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PARTICIPAÇÃO, PROTAGONISMO E APRENDIZAGEM NA FALA-EM-INTERAÇÃO DE SALA DE AULA EM UMA EQUIPE DE TRABALHO NO ENSINO MÉDIO

PARTICIPATION, PROTAGONISM, AND LEARNING IN A CLASSROOM TALK-IN-INTERACTION WITHIN A HIGH SCHOOL WORKING TEAM

RESUMO

Neste artigo temos como objetivo reconhecer protagonismo e agentividade no trabalho de fazer aprendizagem em dados de fala-em-interação da pesquisa de mestrado de Petermann (2016) realizada em um colégio privado no Paraná que funciona por meio de projetos temáticos de aprendizagem. A perspectiva epistemológica é a da Análise da Conversa Etnometodológica (LODER; JUNG, 2008LODER, L. L.; JUNG, N. M. (Org.). Fala-em-interação social: introdução à Análise da Conversa Etnometodológica. Campinas: Mercado de Letras, 2008., 2009LODER, L. L.; JUNG, N. M. (Org.). Análises de fala-em-interação institucional: a perspectiva da Análise da Conversa Etnometodológica. Campinas: Mercado de Letras, 2009.; SACKS; SCHEGLOFF; JEFFERSON, 2003 SACKS, H.; SCHEGLOFF, E. A.; JEFFERSON, G. Sistemática elementar para a organização da tomada de turnos para a conversa. Veredas, Juiz de Fora, v.7, n.1-2, p.9-73, 2003.). Como resultado os dados apontam para uma nova ordem comunicativa de sala de aula que amplia as possibilidades de participação, agentividade e protagonismo na construção conjunta de conhecimento.

PALAVRAS-CHAVE:
fala-em-interação; participação; protagonismo; aprendizagem

ABSTRACT

In this paper, we aim to recognize the protagonism and agentivity in the learning activity in talk-in-interaction data of Petermann’s master’s research project (2016) held at a private high school in Paraná, which works with thematic learning projects. Our epistemological perspective is Ethnomethodological Conversation Analysis (LODER; JUNG, 2008LODER, L. L.; JUNG, N. M. (Org.). Fala-em-interação social: introdução à Análise da Conversa Etnometodológica. Campinas: Mercado de Letras, 2008., 2009LODER, L. L.; JUNG, N. M. (Org.). Análises de fala-em-interação institucional: a perspectiva da Análise da Conversa Etnometodológica. Campinas: Mercado de Letras, 2009.; SACKS; SCHEGLOFF; JEFFERSON, 1974 SACKS, H.; SCHEGLOFF, E. A.; JEFFERSON, G. Sistemática elementar para a organização da tomada de turnos para a conversa. Veredas, Juiz de Fora, v.7, n.1-2, p.9-73, 2003.). As a result, data point to a new communicative order in classroom that increases the possibilities of participation, agentivity and protagonism in the joint construction of knowledge.

KEYWORDS:
talk-in-interaction; participation; protagonism; learning

1 Considerações iniciais

Os resultados de avaliações de larga escala aplicadas no Ensino Médio, como o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e o Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa, na sigla em inglês), sempre ganham repercussão midiática por exporem a situação desse nível de ensino no Brasil. Em dezembro de 2016, por exemplo, os resultados do Pisa foram midiatizados de forma alarmante, como na matéria da Folha de São Paulo intitulada “Estagnado, Brasil fica entre os piores do mundo em avaliação de educação”1 1 Disponível em: <http://bit.ly/2gCgUle>. Acesso em: 28 dez. 2016. , apresentando o Brasil abaixo da quinquagésima posição entre os 69 países e territórios analisados pelo exame. Além disso, a reportagem a que nos referimos destaca, por meio da fala de Priscila Cruz, presidente do Movimento Todos pela Educação, que o grande desafio do país está na formação e valorização de professores.

Como trabalhamos com uma posição ontológica e epistemológica que concebe o uso da linguagem como ação social por meio da qual os sujeitos se constituem no mundo (CLARK, 2000CLARK, H. O uso da linguagem. Cadernos de Tradução, Porto Alegre, v.9, p. 49-71, 2000.), ratificam ou não papéis institucionais (DREW; HERITAGE, 1992DREW, P.; HERITAGE, J. Analyzing talk at work: an introduction. In: DREW, P.; HERITAGE, J. (Org.). Talk at work: Interaction in institutional settings. Cambridge: Cambridge University Press, 1992. p. 3-65.) e negociam identidades sociais (GUMPERZ, 2013GUMPERZ, J. Convenções de contextualização. In: RIBEIRO, B. T.; GARCEZ, P. M. (Org.). Sociolinguística interacional. São Paulo: Loyola, 2013 [1982]. p.149-182.; GOFFMAN, 2013GOFFMAN, E. Footing. In: RIBEIRO, B. T.; GARCEZ, P.M. (Org.). Sociolinguística interacional. São Paulo: Loyola, 2013 [1981]. p.107-148.; JUNG, 2009JUNG, N. M. A reprodução de identidades sociais na comunidade e na escola. Ponta Grossa: Editora UEPG, 2009.), defendemos que avaliações em larga escala desconsideram as realidades escolares localmente situadas, pois apresentam simplesmente dados obtidos a partir de um olhar panorâmico, em que as mesmas provas são aplicadas para avaliar contextos escolares completamente diferentes, com realidades sociais e culturais muito distintas. Desse modo, para repensar políticas públicas para o Ensino Médio e ou práticas pedagógicas, essas devem(riam) ser precedidas por empreendimentos analíticos que se prestem a entender o que efetivamente está acontecendo no aqui-e-agora em uma sala de aula. Há muita política educacional local e protagonismo estudantil que não são visibilizados por essas avaliações que, segundo Street (2014STREET, B. Letramentos sociais: Abordagens críticas do letramento no desenvolvimento, na etnografia e na educação. São Paulo: Parábola, 2014.), se tornaram novas formas de governança global da educação.

Para além de problematizar avaliações em larga escala, queremos retomar os desafios apontados para a educação brasileira na reportagem referenciada anteriormente. Corroboramos o desafio de que precisamos valorizar os professores brasileiros, especialmente por meio de pagamentos justos, direito à hora-atividade para preparação das aulas, direito de ser ouvido em suas reivindicações, dentre tantos outros. O que queremos problematizar, no entanto, é o desafio apontado em relação à formação de professores, não como algo que coloque o professor como o vilão desses “resultados da educação brasileira”, mas no sentido de reconhecer a estagnação de nossas formas de conceber o ensino e especialmente a aprendizagem escolar.

Considerando o avanço das novas tecnologias e as mudanças nas sociedades, em termos por exemplo das mobilidades das pessoas pelo mundo (BLOMMAERT; RAMPTON, 2011BLOMMAERT, J.; RAMPTON, B. Language and superdiversity. Diversities, v. 13, n. 2, p. 1-21, 2011.), dos novos formatos de textos, das translinguagens dos falantes (CANAGARAJAH, 2012CANAGARAJAH, S. Translingual practice: Global Englishes and cosmopolitan relations. New York: Routledge, 2012.; LUCENA, 2015LUCENA, M. I. P. Práticas de linguagem na realidade da sala de aula: contribuições da pesquisa de cunho etnográfico em Linguística Aplicada. DELTA, São Paulo, v. 31, n. especial, p. 67-95, 2015.), enfim, temos alunos contemporâneos em nossas salas de aula. Desse modo, o modelo de organização da sala de aula, no sentido de o professor gerenciar a tomada de turnos e ser aquele ratificado o tempo todo como o que sabe e precisa transmitir conhecimento já nem sempre tem sido coconstruído no aqui-e-agora dos espaços escolares. Há espaços com novas ordens comunicativas nas quais o termo “protagonismo” vai além do papel do discente nas mais diversas atividades do contexto escolar, como a organização política com os grêmios estudantis e o processo de ensino e aprendizagem (FERRETI et al., 2004FERRETTI, C. J.; ZIBAS, D. M. L.; TARTUCE, G. L. B. P. Protagonismo juvenil na literatura especializada e na reforma do ensino médio. Cadernos de Pesquisa, vol.34, n.122, p. 411-423, 2004. https://doi.org/10.1590/S0100-15742004000200007
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). Rampton (2006RAMPTON, B. Language in late modernity: Interaction in an urban school. Cambridge: Cambridge University Press, 2006. https://doi.org/10.1017/CBO9780511486722
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) demonstrou, por exemplo, por meio de uma etnografia realizada em uma escola pública na periferia de Londres, que uma nova ordem comunicativa, avessa aos modelos canônicos de interação de sala de aula, acontecia naquele ali-e-então. Ele verificou ocorrências de aluno disciplinando aluno; aluno desafiando professor; cantorias; e verificou ainda que, por meio dessas atividades interacionais, os alunos mantinham a aula em curso.

