Acessibilidade / Reportar erro

Modelo analítico para instrumentos musicais de cordas dedilhadas

Analytical model for plucked string instruments

Resumos

Este artigo tem como objetivo o estudo e a avaliação do modelo analítico de uma corda dedilhada. As condições iniciais que ocorrem em instrumentos com este tipo de ataque serão aplicadas à equação geral do movimento das ondas em uma corda para que seja obtida a descrição matemática de tal movimento; em seguida será evidenciado o que é possível concluir de tais resultados quando aplicados a instrumentos musicais.

Palavras-chave
Cordas dedilhadas; timbre; física e música; acústica


This article aims to study and evaluate the analytical model of a plucked string. The initial conditions that occur in instruments with this type of attack will be applied to the general equation for the movement of waves on a string, so that the mathematical description of such movement is obtained; then, it will be shown what is possible to be concluded from such results when applied to musical instruments.

Keywords
Plucked strings; timbre; physics and music; acoustics


1. Introdução

Diferentes tipos de ataques, ou seja, diferentes maneiras de iniciar o movimento da corda de instrumentos musicais, geram timbres nitidamente distintos. Isso é perceptível comparando, por exemplo, um piano, onde as cordas são percutidas – atingidas com um martelo – a um violino, onde um arco é friccionado contra a corda para produzir som. Essas características sonoras, praticamente uma identidade sonora de cada tipo de instrumento [1[1] E.M. von Hornbostel e C. Sachs, The Galpin Soc. J. 14, 3 (1961).], devem-se majoritariamente ao fato de que o timbre é resultado da soma de várias ondas com diferentes frequências (os harmônicos). A amplitude associada a cada uma dessas ondas e respectivas frequências é diretamente influenciada pela técnica usada para tocar e pela forma característica como o instrumento funciona, conferindo-lhes características sonoras peculiares, conforme discutido por Henrique [2[2] L. Henrique, Acústica musical (Calouste Gulbenkian, Lisboa, 2011).], em especial nos capítulos sobre cordofones friccionados e cordofones dedilhados.

Modelar analiticamente o ataque em uma corda permite não só ampliar o entendimento de como são gerados os sons nos instrumentos musicais como também evidenciar a influência de cada parâmetro do sistema nos harmônicos e no som como um todo. Possibilita também aplicar esse conhecimento em diversas situações, como na facilitação da busca por um timbre específico ou no estudo da captação eletromagnética em instrumentos musicais, uma vez que, além das características de cada modelo de captador [3[3] T. Jungmann, Theoretical and Practical Studies on the Behavior of Eletric Guitar Pick-Ups . Dissertação de Mestrado, Helsinki University of Technology, Helsinque (1994)., 4[4] M.E. Zaczéski, C.H. Beckert, T.G. Barros, A.L. Ferreira e T.C. Freitas, Rev. Bras. Ens. Fis. 40, e1309 (2018).], este precisa ainda ser posicionado no instrumento. Além disso, trata-se, no caso da corda dedilhada, de um importante exercício de aplicação de cálculo, uma vez que pode ser facilmente contextualizado e eventualmente acompanhado por uma demonstração sonora quando se dispõe de um violão ou uma guitarra elétrica.

Dedilhar uma corda significa deslocá-la de sua posição de equilíbrio e logo em seguida soltá-la para que comece a vibrar, como em um violão, uma guitarra, um baixo elétrico, uma harpa, entre outros instrumentos. Para realizar essa ação, chamada de ataque, pode ser usada uma gama de ferramentas, desde os próprios dedos das mãos até palhetas ou plectros, objetos geralmente triangulares feitos para auxiliar a produção de sons nesse tipo de instrumento.

Cada uma dessas ferramentas altera o timbre final, por conta de seu material, formato e demais características. Porém, o som também é afetado por outros parâmetros geométricos, como o ponto onde a corda é deslocada da posição de equilíbrio e a respectiva amplitude dessa ação, os quais serão analisados a seguir com o objetivo de entender quantitativamente o efeito da alteração de cada um desses parâmetros sobre a onda e consequentemente o som resultante [5[5] H.E. White e D.H. White, Physics and the music (Dover, Mineola, 2014).]. Do ponto de vista do ensino de física contextualizado com instrumentos musicais, o trabalho soma-se à proposta do uso do violão para o ensino de conceitos de física ondulatória por Santos et al. [6[6] E.M. Santos, C. Molina e A.P.B. Tufaile, Rev. Bras. Ens. Fis. 35, 2507 (2013).] e também por Coelho et al. [7[7] A.L.M.B. Coelho e A.M.M. Polyto, Physicae Organum 2, 1 (2016).], do uso de um protótipo e do violão para o ensino de acústica por Neto [8[8] D.D.A. Moura e P.B. Neto, Física na Escola 12, 12 (2011).], das propostas do uso do violão no ensino de Física de grupo de Grillo et al. [9[9] M.L.N. Grillo, L.R.P.L. Baptista, J.A.A. Crespo, S.A. Moreira e L.N. Vicente: II Simpósio Nacional de Ensino de Ciência e Tecnologia (Praná, 2010)., 10[10] M.L. Grillo e L.R. Perez, A Física na Música (EdUERJ, Rio de Janeiro, 2013).] e da discussão a respeito do funcionamento do violão feito por Zaczéski et al. [4[4] M.E. Zaczéski, C.H. Beckert, T.G. Barros, A.L. Ferreira e T.C. Freitas, Rev. Bras. Ens. Fis. 40, e1309 (2018).]. Estes textos que podem dialogar com a visão física da teoria musical proposta por Dantas e Cruz [11[11] J.D. Dantas e S.S. Cruz, Rev. Bras. Ens. Fís. 41, e20180099 (2019).], assim como outras discussões sobre as cordas como as feitas por Toneguzzo [12[12] L. Toneguzzo e F.O. Coelho, Cad. Cat. Ens. Fís. 7, 227 (1990).] e por Catellil e Mussatto [13[13] F. Catellil, e G.A. Mussatto, Rev. Bras. Ens. Fís. 36, 1306 (2014)., 14[14] F. Catellil e G.A. Mussatto, Rev. Bras. Ens. Fís. 36, 2340 (2014).] ou mesmo abordagens com caráter epistemológico como o de Lima e Damasio [15[15] D.O. Lima e F. Damasio, Cad. Bras. Ens. Fís. 36, 3 (2019).].

