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Implicações na voz e na deglutição de pacientes com tumores no mediastino

RESUMO

Objetivo:

verificar as implicações na voz e na deglutição em pacientes com diagnóstico de tumores localizados no mediastino.

Métodos:

o estudo foi realizado em 21 indivíduos com idades entre 18 e 60 anos, com diagnóstico de tumores localizado no mediastino. A coleta de dados foi realizada nos ambulatórios de Oncologia Clínica, OncoHematologia e Cirurgia Torácica Oncológica, e nas enfermarias das clínicas acima mencionadas de um hospital de referência em Oncologia. Os dados foram obtidos por meio da aplicação de um questionário próprio para a pesquisa, e da avaliação da voz e da deglutição, por meio dos protocolos CAPE-V e O’Neil, respectivamente.

Resultados:

houve maior prevalência do sexo feminino com média de idade aos 40 anos. Observou maior prevalência de tumores na região anterior do mediastino e dos linfomas do tipo não Hodgkin, no entanto, os linfomas do tipo Hodgkin apresentaram piores resultados em todos os parâmetros da avaliação de voz. Quanto à disfagia, 14 sujeitos apresentaram algum grau de disfagia, compreendendo da disfagia discreta a moderada.

Conclusão:

pacientes com tumores no mediastino apresentam comprometimentos significantes nas funções de voz e deglutição, principalmente nos tumores localizadas na região anterior do mediastino e Linfomas do tipo Hodgkin.

Descritores:
Voz; Deglutição; Neoplasias do Mediastino; Fonoaudiologia

ABSTRACT

Purpose:

to verify voice and swallowing implications in patients diagnosed with tumors in the mediastinum.

Methods:

the study was carried out with 21 individuals aged between 18 and 60 years, with a diagnosis of tumors in their mediastinum. Data collection was performed at Oncology, OncoHematology and Thoracic Oncology Surgery ambulatory, and in the wards of the aforementioned clinics at an oncology reference hospital. The data was obtained by applying a questionnaire, and by evaluating voice and swallowing, using CAPE-V and O'Neil protocols, respectively.

Results:

there was a higher prevalence of females with mean age at 40 years. A higher prevalence of tumors in the anterior region of the mediastinum and non-Hodgkin's lymphomas was found, however, Hodgkin's lymphomas presented worse results in all the parameters of the voice evaluation. Fourteen subjects presented some degree of dysphagia, ranging from mild to moderate.

Conclusion:

patients with tumors in the mediastinum have significant impairments in voice and swallowing functions, especially when they are located in the anterior mediastinal region and Hodgkin lymphomas.

Keywords:
Voice; Swallowing; Mediastinum Neoplasms; Speech, Language and Hearing Therapy

Introdução

Os tumores malignos mediastinais são raros (75% dos casos são benignos), frequentemente assintomáticos e ocorrem predominantemente em adultos11. Figueiredo E, Monteiro M, Ferreira A. Tratado de oncologia. Revinter. 1ª Edição; 2013.. Segundo Oliveira, Oliveira e Pietro22. Oliveira HE, Oliveira CH, Pietro D. Associated factors to survival of patients with mediastinal tumors. Arq. Catarin Med. 2017;46(3):2-16., as massas mediastinais incluem uma grande variedade de tumores. Esses tumores podem ser congênitos ou adquiridos, de origem primária ou secundária. As massas mais comuns no mediastino incluem timoma, linfoma, feocromacitoma, tumores de células germinativas e lesões paratireóides.

O espaço do mediastino é estreito e qualquer massa nesta região pode comprimir as estruturas adjacentes levando a emergências que ameçam a vida33. Dubashi B, Cyriac S, Tenali SG. Clinicopathological analysis and outcome of primary mediastinal malignancies - a report of 91 cases from a single institute. Ann Thorac Med. 2009;4(3):140-2.. Os sinais e sintomas mais frequentes envolvem alterações respiratórias, dor torácica, emagrecimento e distúrbios neurológicos11. Figueiredo E, Monteiro M, Ferreira A. Tratado de oncologia. Revinter. 1ª Edição; 2013.. Outros sinais e sintomas que podem apresentar impactos diversos na qualidade de vida dos sujeitos com tumores em mediastino são: disfagia por compressão do esôfago, síndrome da veia cava superior, invasão do pericárdio gerando tamponamento e disfonia por compressão brônquica44. Bastos P, Magalhães A, Fernandes G, Cruz MR, Saleiro S, Gonçalves L et al. Cistos e tumores primários do mediastino. Revista Portuguesa de Pneumología. 2007;13(5):659-73.