Lopes (2015LOPES, M. F. R. A fala-em-interação de sala de aula contemporânea no Ensino Médio: o trabalho de fazer aula e fazer aprendizagem de língua espanhola. 2015. 197f. Tese (Doutorado em Letras) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2015.), por sua vez, em pesquisa etnográfica orientada por pressupostos da Análise da Conversa Etnometodológica, realizada em uma sala de aula de espanhol como língua adicional em uma escola pública de Porto Alegre, também observou um contexto em que aluno disciplinava aluno, aluno desafiava professor, alunos e professor compartilhavam o trabalho de fazer aula animada e também o trabalho de fazer aprendizagem e, segundo a pesquisadora, nesses empreendimentos interacionais conjuntos os participantes negociavam a pauta, mantinham a aula em curso e manifestavam sua identidade juvenil.

Esses estudos mostram que precisamos compreender como sujeitos inseridos em um contexto específico de sala de aula se constituem e são constituídos como aluno, professor e como coconstroem o trabalho de participar, aprender e ser protagonistas do próprio processo de aprendizagem no evento aula. Análises interacionais de como se dão os processos de coconstrução da participação e do protagonismo em sala de aula podem auxiliar na compreensão, em perspectiva micro, da organização política da sala de aula, desconstruindo mitos, como o de que estamos estagnados na educação, e apontando para zonas de atuação e mediação docente.

Dentro dessa problemática e a partir da perspectiva microetnográfica (ERICKSON; SHULTZ, 2013ERICKSON, F.; SHULTZ, J. O quando de um contexto: questões e métodos na análise da competência social. In: RIBEIRO, B. T.; GARCEZ, P. M. Sociolinguística interacional. São Paulo: Loyola, 2013. p. 215-234.; GARCEZ, 2008GARCEZ, P. M. Microethnography in the classroom. In: HORNBERGER, N. H. (Ed.). Encyclopedia of language and education.Vol. 10. Berlim: Springer, 2008b. p. 257-272. https://doi.org/10.1007/978-0-387-30424-3_259
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b) e com base nos pressupostos teórico-metodológicos da Análise da Conversa Etnometodológica (LODER; JUNG, 2008LODER, L. L. O modelo Jefferson de transcrição: convenções e debates. In: LODER, L. L.; JUNG, N. M. (Org.). Fala-em-interação social: introdução à Análise da Conversa Etnometodológica. Campinas: Mercado de Letras, 2008. p. 127-161., 2009LODER, L. L.; JUNG, N. M. (Org.). Análises de fala-em-interação institucional: a perspectiva da Análise da Conversa Etnometodológica. Campinas: Mercado de Letras, 2009.; SACKS; SCHEGLOFF; JEFFERSON, 1974 [2003] SACKS, H.; SCHEGLOFF, E. A.; JEFFERSON, G. Sistemática elementar para a organização da tomada de turnos para a conversa. Veredas, Juiz de Fora, v.7, n.1-2, p.9-73, 2003.), nos propomos a analisar e descrever um dado de fala-em-interação2 2 O projeto de pesquisa que permitiu a coleta desses dados passou por avaliação e aprovação do Comitê de Ética da Universidade Estadual de Maringá; CAAE 38194114.1.0000.0104. , gerado no final de 2014. Nosso objetivo é revisitar este dado mostrando protagonismo e agentividade no processo de construção conjunta de conhecimento, no contexto analisado, por meio de oportunidades de participação menos assimétricas e mais democráticas.

Para tanto, na seção seguinte apresentamos breve discussão sobre a organização da fala-em-interação de sala de aula, destacando modos de organização canônicos, que contribuem para o controle social e a reprodução do conhecimento, e modelos não canônicos, que favorecem, por sua vez, a construção conjunta de conhecimento, o protagonismo e o engajamento. Em seguida, apresentamos os procedimentos metodológicos de geração de dados e, depois, analisamos um dado de fala-em-interação, demonstrando como os participantes são protagonistas da própria aprendizagem e constroem conhecimento em conjunto. Por fim, apresentamos as nossas considerações finais, sistematizando alguns resultados a partir da análise empreendida, e tentamos apontar para uma interlocução pedagógica.

2 Organização da fala-em-interação em sala de aula: reprodução ou construção conjunta de conhecimento?

Do ponto de vista da Análise da Conversa Etnometodológica (doravante ACE), base teórica a que nos afiliamos, a constituição da sociedade e de suas instituições se dá em grande medida pelas ações que os membros de cada grupo social executam ao usar a linguagem na fala-em-interação (CORONA, 2009CORONA, M. D. C. Fala-em-interação cotidiana e fala-em-interação institucional: uma análise de audiências criminais. In: LODER, L. L.; JUNG, N. M. (Org.). Análises de fala-em-interação institucional: a perspectiva da Análise da Conversa Etnometodológica. Campinas: Mercado de Letras, 2009. p.13-44.; GARCEZ, 2006GARCEZ, P. M. A organização da fala-em-interação social: controle social, reprodução de conhecimento, construção conjunta de conhecimento. Calidoscópio, São Leopoldo, v.4, n.1, p.66-80, jan./abr.2006.). Desse modo, olhando especificamente para o cenário escolar, aquele que nos interessa, pode-se entender que o que constitui uma sala de aula não são elementos como paredes, janelas ou a disposição física do mobiliário, mas o que as pessoas fazem conjuntamente quando se encontram para fazer o que precisam e desejam fazer nesse espaço (GARCEZ, 2006GARCEZ, P. M. A organização da fala-em-interação social: controle social, reprodução de conhecimento, construção conjunta de conhecimento. Calidoscópio, São Leopoldo, v.4, n.1, p.66-80, jan./abr.2006.), em outras palavras, uma sala de aula constitui-se à medida em que pessoas produzem ações conjuntas que demonstram que aquilo é uma sala de aula.

Para Markee e Kasper (2004MARKEE, N.; KASPER, G. Classroom talks: an introduction. The Modern Language Journal, Madison, v. 88, n. 4, p. 491-500, 2004. https://doi.org/10.1111/j.0026-7902.2004.t01-14-.x
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, p.492; tradução de SCHULZ, 2007SCHULZ, L. A construção da participação na fala-em-interação de sala de aula: um estudo microetnográfico sobre a participação em uma escola municipal de Porto Alegre. 2007. 163f. Dissertação (Mestrado em Letras) - Programa de Pós-Graduação em Letras, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2007.)3 3 No original: “[...] Classroom talk as a nexus of inter-related speech exchange systems rather than as a unified speech exchange system that is characterized by a single set of question-answer-comment practices.” , a fala-em-interação de sala de aula é uma “conexão entre sistemas de trocas de fala inter-relacionados, e não como um sistema unificado caracterizado por um conjunto único de perguntas-respostas e comentários”. Para os autores não há, portanto, uma única organização da fala-em-interação de sala de aula, mas uma gama de falas de sala aula, que são avultadas à medida que há diversidade de práticas sociais dos sujeitos que se encontram engajados em um trabalho conjunto.

Corroboram essa afirmação trabalhos como o de Cazden (2001CAZDEN, C. B. Classroom discourse: the language of teaching and learning. Portsmouth: Heinemann, 2001.), que discute de que modo, no gerenciamento dos turnos na sala de aula, o professor pode selecionar o próximo falante, assim como pode optar por não o fazer; e os de Rampton (2006RAMPTON, B. Language in late modernity: Interaction in an urban school. Cambridge: Cambridge University Press, 2006. https://doi.org/10.1017/CBO9780511486722
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) e Lopes (2015LOPES, M. F. R. A fala-em-interação de sala de aula contemporânea no Ensino Médio: o trabalho de fazer aula e fazer aprendizagem de língua espanhola. 2015. 197f. Tese (Doutorado em Letras) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2015.), que defendem a existência de uma nova ordem comunicativa na chamada sala de aula contemporânea na qual os alunos podem realizar participações exuberantes (RAMPTON, 2006RAMPTON, B. Language in late modernity: Interaction in an urban school. Cambridge: Cambridge University Press, 2006. https://doi.org/10.1017/CBO9780511486722
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), como cantar, fazer zoeiras e fazer riso.

