respectivos acompanhantes. A amostra foi composta por 72 usuários do serviço, sendo 53 portadores de diabetes mellitus do tipo 2, com idade acima de 60 anos, e 19 acompanhantes desses pacientes, e foram excluídos os pacientes que não atendiam aos critérios estabelecidos.

As atividades educativas ocorreram antes do atendimento médico, em uma sala privativa, climatizada e silenciosa. A frequência foi de uma vez por semana, por 12 semanas, com duração aproximada de 60 minutos. Cada grupo conteve de três a dez usuários. As facilitadoras da oficina foram enfermeiras, nutricionistas e fisioterapeutas, integrantes da residência multiprofissional em atenção hospitalar à saúde, da área de concentração de assistência em diabetes, bem como seus respectivos preceptores do serviço de endocrinologia. Como tecnologia leve-dura de ensino-aprendizagem, utilizou-se o mapa de conversação específico para o indivíduo com diabetes. As oficinas educativas foram registradas em livro de ata do serviço, contendo o facilitador da atividade, número de participantes, temática abordada, questionamentos mais prevalentes por parte dos usuários, data e duração da atividade.

No que se refere à condução do grupo, inicialmente, ocorreu a apresentação de cada participante e dos facilitadores. Então, o mapa foi exposto; e os participantes, questionados sobre o que mais lhes chamava a atenção. É importante ressaltar que o profissional facilitador, aquele que aplicou a atividade educativa, conduziu o momento com perguntas incentivadoras do diálogo e da participação de todos, evitando focar na explanação de conteúdo, o que proporcionou ambiente não ameaçador para que todos aprendessem uns com os outros. Os resultados foram analisados de acordo com a literatura e apresentados de forma descritiva.

O estudo respeitou as exigências formais contidas nas normas nacionais e internacionais regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos, que é o caso da natureza da pesquisa do tipo relato de experiência.

RESULTADOS

Os grupos iniciaram com a apresentação dos profissionais facilitadores. Logo após, os participantes foram convidados a se apresentar, informando nome, procedência, tempo de diagnóstico de diabetes e se utilizavam insulina. Os participantes e facilitadores permaneceram sentados em uma roda de conversa, onde no centro eram expostos os mapas de conversação, assim todos podiam visualizá-los e discutir. Inicialmente, o facilitador perguntou aos pacientes quais elementos do mapa chamavam-lhes a atenção.

Os mapas que foram utilizados tiveram como tema: Como o corpo e o diabetes funcionam; Alimentação saudável e atividade física; Atingindo as metas com as insulinas; Entendendo os muitos fatores do controle do diabetes; e O diabetes e o cuidado com os pés. Os assuntos foram selecionados de acordo com o perfil dos usuários a serem atendidos no dia, ou seja, de acordo com a avaliação das maiores necessidades destes.

Mapa 1- Como o corpo e o diabetes funcionam

No que se refere ao mapa “Como o corpo e o diabetes funcionam”, os assuntos abordados delinearam os princípios básicos da educação em saúde ao diabético, isto é, a função metabólica das pessoas com e sem diabetes, fatores de risco e complicações em longo prazo, mitos e verdades sobre o DM, automonitoramento glicêmico, os sentimentos e as emoções que o diabético enfrentava. O mapa comparou o corpo de um indivíduo saudável ao do diabético utilizando uma fábrica como modelo, com vistas à compreensão do usuário.

Os idosos observaram as figuras, comentavam sobre a metáfora presente nas ilustrações utilizadas para simular o corpo humano e tentavam decifrar o que a imagem transmitia. Algumas informações eram relatadas devido ao contato com a televisão, redes sociais e internet. No decorrer atividades educativas, buscou-se associar o saber técnico-científico com a realidade vivenciada, rompendo-se com o modelo tradicional de transmissão de informações.

Durante a discussão, evidenciaram-se muitas dúvidas sobre a fisiopatologia do DM2, principais complicações, como evitar as complicações e, principalmente, sobre a dificuldade de mudança do estilo de vida. Diante dos questionamentos, os idosos conversavam entre si, trocando experiência e confortando-se uns aos outros. Quando necessário, o facilitador interveio e esclareceu dúvidas.

Mapa 2 - Alimentação saudável e atividade física

O mapa de conversação alimentação saudável e atividade física" foi representado ludicamente por uma feira com os variados tipos de alimentos que o diabético pode encontrar na sua rotina. A partir dela, foram discutidos tópicos como a quantidade, a qualidade e as opiniões sobre os alimentos, os componentes nutricionais, o planejamento das refeições e outras estratégias para uma alimentação saudável. Discutiu-se, ainda, sobre a importância da atividade física e de ser ativo.