2. Modelo e Solução

2.1. Equação da onda e solução geral

Consideremos uma corda esticada ao longo do eixo x, presa nas duas extremidades (x=0 e x=L). A função que representa o movimento das ondas em cordas no geral é nada mais que a f(x,t) que satisfaz a chamada equação da onda:

(1) 1 c 2 2 f ( x , t ) t 2 = 2 f ( x , t ) x 2 ,

cuja dedução pode ser encontrada na Ref. [16[16] H.M. Nussenzveig, Curso de Física Básica (Blücher, São Paulo, 2002), v. 2, 4 ed.]. As soluções para essa equação serão obtidas pelo método de separação de variáveis, que se inicia assumindo que a solução pode ser escrita da forma

f ( x , t ) = F ( x ) T ( t ) ,

ou seja, como um produto de uma função espacial e uma função temporal. (O que é justificado pela linearidade da equação (1), ou seja, iaiFi(x)Ti(t) também é solução, para qualquer ai.) Para essas soluções, temos:

  • 2 f ( x , t ) t 2 = F ( x ) T ′′ ( t )

  • 2 f ( x , t ) x 2 = F ′′ ( x ) T ( t )

o que faz com que possamos reescrever a equação (1) como

1 c 2 F ( x ) T ′′ ( t ) = F ′′ ( x ) T ( t )

e depois rearranjá-la para que o lado direito seja uma função apenas de x, e o lado esquerdo uma função apenas de t. O único caso em que uma função apenas de x é igual a algo que não depende de x (e, analogamente, que uma função de t é igual a algo que não depende de t) é quando ambos os lados são iguais a uma constante, chamada constante de separação λ.

(2) T ′′ ( t ) T ( t ) = c 2 F ′′ ( x ) F ( x ) = λ

O que temos agora são duas EDOs, nas variáveis x e t.

(3) F ′′ ( x ) = λ c 2 F ( x )
(4) T ′′ ( t ) = λ T ( t )

Usando a relação de dispersão (ω=kc), relacionando a frequência com a frequência angular (ω=2πf) e estabelecendo λ=-k2, onde k é o número de onda (isso nos permitirá trabalhar com soluções do tipo senos e cossenos [17[17] T.C. Freitas, A. Laibida Junior, Physicae 8, 19 (2009).], que é o nosso objetivo), temos agora:

(5) F ′′ ( x ) + k 2 c 2 F ( x ) = 0
(6) T ′′ ( t ) + k 2 T ( t ) = 0

Para as quais adotaremos soluções oscilatórias da forma

(7) F ( x ) = A sin ( k x ) + B cos ( k x )
(8) T ( t ) = cos ( ω t - ϕ )

onde ϕ é a fase da oscilação.

Para encontrar os valores de A e B, aplicaremos as condições de contorno, nas quais a corda está presa nas duas extremidades. Em uma das pontas: f(x=0,t)=0, ou ainda F(0)=0, portanto B = 0. Na outra ponta:

(9) f ( x = L , t ) = 0 F ( L ) = 0 A sin ( k L ) = 0

Se A = 0, teríamos uma solução trivial, portanto garantimos que isso não seja necessário fazendo k=nπL, com n inteiro positivo.

Lembrando que a solução é da forma f(x,t)=F(x)T(t), somamos todas as n soluções que obtivemos até agora para chegar na solução geral, já no formato de combinação linear do produto das soluções da EDO espacial e da temporal:

(10) f ( x , t ) = n = 1 A n sin ( n π x L ) cos ( ω n t - ϕ n ) ,

onde An é o coeficiente associado à amplitude do n-ésimo harmônico, ωn=nπcL e ϕn é a fase associada a cada harmônico (dependendo das condições iniciais).

2.2. Corda dedilhada: condição inicial

Em um instrumento de cordas dedilhadas, como o violão ou a harpa, a corda começa a vibrar depois que algo (seja um dedo, uma palheta ou algo similar) a desloca da posição de equilíbrio e depois a solta. Matematicamente, isso pode ser descrito considerando uma corda de comprimento L e adotando um sistema de coordenadas tal que o eixo x corra ao longo da corda. Dessa forma, podemos considerar que a corda está presa nos pontos (0,0) e (L,0). Para modelar o deslocamento da corda até a posição da qual será solta, toma-se um ponto na corda (x=a) que será levado até uma altura (y=b), como ilustra a Figura 1, e atribui-se o instante t=0 para essa configuração.

Figure 1
Corda de comprimento L presa nas extremidades x=0 e x=L. O ponto x = a é deslocado da posição de equilíbrio de uma distância b. Se estivesse em repouso, a corda estaria toda no eixo x, ou seja, y(x)=0. Com a corda nessa condição inicial, é possível aproximá-la por duas retas, sendo a primeira entre 0xa e, a segunda entre axL.

Reta 1 (0xa):

Relembrando a forma geral de uma função linear, que nos dará uma reta genérica:

(11) y ( x ) = m x + n ,

onde m é o coeficiente angular, e n é o coeficiente linear. Sabemos que y1(0)=0 e y1(a)=b (pois a reta passa pelos pontos (0,0) e (a,b)), então podemos substituir x=y=0 na equação (11) para descobrir que, nesse caso, n = 0. Sabendo disso e substituindo x = a e y = b:

(12) y = m x + n b = m a m = b a .

