COMPORTAMENTO ECOEMPREENDEDOR NO CONTEXTO PANDÊMICO

RESUMO

Este estudo explora o comportamento ecoempreendedor no contexto da Covid-19, analisando a influência da obrigação moral e do engajamento ambiental na percepção de empatia, autoeficácia ecoempreendedora e criação de valor ambiental. Dados primários foram coletados de 130 participantes do Projeto Conexão Mata Atlântica. A análise dos dados foi realizada usando o PLS-SEM. Seis das oito hipóteses de pesquisa foram suportadas. O estudo confirmou que a percepção de empatia e autoeficácia é influenciada por níveis mais elevados de obrigação moral. Os resultados indicam que os ecoempreendedores mais engajados com o meio ambiente têm níveis mais altos de autoeficácia e criação de valor ambiental. Foi contrariada a premissa de que um sentimento de moralidade poderia impactar positivamente a criação de valor ambiental decorrente do negócio. A hipótese de que o engajamento ambiental influencia positivamente a empatia ecoempreendedora não foi confirmada. Os resultados demonstram a complexidade das relações entre as variáveis que medem o comportamento ecoempreendedor e a necessidade de explorar esses determinantes de características-chave. Assim, a pesquisa representa um avanço na temática do ecoempreendedorismo, abrindo-se uma nova direção para invetigações ao testar o poder explicativo de variáveis até então não testadas. Ela também oferece percepções práticas para formuladores de políticas e educadores envolvidos com o ecoempreendedorismo. Por fim, fazemos algumas reflexões à luz dos produtores rurais e das atividades rurais. Além disso, apresentamos contribuições diretamente relacionadas à Agenda dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU.

Palavras-Chave:
ecoempreendedorismo; sustentabilidade; país em desenvolvimento; pandemia; objetivos de desenvolvimento sustentável

ABSTRACT

In this study, we examined ecopreneurial behavior in the COVID-19 context by analyzing the influence of moral obligation and environmental engagement on the perception of empathy, ecopreneurial self-efficacy, and environmental value creation. Primary data was collected from 130 Atlantic Forest Connection Project participants. Data analysis was performed using PLS-SEM. Six of eight hypotheses were supported. Our study confirmed that empathy and self-efficacy perception are influenced by higher moral obligation levels. Results also indicate that more environmentally engaged ecopreneurs have higher levels of self-efficacy and environmental value creation. On the other hand, the premise that a feeling of morality could positively impact environmental value creation arising from the business was contradicted. Similarly, the hypothesis that environmental engagement positively influences ecopreneurial empathy has not been confirmed. Thus, we advanced on ecopreneurship by opening a new research direction for testing the explanatory power of variables that have not been tested so far. The research also offers practical insights for policymakers and educators involved with ecopreneurship. In the same way, we shed light on farmers and agriculture. Additionally, we present contributions directly related to the UN Sustainable Development Goals (SDG) Agenda.

Keywords:
ecopreneurship; sustainability; developing country; pandemic; sustainable development goals

RESUMEN

En este estudio exploramos el comportamiento ecoemprendedor en el contexto de la COVID-19 analizando la influencia de la obligación moral y el compromiso ambiental en la percepción de empatía, autoeficacia ecoemprendedora y creación de valor ecológico. Los datos primarios se recolectaron de 130 participantes del Proyecto de Conexión del bosque Atlántico. El análisis de los datos se realizó mediante el PLS-SEM. Seis de las ocho hipótesis de la investigación fueron respaldadas. Nuestro estudio confirmó que la percepción de empatía y autoeficacia está influenciada por niveles más altos de obligación moral. Los resultados indican que los ecoemprendedores más comprometidos con el medio ambiente tienen niveles más altos de autoeficacia y creación de valor ecológico. Se contradijo la premisa de que un sentimiento de moralidad podría impactar positivamente en la creación de valor ecológico proveniente del negocio. La hipótesis de que el compromiso ambiental influya positivamente en la empatía ecoemprendedora no ha sido confirmada. El estudio demuestra la complejidad de las relaciones entre las variables que miden el comportamiento ecoemprendedor y la necesidad de explorar estos determinantes de características clave. Por lo tanto, avanzamos en el tema del ecoemprendimiento abriendo una nueva dirección de investigación al probar el poder explicativo de variables hasta ahora no probadas. La investigación también ofrece conocimientos prácticos para los formuladores de políticas y los educadores relacionados con el espíritu empresarial ecológico. Asimismo, hacemos algunas consideraciones sobre los productores y las actividades rurales. Además, presentamos contribuciones directamente relacionadas con la Agenda de los Objetivos de Desarrollo Sostenible (ODS) de la ONU.