5. Moraes RM, Tavares MRF, Vita AG, Bernardi Junior C, Sellera CAC, Ribeiro AT. Symptomatic thoracic mass in young adult: giant mediastinal teratoma. Case report. Rev Bras Clin Med. 2011;9(2):154-6.
-66. Bokemeyer C, Nichols CR, Droz JP. Extragonadal germ cell tumors of the mediastinum and retroperitoneum: results from an international analysis. J Clin Oncol. 2002;20(7):1864-73..

Contudo, o surgimento desses sintomas dependerá do tipo histológico da doença, da localização do tumor e do grau de comprometimento nervoso77. Serrano AE, Arostigue AD, Crespo EC, Martínez VL. Enfermedad de Hodgkin primitiva de mediastino. Reporte de un caso. Archivo Médico de Camagüey. 2007;11(5):1-7.,88. Aguirre MB, Pérez GR. Hodgkin pulmonar bilateral. Rev. Clin Esp. 2002;176(5):262-4.. Nesse estudo, delimitou-se a pesquisa nas funções de voz e deglutição em indivíduos com tumores no mediastino.

A disfonia é caracterizada como qualquer perturbação na produção vocal que pode apresentar sintomas de diferentes graus, originados ou agravados por fatores de risco ambientais, comportamentais e/ou traumáticos99. Lopes LW, Silva HF, Evangelista DS, Silva JD, Simões LB, Costa e Silva PO et al . Relationship between vocal symptoms, severity of voice disorders, and laryngeal diagnosis in patients with voice disorders. CoDAS. 2016; 28(4):439-45.. Além de comprometer funcionalmente a qualidade vocal, alterações no mecanismo laríngeo podem resultar em riscos para a proteção de vias aéreas inferiores (VAI), visto que, a laringe assume a importante função de proteção de VAI, respiração e fonação, respectivamente.

Diante disto, alterações na mobilidade laríngea pode desenvolver alteração na deglutição segura, conhecido como disfagia. Estando associado ao alto risco de mortalidade, se não diagnosticado precocemente99. Lopes LW, Silva HF, Evangelista DS, Silva JD, Simões LB, Costa e Silva PO et al . Relationship between vocal symptoms, severity of voice disorders, and laryngeal diagnosis in patients with voice disorders. CoDAS. 2016; 28(4):439-45.,1010. Cohen SM, Pitman MJ, Noordzij JP, Courey M. Management of dysphonic patients by otolaryngologists. Otolaryngol Head Neck Surg. 2012;147(2):289-94..

A disfagia é uma desordem na deglutição, que envolve uma atividade complexa de ações voluntárias e involuntárias coordenadas, envolvendo estruturas neuromusculares da região orofaringolaríngea e do esôfago. Essa alteração pode resultar na entrada do alimento na via aérea, apresentando-se como tosse, sufocação/asfixia, problemas pulmonares e aspiração1111. Bordon A, Bokhari R, Sperry J, Testa D, Feinstein A, Ghaemmaghami V. Swallowing dysfunction after prolonged intubation: analysis of risk factors in trauma patients. Am J Surg. 2011;202(6):679-82.,1212. Brown CVR, Heji K, Mandaville AD, Chaney PE, Stevenson G, Smith C. Swallowing dysfunction after mechanical ventilation in trauma patients. J Crit Care. 2011;26(1):9-13..

Assim sendo, o objetivo desse estudo foi verificar as implicações na voz e na deglutição em pacientes com tumores localizados no mediastino.

Métodos

Estudo de corte transversal e de caráter observacional, composto por 21 indivíduos de 18 a 60 anos de idade, com diagnóstico de tumores no mediastino em um Hospital de Referência em Oncologia no estado de Pernambuco. Aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Sociedade Pernambucana de Combate ao Câncer sob nº 1.443.356. Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido antes do início da coleta de dados.

A pesquisa é de caracterização e constou incialmente de duas etapas: 1. Investigação dos sujeitos por meio do Registro Hospitalar de Câncer da instituição referida; 2. Coleta direta durante as consultas nos ambulatórios da Oncologia Clínica, OncoHematologia e Cirurgia Torácica Oncológica, conforme os critérios de elegibilidade do estudo.