Ou seja, a Reta 1 pode ser escrita como

(13) y 1 ( x ) = b a x

Reta 2 (axL):

Novamente partimos da equação (11), agora sabendo que y2(a)=b e y2(L)=0. Podemos então substituir x = L e y = 0:

(14) y = m x + n 0 = m L + n n = - m L

E agora usamos x = a, y = b e o recém descoberto n=-mL:

(15) y = m x + n b = m a - m L m = b ( a - L ) ,

que nos dá, portanto, n=-bL(a-L). Ou seja, a Reta 2 pode ser escrita como

(16) y 2 ( x ) = b ( a - L ) x - b L ( a - L ) , y 2 ( x ) = b ( x - L ) ( a - L ) .

A função que descreve a corda como um todo no instante t=0, em que está deslocada, como ilustra a Figura 1, fica descrita pelas seguintes equação:

(17) f ( x , t = 0 ) = { b a x ,0 x a b ( x - L ) ( a - L ) , a x L .

3. Desenvolvimento e Resultados

Sabendo das condições iniciais impostas pelos resultados obtidos em (17), supomos que a corda está na posição da Figura 1 em t=0, e a partir daí é deixada vibrar livremente. Para esse instante, o deslocamento da corda, de acordo com a equação (10), é:

(18) f ( x , t = 0 ) = n = 1 A n sin ( n π x L ) .

O termo ϕn (que representa a fase da oscilação) foi desconsiderado. Isso pode ser feito sem perda de generalidade, pois ele é constante e estará embutido nos coeficientes An.

Utilizaremos essas informações e alguns artifícios matemáticos para obter os coeficientes An. O primeiro passo é multiplicar ambos os lados das duas equações de condições iniciais (do fim da seção anterior, mas agora com t=0) pelo termo sin(mπxL), com m (o que facilitará nosso trabalho em passos subsequentes):

(19) f ( x , t = 0 ) sin ( m π x L ) = b a x sin ( m π x L ) ,
(20) f ( x , t = 0 ) sin ( m π x L ) = b ( x - L ) ( a - L ) sin ( m π x L ) .

Então integramos de x=0 até L, cada expressão em seus respectivos domínios. Façamos isso com a primeira sentença, que se aplica para valores de x entre 0 e a:

(21) 0 a d x f ( x , t = 0 ) sin ( m π x L ) = 0 a d x b a x sin ( m π x L ) = b a 0 a d x x sin ( m π x L )

Usando a tabela de integrais Schaum [19[19] M.R. Spiegel, S. Lipschutz e J. Liu, Manual de fórmulas e tabelas matemáticas (Bookman, Porto Alegre, 2011), 3 ed.], a integral anterior resulta em:

(22) = b a [ sin ( m π x L ) - m π x L cos ( m π x L ) m 2 π 2 L 2 ] | 0 a = b a [ L 2 m 2 π 2 sin ( m π x L ) - L x m π cos ( m π x L ) ] | 0 a = b a [ L 2 m 2 π 2 sin ( m π a L ) - L a m π cos ( m π a L ) - L 2 m 2 π 2 sin ( m π 0 L ) + L 0 m π cos ( m π 0 L ) ] = b a [ L 2 m 2 π 2 sin ( m π a L ) - L a m π cos ( m π a L ) ] = L 2 b m 2 π 2 a sin ( m π a L ) - L b m π cos ( m π a L ) .

Agora, na integral da segunda sentença, que se aplica para valores de x entre a e L, precisaremos separar os termos para que fique mais prático e organizado:

(23) a L d x f ( x , t = 0 ) sin ( m π x L ) = a L d x b ( x - L ) ( a - L ) sin ( m π x L ) = a L d x b x ( a - L ) sin ( m π x L ) - a L d x b L ( a - L ) sin ( m π x L ) .

O primeiro termo, já utilizando o resultado da integral anterior, fica:

(24) a L d x b x ( a - L ) sin ( m π x L ) = b ( a - L ) a L d x x sin ( m π x L ) = b ( a - L ) [ L 2 m 2 π 2 sin ( m π x L ) - L x m π cos ( m π x L ) ] | a L = b ( a - L ) [ L 2 m 2 π 2 sin ( m π ) - L 2 m π cos ( m π ) - L 2 m 2 π 2 sin ( m π a L ) + L a m π cos ( m π a L ) ] = b L a ( a - L ) m π cos ( m π a L ) - b L 2 ( a - L ) m π cos ( m π ) - b L 2 ( a - L ) m 2 π 2 sin ( m π a L ) ;

e o segundo termo:

(25) a L d x b L ( a - L ) sin ( m π x L ) = b L ( a - L ) a L d x sin ( m π x L ) = b L ( a - L ) [ - cos ( m π x L ) L m π ] | a L = b L ( a - L ) [ - cos ( m π L L ) L m π + cos ( m π a L ) L m π ] = b L 2 ( a - L ) m π cos ( m π a L ) - b L 2 ( a - L ) m π cos ( m π ) .

Podemos então juntar os dois termos novamente (já eliminando os termos bL2(a-L)mπcos(mπ), que aparecem em ambos os resultados, portanto, subtrair um do outro os anula):

(26) a L d x f ( x , t = 0 ) sin ( m π x L ) = b L a ( a - L ) m π cos ( m π a L ) - b L 2 ( a - L ) m 2 π 2 sin ( m π a L ) - b L 2 ( a - L ) m π cos ( m π a L ) .