Palabras clave:
espíritu ecoemprendedor; sostenibilidad; país en desarrollo; pandemia; objetivos de desarrollo sostenible

INTRODUÇÃO

A pandemia da Covid-19 gerou uma crise sem precedentes e tornou-se fonte de transformações sociais inesperadas (Sharma et al., 2022). A preocupação sanitária global causada pelo vírus impôs uma crise econômica de grandes proporções devido às medidas de distanciamento social adotadas na maioria dos países, o que trouxe à tona necessidades, como a de adaptação a uma nova realidade digital, a reorganização da cadeia de abastecimento e novas formas de reter clientes (Tampakoudis et al., 2021).

No auge da pandemia, os consumidores experimentaram mudanças significativas no comportamento de compra. Uma nova abordagem à saúde foi caracterizada pela interdependência entre saúde humana e ambiental (Tanveer et al., 2020). As pessoas tornaram-se mais seletivas em relação ao que compram ou consomem, ao mesmo tempo que passaram a ficar mais atentas ao consumo de determinados produtos prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente (Bawakyillenuo & Agbelie, 2021). Coincidentemente, a consciência ambiental aumentou recentemente na sociedade em todos os níveis (Alwakid et al., 2021), provocando um aumento na procura por produtos ecologicamente corretos e, consequentemente, fortalecendo um mercado verde (Gupta & Dharwal, 2022).

A pandemia da Covid-19 e o aumento da consciência ambiental dos consumidores trouxeram oportunidades de negócios para empreendedores interessados em contribuir para melhorar o meio ambiente (Bawakyillenuo & Agbelie, 2021; Galindo-Martín et al., 2021). Nesse contexto, o ecoempreendedorismo surgiu como uma nova frente de empreendedorismo, que une o ambientalismo ao espírito empreendedor, com potencial para avançar em direção a uma sociedade ecológica (Bawakyillenuo & Agbelie, 2021).

Ainda, desde a sua ratificação pelas Nações Unidas em 2015, os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) tornaram-se a estrutura global predominante para abordar o progresso social rumo à prosperidade de maneira sustentável. Ao mesmo tempo, as atividades empresariais têm sido consideradas como soluções potenciais para problemas ambientais e sociais (Dhahri et al., 2021).

Numa definição geral, o ecoempreendedorismo tem as mesmas características básicas da atividade empreendedora, somadas à iniciativa dos empreendedores por meio de inovações sociais e ambientais para a sustentabilidade e a priorização de competências nesse sentido (Alwakid et al., 2021; Dhahri et al., 2021; Gupta & Dharwal, 2022). O conceito está mais intimamente relacionado com a perspectiva do desenvolvimento sustentável e amplia a noção de ganhos nos negócios ao incluir desejos não financeiros (Soomro et al., 2020) associados às necessidades do ambiente e da sociedade (Bawakyillenuo & Agbelie, 2021).

As características básicas de um empreendedor geralmente incluem autoeficácia, propensão ao risco, planejamento, reconhecimento de oportunidades e persistência. No caso dos subtipos empreendedores orientados para a sustentabilidade, muito se fala sobre empatia, obrigação moral e engajamento ambiental (Hockerts, 2017; Kaida & Kaida, 2019; Prado et al., 2022). Em relação aos ecoempreendedores, as pesquisas têm indicado eles são solucionadores de problemas que conseguem aplicar inovação e pensamento crítico para enfrentar desafios (Bawakyillenuo & Agbelie, 2021) ao mesmo tempo que dependem de uma motivação para colocar suas ideias em prática (Dhahri et al., 2021). Essa característica requer mais estudos sobre o tema, uma vez que existe um consenso de que o empreendedorismo é um catalisador essencial na criação de emprego e no desenvolvimento do país (Audretsch et al., 2023), e as modalidades de empreendedorismo sustentável são canais para que se alcance os objetivos de desenvolvimento sustentável.

Tal como discutido acima, o contexto da pandemia também lança luz sobre as oportunidades de mercado em torno de bens e serviços mais ecológicos. Isso tem aumentado o lançamento de empreendimentos voltados à esfera ambiental (Dabbous et al., 2023; Manoj et al., 2020; Severo et al., 2021). Contudo, para incentivar o ecoempreendedorismo, é essencial compreender suas características e comportamentos, bem como as motivações que ainda se encontram na fase inicial de investigação por parte dos acadêmicos (Yasir et al., 2023). Emerge assim um campo de investigação estimulante, onde o estudo do ecoempreendedorismo pode aumentar a riqueza e a eficiência econômica num país em desenvolvimento (Annamdevula et al., 2023; Hoogendoorn et al., 2020).

