Acessibilidade / Reportar erro

Espalhamento elétron-pósitron

Electron-positron scattering

Resumos

Este trabalho tem como foco estudar o espalhamento elétron-pósitron. Utilizando os o postulados da mecânica quântica, teoria de espalhamento e funções de Green, é mostrada a forma da matriz-S e sua relação com seções de choque. Além disso, são apresentadas algumas regras de Feynman que são utilizadas para encontrar a seção de choque de um espalhamento elétron pósitron resultando em um par múon-antimúon e a seção de choque referente ao mesmo espalhamento, porém gerando dois fótons. A técnica também é utilizada para escrever as seções de choque de processos de produção do bóson de Higgs através de um espalhamento elétron pósitron, o Higgs-strahlung e a fusão WW. É apresentado então um breve texto sobre os programas ILC e CLIC e sua relação com uma nova física.

Palavras-chave
Espalhamento; Teoria Quântica de Campos


This paper focuses on studying electron-positron scattering. Using the postulates of quantum mechanics, scattering theory and Green’s functions, the shape of the S-matrix and its relation to cross sections is shown. In addition, some Feynman rules are presented that are used to find the cross section of an electron-positron scattering that results in a muon-antimuon pair and also the cross section of the same scattering process, but with the outcome of two photons. The technique is also used to write the cross sections of some Higgs boson production processes, such as the Higgs-strahlung and the WW fusion. Finally it is presented a short text on the ILC and CLIC programs and their relation to new physics.

Keywords
Scattering; Quantum Field Theory


1. Introdução

Imediatamente após Paul Adrien Maurice Dirac descobrir (ou inventar) sua equação (i-m)ψ=0, em 1928, foram reconhecidas duas propriedades da partícula com massa m (o elétron):

  • O spin resultava diretamente das equações, que “faziam surgir” as matrizes de Pauli já conhecidas, as quais representavam exatamente os operadores correspondentes às componentes Sx,Sy,Sz, do operador de spin S.

  • A energia apresentava um espectro com valores negativos, inesperados, e, à primeira vista, inconvenientes.

A primeira propriedade foi celebrada como um avanço da Física teórica quântica. Ao contrário da segunda, execrada pelos pilares da comunidade científica, como Wolfgang Pauli e Werner Heisenberg, por acarretar, segundo eles, a derrocada dos modelos atômicos vigentes. Eis que, em 2 de agosto de 1930, o físico estadunidense Carl David Anderson observa uma foto tirada em uma câmara de vapor sujeita à radiação cósmica, e identifica uma partícula com a mesma massa do elétron de Dirac, mas com a carga contrária. Estava descoberta a antimatéria, prevista dois anos antes pela equação de Dirac, o que resultou na atribuição do prêmio Nobel ao seu autor em 1933, “pela descoberta de novas formas produtivas da teoria atômica” – seja lá o que isto quer dizer. Nos dias atuais as interações entre as duas partículas descobertas pela equação de Dirac estão “bombando” no território da Física – experimental e teórica –, com perspectivas de virem a ser um campo fértil de pesquisas nos próximos 20–30 anos. Os experimentos que vêm sendo realizados há décadas no LHC/CERN ainda não se mostraram capazes de revelar uma Nova Física, restringindo-se à exploração – e confirmação cabal, é bom que se diga – do Modelo Padrão de Partículas. Novos projetos de aceleradores lineares de partículas – o ILC/International Linear Collider (no Japão) e o CLIC/Compact Linear Collider (no CERN) – estão sendo desenvolvidos, desde 2013 e 2015, respectivamente, e construídos, para estudar mais acuradamente as interações e+e-, com três metas principais:

  • Descrever com mais precisão as propriedades do bóson de Higgs;

  • Refinar os dados sobre o quark top – o mais pesado –, por exemplo, medindo diretamente seu acoplamento de Yukawa com o campo de higgs;

  • Identificar indícios de uma Nova Física.

O trabalho de conclusão de curso do bacharelando em Física no Instituto de Ciências Exatas da Universidade Federal Fluminense (UFF/ICEx) Erick Landim, apresentado a seguir, poderá servir, por sua excelência, como referência para alunos e professores de Física em geral nessa promissora área de pesquisa teórica e experimental. Reproduzo abaixo, em tradução livre, algumas conclusões de Zarneck em seu trabalho [1[1] A.F. Zarneck, arXiv:2004.14628v1 (2020).]: “Colisores lineares e+e- com altas energias oferecem um programa de pesquisa rico e diverso: determinação precisa de acoplamentos de Higgs, determinação precisa da massa do quark top, e outras propriedades. Assim como restrições rigorosas a muitos cenários de Nova Física, por buscas indiretas em escalas de massa até 100TeV, e prospecções para observação direta de Nova Física em vários outros cenários. Graças às escolhas diferentes de energias e aos cenários de experimentação, os dois projetos, ILC e CLIC, são, em grande medida, complementares.

2. Espalhamento Quântico Não Relativístico

2.1. Espalhamento por um potencialindependente do tempo

Enquanto no regime clássico podemos determinar simultaneamente com precisão a velocidade e posição da partícula, no regime quântico isso já não é possível devido ao princípio de incerteza de Heisenberg [2[2] W. Heisenberg, Zeitschrift für Physik 33, 879 (1935).], ΔxΔp1/2, considerando um o sistema de unidades onde c==1. Portanto trataremos as partículas como ondas. Por exemplo, uma onda plana dada por eikx representa uma partícula livre [3[3] C. Cohen-Tannoudji, B. Diu e F. Laloe, Quantum Mechanics (Wiley-VCH, Weinheim, 1996 ), v. 1.].

Vamos agora considerar uma partícula sujeita a um dado potencial V(r) no espaço de coordenadas. Utilizando a equação de Schrödinger [4[4] E. Schrödinger, Phys. Rev. 28, 1049 (1926).] independente do tempo, temos:

(1) [ E - V ( r ) + 2 2 m ] ψ ( r ) = 0 .

Como a equação de Schrödinger é uma equação diferencial parcial linear, o princípio de superposição vale, e portanto, podemos escrever uma dada solução ψ como a soma de duas outras ψinc e ψesp, representando, respectivamente, uma onda incidente e outra espalhada

(2) ψ ( r ) r ψ i n c ( r ) + ψ e s p ( r ) .

Considerando que a partícula incidente é livre, temos que ψinc é representada por uma onda plana. Supondo que a onda que sai do sistema é esférica, podemos escrever o seguinte tentativa de solução para a equação (1):

(3) ψ + ( r ) r e i p r + f + ( p r ^ , p ) e i p r r .

Definimos f(p,θ)f+(pr^,p) como a amplitude de espalhamento do processo. A amplitude de espalhamento nos dirá qual o efeito do potencial na partícula.

Utilizando a notação de braket de Dirac [5[5] P.A.M. Dirac, Mathematical Proceedings of the Cambridge Philosophical Society 35, 416 (1939).], podemos escrever a equação de Schrödinger de um estado |ψE+ como:

(4) H | ψ E + = E | ψ E + .

Podemos ainda decompor o operador hamiltoniano em duas partes, uma parte livre e uma de interação, ou seja,

(5) H = H 0 + V .

Desta forma, obtemos duas possíveis equações, uma onde a interação V está presente

(6) ( E - H 0 ) | ψ E + = V | ψ E + .

E uma equação de partícula livre

(7) ( E - H 0 ) | φ E = 0 .

Desta forma, combinando as duas obtemos:

(8) | ψ E ± = | φ E + ( E - H 0 ) - 1 V | ψ E ± .

Seja V um potencial diagonal, ou seja

(9) r | V | r = V ( r ) - δ 3 ( r - r ) .

Multiplicamos (8) à esquerda por r|, utilizando que d3r|rr|=𝕀 [3[3] C. Cohen-Tannoudji, B. Diu e F. Laloe, Quantum Mechanics (Wiley-VCH, Weinheim, 1996 ), v. 1.] e aplicando a diagonalidade de V temos

(10) r | | ψ E ± = r | φ E + d 3 r r | ( E - H 0 ) - 1 | r × V ( r ) r | ψ E ± .