Cabe salientar que embora certas rupturas com as formas de organização canônicas da fala-em-interação tornem a interação de sala de aula menos ritualizada, como é o caso que abordaremos neste artigo, não se pode falar que nesses contextos a institucionalidade inexista ou que se passou a ter uma conversa cotidiana (GARCEZ, 2008aGARCEZ, P. M. A perspectivada Análise da Conversa Etnometodológica sobre o uso da linguagem em interação social. In: LODER, L. L.; JUNG, N. M. (Org.). Fala-em-interação social: introdução à Análise da Conversa Etnometodológica. Campinas: Mercado de Letras, 2008a. p. 17-38.), pois nesses contextos ainda há uma meta-fim e a necessidade de o professor e/ou alunos organizarem-se por/para uma pauta.

Entendemos, portanto, que a fala-em-interação de sala aula pode ser genericamente caracterizada como um fazer conjunto orientado para uma pauta relacionada a uma tarefa, em que controle e gerenciamento das formas de participação são de responsabilidade de um dos participantes, em geral o professor, ou compartilhadas. Dessa forma, a organização e o gerenciamento da tomada de turnos e da participação em sala de aula podem se direcionar para sequências que primam o controle social e a reprodução de conhecimento; ou podem se direcionar para possibilidades mais democráticas da organização da fala, como o revozeamento e outras formas que variam conforme as diferentes demandas desse contexto. A seguir, apresentamos algumas formas já descritas de organização das interações de sala de aula.

2.1 Iniciação-Resposta-Avaliação

A sequência interacional denominada Iniciação-Resposta-Avaliação (IRA) é uma sequência de avaliação que se inicia com uma pergunta, seguida de uma resposta e, por fim, por um turno de avaliação. O exemplo adaptado de Garcez (2006GARCEZ, P. M. A organização da fala-em-interação social: controle social, reprodução de conhecimento, construção conjunta de conhecimento. Calidoscópio, São Leopoldo, v.4, n.1, p.66-80, jan./abr.2006., p.68) ilustra sua organização:


Por se tratar de um modelo de organização da fala-em-interação de sala de aula praticamente universal (CAZDEN, 2001CAZDEN, C. B. Classroom discourse: the language of teaching and learning. Portsmouth: Heinemann, 2001.; GARCEZ, 2006GARCEZ, P. M. A organização da fala-em-interação social: controle social, reprodução de conhecimento, construção conjunta de conhecimento. Calidoscópio, São Leopoldo, v.4, n.1, p.66-80, jan./abr.2006., 2012 GARCEZ, P. M. A fala-em-interação de sala de aula: controle social, reprodução, construção conjunta. In: GUEDES, P. C. (Org.). Educação Linguística e cidadania. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2012. p. 87-121.), não seria difícil associar a sequência acima a uma sala de aula de Ensino Fundamental em que Marta aponta para um relógio diante dos alunos, seleciona Lucas como próximo falante e solicita a ele a informação. Cabe ressaltar que Marta, além de conhecedora da informação que solicitou para Lucas, também é a mais capacitada para organizar uma resposta diante da própria solicitação (GARCEZ, 2006GARCEZ, P. M. A organização da fala-em-interação social: controle social, reprodução de conhecimento, construção conjunta de conhecimento. Calidoscópio, São Leopoldo, v.4, n.1, p.66-80, jan./abr.2006., p. 68), por isso a sequência IRA geralmente legitima papéis institucionais (LOPES, 2015LOPES, M. F. R. A fala-em-interação de sala de aula contemporânea no Ensino Médio: o trabalho de fazer aula e fazer aprendizagem de língua espanhola. 2015. 197f. Tese (Doutorado em Letras) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2015.). Isso significa que a pergunta do turno de iniciação na sequência IRA tem a finalidade de verificar se os alunos sabem responder corretamente ao que se espera. Dessa forma, o iniciador e avaliador são identificados como o professor, aquele que sabe e que pode avaliar, pois já é conhecedor da resposta, assim “não se trata de uma pergunta qualquer, com que nos deparamos a todo momento na conversa cotidiana, e sim uma ação preliminar que só será levada a cabo plenamente no turno em terceira posição, de avaliação. ” (GARCEZ, 2006GARCEZ, P. M. A organização da fala-em-interação social: controle social, reprodução de conhecimento, construção conjunta de conhecimento. Calidoscópio, São Leopoldo, v.4, n.1, p.66-80, jan./abr.2006., p.69).

Com efeito, considerar que na sequência IRA a iniciação é realizada a fim de que, depois da resposta, seja feita uma avaliação implica dizer que ela serve ao propósito de testar e perseguir uma resposta ideal, em geral, a do professor. Nesse sentido, quando a resposta esperada não é dada, o professor pode seguir com o turno, fazendo iniciações até que a resposta esperada seja conseguida, ficando “surdo” para outras respostas, fechando a sequência IRA apenas com a avaliação positiva (WARING, 2008WARING, H. Z. Using explicit positive assessment in the language classroom: IRF, feedback, and learning opportunities. The Modern Language Journal, Hoboken, v.92, n.4, p.577-594, 2008. https://doi.org/10.1111/j.1540-4781.2008.00788.x
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).

Vale ressaltar que conforme aponta estudo realizado por Waring (2008WARING, H. Z. Using explicit positive assessment in the language classroom: IRF, feedback, and learning opportunities. The Modern Language Journal, Hoboken, v.92, n.4, p.577-594, 2008. https://doi.org/10.1111/j.1540-4781.2008.00788.x
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) em uma sala de aula de língua inglesa como língua adicional nos Estados Unidos, ao avaliar positivamente a resposta de um aluno, o professor finaliza a sequência IRA e, consequentemente, inibe as demais participações de outros alunos. Assim, a crítica que recai sobre essa sequência é que, além de ser vista como uma forma econômica para se avaliar os alunos em sala de aula, também pode ser caracterizada como uma ação de controle social que reforça a assimetria entre professor e aluno e, por isso, as atividades geralmente produzidas nessa sequência (avaliar, testar, impor informações) dificilmente resultam em construção conjunta de conhecimento, pelo contrário, favorecem a reprodução de conhecimento. Além disso, conforme Garcez (2006GARCEZ, P. M. A organização da fala-em-interação social: controle social, reprodução de conhecimento, construção conjunta de conhecimento. Calidoscópio, São Leopoldo, v.4, n.1, p.66-80, jan./abr.2006., 2012 GARCEZ, P. M. A fala-em-interação de sala de aula: controle social, reprodução, construção conjunta. In: GUEDES, P. C. (Org.). Educação Linguística e cidadania. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2012. p. 87-121.), essa sequência também não contribui muito para formação de cidadãos participativos e críticos, uma vez que os espaços para participações e protagonismo do estudante no trabalho de construir conhecimento em conjunto são cerceados neste modo de organização interacional.

2.2 Revozeamento e nova(s) ordem(ns) comunicativa(s) de sala de aula

Cazden (2001CAZDEN, C. B. Classroom discourse: the language of teaching and learning. Portsmouth: Heinemann, 2001.) afirma que novos objetivos curriculares demandam diferentes formas de organização da fala, o que significa que professores, com repertórios variados de organização das aulas, podem organizá-las de modo a possibilitar momentos de construção conjunta de conhecimento. Assim, entendemos que não há uma fala-em-interação de sala de aula, mas, conforme já pontuaram Markee e Kasper (2004MARKEE, N.; KASPER, G. Classroom talks: an introduction. The Modern Language Journal, Madison, v. 88, n. 4, p. 491-500, 2004. https://doi.org/10.1111/j.0026-7902.2004.t01-14-.x
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), falas (no plural) de sala de aula.

Uma das formas de organização alternativas à IRA é o revozeamento, descrito por O´Connor e Michaels (1996O’CONNOR, M. C.; MICHAELS, S. Shifting Participant Frameworks: orchestrating thinking practices in group discussion. In: HICKS, D. (Org.). Discourse, learning and schooling. Cambridge: Cambridge University Press, 1996. p. 63-103. https://doi.org/10.1017/CBO9780511720390.003
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, p.71; tradução de LOPES, 2015LOPES, M. F. R. A fala-em-interação de sala de aula contemporânea no Ensino Médio: o trabalho de fazer aula e fazer aprendizagem de língua espanhola. 2015. 197f. Tese (Doutorado em Letras) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2015.) como “um tipo particular de redizer (oral ou escrito) a contribuição do aluno - por outro participante da fala-em-interação”4 4 No original: “[...] a particular kind of reuttering (oral or written) of a student´s contribution – by another participant in the discussion”. . Nessa organização interacional de sala de aula, o professor reformula a contribuição do estudante para avaliação pelo próprio aluno ou por um colega, dando créditos à contribuição original do aluno. A seguir, reproduzimos excerto dos dados de Conceição e Garcez (2005CONCEIÇÃO, L. E.; GARCEZ, P. M. O revozeamento no discurso da escola pública cidadã. Intercâmbio, São Paulo, v.14, p. 1-10, 2005., p. 5) gerado em uma Escola Pública Municipal de Porto Alegre a fim de ilustrar uma organização semelhante ao revozeamento.