Participaram da pesquisa indivíduos de ambos os sexos, com idade entre 18 a 60 anos e com diagnóstico de tumores em mediastino. Já os critérios de exclusão foram: sujeitos com diagnóstico de tumores acometendo cavidade oral, orofaringe, laringe, tireóide, esôfago e pulmão, concomitantemente ao tumor em mediastino; pacientes submetidos a tratamento radioterápico em região de cabeça e pescoço; indivíduos com comprometimento neurológico e pacientes traqueostomizados.

A pesquisa constou inicialmente do preenchimento de um questionário específico elaborado para o estudo, sendo composta por dados de identificação e clínicos, como tipo de tumor, localização no mediastino e tratamento oncológico realizado, em seguida foram avaliadas a voz e a deglutição por meio de protocolos específicos.

Para registro vocal foi utilizado o gravador digital Zoom portátil e para avaliação vocal foi utilizada a escala CAPE-V (Auditory- Perceptual Evaluation of voice), adaptada ao português em 20041313. Behlau M. Consensus auditory-perceptual evaluation of voice (CAPE-V), ASHA 2003. Rev Soc Bras Fonoaudiologia. 2004;9(3):187-9.. Este protocolo para avaliação perceptiva-auditiva da voz é composto por parâmetros que avaliam subjetivamente o grau geral de desvio da voz, rugosidade, soprosidade, tensão, pitch, loudness e ressonância, contemplando uma tendência atual ao utilizar a escala analógica-visual de 100 mm na classificação desses parâmetros1313. Behlau M. Consensus auditory-perceptual evaluation of voice (CAPE-V), ASHA 2003. Rev Soc Bras Fonoaudiologia. 2004;9(3):187-9.,1414. Menezes MHM. Análise perceptivo-auditiva e acústica da voz relacionada ao tempo de execução do exercício de vibração sonorizada de língua em mulheres com nódulos vocais [Tese]. São Paulo (SP): Faculdade Medicina da Universidade de São Paulo; 2010.. A análise dos dados será composta pela média aritmétrica ponderada entre os diferentes grupos estudados, sendo diagnóstico, tipo de tumor, tipo de linfoma e localização do tumor no mediastino.

Na realização da avaliação foi utilizado um gravador próprio, onde o participante foi instruído a permanecer sentado, e, em seguida, solicitado que o sujeito emitisse as vogais sustentadas /a/ e /i/ durante 3 a 5 segundos; Além da leitura de seis frases predeterminadas: Érica tomou suco de pêra e amora; Sonia sabe sambar sozinha; Olha lá o avião azul; Agora é hora de acabar; Minha mãe namorou um anjo e Papai trouxe pipoca quente. E trechos da fala espontânea. A avaliação desses parâmetros foi computada no CAPE-V1414. Menezes MHM. Análise perceptivo-auditiva e acústica da voz relacionada ao tempo de execução do exercício de vibração sonorizada de língua em mulheres com nódulos vocais [Tese]. São Paulo (SP): Faculdade Medicina da Universidade de São Paulo; 2010. a partir da escuta de dois avaliadores.

Já para avaliação funcional da deglutição foi utilizada a escala do grau de gravidade da disfagia (O’Neil)1515. O'Neil KH, Purdy M, Falk J, Gallo L. The dysphagia outcome and severity scale. Dysphagia. 1999;14(3):139-45., apesar desta ferramenta ser desenvolvida para avaliação objetiva da deglutição, devido à ausência de outros instrumentos, esta vem se apresentando como uma excelente e completa alternativa dentre os instrumentos disponíveis para estudos. Além disso, essa escala é considerada como uma valiosa ferramenta com alta confiabilidade para medir a eficácia do tratamento de pacientes disfágicos. Sendo possível classificar a deglutição entre normal à disfagia orofaríngea severa, sendo do nível I ao nível VII, respectivamente.