Se considerarmos H0|p=p22m|p e |ψE=|p e identificarmos (E-H0)-1 como a função de Green da partícula livre [6[6] C. Itzykson e J. Zuber, Quantum Field Theory (Dover, New York, 2005).] no espaço de momento, ou seja

(11) p | G 0 ( E ) | p = p | ( E - H 0 ) - 1 | p = [ E - p 2 / 2 m ] - 1 2 π δ 3 ( p - p ) ,

onde o termo entre colchetes equivale ao hamiltoniano da partícula. Aplicando a transformada de Fourier para levar ao espaço de coordenadas [7[7] E. Butkov, Física Matemática (LTC, Rio de Janeiro, 1978).],

(12) G 0 ( r , r ; E ) = r | ( E - H 0 ) - 1 | r = 4 π m r | k d 3 k k | r p 2 - k 2 .

Analisando o integrando, vemos que possui polos em p2=k2, para evitar singularidades nesses pontos, iremos adicionar um termo iϵ pequeno e positivo, de tal forma que

(13) G 0 ± = ( E - H 0 ± i ϵ ) - 1 .

Consideremos agora que G0±(r,rE)=2m(2π)-3I±, onde I± é uma integral tridimensional no espaço de momento com d3k=k2dkdΩ,

(14) I ± = 0 d k k 2 p 2 - k 2 ± i e d Ω k e i k ( r - r ) .

Como Ωk é um angulo sólido a segunda integral vale

(15) d Ω k e i k ( r - r ) = 2 π i k | r - r | [ e i k | r - r | - e - i k | r - r | ] .

Ou seja,

(16) I ± = 2 π i | r - r | - k d k p 2 - k 2 ± i ϵ e i k | r - r | .

Para avaliar esta integral precisamos estendê-la para o plano complexo, utilizando como denominador

(17) p 2 - k 2 ± i ϵ = - [ k - p 2 ± i ϵ ] [ k + p 2 ± i ϵ ] .
(18) - [ k - ( p ± i ϵ ) ] [ k + ( p ± i ϵ ) ] .

Temos ainda que integrais I+ e I- são analíticas no subplano superior (Im k > 0), a partir daí podemos aplicar o teorema dos resíduos [7[7] E. Butkov, Física Matemática (LTC, Rio de Janeiro, 1978).], utilizando o contorno da Figura 1 para I+ e o contorno da Figura 2 para I-, que nos dá

Figure 1
Contorno para I+.
Figure 2
Contorno para I-.
(19) I ± = 2 π i Res I ± = - i π e ± i p | r - r | .

Com isso obtemos:

(20) G 0 ± ( r , r ; E ) = - 2 m 4 π | r - r | e ± i p | r - r | .

No limite r, temos

(21) G 0 ± ( r , r ; E ) r - 2 m 4 π r e i p r e i p r .

Substituindo (21) na forma assintótica de (10) temos

(22) ψ E ± ( E ) r e i p r - 2 m 4 π r e ± i p r d 3 r e i p r V ( r ) ψ E ± ( r ) .

Comparando com (3), temos que a amplitude de espalhamento é dada por

(23) f ± ( p , p ) = - 2 m 4 π d 3 r e i p r V ( r ) ψ E ± ( r ) .

Vamos agora, com esta expressão para a amplitude de espalhamento, definir o que chamamos de matriz T, que generaliza a interação V.

2.2. Matriz T

A partir da equação (23). podemos também definir a amplitude de espalhamento como a transformada de Fourier da interação V

(24) f p , p = f + ( p , p ) = p | V | p + .

Podemos ainda escrever, considerando o elemento de matriz de um dado operador T

(25) f p , p = - m 2 π p | T | p .

Comparando as duas expressões vemos que

(26) T | p V | p + ,

ou ainda:

(27) T | φ = V | ψ + .

Desta forma, o operador T parece ser uma generalização do potencial V. Podemos, da mesma forma, escrever uma generalização da função de Green da partícula livre G0+

(28) G ± ( E ) = ( E - H ± i ϵ ) - 1 .

Vamos então agora encontrar as equações integrais relacionadas a G+, T e |ψE+.

2.3. Equações integrais de Lippmann-Schwinger

A equação (8) com a condição de contorno prescrita iϵ é o exemplo de uma equação integral. Utilizar a condição de contorno iϵ na equação (8) nos dá

(29) | ψ E ± = | φ E + G 0 ( E ) V | ψ E ± .

Que é a equação de Lippmann-Schwinger [8[8] B.A. Lippmann e J. Schwinger, Phys. Rev. 79, 469 (1950).]. Multiplicando a (29) à esquerda por V e aplicando (27), temos uma equação de autovalor, de onde podemos tirar a seguinte expressão:

(30) T ( E ) = V + V G 0 + ( E ) T ( E ) .

Utilizando a identidade A-1-B-1=B-1(B-A)A-1, considerando que A=G± e B=G0±, temos a relação entre G e G0

(31) G ± ( E ) = G 0 ± ( E ) + G 0 ± ( E ) V G ± ( E ) .
(32) = G 0 + ( E ) + G ± ( E ) V G 0 ± ( E ) .

Estas equações serão muito úteis posteriormente.Vamos agora estudar o caso de uma interação dependente do tempo.

2.4. Funções de Green dependentes do tempo

As funções de onda e funções de Green dependentes do tempo devem satisfazer as equações de Schrödinger

(33) ( i t - H 0 ) | φ ( t ) = ( i t - H ) | ψ ( t ) = 0 .
(34) ( i t - H 0 ) G 0 ( t - t ) = ( i t - H ) G ( t - t ) = δ ( t - t ) .

A menos de condições de contorno, as equações integrais dependentes do tempo análogas às equações de Lippmann-Schwinger são

(35) | ψ ( t ) = | φ ( t ) + G 0 ( t - t ) V ( t ) | ψ ( t ) d t .
(36) G ( t - t ) = G 0 ( t - t ) + G 0 ( t - t ′′ ) V ( t ′′ ) G ( t ′′ - t ) d t ′′ .

2.5. Causalidade

É natural impor uma condição de contorno que manifeste a causalidade. Ou seja

(37) G + ( t - t ) = G 0 + ( t - t ) = 0 para t < t .

Considerando a função degrau de Heaviside

(38) θ ( t - t ) = { 1 se t > t 0 se t < t .

Com a propriedade

(39) t θ ( t - t ) = δ ( t - t ) .

Vemos que ao multiplicar essa função pela função de Green, apenas os valores de t>t produzirão um resultado não nulo. Portanto é uma boa forma de representar causalidade.

As soluções de (34) são

(40) G + ( t - t ) = - i θ ( t - t ) e - i H ( t - t ) .
(41) G 0 + ( t - t ) = - i θ ( t - t ) e - i H 0 ( t - t ) .

Pelos postulados da mecânica quântica, ao aplicarmos um operador e-iH(t-t) a algum estado |ϕ, realizamos a evolução deste estado, ou propagamos este estado no tempo [3[3] C. Cohen-Tannoudji, B. Diu e F. Laloe, Quantum Mechanics (Wiley-VCH, Weinheim, 1996 ), v. 1.]. Por este motivo, as funções de Green para partícula livre atuam como propagadores. Considerando que uma função qualquer da energia F(E) pode ser representada como f(t) e vice-versa por meio da transformada de Fourier, a nomenclatura de propagador também vale para G0+(E).

2.6. Propagadores

Como as funções de Green agem como propagadores, iremos seguir o desenvolvimento de Feynman [9[9] R.P. Feynman, Phys. Rev. 76, 769 (1949).] e utilizar o princípio de Huygens, ou seja, cada ponto em uma frente de onda é uma nova fonte de propagação [10[10] J. Frejlich, Óptica (Oficina de Textos, São Paulo, 2011).].

Portanto, escrevemos para t>t

(42) ψ ( r , t ) = d 3 r i G + ( r , t ; r , t ) ψ ( r , t ) .
(43) φ ( r , t ) = d 3 r i G 0 + ( r , t ; r , t ) φ ( r , t ) ,

onde G+(r,t;r,t) é o elemento de matriz da função de Green causal no espaço de coordenadas.