Neste excerto, é possível perceber que Silvia, a professora, passa o turno para Flávio e rediz a contribuição dele (linhas 1 a 4). Em seguida, a torna objeto de reflexão e discussão dos estudantes a partir da formulação de uma pergunta de informação desconhecida e não seleciona o próximo falante (linha 6), o que abre espaço para que qualquer aluno se sinta autorizado para tomar o turno e fazer sua contribuição. Nesses termos, pode-se considerar que o revozeamento é um mecanismo capaz de gerar participações mais igualitárias e contribuir para a construção conjunta de conhecimento. (CAZDEN, 2001CAZDEN, C. B. Classroom discourse: the language of teaching and learning. Portsmouth: Heinemann, 2001.; CONCEIÇÃO; GARCEZ, 2005CONCEIÇÃO, L. E.; GARCEZ, P. M. O revozeamento no discurso da escola pública cidadã. Intercâmbio, São Paulo, v.14, p. 1-10, 2005.; GARCEZ, 2006GARCEZ, P. M. A organização da fala-em-interação social: controle social, reprodução de conhecimento, construção conjunta de conhecimento. Calidoscópio, São Leopoldo, v.4, n.1, p.66-80, jan./abr.2006., 2012 GARCEZ, P. M. A fala-em-interação de sala de aula: controle social, reprodução, construção conjunta. In: GUEDES, P. C. (Org.). Educação Linguística e cidadania. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2012. p. 87-121.).

No entanto, é preciso observar que, mesmo sendo considerado como uma forma de participação mais democrática, é o professor quem gerencia os turnos de fala dos alunos no revozeamento, por isso não se pode considerar que por si só ele seja uma estrutura que possibilita espaço para o protagonismo dos alunos. Segundo Schulz (2007SCHULZ, L. A construção da participação na fala-em-interação de sala de aula: um estudo microetnográfico sobre a participação em uma escola municipal de Porto Alegre. 2007. 163f. Dissertação (Mestrado em Letras) - Programa de Pós-Graduação em Letras, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2007.), o que determinará o protagonismo é o uso local dessas formas.

Trabalhos recentes como os de Lopes (2015LOPES, M. F. R. A fala-em-interação de sala de aula contemporânea no Ensino Médio: o trabalho de fazer aula e fazer aprendizagem de língua espanhola. 2015. 197f. Tese (Doutorado em Letras) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2015.) e Rampton (2006RAMPTON, B. Language in late modernity: Interaction in an urban school. Cambridge: Cambridge University Press, 2006. https://doi.org/10.1017/CBO9780511486722
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), já mencionados neste texto, têm apontado para novos modos de participar na sala de aula que não se enquadram nos modelos convencionais, ou seja, têm apontado para o aparecimento de uma nova ordem comunicativa da fala-em-interação de sala de aula contemporânea que engloba o novo modo de ser jovem na escola (DARYELL, 2003DAYRELL, J. O jovem como sujeito social. Revista Brasileira de Educação, Rio de Janeiro, n.24, p. 40-52, set./dez.2003.; LOPES, 2015LOPES, M. F. R. A fala-em-interação de sala de aula contemporânea no Ensino Médio: o trabalho de fazer aula e fazer aprendizagem de língua espanhola. 2015. 197f. Tese (Doutorado em Letras) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2015.).

Rampton (2006RAMPTON, B. Language in late modernity: Interaction in an urban school. Cambridge: Cambridge University Press, 2006. https://doi.org/10.1017/CBO9780511486722
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) realizou um estudo etnográfico em uma turma de nono ano em uma escola pública de Londres e demonstrou que nesse contexto os participantes podiam não legitimar na interação a conduta hierárquica tradicional da relação entre professor e alunos, não se limitando a falar quando o professor autorizava, questionando o professor, disciplinando outros alunos, autosselecionando-se, avaliando o professor. Tratava-se de uma ordem comunicativa em que o professor não era o único que regia as tomadas de turno e por isso precisava negociar interacionalmente seu papel social. Chama atenção no estudo de Rampton que os alunos que poderiam ser reconhecidos como perturbadores da ordem canônica da interação de sala de aula, eram os mais participativos, estando atentos a ponto de completar as falas do professor, disciplinar outros alunos e produzir participações exuberantes.

Lopes (2015LOPES, M. F. R. A fala-em-interação de sala de aula contemporânea no Ensino Médio: o trabalho de fazer aula e fazer aprendizagem de língua espanhola. 2015. 197f. Tese (Doutorado em Letras) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2015.) observou as participações não canônicas de alunos do Ensino Médio de uma escola pública brasileira em aulas de língua espanhola. A pesquisadora mostrou ocorrências de aluno disciplinando aluno, aluno corrigindo o professor, aluno desafiando o professor e aluno cantando em sala de aula. Conforme demonstrado na pesquisa, essas participações revelavam que os estudantes compartilhavam os trabalhos interacionais de fazer aula de língua espanhola e fazer aprendizagem5 5 Pesquisas em ACE (ABELEDO, 2008; KANITZ, 2013; LOPES, 2015; UFLACKER, 2012, por exemplo), cujo foco analítico está nos métodos que os participantes de uma interação usam para produzir ação social conjunta, têm entendido que em contextos de sala de aula, quando os participantes estão orientados para o mesmo foco de atenção em torno de um objeto de aprendizagem, eles estão realizando o trabalho de fazer aula e fazer aprendizagem. simultaneamente, pois estavam orientados para um objeto de aprendizagem6 6 Com base no uso do termo “objeto de aprendizagem” nos trabalhos de Abeledo (2008) e Lopes (2015), entendemos que este se trata de ponto/tópico/pergunta/dúvida, emergente e contingente na interação, para o qual os participantes se orientam e produzem ação social no intuito de construir um entendimento satisfatório que o encerra. Neste artigo, é essa a definição que também adotamos quando nos referimos a objeto de aprendizagem. , no caso a língua espanhola, e estavam engajados em torno desse objeto produzindo as ações já mencionadas. Segundo a pesquisadora, os dados evidenciaram que na nova ordem comunicativa da sala de aula havia oportunidades para a participação e protagonismo no trabalho de fazer aprendizagem.

Na organização da fala-em-interação da sala de aula em que os dados para os quais olhamos neste artigo foram gerados, algumas das condutas observadas por Rampton (2006RAMPTON, B. Language in late modernity: Interaction in an urban school. Cambridge: Cambridge University Press, 2006. https://doi.org/10.1017/CBO9780511486722
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) e Lopes (2015LOPES, M. F. R. A fala-em-interação de sala de aula contemporânea no Ensino Médio: o trabalho de fazer aula e fazer aprendizagem de língua espanhola. 2015. 197f. Tese (Doutorado em Letras) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2015.) também são notadas, sobretudo a constante negociação dos participantes em torno de uma pauta. Difere, todavia, o contexto que analisamos, pelo fato de as políticas pedagógicas da instituição buscarem promover, por meio da organização dos alunos, essas condutas. Na próxima seção, apresentamos brevemente o contexto em que os dados foram gerados.

Nesta seção, procuramos abordar a fala-em-interação de sala de aula, apresentando algumas formas de organização em que a regência das falas fica a cargo do professor e outras não canônicas, como na nova ordem comunicativa da sala de aula contemporânea, que evidencia novas formas de participação e um deslocamento do papel do professor como o único organizador dos turnos e aquele que sabe.