Para avaliação funcional foram consideradas diferentes consistências, sendo padronizados os seguintes alimentos e volumes: pastoso (50 ml de água associado à espessante alimentar “thicken up consistência pudim); sólido (uma bolacha integral) e líquido (50 ml de água). Durante avaliação, os sujeitos se mantiveram sentados, sendo observados sinais indicativos de alteração na deglutição, como tosses, pigarros, espirros, aumento de frequência respiratória, mudança na qualidade vocal e alteração na ausculta cervical. Na realização da ausculta cervical, método não invasivo, utilizou-se um estetoscópio que foi posicionado na borda lateral da traqueia, imediatamente inferior à cartilagem cricóide, auxiliando na ocorrência de aspirações e penetrações laríngeas. Finalizada a avaliação, os parâmetros foram classificados na escala O’Neil1515. O'Neil KH, Purdy M, Falk J, Gallo L. The dysphagia outcome and severity scale. Dysphagia. 1999;14(3):139-45..

Para análise dos dados foi construído um banco na planilha Microsoft Excel a qual foi exportada para o software SPSS. A normalidade do escore foi avaliada por meio do teste de Kolmogorov-Smirnov e, nos casos em que foi indicada a normalidade, aplicou-se o teste t de student e o teste da ANOVA para comparar a média do escore dos parâmetros. Nos casos em que não foi indicada a normalidade dos escores dos parâmetros avaliados, aplicou-se o teste de Mann-whitney e o teste de Kruskal-Wallis. Todas as conclusões foram tiradas considerando o nível de significância de 5%.

Resultados

A amostra foi composta por vinte e um sujeitos, onde 11 dos pacientes pertenciam ao sexo feminino e possuíam idade maior de 40 anos ou mais. Observa-se que, em média, os pacientes possuíam idades de 40,1 anos com desvio padrão de 11,7 anos (Tabela 1).

Como pode verificar ainda na Tabela 1, dos tumores localizados em mediastino, 16 sujeitos apresentavam tumor primário localizado no mediastino, sem evidência de doença em outros locais. O linfoma apresentou prevalência de onze casos dos tipos de tumores encontrados no estudo, dos quais oito eram do tipo Não Hodgkin e três do tipo Hodgkin. Outros tipos de tumores também foram encontrados, como o carcinoma, timoma e teratoma.

Tabela 1:
Caracterização da amostra e do perfil clínico dos pacientes

Em relação à localização do tumor no mediastino, o estudo demonstrou que quatorzes estavam na região ântero-superior, seguido da região média e posterior. O teste de comparação de proporção foi significante no que se refere ao diagnóstico e local de tumor (p-valor < 0,001 e = 0,004, respectivamente), conforme Tabela 1.

Na análise dos parâmetros vocais, as lesões que ocuparam a região anterior/ântero-superior apresentaram maiores médias do escore nos seguintes parâmetros: Desvio geral da voz, rugosidade, soprosidade e na loudness. Para tensão e pitch houve maiores médias no grupo de sujeitos com tumores localizados no mediastino médio, conforme Tabela 2.

Em relação ao tipo de tumor, os sujeitos com diagnóstico de linfoma apresentaram maiores médias no desvio geral e na rugosidade da voz. Sendo o linfoma do tipo Hodgkin responsável pelas maiores médias em todos os parâmetros avaliados. Os sujeitos com tumores do tipo carcinoma apresentaram piores resultados quanto à tensão e ao pitch, os timomas na soprosidade e os demais tipos de tumores na loudness (Tabela 2). Não houve correlação significante tanto em relação à localização e o tipo do tumor.

Tabela 2:
Média e desvio padrão dos parâmetros de desempenho vocal segundo o perfil clínico dos pacientes com tumores em mediastino

Na avaliação da deglutição, conforme dados apresentados na Figura 1, é possível observar que as variáveis deglutição normal e deglutição funcional representaram dez sujeitos da amostra. Ainda, observa-se que outros dez sujeitos apresentaram disfagia orofaríngea discreta a discreta/moderada, e um sujeito apresentou disfagia orofaríngea moderada, segundo classificação da O’Neil1515. O'Neil KH, Purdy M, Falk J, Gallo L. The dysphagia outcome and severity scale. Dysphagia. 1999;14(3):139-45..

Figura 1:
Distribuição do escore de deglutição, segundo escala de deglutição O'Neil

Dos sinais clínicos da disfagia, o estudo mostrou que três sujeitos apresentaram sinais clínicos de aspiração e/ou penetração laríngea, com tosse voluntária após ingesta do alimento e ausculta cervical ruidosa, com melhora após compensações adequadas, necessitando de manobras para clearence faríngeo completo, como a manobra de Shaker, deglutições múltiplas e de esforço.