Conforme visto anteriormente, a função degrau de Heaviside é uma maneira formal de impor causalidade, portanto, dizer que a onda se propaga para frente em uma forma causal é equivalente a multiplicar o lado de mão esquerda de (42) e (43) por θ(t-t). Como ψ e φ satisfazem a equação de Schrödinger, chamamos iG+(r,t,r,t)iG+(x;x) um propagador causal de Feynman. Para interações dependentes do tempo, o propagador causal satisfaz:

(44) i G + ( x ; x ) = i G 0 + ( x ; x ) + d 4 x ′′ i G 0 + ( x , x ′′ ) [ - i V ( x ′′ ) ] × i G + ( x ′′ ; x ) .

Para demonstrar que as (42)(43) são consistentes com (44), nós garantimos que a condição t>t é satisfeita invocando-se o limite de ondas planas conforme t (também é valida para t)

(45) ψ ( r , t ) t - φ ( r , t ) .

Que simplifica estados em que a partícula está inicialmente livre antes de se espalhar em um tempo finito t>-. Substituindo (44) e (45) na primeira equação das (42)(43) para t nos dá

(46) ψ ( r , t ) t φ ( x ) + d 3 r i G 0 + ( r , t ; r , t ) φ ( r , t ) + d 3 r G 0 + ( x ; x ′′ ) V ( x ′′ ) i G + ( x ′′ ; r , t ) φ ( r , t ) .

Usando que iG0+ propaga φ via (43) enquanto iG+ propaga ψ por meio de (42), vemos que (46) se torna o análogo dependente do tempo da equação de Lippmann-Schwinger

(47) ψ ( x ) = φ ( x ) + d 4 x i G 0 + ( x ; x ) [ - i V ( x ) ] ψ ( x ) .

Estes resultados se aplicam tanto para teoria de Schrödinger não relativística quanto para mecânica de ondas relativísticas.

2.6.1. Propagadores para outras equações

Nas seções anteriores, obtivemos o propagador para as equações de Schrödinger dependentes e independentes do tempo. Iremos agora buscar funções de Green que vão agir como propagadores para as equações de Dirac [11[11] P.A.M. Dirac, Proc. R. Soc. Lond. A 117, 610 (1928).] e Klein-Gordon [12[12] O. Klein, Zeitschrift für Physik 33, 879 (1925).][13[13] W. Gordon, Zeitschrift für PhysiK 40, 117 (1926).].

A função de Green para a equação de Klein-Gordon de spin-0,G0+(x;x)ΔF(x-x), satisfaz:

(48) ( + m 2 ) Δ F ( x - x ) = - δ 4 ( x - x ) .

Utilizando a transformada de Fourier, temos:

(49) Δ F ( x ) = d 4 p e - i p x p 2 - m 2 + i ϵ .

As implicações da prescrição iϵ de Feynman podem ser trabalhadas no plano complexo p0 com os polos em ±p0=E-iϵ, onde E=p2+m2, para realizar a integração basta fechar um contorno semicircular no semiplano p0 inferior se t>0, enquanto para t<0 o contorno é fechado no semiplano p0 superior. Esta escolha garante que a exponencial exp(tIm{p0}) leve integral para zero ao longo dos contornos infinitos. Cada contorno fechado circunda um polo, então, usando o teorema dos resíduos, temos:

(50) i Δ F ( x ) = i 2 π i 2 π [ - d 3 p 2 E θ ( t ) e - i E t e i p r + d 3 p - 2 E θ ( - t ) e i E t e i p r ] .
(51) = d 3 p 2 E [ θ ( t ) e - i p x + θ ( - t ) e i p x ] .

A ultima decomposição diz que iΔF propaga φ+=e-ipx à frente no tempo através de θ(t), enquanto propaga φ-=eipx para trás no tempo através de θ(-t). Na linguagem do princípio de Huygens, os análogos covariantes de (42)(43) são

(52) θ ( t - t ) ϕ + ( x ) = d 3 x i Δ F ( x - x ) i 0 ϕ + ( x ) .
(53) - θ ( t - t ) ϕ - ( x ) = d 3 x i Δ F ( x - x ) i 0 ϕ - ( x ) .

Uma situação similar ocorre para o propagador causal da partícula livre de spin-12 iSF(x;x)=iSF(x-x). Como uma função de Green de partícula livre ela satisfaz

(54) ( i - m ) S f ( x ; x ) = δ 4 ( x - x ) .
(55) S F ( x ) = d 4 p ( p + m ) p 2 - m 2 + i ϵ ,

onde a notação significa μγμ . Adotando os mesmos contornos para p0 adotados anteriormente, temos

(56) i S F ( x ) = d 3 p 2 E [ θ ( t ) ( p + m ) e - i p x + θ ( - t ) ( - p + m ) e i p x ] .

Que propagam os bi espinores de energia positiva ψ+ para frente no tempo e os de energia negativa para trás no tempo, da forma

(57) θ ( t - t ) ψ + ( x ) = d 3 x i S F ( x - x ) γ 0 ψ + ( x ) .
(58) - θ ( t - t ) ψ - ( x ) = d 3 x i S F ( x - x ) γ 0 ψ - ( x ) .

2.7. Série de Dyson

Para conseguir estudar espalhamentos em teoria de campos, devemos ter o aparato matemático correto para tal, partindo de um operador evolução temporal UI(t) arbitrário iremos realizar a expansão em série Dyson [6[6] C. Itzykson e J. Zuber, Quantum Field Theory (Dover, New York, 2005).], e a partir deles encontrar as regras de Feynman

2.7.1. Operador de evolução temporal

Devemos construir um operador UI(t,t) que satisfaz a relação

(59) U ^ I ( t ) | α , t = | α , t .

Se derivarmos em relação ao tempo temos:

(60) { t U I ( t , t ) } | α , t = t | α , t .

Utilizando a equação de Schrödinger considerando o sistema de unidades =c=1

(61) { t U I ( t , t ) } | α , t = - i H I | α , t ,

onde HI é uma dada interação qualquer. Consideremos a seguinte condição de contorno

(62) U I ( t 0 , t 0 ) = 𝕀 ,

onde 𝕀 é o operador identidade. Desta forma podemos reescrever a equação (61) na forma de uma equação integral

(63) U I ( t , t ) = 𝕀 - i d t H I ( t ) U I ( t , t ) .

Supondo HI uma interação pequena e positiva, podemos então buscar uma expansão em série por meio de teoria de perturbação [14[14] C. Cohen-Tannoudji, B. Diu e F. Laloe, Quantum Mechanics (Wiley-VCH, Weinheim, 1996 ), v. 2]. Neste caso UI(t,t0) é representado pela série

(64) U I ( t , t ) = n = 0 U I ( n ) ( t , ) .

Com o termo inicial dado por

(65) U I ( 0 ) ( t , t ) = 𝕀 .

E o termo geral dado por:

(66) U I ( n ) = i d t ′′ H I ( t ′′ ) U I ( n - 1 ) ( t ′′ , t ) ; n 1 .

De forma explícita

(67) U I ( 1 ) = - i d t 1 H I ( t 1 ) U I ( 0 ) ( t 1 , t 0 ) 𝕀 .
(68) U I ( 2 ) = ( - i ) 2 t t 1 d t 1 d t 2 H I ( t 1 ) H I ( t 2 ) .
(69) U I ( n ) = ( - i ) n t t d t 1 t t n - 1 d t n H I ( t 1 ) H I ( t n ) .

A solução iterativa é conhecida como expansão de Liouville-Neumann [15[15] D. Belkic, Principles of Quantum Scattering Theory (CRC Press, Boca Raton, 2003).].

2.7.2. Ordenação temporal dos produtosde operadores

Dados dois operadores dependentes do tempo A^(t1) e A^(t2) [16[16] M.E. Peskin e D.V. Schroeder, An Introduction To Quantum Field Theory (Westview Press, Nashville, 2007).] define o produto ordenado temporalmente como:

(70) T { A ^ ( t 1 ) B ^ ( t 2 ) } = { A ^ ( t 1 ) B ^ ( t 2 ) , t 1 > t 2 B ^ ( t 2 ) A ^ ( t 1 ) , t 2 > t 1 .

Ou, de forma equivalente

(71) T { A ^ ( t 1 ) B ^ ( t 2 ) } = θ ( t 1 - t 2 ) A ^ ( t 1 ) B ^ ( t 2 ) + θ ( t 2 - t 1 ) B ^ ( t 2 ) A ^ ( t 1 ) ,

onde θ é a função degrau de Heaviside.