Assim, pretendemos aqui responder à seguinte questão de pesquisa: Qual a influência da obrigação moral e do engajamento ambiental na empatia, na autoeficácia e na criação de valor ambiental em ecoempresas? Mais especificamente, o presente estudo visa examinar o comportamento ecoempreendedor no contexto da pandemia da Covid-19, analisando a influência da obrigação moral e do engajamento ambiental - que são antecedentes comportamentais impulsionados por esse contexto disruptivo - na percepção de empatia, autoeficácia ecoempreendedora e criação de valor ambiental.

O presente estudo baseia-se em três suposições principais, contribuindo para o contexto do empreendedorismo e das questões voltadas a sustentabilidade social e ambiental no Brasil. Em primeiro lugar, reconhece o papel crucial do empreendedorismo centrado na sustentabilidade na busca do desenvolvimento sustentável e no avanço da Agenda dos ODS (Dhahri et al., 2021; Gurău & Dana, 2018; Rodríguez-García et al., 2019) - em outras palavras, a pesquisa enfatiza a importância do ecoempreendedorismo como um campo emergente de investigação, uma vez que essa área tem exigido uma maior exploração do papel das atividades empreendedoras na promoção de benefícios econômicos e não econômicos para os investidores e a sociedade em geral, como demonstrado em o trabalho de Alwakid et al. (2021). Em segundo lugar, existe uma lacuna na compreensão de como o empreendedorismo e os empreendedores apoiaram a mudança social impulsionada pela pandemia, e esse estudo tenta compreender melhor este fenômeno (Sharma et al., 2022). Terceiro, em mercados emergentes como o Brasil, há uma certa sensibilidade às questões ambientais e um esforço para combiná-las com o empreendedorismo verde (Alwakid et al., 2021), uma vez que está comprovado que este subtipo de empreendedorismo traz crescimento econômico e melhoria ambiental (Gupta & Dharwal, 2022).

Nossos resultados contribuem para uma melhor compreensão dos fatores que impulsionam os valores e comportamentos ecoempreendedores, que podem apoiar programas e investimentos públicos e privados para fortalecer o desenvolvimento sustentável no contexto brasileiro. Chamamos atenção também para nossa amostra composta por produtores rurais, considerados catalisadores na implementação de práticas sustentáveis na zona rural por meio da oferta de produtos sustentáveis. Assim, a originalidade desse trabalho reside na aplicação de um modelo empírico que analisa os efeitos das características empreendedoras umas sobre as outras, o que ainda não foi proposto na literatura, o que mostra que nosso modelo conceitual não segue uma abordagem convencional.

REVISÃO DA LITERATURA

Ecoempreendedorismo e desenvolvimento sustentável

O desenvolvimento sustentável envolve objetivos voltados a sustentabilidade social, ambiental e econômica e é considerado uma força motriz por trás de várias políticas econômicas, contribuindo para a competitividade de um país a longo prazo com base no seu desenvolvimento social e econômico (Dabbous et al., 2023). Em resposta às preocupações crescentes sobre a degradação ambiental e a dada sua maior visibilidade, formuladores de políticas públicas e a sociedade em geral têm esperado dos empreendedores que contribuam para objetivos sociais e sustentáveis por meio de atividades empresariais igualmente sustentáveis (Audretsch et al., 2023). O empreendedorismo, reconhecido como uma fonte dinâmica de crescimento econômico, criação de emprego e inovação, desempenha um papel fundamental na otimização dos recursos disponíveis para criar valor econômico e social (Zhao et al., 2023).

Os empreendedores, quando alinhados com os objetivos de desenvolvimento sustentável, são vistos como agentes para promover uma sociedade mais social e ambientalmente correta (Antolin-Lopez et al., 2019). “Empreendedores sustentáveis”, também chamados de “ecoempreendedores”, são considerados atores-chave no enfrentamento aos desafios globais (Audretsch et al., 2023; Dabbous et al., 2023; Hoogendoorn et al., 2020; Xu et al., 2022; Yasir et al., 2023). Eles concentram-se no suporte à vida, na comunidade e na preservação da natureza, visando gerar ganhos econômicos e não econômicos para os indivíduos, para a própria economia e para a sociedade como um todo (Xu et al., 2022), ou seja, seus esforços contribuem para a sustentabilidade das organizações, de seu setor da economia e da sociedade em geral (Yasir et al., 2023).