Agora, pelas propriedades das integrais, podemos somar as duas equações (22) e (26) com as quais estávamos trabalhando:

(27) 0 L d x f ( x , t = 0 ) sin ( m π x L ) = b L 2 m 2 π 2 a sin ( m π a L ) - b L m π cos ( m π a L ) + a b L ( a - L ) m π cos ( m π a L ) - b L 2 ( a - L ) m 2 π 2 sin ( m π a L ) - b L 2 ( a - L ) m π cos ( m π a L ) = 1 m 2 π 2 sin ( m π a L ) [ b L 2 a - b L 2 ( a - L ) ] + 1 m π cos ( m π a L ) [ a b L ( a - L ) - b L - b L 2 ( a - L ) ] = 1 m 2 π 2 sin ( m π a L ) [ b L 2 ( a - L ) - a b L 2 a ( a - L ) ] + 1 m π cos ( m π a L ) [ a b L - b L ( a - L ) - b L 2 ( a - L ) ] = 1 m 2 π 2 sin ( m π a L ) [ a b L 2 - b L 3 - a b L 2 a ( a - L ) ] + 1 m π cos ( m π a L ) [ a b L - a b L + b L 2 - b L 2 ( a - L ) ] = - b L 3 a ( a - L ) m 2 π 2 sin ( m π a L ) .

Basta então integrar o lado esquerdo dessa equação, o que faremos usando a eq. (18):

(28) f ( x , t = 0 ) = n = 1 A n sin ( n π x L ) f ( x , t = 0 ) sin ( m π x L ) = n = 1 A n sin ( n π x L ) sin ( m π x L ) 0 L d x f ( x , t = 0 ) sin ( m π x L ) = n = 1 [ A n 0 L d x sin ( n π x L ) sin ( m π x L ) ] .

Resolvendo a integral do lado direito:

(29) 0 L d x sin ( n π x L ) sin ( m π x L ) = 0 L d x [ 1 2 cos [ ( n - m ) π x L ] - 1 2 cos [ ( m + n ) π x L ] ] = 1 2 0 L d x cos [ ( n - m ) π x L ] - 1 2 0 L d x cos [ ( m + n ) π x L ] .

Aqui chegamos em um ponto em que precisaremos considerar 2 casos: quando m e n são iguais, e quando são diferentes. Essa separação é motivada pelo fato de que se simplesmente seguirmos com a integração, nos depararemos com uma divisão por (m-n), o que pode nos deixar com uma divisão por zero no caso m=n se não tomarmos os devidos cuidados. Vejamos então o caso mn primeiro, onde podemos resolver sem problemas:

(30) 1 2 0 L d x cos [ ( n - m ) π x L ] - 1 2 0 L d x cos [ ( m + n ) π x L ] = [ L 2 π ( n - m ) sin [ ( n - m ) π x L ] - L 2 π ( n + m ) sin [ ( m + n ) π x L ] ] | 0 L = L 2 π ( n - m ) sin [ ( n - m ) π L L ] - L 2 π ( n + m ) sin [ ( m + n ) π L L ] - L 2 π ( n - m ) sin [ ( n - m ) π 0 L ] - L 2 π ( n + m ) sin [ ( m + n ) π 0 L ] = L 2 π ( n - m ) sin [ ( n - m ) π ] - L 2 π ( n + m ) sin [ ( m + n ) π ] .

Essa expressão resultará em zero, pois ambos os termos estão multiplicados pelo seno de um múltiplo inteiro de π, que é sempre nulo. Observe que, como comentado anteriormente, havia no primeiro termo uma divisão por (n-m). Isso não foi problema aqui, pois estávamos tratando do caso em que esses dois inteiros são diferentes. Mas no caso a seguir, em que m=n, sabemos que o termo (m-n) é nulo, portanto, devemos evitar que ele apareça no denominador. Vejamos como esse problema é contornado:

(31) 1 2 0 L d x cos [ ( n - m ) π x L ] - 1 2 0 L d x cos [ ( m + n ) π x L ] = 1 2 0 L d x cos [ 0 π x L ] - 1 2 0 L d x cos [ ( m + n ) π x L ] = 1 2 0 L d x - [ 1 2 L ( m + n ) π sin [ ( m + n ) π x L ] ] | 0 L = L 2 - 1 2 L ( m + n ) π sin [ ( m + n ) π ] = L 2 .

Aqui, o segundo termo do penúltimo passo é igual a zero pelo mesmo motivo do caso mn, e o termo m-n não é problema pois ele zera todo o argumento do cosseno e desaparece.

Analisando então os termos do somatório do lado esquerdo da equação (28), vemos que quase todos eles zeram, a não ser quando m = n. Portanto temos:

(32) 0 L d x f ( x , t = 0 ) sin ( n π x L ) = A n L 2

Tendo feito tudo isso, podemos finalmente obter os coeficientes An, pois o resultado da (27) pode ser substituído no lado esquerdo da (32):

(33) - b L 3 a ( a - L ) n 2 π 2 sin ( n π a L ) = A n L 2 A n = 2 b L 2 a ( L - a ) n 2 π 2 sin ( n π a L )

Temos tudo o que é necessário para construir a solução completa para o caso de cordas dedilhadas. Partiremos da solução geral (10):

(34) f ( x , t ) = n = 1 A n sin ( n π x L ) cos ( ω n t - ϕ n )

Agora, substituímos o resultado obtido em (33), para chegar em:

(35) f ( x , t ) = 2 b L 2 a ( L - a ) π 2 × n = 1 [ 1 n 2 sin ( n π a L ) sin ( n π x L ) cos ( ω n t ) ]

(Como dito anteriormente, desconsideramos o termo ϕn sem perda de generalidade).

4. Análise, Discussão e Aplicações

4.1. Análise dos resultados e implicações práticas

Para entender o que significam e a que conclusão nos levam os resultados obtidos, é necessário entender o efeito de cada parte da função obtida. Analisando a solução geral (10):

f ( x , t ) = n = 1 A n sin ( n π x L ) cos ( ω n t - ϕ n )

repara-se que ela pode ser separada em 3 partes:

  • um termo temporal oscilante: cos(ωnt-ϕn);

  • um termo espacial oscilante: sin(nπxL);

  • e um termo de amplitude: An.