Integrando o produto temporalmente ordenado em relação a t1 e t2

(72) t 0 t d t 1 t 0 t 1 d t 2 T { A ^ ( t 1 ) A ^ ( t 2 ) } = t t d t 1 t t 1 d t 2 [ θ ( t 1 - t 2 ) × A ^ ( t 1 ) A ^ ( t 2 ) ] + θ ( t 2 - t 1 ) A ^ ( t 2 ) A ^ ( t 1 ) .

Usando as propriedades da função de Heaviside

(73) = t t d t 1 t t 1 d t 2 A ^ ( t 1 ) A ^ ( t 2 ) + t t 1 d t 2 t t d t 1 A ^ ( t 2 ) A ^ ( t 1 ) .

Realizando uma troca de índices, temos:

(74) = t t d t 1 t t 1 d t 2 A ^ ( t 1 ) A ^ ( t 2 ) .

Ou seja

(75) t t d t 1 t t 1 d t 2 A ^ ( t 1 ) A ^ ( t 2 ) = 1 2 ! t 0 t d t 1 t t d t 2 T { A ^ ( t 1 ) A ^ ( t 2 ) } .

Podemos generalizar este resultado para n iterações, o que nos dá

(76) t t d t 1 t t n - 1 d t n A ^ ( t 1 ) A ^ ( t n ) = 1 n ! t t d t 1 t t d t n T { A ^ ( t 1 ) A ^ ( t n ) } .

Se introduzirmos em (76) os elementos UIn(t,t), teremos, para o N-ésimo termo da série

(77) U I ( n ) = ( - i ) n n ! t d t 1 t t n - 1 d t n T { H I ( t 1 ) H I ( t n ) } = 1 n ! T { [ - i t t d t H ( int ) ( t 1 ) ] n } .

Assim o operador

(78) U I ( t , t ) = n = 0 U I ( n ) ( t , t ) .

Se comporta como uma exponencial

(79) U ( t , t ) = T exp { - i t t d t ′′ H I ( t ′′ ) } .

Vamos agora estudar a forma de cada ordem de perturbação e definir a matriz-S e a matriz-T.

2.8. Matriz-S

Considere o termo geral (69). Fazendo n=1 e os limites superiores e inferiores tenderem ao infinito, ou seja, t e t0- temos a correção de primeira ordem para o operador de espalhamento S

(80) S 1 = - i - d t 1 H I ( t 1 ) .

Tomando o elemento de matriz de (80), obtemos

(81) S i f ( 1 ) = ϕ f | S 1 | ϕ i .

Portanto,

(82) S i f ( 1 ) = - i - d t 1 ϕ f | H I ( t 1 ) | ϕ i .

Vamos agora considerar a condição de contorno em que o estado |ψE(t)s tende a uma onda plana em t, ou seja, |ψE(t)se-iEt|φE onde |φE é o estado de onda plana. Considerando uma dada interação devemos também ter uma dependência eiH0t adicional, resultando em

(83) | ψ E ( t ) I t ± e - i E t e i H 0 t | φ E = | φ E .

Para garantir que esse limite seja alcançado pelos estados espalhados por uma interação dinâmica VI(t), atenuamos as exponenciais oscilando loucamente em t=± desligando adiabaticamente HI de acordo com

(84) H I H I , ϵ = e i H 0 t V ( t ) e - ϵ | t | e - i H 0 t .

se ϵ for pequeno e positivo, VI,ϵ0 para t± como requerido. Ou ainda,

(85) H I = e i E f t V e - i E i t .

Assim, o elemento de matriz pode ser escrito como

(86) S i f ( 1 ) = - i ϕ f | V | ϕ i - d t 1 e i ( E f - E i ) t 1 .

A integral é justamente a função delta de Dirac, portanto

(87) S i f ( 1 ) = - 2 π i δ ( E f - E i ) ϕ f | V | ϕ i .

A interpretação física desta correção é simples. Consideremos um sistema de duas partículas de massas m1 e m2 respectivamente. Consideremos agora o sistema no referencial do centro de massa. Neste caso, teríamos uma partícula de massa reduzida μ=m1m2m1+m2 se propagando livremente no estado ϕi para ser espalhada por um dado potencial V e terminar em um estado ϕf. Por ser simples, esta correção não nos dá informações de estados intermediários, para isso, vamos utilizar a segunda correção na matriz S. Partindo novamente de (69), desta vez n=2, temos o elemento de matriz

(88) S i f 2 = - ( i ) 2 - d t 1 t 1 ϕ f | H I ( t 1 ) H I ( t 2 ) | ϕ i .

Lembrando da relação de completeza [3[3] C. Cohen-Tannoudji, B. Diu e F. Laloe, Quantum Mechanics (Wiley-VCH, Weinheim, 1996 ), v. 1.]

(89) m | ϕ m ϕ m | = 𝕀 .

Temos

(90) S i f 2 = ( - i ) 2 - d t 1 t 1 ϕ f | H I ( t 1 ) m | ϕ m ϕ m | H I ( t 2 ) | ϕ i .

Ou ainda

(91) S i f 2 = ( - i ) 2 m - d t 1 t 1 ϕ f | H I ( t 1 ) | ϕ m ϕ m | H I ( t 2 ) | ϕ i .

Reescrevendo o operador de interação de forma análoga à realizada para a primeira ordem de perturbação nos dá

(92) S i f 2 = ( - i ) 2 m ϕ f | V | ϕ m ϕ m | V | ϕ i - d t 1 e i ( E f - E m ) t 1 - t 1 d t 2 e i ( E m - E 1 ) t 2 .

Enquanto a integral em t1 não nos representa problema, a integral em t2 diverge.Para evitar isto, vamos novamente invocar a prescrição iϵ. Desta forma a segunda integral deixa de ser um problema e a perturbação de segunda ordem para a matriz S é dada por

(93) S i f ( 2 ) = - 2 π i δ ( E i - E f ) m ϕ f | V | ϕ m ϕ m | V | ϕ i E i - E m + i ϵ .

Considerando novamente uma partícula reduzida de massa μ, podemos interpretar este resultado da seguinte forma:

A partícula se propaga livremente no estado ϕi e logo após é espalhada pelo potencial H em um ponto r do espaço, então ela se propaga livremente no estado intermediário φm até ser espalhada novamente pelo potencial V em um ponto r’ e por fim se propaga livremente no estado ϕf.

Devemos então estudar a soma sobre os estados intermediários e retirar mais informações. Considerando o hamiltoniano não perturbado H0, temos o seguinte problema de autovalor

(94) H 0 | ϕ m = E m | ϕ m .

Ou seja, podemos escrever Em como o elemento de matriz de H0

(95) E m = ϕ m | H 0 | ϕ m .

Desta forma, podemos reescrever a soma sobre os estados intermediários como

(96) m ϕ f | V | ϕ m ϕ m | V | ϕ i E - ϕ m | H 0 | ϕ m + i ϵ .

Podemos reorganizar esta suma na forma

(97) m ϕ f | V | ϕ m ϕ m | 1 E - H 0 + i ϵ | ϕ m ϕ m | V | ϕ i .

Temos então novamente a aparição da função de Green da partícula livre G0+(+), isso nos permite escrever, considerando a relação de completeza,

(98) S i f ( 2 ) = - 2 π i δ ( E i - E f ) ϕ f | V G 0 + ( E ) V | ϕ i .

Repetindo um procedimento similar para ordens mais alta de perturbação nos leva à expansão

(99) S i f = δ ( E i - E f ) { δ i f - 2 π i [ ϕ f | V | ϕ i + + m ϕ f | V | ϕ m ϕ m | V | ϕ i E i - E m + i ϵ + m n ϕ f | V | ϕ m ϕ m | V | p h i n ϕ n | V | ϕ i ( E i - E m + i ϵ ) ( E i - E n + i ϵ ) ] } .

Utilizando a função de Green G0+, podemos reescrever esta expansão na forma

(100) S i f = δ ( E i - E f ) { δ i f - 2 π i [ ϕ f | V | ϕ i + ϕ f | V G 0 + ( E ) V | ϕ i + ϕ f | V G 0 + ( E ) V G 0 + ( E ) V | ϕ i + ] } .