Dos vinte e um sujeitos, 7 apresentaram aumento no tempo de trânsito oral, sinais broncoaspirativos, sem melhora com manobras de proteção de vias aéreas inferiores em uma única consistência, sendo esta líquida. Além disto, outros quatro sujeitos apresentaram sinais clínicos broncoaspirativos em duas consistências, tosse fraca, sendo necessária suplementação com via alternativa, esses achados correspondem as disfagias orofaríngeas discreta/moderada e moderada, respectivamente.

Discussão

Os tumores no mediastino apresentam taxas elevadas de morbidade e mortalidade devido à aproximação de estruturas torácicas importantes. Os principais sintomas que podem ser encontrados estão relacionados à dificuldade na respiração, tosse, febre, perda de peso, rouquidão, estridor, sintomas posturais, síndrome da veia cava superior, disfagia e compressão traqueal 55. Moraes RM, Tavares MRF, Vita AG, Bernardi Junior C, Sellera CAC, Ribeiro AT. Symptomatic thoracic mass in young adult: giant mediastinal teratoma. Case report. Rev Bras Clin Med. 2011;9(2):154-6.

6. Bokemeyer C, Nichols CR, Droz JP. Extragonadal germ cell tumors of the mediastinum and retroperitoneum: results from an international analysis. J Clin Oncol. 2002;20(7):1864-73.
-77. Serrano AE, Arostigue AD, Crespo EC, Martínez VL. Enfermedad de Hodgkin primitiva de mediastino. Reporte de un caso. Archivo Médico de Camagüey. 2007;11(5):1-7.,1616. Rajagopalan S, Harbott M, Ortiz J, Bandi V. Manejo anestésico de grande massa mediastinal para colocação de stent traqueal. Rev Bras Anestesiol. 2016;66(2):215-8..

No presente estudo foi verificado a prevalência do sexo feminino com média de idade aproximada aos 40 anos, com isso, o perfil dos sujeitos se contrapõe ao de outras pesquisas66. Bokemeyer C, Nichols CR, Droz JP. Extragonadal germ cell tumors of the mediastinum and retroperitoneum: results from an international analysis. J Clin Oncol. 2002;20(7):1864-73.,1717. Macchiarini P, Ostertag H. Uncommon primary mediastinal tumours. Lancet Oncol. 2004;5(2):107-18.,1818. Moran CA, Suster S, Koss MN. Primary germ cell tumors of the mediastinum: III. Yolk sac tumor, embryonal carcinoma, choriocarcinoma, and combined nonteratomatous germ cell tumors of the mediastinum-a clinicopathologic and immunohistochemical study of 64 cases. Cancer. 1997;80(4):699-707., que apresentam, em sua maioria, uma população com homens jovens entre 15 e 35 anos, principalmente na segunda e terceira décadas de vida. Já o estudo de Bokemeyer66. Bokemeyer C, Nichols CR, Droz JP. Extragonadal germ cell tumors of the mediastinum and retroperitoneum: results from an international analysis. J Clin Oncol. 2002;20(7):1864-73. menciona que esses tumores não apresentam predilação por sexo, sendo mais prevalentes tumores malignos na população masculina.

O estudo com 171 pacientes, 100 (58%) tinham tumores localizados no mediastino ântero-superior, seguido do mediastino posterior e por último, mediastino médio. Sendo os tumores mais frequentes, timomas, linfomas e os teratomas. Dentre eles, o linfoma se manifesta como o tumor com maior prevalência no estudo, principalmente em tumores nas regiões ântero-superior e médio 44. Bastos P, Magalhães A, Fernandes G, Cruz MR, Saleiro S, Gonçalves L et al. Cistos e tumores primários do mediastino. Revista Portuguesa de Pneumología. 2007;13(5):659-73..

Tais achados corroboram parcialmente com a pesquisa desenvolvida, sendo verificado que houve prevalência significante de tumores localizados no mediastino ântero-superior, e os principais tipos de tumores presentes foram os linfomas, carcinoma, timomas e os Teratomas, respectivamente. Dentre os linfomas, o mais prevalente foi do tipo Não Hodgkin.

Devido às diferenças no estadiamento clínico de cada tipo histológico presente na pesquisa, não foi possível classificar o tipo de tratamento conforme o estágio tumoral.