3 Percurso metodológico e contexto de geração de dados

Os dados de fala-em-interação desta pesquisa foram gerados no último bimestre letivo de 2014 em uma sala de aula do Colégio Empreendedor7 7 O nome da instituição em que os dados foram gerados, bem como dos participantes da pesquisa são fictícios a fim de se preservar a identidade dos sujeitos da pesquisa. , escola privada situada no Paraná, por ocasião do trabalho de mestrado de Petermann (2016PETERMANN, R. A fala-em-interação em sala de aula de ensino médio: participação e construção conjunta de conhecimento em uma equipe de trabalho. 2016.138f. Dissertação (Mestrado em Letras) - Universidade Estadual de Maringá, Maringá, 2016.). Essa escola adota metodologia específica que prima pelo trabalho pedagógico em perspectiva interdisciplinar e pautado em projetos temáticos norteados por desafios de aprendizagem. A disposição física das salas de aula é constantemente formada por equipes com até seis alunos de diferentes séries do Ensino Médio, o que mostra outra faceta da metodologia da escola, a interseriação8 8 A interseriação, no Colégio Empreendedor, consiste em alunos das diferentes séries do Ensino Médio trabalhando juntos, nas mesmas equipes e nas mesmas tarefas. . Além disso, o colégio não adota um material didático específico, mas os alunos trazem materiais diversos, como tablets, celulares, notebooks que podem utilizar para dar conta dos desafios propostos.

O projeto temático que ocorria na época da geração de dados era intitulado O que se põe à mesa. O desafio que norteava o trabalho das diferentes disciplinas era a discussão da mesa como local de refeições e encontros sociais. A atividade final deste projeto era a produção de uma pizza saborosa, nutritiva e sustentável, que seria produzida pelos próprios alunos e servida em uma mesa onde, além de se alimentarem, os alunos e professores promoveriam debate sobre várias questões dos cenários político, cultural, esportivo etc.

Os procedimentos que envolveram a geração dos dados foram: observação participante; registro audiovisual de uma das equipes de trabalho da sala; segmentação e transcrição seletiva dos dados segundo convenções de Jefferson (GAGO, 2002GAGO, P. C. Questões de transcrição em Análise da Conversa. Veredas, Juiz de Fora, v.6, n.2, p.89-113, jul./dez. 2002.; LODER, 2008LODER, L. L. O modelo Jefferson de transcrição: convenções e debates. In: LODER, L. L.; JUNG, N. M. (Org.). Fala-em-interação social: introdução à Análise da Conversa Etnometodológica. Campinas: Mercado de Letras, 2008. p. 127-161.) e com base também em transcrição multimodal (GARCEZ; BULLA; LODER, 2014GARCEZ, P. M.; BULLA, G. S.; LODER, L. L. Práticas de pesquisa microetnográfica: geração, segmentação e transcrição de dados audiovisuais como procedimentos analíticos plenos. DELTA, São Paulo, v. 30, n. 2, p. 257-288, 2014. https://doi.org/10.1590/0102-445078307364908145
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), conforme convenções em anexo ANEXO A - Convenções de transcrição . (ponto final) Entonação descendente ? (ponto de interrogação) Entonação ascendente , (vírgula) Entonação de continuidade - (hífen) Marca de corte abrupto ↑↓ (flechas para cima e para baixo) Alteração do tom de voz. Mais agudo: para cima; mais grave para baixo palavra (sublinhado) Som enfatizado PALAVRA (maiúsculas) Fala em volume alto °palavra ° (sinais de graus) Fala em voz baixa °°palavra °° (sinais de graus duplos) Fala em voz destacadamente mais baixa. >palavra< (sinais de maior do que e menor do que) Fala acelerada <palavra> (sinais de menos do que e maior do que) Fala desacelerada hh (série de h´s) Aspiração ou riso .hh (h´s precedidos de ponto) Inspiração audível [ ] (colchetes) Fala simultânea ou sobreposta = (sinal de igual) Elocuções contíguas (2,4) (números entre parênteses) Medida de silêncio (em segundos e décimos de segundos) (.) (ponto entre parênteses) Micropausa, até 2/10 de segundo ( ) (parênteses vazios) Segmento de fala que não pode ser transcrito (palavra) (segmento de fala entre parênteses) Transcrição duvidosa (( deixando o texto)) (parênteses duplos) Descrição de atividade não vocal De domingo (segmento em itálico) Reprodução de leitura em voz alta {transcrição impossível} (chaves duplas) Explicação de uma omissão de transcrição ou outra explicação necessária. (círculo vermelho) Ênfase em um participante, movimento ou parte do quadro de imagem . (quadro laranja) Destaque para um piso conversacional. Fonte: Adaptado de Loder (2008). .

Ao todo, foram feitas cerca de trinta horas de registro audiovisual da atividade interacional de uma das equipes de trabalho formada por seis alunos do Ensino Médio: dois da terceira série, Célia e Arthur; um da segunda, João; e três da primeira Taís, Laís e Lucas. Esses alunos e o professor Miguel são os participantes da pesquisa.

Para os fins deste artigo, selecionamos um segmento gerado em uma aula de história do professor Miguel. Entendemos que este é um exemplo representativo de nosso corpus de análise, tendo em vista os seguintes critérios: i) trabalho interacional bem marcado em torno de um objeto de aprendizagem; e ii) participação e engajamento de estudantes em determinada pauta, demonstrando protagonismo no trabalho de construir conhecimento em conjunto. Na seção seguinte, apresentamos o exercício analítico que empreendemos sobre o dado de fala-em-interação selecionado e discutimos como a participação e o engajamento na fala-em-interação são evidências de agentividade e protagonismo estudantis na aprendizagem.

4 Fala-em-interação na sala de aula contemporânea: espaços para participação e protagonismo

Pesquisas brasileiras em Linguística Aplicada se propuseram a discutir a aprendizagem como ação social, investigando cenários diversos e interpretando como se dão participação e aprendizagem. Nosso recorte e filiação aqui são com trabalhos produzidos na perspectiva da ACE, que analisaram dados de ocorrência natural de uso da linguagem, com “[...] interesse etnometodológico em estudar a racionalidade prática cotidiana, o raciocínio sociológico dos agentes sociais enquanto agem e que fica evidente na sua conduta” (GARCEZ, 2008GARCEZ, P. M. Microethnography in the classroom. In: HORNBERGER, N. H. (Ed.). Encyclopedia of language and education.Vol. 10. Berlim: Springer, 2008b. p. 257-272. https://doi.org/10.1007/978-0-387-30424-3_259
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a, p. 22). Em especial, nos filiamos a pesquisas produzidas pelo Grupo de Pesquisa Interação Social e Etnografia, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, com destaque para a pesquisa de doutorado de Abeledo (2008ABELEDO, M. L. Uma compreensão etnográfica da aprendizagem de língua estrangeira na fala-em-interação de sala de aula. 2008. 217f. Tese (Doutorado em Letras) - Programa de Pós-Graduação em Letras, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2008.), que é um dos trabalhos seminais brasileiros acerca de investigações sobre aprendizagem como ação social pela perspectiva da ACE.

Abeledo (2008ABELEDO, M. L. Uma compreensão etnográfica da aprendizagem de língua estrangeira na fala-em-interação de sala de aula. 2008. 217f. Tese (Doutorado em Letras) - Programa de Pós-Graduação em Letras, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2008.) aponta para a ligação entre participação e construção conjunta de conhecimento. A pesquisadora analisa, na aula de língua espanhola em uma escola de idiomas, o trabalho de fazer aprendizagem de vocabulário. Ela mostra que o trabalho de aprender implica que os participantes tornem pública sua competência9 9 Abeledo (2008, p. 169) define etnometodologicamente competência como a condição de membro competente de uma comunidade que é sustentada pelo uso da linguagem em interação para participar das atividades cotidianas de uma comunidade. para participar de determinadas atividades em comunidades situadas, o que ocorre por meio da construção de conhecimento situado, sobretudo pela busca de superação de obstáculos para participar das ações da própria aula. Assim, Abeledo (2008ABELEDO, M. L. Uma compreensão etnográfica da aprendizagem de língua estrangeira na fala-em-interação de sala de aula. 2008. 217f. Tese (Doutorado em Letras) - Programa de Pós-Graduação em Letras, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2008., p. 6) formula uma compreensão etnometodológica de aprendizagem como:

Uma articulação pública, intersubjetiva, emergente e contingente, produzida para os fins práticos das atividades desenvolvidas em cada interação; (b) observável nos métodos que constituem o trabalho dos participantes para produzir essa realização, que não são generalizáveis, mas adequados a um contexto e a identidades que eles reflexivamente instauram - institucionais ou não -, e a objetos de aprendizagem que eles definem e tornam relevantes; e (c) que produz relações de participação e pertencimento, já que implica a produção pública e intersubjetiva de competência para participar em atividades levadas a cabo em uma comunidade.