Se observarmos que a série infinita de Sif representa a expansão de um operador binomial, podemos escrever

(101) S i f = δ ( E i - E f ) { δ i f = 2 π i ϕ f | n = 0 [ V G 0 + ( E ) ] n V | ϕ i } .

Ou seja

(102) S i f = δ ( E i - E f ) δ i f ϕ f | [ 1 - V G 0 + ( E ) ] - 1 | ϕ i .

Escrevendo o termo [1-VG0+(E)] como T+(E), e realizando a propagação do estado ϕf para ϕi, ou seja, Tif+=ϕf|T+|ϕi, temos a forma compacta da matriz-S

(103) S i f = δ ( E i - E f ) [ δ i f - 2 π i T i f + ( E ) ] .

2.8.1. Taxa de probabilidade de transição

Como o elemento de matriz Sif realiza a transição de um estado inicial para outro final, a probabilidade dessa transição ser realizada, segundo os fundamentos da mecânica quântica [3[3] C. Cohen-Tannoudji, B. Diu e F. Laloe, Quantum Mechanics (Wiley-VCH, Weinheim, 1996 ), v. 1.], é dado pelo quadrado absoluto |Sif|2. Consequentemente, para obter a taxa de probabilidade de transição, dividiremos a probabilidade pelo tempo total T da interação.

(104) ω f i = d d t | ψ f ( t ) | ψ i ( t ) | 2 | S i f | 2 T .

Iremos utilizar o limite de ondas planas para calcular ωfi. Neste caso, temos:

(105) | S f i | 2 = | δ ( E f i ) | 2 | T f i | 2 ,

onde, formalmente, |δ(E)|2=δ(0)δ(E) e

(106) δ ( E ) = lim T - T / 2 T / 2 d t e - i E t .
(107) E 0 δ ( 0 ) = T / 2 T / 2 d t = T .

Ou seja

(108) ω f i = | S f i | 2 T = δ ( E f i ) δ ( 0 ) T | T i f | 2 = δ ( E f i ) | T f i | 2 .

Densidade de estados Uma transição quântica sempre envolve ir de um estado preparado i para um range de estados finais f. O número de estados finais em um dado range de momento e energia é conhecido da mecânica quântica estatística como tendo uma incerteza do espaço de fases 6-dimensional da ordem de h3, portanto, para um espaço de fases unidimensional com pf=p

(109) d N f = V d 3 p h 3 = V d 3 p h 3 V d 3 p .

nas unidades de =c=1. Aqui V é a é a parte de coordenada tridimensional do espaço de fase.

Dado um fator de número de estados finais tal como (109), a taxa de transmissão em um conjunto de estados finais é

(110) d Γ f i = ω f i d N f = | S f i | 2 T d N f = δ ( E f i ) | T f i | 2 d N f .

Para processos de um corpo no espaço de fase que conservam energia, com Ei = Ef e dNf=(dNf/dEf)dEf, temos uma taxa de probabilidade de transição integrada de

(111) Γ f i = | T f i | 2 d N f d E f d E f .
(112) = 2 π ρ ( E f ) | T f i | 2 ,

onde ρ(Ef) é chamado o fator densidade de estados

2.8.2 Relação com a seção de choque

Definimos no Capítulo 2 a seção de choque,

(113) σ d Ω = N d Ω I t .

Podemos ainda reescrevê-la na forma

(114) σ = Taxa de espalhamento fluxo incidente .

O fluxo é o número de partículas que passa por uma dada área A em um período T de tempo, ou seja

(115) F i = N i A t .

Vamos agora considerar o caso de uma partícula livre de momento p sendo espalhada elasticamente por uma partícula livre de momento p. Como estão livres, temos que, ψf*, ψi1/V e |Tfi|21/V2, portanto

(116) d σ = d Γ f i F i = | m 2 π T f i | 2 d Ω = | f ( p , θ ) | 2 d Ω .

Desta forma, podemos obter a seção de choque a partir da amplitude de espalhamento. Com isso vamos focar agora no caso relativístico e desenvolver as regras de Feynman necessárias.

3. Espalhamento Quântico Relativístico

3.1. Fluxo covariante

O fator de fluxo, das seções anteriores, é dado por:

(117) F = N A t = N v V .

Como os fatores 2E e 2ω aparecem nos cálculos relativísticos, é interessante definir o fluxo relativístico de forma que eles apareçam. Dito isso, definimos como o fluxo relativístico não invariante sob transformações de Lorentz

(118) = 2 E 2 ω v r = | 4 E q - ω p | .

sendo E e ω as energias das partículas envolvidas e p e q os seus momentos, vr a diferença de velocidades relativas absolutas

(119) v r = | ( q ω ) - ( p E ) | .

Como as velocidades envolvidas não são invariantes, também é conveniente definir o fluxo total de momento, dado por

(120) q k = 4 ( q W - ω q ^ k ) ,

onde k=p+q. Podemos usar este e qk para definir o fluxo de Møller [6[6] C. Itzykson e J. Zuber, Quantum Field Theory (Dover, New York, 2005).]

(121) M = 4 [ ( p q ) - m 2 μ 2 ] . .

Para frames de referência colineares, todos os três são invariantes.

3.2. Espaço de fase covariante

Devemos definir um fator de densidade de estados que seja invariante à transformação de Lorentz.

(122) d N f = d 3 p n f 2 E n f .

Lembrando que d3p2E=δ+(p2-m2)d4p, onde δ+(p2-m2)=θ(p0)δ(p2-m2), definimos o fator de n corpos do espaço de fase covariante “entrando” em uma função delta que conserva a energia e momento.

(123) d p n f c o v = δ 4 ( k - f p f ) d N f c o v .
(124) = δ + ( p 2 - m 2 ) f - 1 d 3 p n f - 1 2 E n f - 1 .

3.3. Matriz-S covariante

O elemento de matriz covariante deve ter a estrutura simples para os processos de conservação de energia-momento

(125) S f i cov = δ f i cov + i ( 2 π ) 4 δ ( P f i ) T f i c o v .

Para converter (125) em uma taxa de transmissão covariante, Γfi(cov), iremos utilizar a identidade formal

(126) [ δ 4 ( P f i ) ] 2 = V T δ 4 ( P f i ) .

Para escrever a taxa de probabilidade de transmissão na forma covariante

(127) d Γ f i cov = | S f i cov | 2 T d N f c o v ,

onde Nf é a densidade de estados finais. Extraindo os elementos de volume da densidade de estados e de Tficov temos:

(128) d Γ f i cov = V 1 - n i | T f i cov | 2 d ρ n f cov ,

onde ni é a quantidade de estados iniciais. Considerando o espalhamento de dois corpos, podemos definir a seção de choque diferencial como

(129) d σ f i = d Γ i = 1 i | T f i cov | d p 2 c o v ,

onde i é o fator de fluxo inicial. Podemos ainda escrever a seção de choque diferencial geral como:

(130) d σ f i d Ω q = ( q / 2 π ) 2 i q k | T f i c o v | 2 .

No referencial de centro de massa, i4qcmE e qk4qcmW temos:

(131) d σ d Ω C M = q C M q C M | T i f c o v 8 π W | 2 .

logo, a amplitude de espalhamento é dada por:

(132) f = T f i c o v 8 π W .

3.4. Regras de Feynman

Na Seção 3 vimos que para o caso não relativístico, as funções de Green de partícula livre atuam como os propagadores das mesmas. Considerando as equações de Dirac, Klein-Gordon e Schrödinger, temos os propagadores

(133) i G 0 ϕ ( q 2 ) = i Δ F ( q 2 ) = i ( q 2 - μ 2 + i ϵ ) - 1 . i G 0 ϕ ( p ) = i S F ( p ) = i ( p - m + i ϵ ) - 1
(134) = i ( p + m ) ( p 2 - m 2 + i ϵ ) .

Vamos voltar ao operador

(135) S I = T exp { - i d 4 x I ( x ) } .

Consideremos a interação entre duas partículas de spin 1/2 quaisquer produzindo um fóton. No referencial das partículas o campo eletromagnético A gera um potencial efetivo, determinado por

(136) ( p - m ) ψ = V ψ ψ , V ψ = e γ A .