Durante os relatos e as trocas de experiências no grupo, foi evidenciada a grande carência de conhecimento no que diz respeito a quais alimentos o paciente diabético poderia comer, quantidades e qualidade destes. Quanto à atividade física, os indivíduos apresentaram maior conhecimento sobre o tema, o que tornou o grupo dinâmico, participativo e com maior troca de vivências, agindo como incentivo para que os sedentários iniciassem e/ou retomassem o exercício físico e conhecessem mais sobre o mesmo.

Mapa 3 - Atingindo as metas com as insulinas

O mapa Atingindo as metas com as insulinas" trouxe em seu conteúdo o uso das insulinas como tratamento para o DM, simbolizado por uma praça, em que o paciente encontrou os vários aspectos relacionados a sua terapêutica.

Foram explorados os aspectos psicológicos, os quais o paciente enfrentava quando iniciava o tratamento insulínico, bem como o esclarecimento de dúvidas frequentes relacionadas a essa temática. Com auxílio de gráficos, foi abordado o tempo de ação das insulinas, além de suas diferentes apresentações: frascos, canetas injetoras e sistema de infusão contínua. Outra temática abordada foi o acondicionamento da insulina em domicílio e seu transporte, os locais de aplicação de insulina e a importância do rodízio para prevenção de lipodistrofias.

Discutiram-se sobre os mitos e verdades acerca da insulinoterapia. Esse momento foi de grande atenção, pois permitiu o esclarecimento de dúvidas, muitas das quais foram consideradas crenças populares. Observou-se que é escassa a informação sobre tal modalidade de tratamento, o que gera mitos, como a sensação de “punição” que a aplicação de insulina representa no imaginário popular, cabendo ao profissional de saúde esclarecer tais pensamentos.

Mapa 4 - Entendendo os muitos fatores do controle do diabetes

O mapa “Entendendo os muitos fatores do controle da diabetes” expôs de maneira lúdica as problemáticas das complicações crônicas macrovasculares e microvasculares por meio de um vulcão em erupção em uma ilha, a qual denominou-se “ilha das complicações”. Os fatores de risco para essas complicações foram colocados como desencadeadores da erupção do vulcão.

Logo abaixo da ilha das complicações, colocou-se um barco que está navegando entre os fatores de risco modificáveis e não modificáveis. Com base nisso, o facilitador gerou uma discussão acerca de como as mudanças no estilo de vida previnem as complicações. Além disso, foi enfatizado no mapa a importância da realização de exames periódicos, como a glicemia em jejum, hemoglobina glicada (HbA1c), triglicerídeos e colesterol, para acompanhamento e rastreamento dessas complicações. A fim de facilitar a educação, foram utilizados os cartões com os valores de referência.

Por fim, o barco chegou ao destino: uma outra ilha, agora a que todos almejam, em que os fatores de risco modificáveis estavam controlados, juntamente com a prática da dieta e do exercício físico e com a utilização dos medicamentos prescritos.

Pelo uso desse mapa de conversação, foram construídas sessões de grupo com o cotidiano, nas quais os participantes demostraram interesse pela temática e discutiram sobre os fatores de risco para o desenvolvimento de complicações. Os usuários, muitas vezes, discorreram sobre assuntos que não são relatados nas consultas individuais, pois eles veem-se a si por meio do relato do outro e quando se expressam, percebem que não estão sozinhos, outros também passam pelas mesmas dificuldades. Mediante a empatia e a fala do outro, o participante constrói saberes e práticas para o dia a dia.

Mapa 5 – O diabetes e o cuidado com os pés

O mapa “O diabetes e o cuidado com os pés” trouxe em seu percurso abordagens lúdicas por meio dos seguintes temas: Observando os pés; Limpando e cuidando dos pés; Proteja os pés; No consultório médico ou na clínica de pés. Isso possibilita que o diabético aprenda sobre os cuidados com os pés por meio de situações cotidianas.

Na temática “Observando os pés”, o mediador discutiu com o grupo sobre a forma correta de visualização do pé, auxiliando na identificação de sinais de alerta, como calosidades, pele desidratada e diminuição de sensibilidade do membro; e na presença dos mesmos, foi mostrado como intensificar os cuidados no domicílio e em que momento procurar atendimento de saúde. Durante a discussão do tema, o grupo compartilhou experiências daqueles que já realizaram as práticas e vivências discutidas.