Cabe destaque também, pela discussão que faz sobre participação e construção conjunta de conhecimento, a pesquisa de Kanitz (2013KANITZ, A. Resolução de problemas e construção conjunta de conhecimento na fala-em-interação em cenário de desenvolvimento tecnológico. 2013. 184f. Dissertação (Mestrado em Linguística) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2013.). Fora do contexto de sala de aula, porém ainda pensando na aprendizagem como ação social e em termos de construção conjunta do conhecimento, a pesquisadora observou um cenário de desenvolvimento tecnológico - laboratório de tecnologia voltado à produção de materiais biomédicos - em que a resolução de problemas e a busca por entendimentos para retomada de atividade suspensa pelo problema se constituem como instância interacional da construção conjunta de conhecimento. Os resultados da pesquisa apontam para o fato de que é “envidando esforços para a resolução dos problemas que os participantes constroem conhecimento com o outro”. (KANITZ, 2013KANITZ, A. Resolução de problemas e construção conjunta de conhecimento na fala-em-interação em cenário de desenvolvimento tecnológico. 2013. 184f. Dissertação (Mestrado em Linguística) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2013., p. 6)

Nesses dois trabalhos verificamos que, no processo de construção conjunta de conhecimento descrito, são pontos convergentes agentividade, participação e protagonismo dos estudantes, produzindo ação social orientada para objetos de aprendizagem que se tornam relevantes no aqui-e-agora da interação. Nesse sentido, para os fins analíticos deste artigo propomos, conforme Petermann (2016PETERMANN, R. A fala-em-interação em sala de aula de ensino médio: participação e construção conjunta de conhecimento em uma equipe de trabalho. 2016.138f. Dissertação (Mestrado em Letras) - Universidade Estadual de Maringá, Maringá, 2016.), que o trabalho de construir conhecimento conjuntamente compreende:

i) participação e engajamento dos interagentes ii) orientados para um objeto de aprendizagem tornado relevante no aqui-e-agora da interação iii) produzindo ação social em torno desse objeto, iv) demonstrando sua competência para participar, ratificando a participação dos demais e sendo ratificado v) a fim de dar conta dos fins práticos emergentes do objeto de conhecimento. (p. 43, grifos nossos)

Tendo em vista que construir conhecimento conjuntamente implica participação e engajamento na fala-em-interação orientada a um objeto de aprendizagem emergente e contingente de um aqui-e-agora; passamos à apresentação do exercício analítico que empreendemos a partir de um segmento interacional gerado em uma aula de história. Nessa aula, a tarefa proposta pelo professor era um estudo e elaboração de perguntas sobre a crise financeira de 1929 que seriam, depois de formuladas, trocadas entre as equipes da sala para serem respondidas. No Excerto 1 (o Anexo A ANEXO A - Convenções de transcrição . (ponto final) Entonação descendente ? (ponto de interrogação) Entonação ascendente , (vírgula) Entonação de continuidade - (hífen) Marca de corte abrupto ↑↓ (flechas para cima e para baixo) Alteração do tom de voz. Mais agudo: para cima; mais grave para baixo palavra (sublinhado) Som enfatizado PALAVRA (maiúsculas) Fala em volume alto °palavra ° (sinais de graus) Fala em voz baixa °°palavra °° (sinais de graus duplos) Fala em voz destacadamente mais baixa. >palavra< (sinais de maior do que e menor do que) Fala acelerada <palavra> (sinais de menos do que e maior do que) Fala desacelerada hh (série de h´s) Aspiração ou riso .hh (h´s precedidos de ponto) Inspiração audível [ ] (colchetes) Fala simultânea ou sobreposta = (sinal de igual) Elocuções contíguas (2,4) (números entre parênteses) Medida de silêncio (em segundos e décimos de segundos) (.) (ponto entre parênteses) Micropausa, até 2/10 de segundo ( ) (parênteses vazios) Segmento de fala que não pode ser transcrito (palavra) (segmento de fala entre parênteses) Transcrição duvidosa (( deixando o texto)) (parênteses duplos) Descrição de atividade não vocal De domingo (segmento em itálico) Reprodução de leitura em voz alta {transcrição impossível} (chaves duplas) Explicação de uma omissão de transcrição ou outra explicação necessária. (círculo vermelho) Ênfase em um participante, movimento ou parte do quadro de imagem . (quadro laranja) Destaque para um piso conversacional. Fonte: Adaptado de Loder (2008). contém uma descrição dos símbolos utilizados na transcrição dos excertos), Lucas, Arthur e João estão lendo um texto extraído de um portal de pesquisas da internet10 10 GOMES, C. A crise 1929 (Grande Depressão). Disponível em:<http://bit.ly/2pyDQsE/>. Acesso em: 10 out. 2015. buscado por eles mesmos.

Excerto 1

Lucas, assim que conclui a leitura do texto, orienta-se para João e faz uso de repertório próprio para produzir uma explicação sobre o que leu (linhas 002 a 007) e ajudar João a construir um entendimento acerca das informações necessárias para execução da tarefa proposta para a aula. Arthur também participa dessa atividade interacional (linhas 010 a 011; 016 a 017 e 024 a 028). Todavia, as explicações oferecidas por Lucas e Arthur não são suficientes para que João se convença, como fica marcado nos turnos (mas eu acho estranho) (linha 008), o (.) sim mas (1,0) tipo como é que de uma hora para outra foi surgi:r (linhas 013 a 015) e mas:: (1,0) mesmo assim (linha 029).

A presença constante da adversativa “mas” nos turnos de João configura sua não concordância com as explicações oferecidas pelos colegas e também sinaliza a questão sobre a qual quer construir entendimento: como o governo estadunidense conseguiu recursos para reerguer a economia devastada na crise econômica de 1929.

Vale destacar nesta análise a presença de marcas de linguagem características da juventude nos turnos de Lucas e Arthur ao se apropriarem do conteúdo estudado para tentarem construir entendimento e avançar na tarefa da aula. Lucas usa, além do marcador discursivo “tipo” (linha 002), o termo “carinhas” (linha 006), referindo-se aos responsáveis pelo setor produtivo estadunidense da década de 1929. Arthur, para se dirigir a João, usa a expressão “né mano” (linha 016). Entendemos que ao usarem dessa linguagem engajados em tentar dar conta do objeto de aprendizagem emergente daquele ali e então e, ainda, orientados para o cumprimento da meta-fim da aula fazem ecoar suas identidades juvenis, evidenciando protagonismo no trabalho de fazer aprendizagem.

Outro ponto a ser destacado neste excerto é a ocorrência de aluno disciplinando aluno. Isso pode ser reconhecido quando Lucas (linha 022) chama atenção de Célia que falava de forma sobreposta a Arthur (linha 018). Essa ocorrência, também observada por Lopes (2015LOPES, M. F. R. A fala-em-interação de sala de aula contemporânea no Ensino Médio: o trabalho de fazer aula e fazer aprendizagem de língua espanhola. 2015. 197f. Tese (Doutorado em Letras) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2015.) e Rampton (2006RAMPTON, B. Language in late modernity: Interaction in an urban school. Cambridge: Cambridge University Press, 2006. https://doi.org/10.1017/CBO9780511486722
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), aponta para um engajamento em torno da meta-fim do encontro que é compartilhada. Isso significa que nesse contexto não apenas o professor é responsável por perseguir essa meta.

No Excerto 2, é Célia quem toma o turno para chamar atenção de Lucas, João e Arthur e assegurar que a tarefa proposta para a aula seja cumprida.

Excerto 2

Célia interrompe a conversa de Lucas, Arthur e João, tomando o turno e orientando-se para eles a fim de verificar se estavam fazendo anotações sobre as discussões (linhas 051 a 053). Essa postura de Célia sinaliza sua preocupação em dar conta da tarefa proposta para a aula, inclusive enfatizando a necessidade de anotar as discussões, pois, segundo ela porque fala fala fala aí depois esquece tudo (linhas 058 e 059).

Lucas, Arthur e João, ao interagirem com Célia, defendem a conduta que vinham adotando no trabalho. Inicialmente Arthur diz a Célia que estão fazendo anotações (linha 055) e João o desmente (linha 057). Lucas, porém, argumenta que quando discutem detalhadamente a “mente grava” (linhas 060 a 061).

Todavia chama nossa atenção como, a partir da necessidade de cumprimento da tarefa proposta, um objeto de aprendizagem é legitimado como relevante na emergência e contingência da interação. Embora devendo cumprir com a tarefa proposta pelo professor de formular perguntas para troca com outras equipes, Lucas, João e Arthur continuam tentando produzir um entendimento que satisfaça João sobre como os Estados Unidos conseguiram dinheiro para se reerguer na crise de 1929 mesmo com dificuldades financeiras.