Diante da análise vocal realizada no estudo, verificaram piores resultados vocais em tumores localizados apenas em mediastino, nos linfomas (principalmente do tipo Hodgkin) e nos tumores localizados no mediastino ântero-superior. De modo geral, a diminuição do rendimento vocal ou intensidade do desvio vocal apresentados pelos sujeitos do estudo, podem refletir na fisiologia da laringe, diminuindo a realização eficiente das suas funções principais (respiração, fonação e proteção de vias aéreas inferiores)99. Lopes LW, Silva HF, Evangelista DS, Silva JD, Simões LB, Costa e Silva PO et al . Relationship between vocal symptoms, severity of voice disorders, and laryngeal diagnosis in patients with voice disorders. CoDAS. 2016; 28(4):439-45.,1010. Cohen SM, Pitman MJ, Noordzij JP, Courey M. Management of dysphonic patients by otolaryngologists. Otolaryngol Head Neck Surg. 2012;147(2):289-94..

O parâmetro da rugosidade na voz relaciona-se pela energia aperiódica nas pregas vocais e pode está relacionada com aspereza e /ou rouquidão. Na presente pesquisa foi registrado desvio de grau moderado na rugosidade (50,71 mm), sendo a rouquidão um dos sintomas mais citados nos estudos de pacientes com tumores localizados no mediastino77. Serrano AE, Arostigue AD, Crespo EC, Martínez VL. Enfermedad de Hodgkin primitiva de mediastino. Reporte de un caso. Archivo Médico de Camagüey. 2007;11(5):1-7.,1616. Rajagopalan S, Harbott M, Ortiz J, Bandi V. Manejo anestésico de grande massa mediastinal para colocação de stent traqueal. Rev Bras Anestesiol. 2016;66(2):215-8.. Apesar disto, este parâmetro não foi avaliado a partir de nenhum protocolo específico nos estudos apresentados.

Com relação à soprosidade, evidenciou-se que tumores no mediastino da região ântero-superior e linfomas do tipo Hodgkin apresentaram piores resultados neste parâmetro vocal. Este dado se mostra um importante parâmetro na avaliação dos sinais que comprometem funcionalmente a deglutição. Isto ocorre porque a proteção das vias aéreas depende do equilíbrio de mecanismos indireto, dentre eles a competência glótica1919. Chin SC, Edelstein S, Chen CY. Using to localize side and level of vocal cord paralysis. AJR Am J Roentgenol. 2003;180(4):1165-70..

A partir dos sinais clínicos da disfagia apresentados, pode-se verificar que quatorze sujeitos do estudo apresentavam algum grau de disfagia, desde a deglutição funcional à disfagia moderada segundo escala O’Neil1515. O'Neil KH, Purdy M, Falk J, Gallo L. The dysphagia outcome and severity scale. Dysphagia. 1999;14(3):139-45.. Com isso, pode-se sugerir que a presença da voz soprosa pode está relacionada com a prevalência das disfagias no grupo estudado.

A tosse reflexa durante e após a deglutição é o mecanismo clássico da defesa da aspiração por disfagia orofaríngea2020. Padovani AR, Moraes DP, Mangili LD, Andrade CRF. Protocolo fonoaudiológico de avaliação do risco para disfagia (PARD). Rev. Soc Bras Fonoaudiol. 2007;12(3):199-205.,2121. Garcia MM, Magalhaes FP, Dadalto GB, Moura MVT. Avaliação por imagem da paralisia de pregas vocais. Radiol Bras. 2009;42(5):321-6.. No estudo foi possível identificar a frequência deste sintoma em dez sujeitos do estudo. Sendo este indicador da existência da sensibilidade laríngea e da habilidade de limpeza de vias aéreas. Apesar disto, sua presença não significa limpeza total do conteúdo de via aérea, mostrando-se como principal alteração da disfagia desse estudo.