O ecoempreendedorismo, como um subconjunto do empreendedorismo sustentável, enfatiza a integração de soluções de degradação ambiental nas atividades empresariais (Gupta & Dharwal, 2022; Soomro et al., 2020; Sun et al., 2020). O termo “ecoempreendedorismo” deriva da combinação de “eco”, oriundo do conceito de ecologia, e “empreendedorismo” (Rodríguez-García et al., 2019). Vários outros termos têm sido introduzidos nesse debate tais como o empreendedorismo ambiental, empreendedorismo verde, empreendedores ecológicos de base e empreendedorismo ecológico, todos buscando descrever atividades empreendedoras orientadas a proteção ambiental (Antolin-Lopez et al., 2019; Bawakyillenuo & Agbelie, 2021; Juma et al., 2023).

Os ecoempreendedores desempenham um papel crucial na condução de atividades empresariais que não prejudiquem as pessoas e o meio ambiente. As suas características são moldadas por experiências pessoais e históricas, incluindo orientação temporal, perspectivas futuras, reconhecimento de oportunidades em evolução e estabelecimento de metas ambiciosas (Alwakid et al., 2021; Gurău & Dana, 2018). Estes ecoempreendedores podem ser definidos pelos seus objetivos ambientais e econômicos, esforçando-se por alcançar resultados rentáveis ao mesmo tempo que promovem valores verdes e oportunidades de mercado ambientais (Antolin-Lopez et al., 2019; Hoogendoorn et al., 2020).

No que diz respeito aos vários tipos de empreendedores orientados à questão da sustentabilidade, as pesquisas têm apontado várias características fundamentais observadas entre aqueles que se envolvem em atividades empreendedoras que promovem o desenvolvimento sustentável. Entre elas estão empatia, obrigação moral, autoeficácia, percepção de apoio social (Hockerts, 2017) e engajamento ambiental (Kaida & Kaida, 2019). O foco do presente estudo está na empatia, na autoeficácia ecoempreendedora e na capacidade de gerar valor ambiental dentro das ecoempresas, bem como em examinar como essas perspectivas são influenciadas pela obrigação moral e pelo envolvimento ambiental dos ecoempreendedores.

A empatia, definida como a capacidade de compreender e responder aos estados mentais e emoções das outras pessoas, está altamente presente nos empreendedores sociais e desempenha um papel significativo na previsão das intenções em torno do empreendedorismo social (Kim, 2022; Tan et al., 2021). No contexto do ecoempreendedorismo, a empatia combina-se com a preocupação ambiental para impulsionar práticas sustentáveis (Gupta & Dharwal, 2022).

A autoeficácia dos ecoempreendedores, refletindo a sua crença em alcançar objetivos e tarefas específicas, tem sido associada à eficácia empreendedora e a comportamentos pró-ambientais (Soomro et al., 2020). Os empreendedores orientados para a sustentabilidade e com maior autoeficácia estão mais bem equipados para buscar objetivos ambientalmente responsáveis (Hockerts, 2017; Kim, 2022).

Finalmente, o ecoempreendedorismo abrange tecnologias, produtos, serviços e processos verdes que promovem a criação de valor, ao mesmo tempo que reduzem o consumo de recursos e a poluição em comparação com os métodos de produção tradicionais. Os estudiosos da área enfatizam que as atividades ecoempreendedoras oferecem oportunidades para reduzir a poluição ambiental e promover o crescimento econômico sustentável (Sun et al., 2020). O conceito de criação de valor ambiental emergiu, defendendo a criação de valor para uma gama mais ampla de partes interessadas, para além do âmbito restrito da maximização do lucro (Prado et al., 2022; Rodríguez-García et al., 2019). A criação de valor ambiental envolve práticas inovadoras de gestão ambiental e mecanismos de produção limpa para negócios ambientais (Prado et al., 2022; Yi, 2021).

Desenvolvimento das hipóteses e modelo empírico

De acordo com a literatura existente, especialmente devido ao aumento dos debates sobre as questões socioambientais, as empresas têm-se sentido pressionadas a reorganizar as suas atividades para gerar valor em três dimensões: econômica, social e ambiental (Rodríguez-García et al., 2019). Nesse contexto, a obrigação moral refere-se à ideia de que o indivíduo se sente pressionado a tomar alguma ação diante de um problema (Hockerts, 2017).