Fenômeno parecido foi analisado por Kanitz (2013KANITZ, A. Resolução de problemas e construção conjunta de conhecimento na fala-em-interação em cenário de desenvolvimento tecnológico. 2013. 184f. Dissertação (Mestrado em Linguística) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2013.) em um contexto de laboratório de desenvolvimento científico. Os dados desse contexto revelaram que, no curso das ações dos participantes, objetos de aprendizagem emergiam na forma de impasses, dúvidas etc.; e que alcançar entendimentos que resolvessem as questões e permitissem o retorno à atividade interrompida, envolvendo esforços interacionais dos participantes em torno dessa questão, consistia no trabalho de construir conhecimento em conjunto. Nesses termos é que entendemos que o objeto de aprendizagem que Lucas, Arthur e João tentam dar conta surge a partir da tarefa sugerida. Assim, a atividade de sala de aula aqui proposta e inserida no contexto institucional que analisamos oportuniza participação, engajamento e protagonismo dos estudantes no processo de aprendizagem.

No Excerto 3 apresentamos a sequência do empreendimento interacional dos participantes tentando dar conta do objeto de aprendizagem tornado relevante.

Excerto 3

João, Lucas e Arthur, conforme se nota na sequência interacional transcrita no Excerto 3, envidam esforços para lidar com o objeto de aprendizagem emergente e contingente do aqui-e-agora. Todavia, é possível perceber que nem Lucas nem Arthur têm suas explicações aceitas por João como suficientes, por isso o entendimento não é construído. Dessa forma, os participantes recorrem a Miguel, o professor, a fim de que ele os auxilie.

No Excerto 4, Miguel passa a participar da atividade interacional empreendida pelos participantes.

Excerto 4

Após ser questionado por João e Arthur sobre como os Estados Unidos conseguiram dinheiro para se reerguerem na crise de 1929 (linhas 170 a 179), Miguel toma o turno (linha 180) e não oferece resposta direta aos alunos, mas devolve a questão dizendo ah me respondam vocês. Na sequência do excerto, os turnos de Miguel nos chamam atenção, pois eles não são respostas prontas às perguntas dos alunos, mas sim formulações que aparentemente conduzem os alunos à construção conjunta de um entendimento. Selecionamos três recortes do Excerto 4 em que há turnos de Miguel a fim de explicar e exemplificar essa asserção.

No primeiro, discutimos a relação menos assimétrica entre papéis institucionais de professor e alunos coconstruída no contexto; no segundo, demonstramos que Miguel ratifica o objeto de aprendizagem com que lidam os alunos e, como dissemos, não oferece respostas prontas, mas constrói reflexões conjuntas; por fim, no terceiro, apresentamos como os participantes conseguem dar cabo do objeto de aprendizagem.

Neste primeiro recorte retomado do Excerto 4, Arthur responde ao turno anterior de Miguel (linha 180) com uma nova pergunta: [hhhhhh] (.)será que é por conta do- da boa administração do estado? (linhas 183 e 184). Embora não tendo selecionado o próximo falante, a pergunta formulada por Arthur tem a intenção de receber uma confirmação que, em um contexto de sala de aula convencional seria oferecida pelo professor que, em geral, é sempre o próximo a tomar o turno. Todavia, João se autosseleciona e responde à questão de Arthur, deixando uma outra pergunta a ser respondida sem selecionar o próximo falante: mas é: estava tudo em cri:se (.) não tinha onde ele investi:r (.) como ele conseguiu [esse dinheiro]? (linhas 186 a 188). Miguel é o próximo a tomar o turno e oferece a contribuição para lidar com o objeto de aprendizagem em questão (linhas 189 a 192). Arthur, autosselecionando-se para tomar o turno, demonstra estar atento à explicação de Miguel a ponto de completar sua informação (linhas 193 a 195).

Recorte 1
Excerto 4

Reconhecemos, a partir da fala-em-interação demonstrada neste recorte, que no contexto analisado há uma relação menos assimétrica entre professor e alunos. A negociação das identidades institucionais de professor/aluno aparentemente está mais associada a outras espécies de relações, como a de saber; do que a relações de poder e controle social institucionalmente predeterminadas, como ocorre na IRA.

Neste recorte, como amostra de outras ocorrências ao longo do excerto, em dois turnos mais longos (linhas 198 a 201 e linhas 210 a 214), Miguel produz reflexões sobre o conteúdo em questão sem, contudo, responder diretamente às perguntas dos alunos. Essas participações de Miguel, instigando os alunos a construírem juntos um entendimento, estão arraigadas na proposta pedagógica do Colégio Empreendedor: desenvolver um trabalho conjunto de alunos e professores a fim de darem conta de desafios de aprendizagem.

Recorte 2
Excerto 4

É importante ainda mencionar que Miguel ratifica o objeto de aprendizagem em torno do qual os alunos produzem ação social. Em outras palavras, Miguel não deslegitima o trabalho interacional de João, Arthur e Lucas por conta de não estarem necessariamente executando a tarefa da aula, formulando questões e as anotando para posteriormente trocar entre as equipes. Isso fica evidenciado na sequencialidade dos turnos de fala, já que os turnos de Miguel levam em consideração o conteúdo do turno anterior. Dessa forma, o entendimento necessário para dar conta do objeto de aprendizagem em questão vai sendo construído conjuntamente na fala-em-interação.

No recorte a seguir, os participantes conseguem chegar conjuntamente a esse entendimento satisfatório com a ajuda de Miguel.

Miguel, conforme demonstramos, não oferece respostas prontas às perguntas feitas pelos alunos João, Lucas e Arthur, mas prefere construir entendimento conjunto, permitindo que os alunos opinem e manifestem seus entendimentos. Todavia, avançando na construção conjunta do entendimento que poderia dar conta do objeto de aprendizagem para o qual os alunos estavam orientados e se engajam interacionalmente, Miguel aponta para outro fator que, para ele, seria fundamental para compreensão da questão, sem, contudo, dizer de imediato o que era: tem outra coisa que ele faz (.) não sei se na pesquisa de vocês tem na web (.) que é: (.) cara que é o fundamental (linhas 240 a 242).

Recorte 3
Excerto 4

Lucas, entre as linhas 244 e 245, toma o turno para responder ao questionamento de Miguel a partir de um achado no texto que liam: aqui fala outra medida foi a criação de programa de obras públicas. Diante dessa resposta, Miguel exclama aí ó (linha 246) e aponta o dedo (linha 247), demonstrando tanto com sua fala quanto com seu gesto corporal que aquela era a informação essencial que daria conta da questão que tentavam responder.

Assim, após Arthur demonstrar que havia compreendido (linha 248), Lucas se autosseleciona e lê o trecho do texto que tinha em mãos que dava mais detalhes sobre a informação (linhas 249 a 252). Miguel, então, formula nova pergunta para os alunos por que- por que que isso é importante? (linha 253) para verificar sua compreensão. Essa pergunta é respondida por João (linha 254), demonstrando seu entendimento sobre a informação. Essa resposta é ratificada por Miguel, que assume o turno completando a informação de João (linha 255) e oferece explicações extras sobre a importância do programa de obras públicas para recuperação da economia estadunidense durante a crise de 1929. Arthur, João e Lucas assentem (linha 263), demonstrando entendimento das explicações de Miguel e, assim, fechando a construção conjunta de um entendimento necessário para dar cabo do objeto de aprendizagem.

Em síntese, a atividade interacional transcrita neste dado evidencia os seguintes momentos: i) ratificação de um objeto de aprendizagem emergente e contingente na fala-em-interação - como os Estados Unidos conseguiram dinheiro para se reerguer na crise econômica de 1929; ii) participação e engajamento na produção de ação social tentando dar conta desse objeto legitimado no curso da atividade interacional; iii) participação de Miguel, a partir de convite dos alunos, pois não conseguem chegar a uma resposta satisfatória; iv) ratificação de Miguel do objeto de aprendizagem com que lidam os alunos, construindo entendimento satisfatório para a questão sem, contudo, dar respostas prontas; v) protagonismo dos alunos, pois conseguem dar cabo do objeto de aprendizagem, envidando esforços conjuntos na construção de um entendimento satisfatório - o programa de obras públicas adotado pelo governo estadunidense foi fundamental para recuperação da economia durante a crise de 1929, pois gerou emprego e renda para os trabalhadores.