O termo temporal é o que vai fazer a corda oscilar a partir do instante inicial, com uma frequência angular descrita pelo termo ωn e uma fase descrita por ϕn. Porém, algo que o termo temporal não leva em conta é o decaimento da intensidade do som ao longo do tempo, que aconteceria numa situação real por efeito da resistência do ar, da dissipação da energia da corda para o corpo de um instrumento acústico ou da atenuação devido ao campo magnético do captador em um instrumento eletrófono [4[4] M.E. Zaczéski, C.H. Beckert, T.G. Barros, A.L. Ferreira e T.C. Freitas, Rev. Bras. Ens. Fis. 40, e1309 (2018).]. Estamos considerando um sistema ideal, portanto, esses efeitos não foram colocados na função. Entretanto, um modelo simples pode ser adotado ao se multiplicar a parte temporal por e-λt, sendo λ um número real positivo que carrega as informações da atenuação, podendo ser obtido empiricamente.

O termo espacial nos permite saber a forma com a qual a corda vai vibrar, os nós e os ventres. Casos notáveis são os pontos onde (nxL) é um número inteiro, o que faz com que o termo espacial (e portanto a função toda naquele ponto) seja nula. Esses pontos serão os nós de cada harmônico. Em qualquer harmônico, os pontos x=0 e x=L resultarão em nós, o que faz sentido, já que a corda está presa em ambas as extremidades. Mas, além desses pontos nodais das extremidades, cada harmônico n terá (n-1) nós, distribuídos uniformemente ao longo da corda, onde a função será zero.

Resta analisar o efeito dos coeficientes de amplitude An na função. Eles estão, em cada termo, multiplicando as funções seno e cosseno, ou seja, alterando sua amplitude a cada instante no tempo e em cada ponto no espaço. Como a intensidade sonora é proporcional ao quadrado da amplitude, o coeficiente associado a cada harmônico nos diz quão intenso esse harmônico será naquele caso. Nas cordas dedilhadas, que é o que está sendo analisado, esses coeficientes têm a seguinte forma (como demonstrado na seção anterior):

A n = 2 b L 2 a ( L - a ) n 2 π 2 sin ( n π a L ) .

Figure 2
Coeficiente An(a) em função de a para n=1, 2 e 3. Foram estabelecidos para a construção desse gráfico os valores L = 650mm, medida próxima da encontrada comummente em instrumentos como o violão e a guitarra elétrica, e um deslocamento da posição de equilíbrio b = 4mm.

Observa-se que a amplitude depende do comprimento da corda L, do quanto a corda é deslocada de sua posição de repouso b e do ponto a ao longo da corda escolhido para realizar esse deslocamento. Além disso, a presença de um termo n2 no denominador dos coeficientes implica que nesse tipo de corda a frequência fundamental (primeiro harmônico, n= 1) será a de maior intensidade, e que a amplitude de cada harmônico seguinte (n=2, n=3, etc) decairá em relação ao anterior numa taxa de (1n2).

A parte envolvendo o seno nos dá informações importantes, por exemplo, se a corda for atacada num ponto a tal que (naL) seja inteiro, a intensidade do n-ésimo harmônico será nula. Ilustrando a situação, se o ataque ocorrer em a=(L2), qualquer harmônico par irá se anular completamente. A Figura 2 traz o gráfico dos coeficientes An(a) para alguns valores de n. Verifica-se que o coeficiente An(a) muda de acordo com o lugar onde a corda é atacada. Nela observam-se exemplos dos padrões descritos anteriormente: a amplitude de cada harmônico é sempre menor que a do anterior; a curva de cada coeficiente An cruza o eixo horizontal (n-1) vezes, exatamente nos pontos onde a é um múltiplo de (Ln). Convém ainda ressaltar que os coeficientes não precisam ser nulos em x=0 e x=L, uma vez que na solução completa o respeito às condições de contorno é garantido pela parte espacial da solução.

A função f(x,t) representa, em cada instante t, o quão distante um ponto x qualquer está da posição de equilíbrio (f = 0). Portanto, ao fazer um gráfico com f no eixo vertical e x no eixo horizontal, para um conjunto de parâmetros a e b, o que teremos é o formato da corda no instante t escolhido. A solução é composta de uma soma infinita de termos, permitindo que para fins de análise cada termo n possa ser estudado. Para que a forma da corda obtida a partir da solução seja igual à forma imposta na condição inicial, é preciso que vários termos sejam computados, para que no limite de n a solução descreva exatamente a forma da condição inicial. Na Figura 3, vemos ilustrada como a soma de vários harmônicos, agora com um t=3L/4c fixo, faz com que a solução se aproxime da condição inicial.

Figure 3
Somas dos primeiros 3, 5, 10 e 50 termos da solução f(x,t) em função de x. Para todas essas curvas, t=3L4c, a = 60mm e b = 4mm.

Além dos resultados obtidos aqui, é importante ressaltar novamente que não foram levados em consideração os efeitos de perda de energia que ocorrem a partir do momento de ataque, seja por atrito da corda com os pontos de fixação ou pela resistência oferecida pelo ar ao movimento da corda, ou pela dissipação da energia para o corpo do instrumento. Entretanto, o efeito de dissipação da energia da corda é fundamental para que ocorra o processo de produção de som em qualquer instrumento cordófono acústico, o que será exemplificado na sequência, junto a outras implicações práticas do resultado aqui obtido.