Enquanto o fóton enxerga uma corrente de Dirac

(137) - k 2 A μ = j μ e m = e ψ ¯ γ μ ψ .

Consideremos agora propagação não relativística à direita de uma partícula de momento pn e energia En=Ep+ωq, que tem como propagador i(E-En+iϵ)-1 e a propagação à direita de uma antipartícula de momento -pn e energia En, desta forma, temos como propagador i(E+En+Iϵ)-1

Levando em conta a conservação de energia e momento, podemos escrever

(138) i E - E n + i ϵ + i E + E n + i ϵ = 2 E i E 2 - E n 2 + i ϵ .

Ou seja

(139) = 2 E i ( E 2 - p n 2 ) - ( E n 2 - p n 2 ) + i ϵ .

Se fizermos a mudança En2-pn=m2 e definirmos pn2=E2-pn2 temos

(140) = 2 E i p n 2 - m 2 + i ϵ .

Para partículas de spin 1/2 o propagador é dado pela função de Green da equação de Dirac, descrita pela Equação (134).

Se considerarmos partículas de spin 1 massivas, escrevemos

(141) i λ 4 ξ μ ( λ ) ( p n ) ξ ν ( λ ) * ( p n ) E - E n + i ϵ + i λ 4 ξ μ ( λ ) * ( - p n ) ξ ν ( λ ) ( - p n ) E + E n + i ϵ .

Para que a condição pξ(p)=0 seja válida na região em que (pn2=m2) devemos ter

(142) λ 3 ξ μ ( λ ) ( p n ) ξ ν ( λ ) * = - ( g μ ν - p μ p ν / m 2 ) .

devemos ainda adicionar um quarto estado de spin para que a condição continue válida nos pontos onde (pn2m2) que satisfaz

(143) ξ μ ( 4 ) ( p n ) ξ ν ( 4 ) * = p n - m 2 p n m 2 p μ n p ν n .

Para o fóton, a equação (141) fica

(144) i λ 4 ξ μ ( λ ) ( k n ) ξ ν ( λ ) * ( k n ) ω - ω n + i ϵ + i λ 4 ξ μ ( λ ) * ( - k n ) ξ ν ( λ ) ( - k n ) ω - ω n + i ϵ = 2 ω - i g μ ν k n 2 + i ϵ .

Vamos agora obter a forma do operador S, considerando um espalhamento de uma partícula carregada (1), por outra partícula (2) através de um potencial Coulombiano com um elemento de matriz de ordem mais baixa Sficov=-iej0(1)A0(2), onde A0(2) é tomado como se fosse um potencial externo.

Podemos pensar em A0(2) como sendo gerada pela densidade de carga ej0(2) de acordo com a lei de Gauss [17[17] J.R. Reitz, F.J. Milford e R.W. Christy, Foundations of Electromagnetic theory (Pearson, New York, 1993), 4 ed.] E=ej0(2) ou k2A0(2)=ej0(2). Resolvendo para A0(2) em Sfi vemos que Sficov=-ie2j0(1)k-2j0(2)

Que tem a estrutura de um propagador estático correspondendo ao hamiltoniano de Coulomb

(145) H c o u l = e 2 8 π d 3 r d 3 r j 0 ( 1 ) ( r , t ) j 0 ( 2 ) ( r , t ) | r - r | .

Desta forma, temos, utilizando a transformada de Fourier

(146) ( V ) s t a t = e 2 j 0 ( 1 ) ( k ) 1 | k | 2 j 0 ( 2 ) ( k ) = e 2 j 0 ( 2 ) k 0 2 - | k | 2 | k 2 | j 0 ( 1 ) ( k ) k 2 + i ϵ .
(147) e 2 j i ( 1 ) k i k j | k 2 | j j ( 2 ) ( k ) - j 0 ( 1 ) ( k ) j 0 ( 2 ) ( k ) k 2 + i ϵ .

Por causa da conservação de corrente eletromagnética kj=0 ou k0 j0 = ki ji. Observe que os dois termos no numerador de (146) respectivamente correspondem aos termos longitudinal e de spin-0 na soma de spins

Por outro lado, a interação eletromagnética transversa dinâmica Hdyn=-ejA1 leva à interação de segunda ordem

(148) ( V G 0 + V ) d y n = e 2 j i ( 1 ) ( k ) ( δ i j - k i k j | k | 2 ) j j 2 ( k ) k 2 + i ϵ .

Somando (146) e (148), temos

(149) ( V G 0 + V ) d y n + ( V ) s t a t = e j μ ( 1 ) ( k ) ( - g μ ν k 2 + i ϵ ) e j ν ( 2 ) ( k ) .

Portanto vemos que o termo entre parênteses é correspondente ao propagador do fóton. Considerando que jμ é uma corrente de Dirac, temos que jμ=ψ¯γμψ. Portanto temos, considerando as partículas incidentes um elétron e um pósitron as regras

(150)

e o equivalente para uma antipartícula de mesmo spin

(151)

As setas estão sempre na direção da corrente de carga. Para a propagação interna de partículas temos para o fóton, partícula de interesse para o problema, o diagrama

(152)

Temos então que o termo referente ao vértice desejado é dado por

(153)

Por fim, para partículas de spin 1/2 já espalhadas, temos

(154)

E para a antipartícula

(155)

3.5. Aplicação para o espalhamento e-e+μ-μ+

Vamos então utilizar os conceitos estudados anteriormente, tal como a relação da matriz-S com a seção de choque, aplicando as regras de Feynman para descobrir os elementos da matriz-S.

Existem múltiplos diagramas possíveis na segunda ordem de interação, porém vamos focar nesta seção o que possui apenas um fóton virtual e gera um par múon antimúon, que está representado na Figura3

Figure 3
Diagrama de Feynman de Segunda ordem de Perturbação para o espalhamento Elétron-Pósitron [18[18] A. Zee, Quantum Field Theory in a Nutshell (Princeton University Press, Princeton, 2003).].

Considerando o diagrama da Figura 3, obtemos, utilizando as regras de Feyman para montar o elemento de matriz Sfi:

(156) S i f = v ¯ s ( p ) ( - i e γ μ ) u s ( p ) × ( - i g μ ν k 2 + i ϵ ) u ¯ r ( q ) ( - i e γ ν ) v r ( q ) .

Podemos simplificar essa equação se fizermos um pequeno rearranjo e subentendermos os índices de spin, de forma que;

(157) S i f = i e 2 k 2 + i ϵ ( v ¯ ( p ) γ μ u ( p ) ) ( u ¯ ( q ) γ μ v ( q ) ) .

Segundo o que foi mostrado anteriormente, obtemos a seção de choque ao tomar o módulo quadrado do elemento de matriz da matriz-S. A partir daí obtemos:

(158) | S i f | 2 = e 4 q 4 ( v ¯ ( p ) γ μ u ( p ) u ¯ ( p ) γ ν v ( p ) ) × ( u ¯ ( k ) γ μ v ¯ ( k ) v ( k ) γ ν u ( k ) ) .

A equação (158) pode ser simplificada se nos livrarmos da informação de spin, para tal, computamos

(159) 1 4 s s r r | S i f ( s , s r , r ) | 2 .

Utilizando as relações de completeza podemos escrever:

(160) 1 4 s p i n s | S i f | 2 = e 4 4 k 4 Tr [ ( p - m e ) γ μ ( p + m e ) ] × Tr [ ( q - m μ ) γ m u ( q + m μ ) ] .

Usando teoremas do traço [6[6] C. Itzykson e J. Zuber, Quantum Field Theory (Dover, New York, 2005).], podemos simplificar o primeiro colchete de forma que

(161) Tr [ ( p - m e ) γ μ ( p + m e ) ] = [ p μ p ν + p ν p μ - 4 g μ ν ( p p + m e 2 ) ] .

Da mesma forma podemos escrever

(162) Tr [ ( q - m μ ) γ μ ( q + m μ ] = [ q μ q ν + q ν q μ - 4 g μ ν ( q q + m μ 2 ) ] .

Multiplicando estes termos, temos uma expressão para a seção de choque diferencial que depende apenas dos momentos das partículas incidentes e emergentes

(163) 1 4 s p i n s | S i f | 2 = 8 e 4 k 4 [ ( p q ) ( p q ) + ( p q ) ( p q ) + m μ ( p p ) ] .