5 Considerações finais

O dado de fala-em-interação analisado aponta para uma forma de organização não canônica, isto é, sem a “regência” e “controle social” exclusivos do professor, pois a negociação de manutenção de uma pauta é compartilhada entre os participantes. Desse modo, as oportunidades de participação nesse cenário são ampliadas, criando um contexto em que as relações interacionais são menos assimétricas e mais democráticas de forma que a negociação das identidades institucionais de professor e aluno é constante e está, aparentemente, mais ligada a uma relação de saberes legitimados do que de autoridade pré-determinada institucionalmente.

Além disso, reconhecemos que, nesse contexto, a maior liberdade para autosseleção e participação, legitimação de um objeto de aprendizagem emergente da interação (inclusive pelo professor), possibilidade para manifestação da identidade juvenil e engajamento interacional para dar conta do objeto de aprendizagem legitimado são índices de uma nova ordem comunicativa de sala de aula que possibilita agentividade e protagonismo dos estudantes, de forma que possam experienciar situações legítimas de construção de conhecimento em que identificam problemas, levantam e testam hipóteses e constroem conjuntamente entendimentos satisfatórios.

Por fim, no intuito de estabelecer uma interlocução pedagógica a partir de nossos resultados destacamos que na sala de aula contemporânea ocorre aprendizagem por meio de participações diferentes daquelas tradicionalmente esperadas na escola. O professor deixou de ser o único protagonista do ensino escolar, por isso há necessidade de reconhecer e legitimar o protagonismo do aluno e dessa forma os modos de organização das salas de aula precisam ser revistos, sobretudo no que tange a aspectos de fala-em-interação. Além disso, é necessário destinar mais atenção à aprendizagem (STREET, 2014STREET, B. Letramentos sociais: Abordagens críticas do letramento no desenvolvimento, na etnografia e na educação. São Paulo: Parábola, 2014.) e não só ao ensino em nossas políticas educacionais e nos cursos de formação de professores. E esse deslocamento de foco implica reconhecer que nas nossas salas de aula contemporâneas, conforme observado em Lopes (2015LOPES, M. F. R. A fala-em-interação de sala de aula contemporânea no Ensino Médio: o trabalho de fazer aula e fazer aprendizagem de língua espanhola. 2015. 197f. Tese (Doutorado em Letras) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2015.), Rampton (2006RAMPTON, B. Language in late modernity: Interaction in an urban school. Cambridge: Cambridge University Press, 2006. https://doi.org/10.1017/CBO9780511486722
https://doi.org/10.1017/CBO9780511486722...
) e neste artigo, há alunos engajados e que protagonizam o trabalho de fazer aprendizagem por meio de práticas de linguagem como as participações exuberantes, sobrevivendo, assim, às contingências da modernidade tardia (RAMPTON, 2006RAMPTON, B. Language in late modernity: Interaction in an urban school. Cambridge: Cambridge University Press, 2006. https://doi.org/10.1017/CBO9780511486722
https://doi.org/10.1017/CBO9780511486722...
).

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    » https://doi.org/10.1111/j.1540-4781.2008.00788.x
  • 2
    O projeto de pesquisa que permitiu a coleta desses dados passou por avaliação e aprovação do Comitê de Ética da Universidade Estadual de Maringá; CAAE 38194114.1.0000.0104.
  • 3
    No original: “[...] Classroom talk as a nexus of inter-related speech exchange systems rather than as a unified speech exchange system that is characterized by a single set of question-answer-comment practices.”
  • 4
    No original: “[...] a particular kind of reuttering (oral or written) of a student´s contribution – by another participant in the discussion”.
  • 5
    Pesquisas em ACE (ABELEDO, 2008ABELEDO, M. L. Uma compreensão etnográfica da aprendizagem de língua estrangeira na fala-em-interação de sala de aula. 2008. 217f. Tese (Doutorado em Letras) - Programa de Pós-Graduação em Letras, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2008.; KANITZ, 2013KANITZ, A. Resolução de problemas e construção conjunta de conhecimento na fala-em-interação em cenário de desenvolvimento tecnológico. 2013. 184f. Dissertação (Mestrado em Linguística) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2013.; LOPES, 2015LOPES, M. F. R. A fala-em-interação de sala de aula contemporânea no Ensino Médio: o trabalho de fazer aula e fazer aprendizagem de língua espanhola. 2015. 197f. Tese (Doutorado em Letras) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2015.; UFLACKER, 2012UFLACKER, C. Fazer avaliar na construção do participante competente em sala de aula. 2012. 223f. Tese (Doutorado em Letras) - Programa de Pós-Graduação em Letras, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2012., por exemplo), cujo foco analítico está nos métodos que os participantes de uma interação usam para produzir ação social conjunta, têm entendido que em contextos de sala de aula, quando os participantes estão orientados para o mesmo foco de atenção em torno de um objeto de aprendizagem, eles estão realizando o trabalho de fazer aula e fazer aprendizagem.
  • 6
    Com base no uso do termo “objeto de aprendizagem” nos trabalhos de Abeledo (2008ABELEDO, M. L. Uma compreensão etnográfica da aprendizagem de língua estrangeira na fala-em-interação de sala de aula. 2008. 217f. Tese (Doutorado em Letras) - Programa de Pós-Graduação em Letras, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2008.) e Lopes (2015LOPES, M. F. R. A fala-em-interação de sala de aula contemporânea no Ensino Médio: o trabalho de fazer aula e fazer aprendizagem de língua espanhola. 2015. 197f. Tese (Doutorado em Letras) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2015.), entendemos que este se trata de ponto/tópico/pergunta/dúvida, emergente e contingente na interação, para o qual os participantes se orientam e produzem ação social no intuito de construir um entendimento satisfatório que o encerra. Neste artigo, é essa a definição que também adotamos quando nos referimos a objeto de aprendizagem.
  • 7
    O nome da instituição em que os dados foram gerados, bem como dos participantes da pesquisa são fictícios a fim de se preservar a identidade dos sujeitos da pesquisa.
  • 8
    A interseriação, no Colégio Empreendedor, consiste em alunos das diferentes séries do Ensino Médio trabalhando juntos, nas mesmas equipes e nas mesmas tarefas.
  • 9
    Abeledo (2008ABELEDO, M. L. Uma compreensão etnográfica da aprendizagem de língua estrangeira na fala-em-interação de sala de aula. 2008. 217f. Tese (Doutorado em Letras) - Programa de Pós-Graduação em Letras, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2008., p. 169) define etnometodologicamente competência como a condição de membro competente de uma comunidade que é sustentada pelo uso da linguagem em interação para participar das atividades cotidianas de uma comunidade.
  • 10
    GOMES, C. A crise 1929 (Grande Depressão). Disponível em:<http://bit.ly/2pyDQsE/>. Acesso em: 10 out. 2015.

ANEXO A - Convenções de transcrição

. (ponto final) Entonação descendente ? (ponto de interrogação) Entonação ascendente , (vírgula) Entonação de continuidade - (hífen) Marca de corte abrupto ↑↓ (flechas para cima e para baixo) Alteração do tom de voz. Mais agudo: para cima; mais grave para baixo palavra (sublinhado) Som enfatizado PALAVRA (maiúsculas) Fala em volume alto °palavra ° (sinais de graus) Fala em voz baixa °°palavra °° (sinais de graus duplos) Fala em voz destacadamente mais baixa. >palavra< (sinais de maior do que e menor do que) Fala acelerada <palavra> (sinais de menos do que e maior do que) Fala desacelerada hh (série de h´s) Aspiração ou riso .hh (h´s precedidos de ponto) Inspiração audível [ ] (colchetes) Fala simultânea ou sobreposta = (sinal de igual) Elocuções contíguas (2,4) (números entre parênteses) Medida de silêncio (em segundos e décimos de segundos) (.) (ponto entre parênteses) Micropausa, até 2/10 de segundo ( ) (parênteses vazios) Segmento de fala que não pode ser transcrito (palavra) (segmento de fala entre parênteses) Transcrição duvidosa (( deixando o texto)) (parênteses duplos) Descrição de atividade não vocal De domingo (segmento em itálico) Reprodução de leitura em voz alta {transcrição impossível} (chaves duplas) Explicação de uma omissão de transcrição ou outra explicação necessária. (círculo vermelho) Ênfase em um participante, movimento ou parte do quadro de imagem . (quadro laranja) Destaque para um piso conversacional. Fonte: Adaptado de Loder (2008).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Jun 2017
  • Data do Fascículo
    Oct-Dec 2017

Histórico

  • Recebido
    30 Dez 2016
  • Aceito
    18 Abr 2017
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