A parte espacial da solução é a responsável por parte da forma da onda que se forma na corda quando se toca, por exemplo, o violão. É ela que traz as informações dos pontos onde a vibração da corda se anula, seus nós, a quantidade destes e os pontos onde está localizado o máximo do deslocamento em relação à posição de equilíbrio. A dependência com o inverso do comprimento da corda é o que permite obter diferentes notas musicais ao se pressionar a corda contra as casas, como exemplifica Zaczéski et al. [4[4] M.E. Zaczéski, C.H. Beckert, T.G. Barros, A.L. Ferreira e T.C. Freitas, Rev. Bras. Ens. Fis. 40, e1309 (2018).]. O fato da relação entre frequência e comprimento ser inversa faz com que a frequência aumente ao se diminuir o comprimento vibrante da corda e vice-versa, uma vez que a velocidade de propagação da onda na corda se mantém constante.

Já a parte temporal da solução é responsável pela emissão sonora do instrumento, com um conjunto de frequências bem definidas. Cada frequência de som fcpsdummyn emitida está relacionada a frequência angular por fcpsdummyn=ωn2π. A essas frequências são atribuídas de maneira bem definida as notas musicais, tomando por referência mais comum a nota tendo a frequência de 440Hz. Afinar a corda do instrumento nada mais é do que fazer com que a frequência com a qual a corda está vibrando corresponda a uma frequência que possui uma nota musical associada a ela, sendo isso feito de maneira geral quando o instrumento já está com as cordas instaladas, através do aumento ou diminuição da tensão aplicada em cada corda.

O termo de amplitude, o qual multiplica tanto a parte espacial quanto a temporal, atua como um seletor de intensidade de cada termo n da solução geral. Sua dependência tanto com o ponto onde a corda é tocada a, o deslocamento da posição de equilíbrio b, o comprimento L e a ordem n do harmônico traz a explicação para alguns comportamentos das cordas dedilhadas que são conhecidos pelos músicos e que podem ser verificadas com alguma facilidade dispondo de um violão ou uma guitarra elétrica. A primeira e bastante intuitiva é que quanto maior for o deslocamento inicial com relação à posição de equilíbrio, maior será a amplitude da corda, uma vez que Anb. A dependência com o ponto onde a corda é tocada pode ser explorada para modificar características do som obtido, uma vez que certos termos n e seus harmônicos correspondentes podem ser intensificados ou anulados dependendo do ponto onde o músico toca a corda. A dependência com o comprimento L da corda, que pode ser resumida a AnL, implica que quanto menor for o comprimento vibrante da corda, para um mesmo conjunto de parâmetros, menor é a sua amplitude, algo que se verifica ao tocar um violão e ir diminuindo o tamanho da corda ao se pressionar a corda contra casas sucessivas. O termo de amplitude também é responsável por parte das características do som do instrumento, sendo que, no caso das cordas dedilhadas, a intensidade dos harmônicos decai com 1n2. Esse decaimento mais rápido que o das cordas friccionadas, o qual é proporcional apenas ao inverso de n [18[18] J.P. Donoso, A. Tannús, F. Guimarães e T.C. Freitas, Rev. Bras. Ens. Fís. 30, 2305 (2008).], é responsável em partes pelas diferenças de timbre entre o som do violão e do violino. O termo An traz características do som de uma corda dedilhada, mas no processo de formação do som não é o único fator determinante. Durante a transmissão da vibração da corda para o corpo do instrumento, e por fim a produção da onda sonora, vários elementos do instrumento modulam a intensidade dos harmônicos, construindo assim o timbre daquele instrumento.

Por fim, o termo de atenuação, embora não esteja no foco deste trabalho, desempenha um papel muito importante na produção de som dos cordófonos acústicos. Modelar a dissipação de energia envolve aspectos mais complexos, de forma que serão discutidos apenas os conceitos fundamentais associados ao tópico. Caso não houvesse dissipação da energia da corda através da transmissão do movimento da corda para o corpo do instrumento, não haveria som e a corda continuaria em movimento por tempo indeterminado. Assim, a transmissão de energia da corda para o corpo do instrumento desempenha um papel primordial para a produção de som em um cordófono. Embora não seja uma corda dedilhada, Donoso et al. [18[18] J.P. Donoso, A. Tannús, F. Guimarães e T.C. Freitas, Rev. Bras. Ens. Fís. 30, 2305 (2008).] exemplificam de maneira bastante didática como o processo ocorre no violino.

A dissipação de energia para a produção do som pode ser exemplificada com um experimento muito simples, dispondo apenas de um diapasão. Ao atingi-lo com um pequeno martelo ou mesmo com os dedos, segurando-o pela haste, deve-se cronometrar o tempo que ele fica vibrando e observar o nível de intensidade sonora percebido. Agora, repete-se o processo, encostando a sua haste em uma superfície como a de uma mesa; o som percebido é mais intenso, entretanto, o tempo de sua duração é menor, uma vez que a energia do diapasão vibrando transforma-se em som irradiado pela superfície, já que a área desta é maior que a das partes vibrantes do diapasão, deslocando muito mais ar e produzindo um som mais intenso. De forma simples, esse é também o motivo pelo qual os cordófonos acústicos precisam de uma caixa acústica. A área da superfície da corda (S=2πRL, com R o raio da corda e L o comprimento) é muito pequena para deslocar ar em quantidade suficiente para sensibilizar nossos ouvidos. Isso passa a ser resolvido com o acoplamento da corda ao corpo do instrumento, o qual passa a ter uma área vibrante significativamente maior, permitindo a emissão de som igualmente mais intenso pelo instrumento.

4.2. Sobre o posicionamento de captadores

O som gerado por um instrumento de corda dedilhada pode ser convertido em sinais elétricos (para posterior gravação, processamento e/ou amplificação) através de um dispositivo chamado captador. Captadores são constituídos por bobinas e ímãs permanentes, os quais são responsáveis por um campo magnético que magnetiza as cordas metálicas do instrumento e é igualmente perturbado com o movimento das mesmas [20[20] N.G. Horton e T.R. Moore, Am. J. Phys. 77, 144 (2009).]. Dessa forma, o campo magnético varia de acordo com a vibração das cordas, o que induz corrente elétrica nas bobinas, de acordo com a Lei de Faraday [4[4] M.E. Zaczéski, C.H. Beckert, T.G. Barros, A.L. Ferreira e T.C. Freitas, Rev. Bras. Ens. Fis. 40, e1309 (2018)., 16[16] H.M. Nussenzveig, Curso de Física Básica (Blücher, São Paulo, 2002), v. 2, 4 ed.].