Utilizando as relações entre os momentos e a energia envolvida

k 2 = ( p + p ) 2 = 4 E 2 . p p = 2 E 2 . p q = p q = E 2 - E E 2 - m μ 2 cos ( θ ) . p q = p q = E 2 + E E 2 - m μ 2 cos ( θ ) .

Substituindo esses termos e rearranjando, temos

(164) 1 4 s p i n s | S i f | 2 = e 4 [ ( 1 + m μ 2 E 2 ) + ( 1 - m μ 2 E 2 ) cos 2 θ ] .

então, a seção de choque diferencial pode ser escrita como:

(165) d σ d Ω = α 2 4 E C M 1 - m μ 2 E 2 × [ ( 1 + m μ 2 E 2 ) + ( 1 - m μ 2 E 2 ) cos 2 θ ] .

ou seja, a seção de choque total é dada por

(166) σ t o t a l = 4 π α 2 3 E C M 1 - m μ 2 E 2 ( 1 + 1 2 m μ 2 E 2 ) .

3.6. Espalhamento e-e+γ+γ

Além do resultado estudado anteriormente, o espalhamento e-e+ também pode resultar em fótons. Para que as leis de conservação sejam respeitadas, é necessário que o processo resulte em dois fótons com momento oposto. Antes de calcular a seção de choque da aniquilação, vamos calcular a seção de choque de um espalhamento Compton. Faremos isso pois ambos os processos possuem diagramas de Feynman praticamente idênticos

3.6.1. Espalhamento Compton por um elétron

Diferente do e-e+μ-μ+, o espalhamento Compton de segunda ordem possui dois possíveis diagramas de Feynman, como pode ser visto na Figura 4. Neste caso a matriz-T covariante deve ser escrita como a soma das matrizes-T de cada diagrama.

Figure 4
Diagramas de Feynman para o espalhamento Compton. Fonte: [19[19] M.D. Scadron, Advanced Quantum Theory and Its Applications Through Feynman Diagrams (Springer, Heidelberg, 1979).].

Desta forma, seguindo as regras de Feynman [18[18] A. Zee, Quantum Field Theory in a Nutshell (Princeton University Press, Princeton, 2003).] e considerando p+k=p+k=K, p-k=p-k=K¯ temos a matriz-S covariante do processo

(167) S f i = ( - i ) 2 ξ μ * ( k ) u ¯ p e γ μ [ i ( K + m ) K 2 - m 2 + i ϵ ] × e γ ν u p ξ ν ( k ) δ 4 ( P f i ) + ( - i ) 2 ξ ν ( k ) u ¯ p e γ ν × [ i ( K ¯ + m ) K ¯ 2 - m 2 + i ϵ ] e γ μ u p ξ ν * ( k ) δ 4 ( P f i ) .

Podemos relacionar a matriz-s com a função M de Compton através de Tficov=ξ*μ(k)Mμνξν(k). Utilizando as variáveis de Mandelstam [6[6] C. Itzykson e J. Zuber, Quantum Field Theory (Dover, New York, 2005).] escrevemos:

(168) M μ ν = - e 2 { γ μ ( K + m ) γ ν s m + γ ν ( K ¯ + m ) γ μ u m } .

Vamos computar a seção de choque não polarizada somando e tomando a média sobre os spins do elétron inicial

(169) | T f i cov | 2 1 2 Tr [ ( p + m ) ξ * M ξ ( p + m ) ξ M ¯ ξ * ] .

Especializando no gauge transverso ξ0=0, de tal forma que ξp=ξ*p=0 no referencial do laboratório, e usando as propriedades do traço temos:

(170) | T c o v f i | 2 4 e 2 ( | ξ * ξ | 2 - t 2 4 S m u m ) .

Logo, a seção de choque no referencial do laboratório é dada por:

(171) d σ imp d Ω L = ( ω 8 π m ω ) 2 | T f i cov | 2 = ( ω ω ) 2 r 0 2 [ | ξ * x i | 2 - 1 2 + 1 4 ( ω ω + ω ω ) ] .

3.6.2. Aniquilação elétron-pósitron

Como dito anteriormente, os diagramas de Feynman para o processo e-e+2γ estão representados na Figura 4, com p representando um pósitron. Neste cenário, temos:

(172) T f i cov = ξ μ * v ¯ p ( - e 2 { γ μ ( p - k ¯ + m ) γ ν s m + γ ν ( p - k + m ) γ μ u m } ) u p ξ ν .

Seguindo o mesmo procedimento, obtemos a seção de choque para a aniquilação elétron-pósitron resultando em dois fótons.

(173) d σ i m p Ω ˙ L = ω 2 r 0 2 8 p ¯ ( E ¯ + m ) [ ω ω ¯ + ω ¯ ω + 2 4 ( ξ * ξ * ) 2 ]

3.6.3. Higgs-Strahlung e fusão WW

Outra aplicação interessante da aniquiliação elétron pósitron é aquela em que o resultado do processo envolve o bóson de Higgs. Este processo é de suma importância, pois é o principal mecanismo para gerar o Higgs em colisores tais como o LHC, ILC e CLIC.

Existem duas principais interações sobre as quais o Higgs pode gerado, sendo elas o Higgs-Strahlung, ou seja, e-e+ZHνν¯H, e a fusão WW, e-e+νeν¯eH

Podemos, utilizando as regras de Feynman, escrever a seção de choque para ambos os processos.

Figure 5
Diagramas de Feynman para o Higgs-strahlung. Fonte: [20[20] W. Kilian, M. Kramer e P.M. Zerwas, arXiv:hep-ph/9512355v1 (1995).].

Começando pelo Higgs-Strahlung, representado pela Figura 5, podemos escrever a seguinte seção de choque [20[20] W. Kilian, M. Kramer e P.M. Zerwas, arXiv:hep-ph/9512355v1 (1995).]:

(174) σ H S = G f 2 m Z 4 96 π s ( v e + a e 4 ) λ 1 2 λ + 12 m z 2 / s ( 1 - m Z 2 / s ) .

S é a energia do centro de massa, ae e ve são as cargas Z do elétron e λ é a função no espaço de fase das partículas, sendo então

(175) λ = ( 1 - ( m H + m Z ) 2 s ) ( 1 - ( m H - m Z ) 2 s ) .

Se não levarmos a largura da distribuição de energia do bóson Z em consideração, temos que a seção de choque tem um crescimento abrupto em torno do valor (s-(mH2-mZ)2)1/2.Em torno de 25 GeV acima deste valor, a seção de choque apresenta um decaimento vertiginoso, logo, o Higgs-strahlung é o processo de produção dominante para valores moderados de Energia.

Figure 6
Diagramas de Feynman para a Fusão WW. Fonte: [20[20] W. Kilian, M. Kramer e P.M. Zerwas, arXiv:hep-ph/9512355v1 (1995).].

Para a fusão WW, representado pela Figura 6, podemos escrever a seguinte seção de choque[20[20] W. Kilian, M. Kramer e P.M. Zerwas, arXiv:hep-ph/9512355v1 (1995).]:

(176) σ W W F = G F 2 m W 4 4 2 π 2 x H 1 d x x 1 d y F ( x , y ) [ 1 ( y - x ) / x W ] 2 ,

onde a função F(x,y) é dada por:

(177) F ( x , y ) = ( 2 x y 3 - 1 + 3 x y 2 + 2 + x y - 1 ) × [ z 1 + z - l o g ( 1 + z ) ] + x y 3 z 2 ( 1 - y ) 1 + z .

Com os valores:

x H = m H 2 s , x W = m W 2 s , z = y ( x - x H ) ( x - x W )

O processo de fusão se torna dominante apenas no âmbito de altas energias.

3.7. Busca por uma nova física

Sabe-se que o vácuo preenchido pelo condensado de Higgs é o responsável pela quebra de simetria eletrofraca. Porém o mecanismo que perite o campo de Higgs formar um condensado no vácuo não é explicado pelo modelo padrão, portanto, se faz necessário a busca por uma nova física, e para conseguirmos discriminar estes modelos é necessário medir com a maior precisão quantos tipos de acoplamentos for possível, e o quanto possível, independente de modelos.

Os desvios preditos pela maioria dos modelos de uma nova física são tipicamente inferiores a um pequeno percentual, logo as medições de acoplamento devem alcançar uma precisão de no mínimo 1%.