No tópico “Limpando e cuidando dos pés”, foram realizadas discussões e compartilhamento de experiências no que diz respeito às ações preventivas e a como cuidar das particularidades dos pés; os participantes foram orientados a realizar a higiene e hidratação do membro e cuidados com as unhas. Quando o mediador passou pelo trajeto “Proteja os pés”, foi enfatizada a importância da realização da proteção do pé, por meio de sapatos e meias adequadas e do uso de filtro solar no membro. Seguindo o trajeto do mapa, chegou-se ao tópico “No consultório médico ou na clínica de pés”, sendo enfatizada a necessidade de acompanhamento por profissionais qualificados e especializados para realização do rastreio anual de alterações morfológicas, sensoriais e circulatórias dos diabéticos.

Durante a utilização do mapa, evidenciou-se que a maioria dos indivíduos desconhecia as práticas apresentadas e compartilhadas, porém já haviam vivenciado em algum momento situações de risco, como uso inadequado de calçados, formações de calosidades e sua evolução para ferimentos.

DISCUSSÃO

Os programas de educação continuada com idosos diabéticos têm, entre seus objetivos, facilitar a adesão ao tratamento, diminuir as complicações decorrentes da doença e melhorar a qualidade de vida. Corroborando tal ideia, alguns estudos evidenciaram a melhoria na adesão ao tratamento e no controle da doença por meio da utilização da tecnologia educativa “Mapa de conversação em diabetes”.

Um estudo experimental realizado na Austrália evidenciou melhoria estatisticamente significativa da hemoglobina glicada na educação realizada com os mapas, quando comparada com a educação convencional. Os resultados também demonstraram melhora em relação ao conhecimento, às atividades de autocuidado e à capacitação dos usuários(77 Kewming S, D’Amore A, Mitchell EKL. Conversation Maps and Diabetes Education Groups: An Evaluation at an Australian Rural Health Service. Diabetes Spectr [Internet]. 2016[cited 2017 Jan 25];29(1):32-6. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4755459/
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).

Em um ensaio clínico controlado realizado na Grécia, em 2015, em que se utilizaram Mapas de Conversação em grupos de pacientes DM2 (n = 193), objetivou-se avaliar a eficácia dos mapas de conversação ao compará-los com a educação individual, por meio da avaliação de valores de hemoglobina glicada, índice de massa corporal (IMC) e perfil lipídico. O estudo evidenciou diminuição significativa nos valores de HbA1c ao término dos encontros e aumento do número de pacientes com HbA1c < 7 em follow-up nos participantes do grupo de intervenção. Não houve evidências quanto às alterações de IMC nos seis meses após o estudo. No entanto, ocorreu diminuição dos valores de IMC ao fim do grupo de intervenção. Apenas o HDL apresentou variação significativa nos dois grupos. O grupo de intervenção apresentou diminuição significativa nos valores de triglicérides e LDL, já os valores de HDL diminuíram após seis meses no grupo-controle(88 Merakou K, Knithaki A, Karageorgos G, Theodoridis D, Barbouni A. Group patient education: effectiveness of a brief intervention in people with type 2 diabetes mellitus in primary health care in Greece: a clinically controlled trial. Health Educ Res [Internet]. 2015[cited 2017 Jan 26];30(2):223-32. Available from: https://academic.oup.com/her/article-lookup/doi/10.1093/her/cyv001
https://academic.oup.com/her/article-loo...
).

Em outro estudo randomizado, realizado na China, também foi possível demonstrar a importância dos Mapas de Conversação no controle do DM. Utilizaram-se dois grupos: um grupo-intervenção, em que ocorreram sessões de educação em diabetes com mapa de conversação com uma hora de duração por quatro semanas; e o grupo-controle, que passou por educação convencional com igual duração e período. Participaram deste estudo 46 diabéticos, sendo avaliados após os 3 e 6 meses da intervenção. Foi possível observar que o grupo-intervenção, em relação ao grupo-controle, obteve significativa melhora na escala de angústia do diabetes, pontuação maior em relação ao conhecimento sobre a patologia. A HbA1c, após os três meses de intervenções, foi significativamente menor no grupo-intervenção, comparado ao grupo-controle(99 Li F, Yao P, Hsue C, Xu J, Lou Q. Impact of “Conversation Maps” on diabetes distress and self-efficacy of Chinese adult patients with type 2 diabetes: a pilot study. Patient Prefer Adherence [Internet]. 2016[cited 2017 Jan 26];10:901-8. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4889097/
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/article...
).