O captador, portanto, para captar melhor o sinal de um harmônico específico, deve ser posicionado onde se encontra um dos ventres desse harmônico, local onde a vibração da corda é mais intensa. Consequentemente, a perturbação do campo magnético é maior, levando à geração de um sinal elétrico mais intenso.

Disso surge um problema infelizmente insolúvel por definição: em um instrumento como a guitarra elétrica, violão, entre outros, para mudar a nota que será tocada numa corda é necessário posicionar o dedo em alguma posição do braço e pressionar, o que diminui o tamanho da parte vibrante da corda. Isso é equivalente a mudar o tamanho da corda em si, e como as posições dos ventres de um harmônico dependem do tamanho da corda, conclui-se que estes estarão em um local diferente para cada nota [21[21] R.C.D. Paiva, J. Pakarinen e V. Välimäki, J. Audio Eng. Soc. 60, 768 (2012).]. Um captador posicionado idealmente para captar a máxima intensidade possível de uma nota estará, portanto, em uma posição não ideal para captar outras notas.

Não existe então uma única posição ideal para instalar captadores em instrumentos como esses. Possíveis maneiras de lidar com este problema ou minimizá-lo incluem: posicionar mais de um captador (comumente dois ou três), que possibilitará ao músico escolher através de chaves seletoras a combinação desejada de captadores e portanto buscar um timbre mais próximo do desejado; posicionar os captadores em posições onde usualmente são colocados, o que trará um timbre que parecerá, por se assemelhar àqueles que se ouve frequentemente, mais familiar; ou, em uma solução menos ortodoxa, optar por uma instalação de captador que possa se mover livremente entre várias posições ao longo da corda. Essa construção torna o instrumento demasiado complexo, porém, possui um grande potencial didático, como no caso do protótipo da Figura 4, construído por Matheus H.S. Mayer. Amplamente utilizado em demonstrações, o protótipo recebeu o apelido de mayerófono e possui certas semelhanças com o histórico pau-elétrico [22[22] A.S. Vargas, Anais Simp. Bras. Pós-grad. Mús. 3, 183 (2014).] criado na Bahia por Dodô e Osmar.

Figure 4
Protótipo construído para demonstrações relacionadas ao posicionamento do captador e a sua influência no som resultante. Possui um único captador que pode se mover em linha reta, através de trilhos, entre o final do braço (A) e a ponte (B). Pode ser ligado a um amplificador como uma guitarra elétrica.

Entretanto, a análise desenvolvida com o modelo analítico que foi apresentado permite entender a razão pela qual certas relações geométricas são importantes na construção de um instrumento de cordas com captação magnética. Apesar de toda a precisão necessária para a construção de um instrumento musical, este não deixa de ter influências da época e local onde foi concebido e dos diferentes usos que tem na criação musical. Isso faz com que um mesmo instrumento possa ter versões distintas, sendo talvez a mais conhecida visualmente a do piano vertical ou de armário e o piano de cauda. Ambos são pianos, mas com construções e características distintas, inclusive as sonoras. Embora não seja visualmente tão perceptível, a existência de variantes ocorre em diversos instrumentos, como o violão, a guitarra elétrica, o clarinete, o fagote, etc.

Dave Hunter [23[23] D. Hunter, The electric guitar sourcebook:How to find the sound you like (Backbeat Books, San Francisco, 2006).] explora a questão das sonoridades específicas da guitarra elétrica exemplificando com os modelos mais amplamente conhecidos desse instrumento. Cada um é descrito em termos de suas características, detalhes do tipo de captador, etc. Como comentado anteriormente, não existe uma posição que possa ser considerada completamente ideal para a instalação do captador. Todavia, posicionamentos específicos em cada modelo de guitarra têm uma contribuição relevante para que uma guitarra Les Paul tenha as características sonoras pertinentes ao modelo. Para esta análise, tomaremos os modelos Les Paul e Stratocaster, os quais, além de serem relativamente bem conhecidos, apresentam como característica diferentes tamanhos da escala, que correspondem ao comprimento vibrante da corda (e não à peça homônima do instrumento). A primeira tem uma escala1 1 Foram mantidas as dimensões em polegadas decimais pois, dada a origem norte americana do instrumento, consagrou-se o uso destes valores nessa unidade. de 24,75”, considerada uma escala curta, e a segunda 25,5”, que é um comprimento considerado mais comum, uma vez que é utilizado em outros instrumentos da família da guitarra elétrica.

Essa diferença no comprimento vibrante L da corda afeta o instrumento e seu tocar. Do ponto de vista geométrico do posicionamento dos captadores, esses dois modelos de guitarra elétrica apresentam diferenças, primeiro devido às diferentes escalas e, segundo, devido à Les Paul possuir dois captadores e a Stratocaster três. Retornando ao problema inicialmente insolúvel, verifica-se, entretanto, que o posicionamento dos captadores é um dos responsáveis pelas características sonoras de cada modelo de instrumento cordófono eletrificado. Isso acontece porque para cada nota tocada em cada corda existe uma relação geométrica bem definida entre o tamanho da corda e a posição do captador, resultando em um sinal gerado pelo captador que é característico dessa configuração. Do ponto de vista prático, ao se construir uma guitarra ou baixo elétrico, deve-se observar rigorosamente o posicionamento do captador ou dos captadores, para que o instrumento construído soe como o modelo de referência. Igualmente os modelos de captador utilizados afetam de maneira relevante o resultado sonoro do instrumento [24[24] D. Hunter, The guitar pickup handbook: The start of your sound (Backbeat Books, San Francisco, 2008).]. Assim, é importante ter em mente que captadores são objetos extensos com diferentes geometrias, o que também afeta o sinal elétrico resultante, uma vez que o campo magnético variável gerado pela movimentação da corda é integrado na área da bobina do captador [4[4] M.E. Zaczéski, C.H. Beckert, T.G. Barros, A.L. Ferreira e T.C. Freitas, Rev. Bras. Ens. Fis. 40, e1309 (2018).]. Desta forma, reitera-se que posicionamento e tipo de captador são dois aspectos relevantes para o resultado sonoro de um instrumento de cordas com captação magnética.