Comparado ao mecanismo de tosse, o estudo apresentou alteração na ausculta cervical em quatorze sujeitos da amostra, sendo uma importante prática referida na literatura durante atuação fonoaudiológica e mostra-se como uma ferramenta eficaz para complementar a avaliação da deglutição2222. Gasparim AZ, Jurkiewicz AL, Marques JM, Santos RS, Marcelino PCO, Herrero FJ. Deglutition and cough in different degrees of Parkinson disease. Arq. Int. Otorrinolaringol. 2011;15(2):181-8.,2323. Mirzakhani H, Williams JN, Mello J, Joseph S, Meyer MJ, Waak K et al. Muscle weakness predicts pharyngeal dysfunction and symptomatic aspiration in long-term ventilated patients. Anesthesiology. 2013;119(2):389-97..

O quadro disfágico denota como importante fator de risco para aumento do período de internação e aumento dos casos de mortalidade. Sendo identificado como uma área de importantes pesquisas devido à influência negativa sobre o prognóstico clínico do paciente2323. Mirzakhani H, Williams JN, Mello J, Joseph S, Meyer MJ, Waak K et al. Muscle weakness predicts pharyngeal dysfunction and symptomatic aspiration in long-term ventilated patients. Anesthesiology. 2013;119(2):389-97.

24. Logemann JA. Oropharyngeal dysphagia and nutritional management. Current Opinion Clin Nutr Metabolic Care. 2007;10(5):611-4.
-2525. Moraes DP, Sassi FC, Mangilli LD, Zilberstein B, Andrade CR. Clinical prognostic indicators of dysphagia following prolonged orotracheal intubation in ICU patients. Crit Care. 2013;17(5):243..

Neste sentido, não encontrou-se outros estudos específicos relacionados à voz e deglutição para confrontar com os dados da presente pesquisa. No entanto, pode-se perceber que a literatura relaciona a presença da disfagia em tumores no mediastino apenas devido ao comprometimento da região esofágica55. Moraes RM, Tavares MRF, Vita AG, Bernardi Junior C, Sellera CAC, Ribeiro AT. Symptomatic thoracic mass in young adult: giant mediastinal teratoma. Case report. Rev Bras Clin Med. 2011;9(2):154-6.

6. Bokemeyer C, Nichols CR, Droz JP. Extragonadal germ cell tumors of the mediastinum and retroperitoneum: results from an international analysis. J Clin Oncol. 2002;20(7):1864-73.

7. Serrano AE, Arostigue AD, Crespo EC, Martínez VL. Enfermedad de Hodgkin primitiva de mediastino. Reporte de un caso. Archivo Médico de Camagüey. 2007;11(5):1-7.
-88. Aguirre MB, Pérez GR. Hodgkin pulmonar bilateral. Rev. Clin Esp. 2002;176(5):262-4. e a rouquidão devido à compressão bilateral brônquica77. Serrano AE, Arostigue AD, Crespo EC, Martínez VL. Enfermedad de Hodgkin primitiva de mediastino. Reporte de un caso. Archivo Médico de Camagüey. 2007;11(5):1-7.. Os achados encontrados nesse estudo, tornando-se importante para utilização de instrumentos objetivos em pesquisas e/ou avaliações clínicas.

Conclusão

Por meio da presente pesquisa é possível identificar que pacientes com tumores localizados em mediastino apresentam potenciais riscos para alterações na voz e na deglutição.

O estudo mostrou um risco aumentado para disfonia, principalmente, em pacientes com diagnóstico de Linfoma, principalmente do tipo Hodgkin, além dos carcinomas e Timomas. Este risco também está relacionado à localização do tumor no mediastino, sendo a região antero-superior com piores resultados na voz.

Quanto à disfagia, mais da metade da população do estudo apresentou algum grau desta alteração, com predominância à disfagia de grau leve e a disfagia de grau discreto a moderado, respectivamente.

A partir disto, sugere-se a realização de novos estudos nessa temática com utilização de instrumentos objetivos, a fim de evidenciar a caracterização dos sujeitos submetidos ao tratamento de tumores no mediastino e a relação das alterações anatomofisiológicas, fortalecendo o processo de investigação das funções de voz e deglutição.

Esses resultados se apresentam como indicadores importantes para direcionamento de novas práticas/cuidados, permitindo ampliar o conhecimento da equipe multiprofissional na identificação precoce das possíveis alterações Fonoaudiológicas, aumentando com isso, a qualidade da assistência e dimuindo os riscos associados com piora do prognóstico a esses sujeitos durante o processo terapêutico.

REFERENCES

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Nov-Dec 2018

Histórico

  • Recebido
    19 Jun 2018
  • Aceito
    03 Out 2018
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