As práticas educativas realizadas com idosos e familiares, por meio dos mapas de conversação, favoreceram a integração da equipe multidisciplinar com os participantes, proporcionando um ambiente dinâmico e empático para a troca de experiências, elucidação de dúvidas e mudanças comportamentais no cotidiano para o controle do diabetes.

O envelhecimento acarreta uma diminuição da autonomia dos indivíduos. Como a maioria dos pacientes idosos portadores de doenças crônicas vivem em condições socioeconômicas desfavoráveis, estes demandam cuidados complexos da equipe de saúde para otimizar o cuidado. Cabe ao profissional envolver os cuidadores e familiares responsáveis pelos idosos, estimulando-os a participar das consultas e das atividades educativas, como o mapa de conversação, transmitindo conhecimento e enfatizando a importância do seu papel na vida dele(1010 Costa NP, Polaro SHI, Vahl EAC, Gonçalves LHT. Storytelling: a care technology in continuing education for active ageing. Rev Bras Enferm [Internet]. 2016[cited 2017 Feb 05];69(6):1132-39. Available from: http://www.scielo.br/pdf/reben/v69n6/en_0034-7167-reben-69-06-1132.pdf
http://www.scielo.br/pdf/reben/v69n6/en_...
).

O paciente idoso com DM deve ser assistido de forma diferenciada. Dentre os principais objetivos da atenção ao idoso com diabetes, destaca-se o estímulo ao resgate da autonomia, de maneira a favorecer o processo de empoderamento para o autocuidado e a adesão ao tratamento. Para tal, o usuário deve conhecer a doença, as potenciais complicações e seu manejo adequado, bem como a importância do tratamento farmacológico para melhor controle metabólico.

A atividade em grupo e a discussão interativa propiciam flexibilidade para discutir tópicos mais relevantes, evidenciando um campo potencial de terapêutica e aprendizagem; assim, ocorre a integração dos saberes de pacientes, alunos e docentes(33 Sociedade Brasileira de Diabetes. SBD. Diretrizes da Sociedade Brasileira de Diabetes: 2015-2016. [Internet]. São Paulo: AC Farmacêutica. 2016[cited 2017 Jan 03]. Available from: http://www.diabetes.org.br/profissionais/images/pdf/DIRETRIZES-SBD-2015-2016.pdf
http://www.diabetes.org.br/profissionais...
). Durante as oficinas realizadas, observou-se boa interação entre usuários e facilitadores, em que se gerou um clima harmônico e de confiança, de forma a contribuir para a aquisição de conhecimento e responsabilidade do autocuidado.

Limitações do estudo

Dentre as restrições, pode-se destacar o tempo para implementação dos mapas, visto que as oficinas foram realizadas antes das consultas médicas, o que criou, muitas vezes, um clima de ansiedade entre os usuários.

Contribuições para a área da saúde

O mapa de conversação permite ao profissional de saúde realizar o empoderamento do paciente com diabetes e, assim, promover o autocuidado e garantir melhor controle da doença, de forma a prevenir ou retardar o surgimento das complicações relacionadas. Por ser um instrumento validado pela Federação Internacional de Diabetes, ele torna a estratégia do grupo educativo uma prática baseada em evidências, já sendo sua eficácia comprovada em outros estudos.

CONSIDERAÇÃOES FINAIS

A utilização do mapa de conversação em diabetes permitiu observar a visão que os usuários têm sobre a própria doença. Evidenciou-se que os mesmos se interessavam mais pelos conselhos dos participantes do que pelo convencional discurso dos profissionais. A experiência da utilização do mapa foi engrandecedora para equipe multiprofissional, pois possibilitou o aprendizado sociocultural dos pacientes envolvidos, aproximando-os.

Foram abordados temas presentes na vida do diabético, como a fisiopatologia da doença, o tratamento, as complicações, a alimentação, os exercícios, os cuidados com os pés, os problemas psicológicos, entre outros. Enfim, promoveu-se um ambiente livre de preconceitos e estigmas, permitindo a participação dos doentes, o que implica aprendizado sobretudo entre eles.

Portanto, sugere-se a realização de novos estudos, principalmente a nível nacional, sobre a implementação dos mapas de conversação em indivíduos com outros tipos de doenças crônicas não transmissíveis, no intuito de demonstrar as vantagens e o impacto dessa tecnologia leve-dura na promoção da saúde.

REFERENCES

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2018

Histórico

  • Recebido
    07 Mar 2017
  • Aceito
    09 Jul 2017
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