5. Conclusões

Descrevemos um modelo que aplica uma condição inicial simples, a qual permite uma resolução analítica fechada, para o caso das cordas dedilhadas. Ao abordar um caso envolvendo condições iniciais, propusemos um caso que pode ser usado para preencher as lacunas desse tema em cursos de cálculo e métodos matemáticos no ensino superior. A aplicação em instrumentos musicais pode tornar a motivação ao estudo desse problema mais atrativa para os estudantes. Do ponto de vista do funcionamento dos instrumentos musicais, o modelo permite explicar, de maneira fundamentada em uma solução matemática, como a posição onde se dedilha a corda afeta o resultado sonoro, algo que é explorado tecnicamente pelos músicos. E, no caso de eletrófones, como o baixo e a guitarra elétrica, permite entender como o posicionamento do(s) captadore(s) afeta o resultado sonoro desses instrumentos, auxiliando luthiers em uma área que apresenta pouca literatura disponível.

Agradecimentos

Agradecemos à Universidade Federal do Paraná pelo apoio à realização deste trabalho, no âmbito do Programa Institucional de Iniciação Científica, projeto Aspectos técnicos e sociais da Luteria. Agradecemos ao Setor de Educação Profissional e Tecnológica da UFPR, pela disponibilização de infraestrutura para a realização deste trabalho. Agradecemos à Ingrid R. Jakubiak pela revisão do texto.

Referências

  • [1]
    E.M. von Hornbostel e C. Sachs, The Galpin Soc. J. 14, 3 (1961).
  • [2]
    L. Henrique, Acústica musical (Calouste Gulbenkian, Lisboa, 2011).
  • [3]
    T. Jungmann, Theoretical and Practical Studies on the Behavior of Eletric Guitar Pick-Ups . Dissertação de Mestrado, Helsinki University of Technology, Helsinque (1994).
  • [4]
    M.E. Zaczéski, C.H. Beckert, T.G. Barros, A.L. Ferreira e T.C. Freitas, Rev. Bras. Ens. Fis. 40, e1309 (2018).
  • [5]
    H.E. White e D.H. White, Physics and the music (Dover, Mineola, 2014).
  • [6]
    E.M. Santos, C. Molina e A.P.B. Tufaile, Rev. Bras. Ens. Fis. 35, 2507 (2013).
  • [7]
    A.L.M.B. Coelho e A.M.M. Polyto, Physicae Organum 2, 1 (2016).
  • [8]
    D.D.A. Moura e P.B. Neto, Física na Escola 12, 12 (2011).
  • [9]
    M.L.N. Grillo, L.R.P.L. Baptista, J.A.A. Crespo, S.A. Moreira e L.N. Vicente: II Simpósio Nacional de Ensino de Ciência e Tecnologia (Praná, 2010).
  • [10]
    M.L. Grillo e L.R. Perez, A Física na Música (EdUERJ, Rio de Janeiro, 2013).
  • [11]
    J.D. Dantas e S.S. Cruz, Rev. Bras. Ens. Fís. 41, e20180099 (2019).
  • [12]
    L. Toneguzzo e F.O. Coelho, Cad. Cat. Ens. Fís. 7, 227 (1990).
  • [13]
    F. Catellil, e G.A. Mussatto, Rev. Bras. Ens. Fís. 36, 1306 (2014).
  • [14]
    F. Catellil e G.A. Mussatto, Rev. Bras. Ens. Fís. 36, 2340 (2014).
  • [15]
    D.O. Lima e F. Damasio, Cad. Bras. Ens. Fís. 36, 3 (2019).
  • [16]
    H.M. Nussenzveig, Curso de Física Básica (Blücher, São Paulo, 2002), v. 2, 4 ed.
  • [17]
    T.C. Freitas, A. Laibida Junior, Physicae 8, 19 (2009).
  • [18]
    J.P. Donoso, A. Tannús, F. Guimarães e T.C. Freitas, Rev. Bras. Ens. Fís. 30, 2305 (2008).
  • [19]
    M.R. Spiegel, S. Lipschutz e J. Liu, Manual de fórmulas e tabelas matemáticas (Bookman, Porto Alegre, 2011), 3 ed.
  • [20]
    N.G. Horton e T.R. Moore, Am. J. Phys. 77, 144 (2009).
  • [21]
    R.C.D. Paiva, J. Pakarinen e V. Välimäki, J. Audio Eng. Soc. 60, 768 (2012).
  • [22]
    A.S. Vargas, Anais Simp. Bras. Pós-grad. Mús. 3, 183 (2014).
  • [23]
    D. Hunter, The electric guitar sourcebook:How to find the sound you like (Backbeat Books, San Francisco, 2006).
  • [24]
    D. Hunter, The guitar pickup handbook: The start of your sound (Backbeat Books, San Francisco, 2008).
  • 1
    Foram mantidas as dimensões em polegadas decimais pois, dada a origem norte americana do instrumento, consagrou-se o uso destes valores nessa unidade.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Mar 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    11 Nov 2021
  • Aceito
    11 Fev 2022
Sociedade Brasileira de Física Caixa Postal 66328, 05389-970 São Paulo SP - Brazil - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: marcio@sbfisica.org.br