Acessibilidade / Reportar erro

COMO VEJO A ABEM

Não é a ABEM uma instituição qualquer, nascida ao sabor das circunstâncias ou criada em razão dos interesses, maio res ou menores, de um grupo ou de uma classe.

Surgiu, sim - é o que acredito - da lucidez e da faculdade de previsão e antevisão de estudiosos atentos da medicina e do ensino médico, que vislumbraram a necessidade imperativa da existência de uma entidade que pudesse oferecer àquele ensino, um sentido de unidade dentro de uma renovação constante, como fator de dinamização e atualização.

Ao assumir sua presidência, em 1980, eleito, que fui, para o biênio 1982/1984, tinha nítida consciência dos problemas que se me deparariam em função dessa minha crença. Sabia, dos obstáculos que haveria de encontrar em termos de novas perspectivas para a educação médica, o que seria agravado por motivos estruturais do órgão, e pela pequena duração do mandato que me era conferido, em eleição, diga-se de passagem, direta, o que não me permitiria identificar soluções mais amplas e adequadas. Não o bastante, esforços foram feitos e, não duvido, alguns deles surtirão efeitos.

Não teria sentido criar e manter uma instituição, que se quedasse na comodidade do estático. Uma instituição dessa natureza teria de ser essencialmente dinâmica e renovadora - (inovadora, também, quando a inovação fosse um condicionador de modernização) - e em sintonia com o processo social e político em todas as suas nuanças.

Sob tal enfoque, afigura-se-me a ABEM como um ponto de convergência de opiniões, conceitos, experiências, levando a tomadas de decisões concretas e úteis.

Não há negar que em seus vinte e dois anos de existência, tem a ABEM procurado situar-se no melhor ângulo para estudos e medidas visando a melhor formação do médico. Mas há, às vezes, descaminhos que podem configurar, no final, um delineamento profissional carente de substância, que representa significativa parcela em detrimento do desenvolvimento do contexto comunitário.

Impõe-se evitar esses descaminhos, em benefício do médico e, assim, da comunidade.

Uma das medidas de indubitável importância é, talvez, a que se vem tentando implantar no ensino médico brasileiro, referente ao sistema integrado docência/serviço s. É assunto complexo e não pode ficar restrito a análises puramente didático/pedagógicas.

Creio que, sob este aspecto, está a ABEM a trilhar caminhos novos e certos.

Será inútil, suponho, a importação de técnicas ou modelos. As soluções, diz o bom senso, surgem da vivência dos problemas, das ações e reações geradas pela cult ura de cada povo...

A posição da ABEM há de ser a de crítica e análise permanente e percuciente do que se faz em termos de ensino da medicina, respaldada em dados de avaliação a serem apresentados em escalas regulares.

A educação, como a entendo, compete dar ao homem a consciência do seu papel na sociedade, em função da preponderância desta sobre o indivíduo e, talvez, filosoficamente, mais do que isto, em função dele próprio como agente de fatores positivos e negativos dessa mesma sociedade, que dele deriva mas que o absorve.

E quando a educação está vinculada à saúde, binômio em que repousa o ideal da melhor qualidade de vida, a participação do educador médico no processo social e político é, irretorquivelmente, da mais alta relevância.

Visualizo, nessa colocação, um dos aspectos profunda e paradoxalmente vulnerável da ABEM.

1ndaga-se às vezes insistentemente, e com razão, qual a meta primordial da ABEM e qual a forma didático-pedagógica para alcançar o objetivo a que ela se propõe.

Abstraindo-se possíveis divagações estatutárias, entendo que ã ABEM cabe o papel de aliciadora de técnicas nativas que possam proporcionar perspectivas para a mais adequada formação do médico brasileiro de acordo com a realidade social do País.

Em nosso contexto social, no qual a carência alimentar sobressai como um dos mais destacados forjadores de doenças, o profissional de técnicas sofisticadas perder-se-á, impotente e frustrado.

Não se trata de visão pessimista. É uma constatação, não só de respeitáveis educadores médicos, mas, até de leigos inteligentes e curiosos. Notadamente daqueles que têm vivência e experiência em zona rural e, particularmente, em zona rural nordestina.

O nosso atual sistema econômico - é público e notório - não favorece o social, e o homem, esmagado por essa estrutura de fundamentos por assim dizer, medievais terá de ser acudido nos males nele provocados por essa ·mesma est rutura. É o mínimo que, pelo menos no atual estágio histórico lhe pode ser dado, para a sua sobrevivência, a que tem direito e não lhe deve ser subtraído.

Entendo, assim, que cabe à ABEM, a função de doutrinadora, para a consolidação de métodos que viabilizem a formação do profissional adequado ao meio, funcionando, ao mesmo tempo, como elemento de estímulo para a integração do educador com o educando e as áreas que oferecem campo para treinamento. Sua responsabilidade repousa na formação do médico com uma recepção crítica do mundo que o cerca e com um único engajamento: o de agente cooperador para a realização de medidas propiciadoras de uma melhor forma de vida.

Com esse posicionamento, vejo a ABEM, como órgão que deverá ordenar uma linha de ação em dois segmentos: o apoio aos atuais Programas de Integração Docente-Assistencial. ajudando aos que neles se empenham, para que consigam sua implantação, no real, no palpável, no verdadeiro, sem "faz de conta", e o total amparo à implantação e viabilização de um Programa Nacional de Educação Médica - PNEM - a fim de que desejadas e esperadas mudanças no ensino da medicina se tornem possíveis.

Não poderá a AB EM, logicamente instituição, que é, congregada de representações nos diversos segmentos de escolas médicas, promover de imediato essas mudanças. Estas polarizariam o apoio dos Ministérios específicos, a força das entidades responsáveis pelos serviços comunitários na área de saúde, tudo isso sublinhado pela conscientização de que o homem, animal social, é o flucro de tudo e de todos.

Em razão de todos esses conceitos, é a ABEM - deve sê-lo - centro irradiador de normas e diretrizes, como fórum para debates de idéias, como fonte de doutrina e de filosofia de ação.

É assim que a vejo e sinto.

Fernando Figueira
Presidente da ABEM

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Set 2021
  • Data do Fascículo
    May-Aug 1984
Associação Brasileira de Educação Médica SCN - QD 02 - BL D - Torre A - Salas 1021 e 1023 | Asa Norte, Brasília | DF | CEP: 70712-903, Tel: (61) 3024-9978 / 3024-8013, Fax: +55 21 2260-6662 - Brasília - DF - Brazil
E-mail: rbem.abem@gmail.com