Esta sensibilidade só é disponível em colisores de Léptons.

3.7.1. ILC

O Colisor Linear Internacional, ou ILC, é um colisor projetado para cobrir um intervalo de energias do centro de massa de 200 GeV a 500 GeV, expansível até 1 Tev. Um de seus principais aspectos é a medição dos acoplamentos do Higgs com precisão sem precedentes, visando encontrar desvios do modelo padrão e comparar seus padrões com as previsões de modelos de nova física [21[21] P. Bambade, T. Barklow, T. Behnke, M. Berggren, J.Brau, P. Burrows, D. Denisov, A. Faus-Golfe, B.Foster, K. Fujii et al., arXiv:1903.01629v3 (2019).].

Assim como no LHC, a maioria das medições do bóson de Higgs são realizadas sobre o produto entre seção de choque e fração de ramificação (branching ratio). O ILC porém também realiza a medição do tamanho absoluto da seção de choque de uma produção inclusiva do Higgs, através da aplicação da técnica do recuo (recoil technique) ao processo Higgs-Strahlung. Esta técnica o envolve se medirem somente os momenta dos produtos do decaimento do bóson Z que recuam contrariamente ao bóson de Higgs, o que, em princípio, portanto, independe do modo de decaimento do Higgs. A medição dessa seção de choque σZH é indispensável para se extraírem, daquelas medições do produto de seções de choque pelas frações de ramificação, as próprias frações de ramificação, a largura total de energia do Higgs, e os acoplamentos. A técnica do recuo, que somente é possível em um colisor de léptons, devido ao estado inicial bem conhecido, é aplicável mesmo quando o bóson de Higgs decai de forma invisível, permitindo assim que se determine σZH de uma forma completamente independente de modelos. A técnica do recuo provê também uma das medições mais precisas da massa do bóson de Higgs (MH), o que é necessário para se estimar o fator do espaço de fase para o decaimento HWW*, e assim extrair a largura total da curva de massa/energia do Higgs [22[22] J. Yan, S. Watanuki, K. Fujii, A. Ishikawa, D. Jeans, J. Strube, J. Tian e H. Yamamoto, arXiv:1604.07524v3 (2021).].

3.7.2. CLIC

O COMPACT LINEAR COLLIDER (CLIC) é um experimento desenvolvido no CERN que, usando uma nova técnica de aceleração de dois feixes e+e-, vai operar em três estágios de energia de centro de massa, 380MeV, 1,5TeV e 3 TeV, possibilitando a obtenção de medições com alta precisão das massas do bóson de Higgs, do quark top, e da constante de acoplamento da interação nuclear forte [23[23] P.N. Burrows, N.C. Lasheras, L. Linssen, M. Petric, A. Robson, D. Schulte, E. Sicking, S. Stapnes e CERN (eds), The Compact Linear Collider (CLIC) – 2018 Summary Report (CERN, Geneva, 2018).]. Neste cenário, será possível, não só estudar em mais detalhe o mecanismo de quebra de simetria da interação eletrofraca (EWSB), como buscar eventos potenciais de uma nova física, vindo complementar em energias mais altas os resultados obtidos pelo ILC . Esta complementaridade se traduziu em 22 de março de 2013 na formação de uma colaboração abrangendo ambos os experimentos, a Linear Collider Collaboration (LCC).

4. Considerações Finais

Estudamos o espalhamento em três níveis diferentes. Começando por um conhecido espalhamento clássico, o experimento de Rutherford, foi definido o ângulo sólido e, utilizando as ferramentas da mecânica clássica, foi obtida a seção de choque para este problema.

Com a seção de choque e ângulo sólido definidos, passamos para o regime quântico não relativístico. Com base em um operador de evolução temporal chegamos na série de Dyson. A partir dessa série, tendo em mente a função de Green da partícula livre e a equação de Lippmann-Schwinger foram mostrados os elementos da matriz-S e matriz-T. Além disso, a relação entre a seção de choque e a matriz-T foi mostrada.

A partir disso, já em um regime relativístico, chegamos à formas covariantes para a matriz-S, e então foram desenvolvidos propagadores covariantes usando como base múltiplos cenários de interação entre duas partículas. A partir disso, foram observadas as regras de Feynman, que foram usadas para encontrar a seção de choque do espalhamento elétron-pósitron resultando em um par múon-antimuón de ordem mais baixa.

Apesar de ter sido apresentados apenas alguns diagramas neste trabalho, sendo calculados através da matriz-S, existem múltiplos outros para o espalhamento elétron-pósitron. Além disso existe uma teoria mais moderna para lidar com esse tipo de problema, a QED (Quantum Electrodynamics). Contudo, este trabalho é, sem dúvidas, um bom começo para estudar interações mais complexas entre partículas, que podem trazer luz sobre a física além do modelo padrão e outros questionamentos.

Referências

  • [1]
    A.F. Zarneck, arXiv:2004.14628v1 (2020).
  • [2]
    W. Heisenberg, Zeitschrift für Physik 33, 879 (1935).
  • [3]
    C. Cohen-Tannoudji, B. Diu e F. Laloe, Quantum Mechanics (Wiley-VCH, Weinheim, 1996 ), v. 1.
  • [4]
    E. Schrödinger, Phys. Rev. 28, 1049 (1926).
  • [5]
    P.A.M. Dirac, Mathematical Proceedings of the Cambridge Philosophical Society 35, 416 (1939).
  • [6]
    C. Itzykson e J. Zuber, Quantum Field Theory (Dover, New York, 2005).
  • [7]
    E. Butkov, Física Matemática (LTC, Rio de Janeiro, 1978).
  • [8]
    B.A. Lippmann e J. Schwinger, Phys. Rev. 79, 469 (1950).
  • [9]
    R.P. Feynman, Phys. Rev. 76, 769 (1949).
  • [10]
    J. Frejlich, Óptica (Oficina de Textos, São Paulo, 2011).
  • [11]
    P.A.M. Dirac, Proc. R. Soc. Lond. A 117, 610 (1928).
  • [12]
    O. Klein, Zeitschrift für Physik 33, 879 (1925).
  • [13]
    W. Gordon, Zeitschrift für PhysiK 40, 117 (1926).
  • [14]
    C. Cohen-Tannoudji, B. Diu e F. Laloe, Quantum Mechanics (Wiley-VCH, Weinheim, 1996 ), v. 2
  • [15]
    D. Belkic, Principles of Quantum Scattering Theory (CRC Press, Boca Raton, 2003).
  • [16]
    M.E. Peskin e D.V. Schroeder, An Introduction To Quantum Field Theory (Westview Press, Nashville, 2007).
  • [17]
    J.R. Reitz, F.J. Milford e R.W. Christy, Foundations of Electromagnetic theory (Pearson, New York, 1993), 4 ed.
  • [18]
    A. Zee, Quantum Field Theory in a Nutshell (Princeton University Press, Princeton, 2003).
  • [19]
    M.D. Scadron, Advanced Quantum Theory and Its Applications Through Feynman Diagrams (Springer, Heidelberg, 1979).
  • [20]
    W. Kilian, M. Kramer e P.M. Zerwas, arXiv:hep-ph/9512355v1 (1995).
  • [21]
    P. Bambade, T. Barklow, T. Behnke, M. Berggren, J.Brau, P. Burrows, D. Denisov, A. Faus-Golfe, B.Foster, K. Fujii et al., arXiv:1903.01629v3 (2019).
  • [22]
    J. Yan, S. Watanuki, K. Fujii, A. Ishikawa, D. Jeans, J. Strube, J. Tian e H. Yamamoto, arXiv:1604.07524v3 (2021).
  • [23]
    P.N. Burrows, N.C. Lasheras, L. Linssen, M. Petric, A. Robson, D. Schulte, E. Sicking, S. Stapnes e CERN (eds), The Compact Linear Collider (CLIC) – 2018 Summary Report (CERN, Geneva, 2018).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Abr 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    17 Set 2021
  • Revisado
    20 Jan 2022
  • Aceito
    10 Mar 2022
Sociedade Brasileira de Física Caixa Postal 66328, 05389-970 São Paulo SP - Brazil - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: marcio@sbfisica.org.br