De acordo com Tan et al. (2021), as obrigações morais implicam uma percepção de que as normas sociais ditam a responsabilidade de ajudar as comunidades marginalizadas e contribuir com soluções que, no mínimo, não ampliem o problema da contínua degradação ambiental (Kaiser & Byrka, 2011; Prado et al., 2022). Como resultado, semelhante à empatia, a obrigação moral orienta os indivíduos para ações que priorizam os resultados sociais em detrimento da mera rentabilidade. Consequentemente, essas normas sociais inspiram um maior sentimento de confiança nos indivíduos para adotarem uma abordagem orientada para a sustentabilidade (Tan et al., 2021).

Pesquisas anteriores já utilizaram a obrigação moral como antecedente da intenção de empreender socialmente (Hockerts, 2017), criar valor ambiental (Prado et al., 2022), e como um dos fatores que interferem nas ações de mitigação das mudanças climáticas (Leviston & Walker, 2021). Os ecoempreendedores são moralmente obrigados a pensar no futuro e a desempenhar um papel ativo nas mudanças ambientais (Gregori et al., 2021; Jayashankar et al., 2018).

A questão da obrigação moral no contexto da pandemia da COVID-19 é particularmente interessante. Para Tanveer et al. (2020), a abordagem sanitária e a saúde ambiental, muito enfatizadas devido a recente pandemia, são caracterizadas pela interdependência entre humanos e animais, interdependência que ganhou especial importância nesse momento crítico e fomentou perspectivas ecoempreendedoras. Segundo Tampakoudis et al. (2021) e Leviston e Walker (2021), tais perspectivas também surgiram como uma obrigação moral resultante do aumento das receitas empresariais durante a pandemia.

A investigação realizada por Razzak e Riyami (2023) sugere que pessoas com níveis significativos de empatia agem com bondade para com o ambiente e a sociedade como um todo porque a sua atitude é influenciada pelo seu sentido de obrigação moral. Da mesma forma, Shuqair et al. (2022) descobriram que a obrigação moral resulta em atitudes mais generosas, como estar disposto a ajudar os outros. Nesse contexto, esperamos que o elevado nível de obrigação moral dos ecoempreendedores tenha um impacto direto nos seus níveis de empatia para com a natureza e a comunidade. Assim, foi elaborada nossa primeira hipótese (H1):

• H1: A obrigação moral influencia positivamente a empatia.

A obrigação moral também pode influenciar um indivíduo a implementar uma prática (Ogiemwonyi & Jan, 2023; Razzak & Riyami, 2023), como Annamdevula et al. (2023), demonstraram ao comprovar que a obrigação moral é antecedente da intenção comportamental de praticar a reciclagem. De acordo com Tan et al. (2021), a obrigação moral é necessária para conscientizar o desejo de estabelecer empresas orientadas para a sustentabilidade. Estudos anteriores relataram que a obrigação moral influencia a autoeficácia empreendedora. Em outras palavras, uma motivação moral empreendedora para ajudar os outros desencadeia uma avaliação cognitiva sobre se são capazes e têm apoio suficiente para contribuir para um propósito ambiental, o que influencia a posterior decisão de criar um empreendimento ambiental (Ukil et al., 2023). Nesse contexto, destacamos nossa segunda hipótese de pesquisa (H2):

• H2: A obrigação Moral influencia positivamente a autoeficácia ecoempreendedora.

Na área ambiental, a obrigação moral também inclui a responsabilidade em relação ao valor que um empreendimento pode criar para a comunidade. Mais especificamente, o sentimento de culpa pode impulsionar uma atitude solidária (Razzak & Riyami, 2023; Shuqair et al., 2022). De acordo com Ogiemwonyi e Jan (2023), a obrigação moral reflete escolhas éticas que se baseiam no caráter central da boa cidadania, justiça e responsabilidade. Este sentido de obrigação moral também tem impacto nas atitudes dos indivíduos em relação ao consumo e às práticas verdes. No contexto da presente pesquisa, esperamos que os ecoempreendedores com elevados níveis de obrigação moral também criem maior valor ambiental. Assim, nossa terceira hipótese de pesquisa (H3) é:

• H3: A obrigação moral influencia positivamente a criação de valor ambiental.

Além da obrigação moral pessoal, o engajamento ambiental é outro preditor do comportamento ecoempreendedor (Kaiser & Byrka, 2011). Envolve o compromisso de um indivíduo com práticas ecológicas, incluindo o consumo de bens e recursos naturais, bem como o seu conhecimento sobre questões ambientais e soluções potenciais (Piyapong, 2020).

Assim, o engajamento é um fator diferencial com componentes relacionados a cognição, a emoção e ao comportamento vinculados ao desempenho do papel do indivíduo. Segundo Piyapong (2020), o engajamento em comportamentos ambientais contribui para mitigar os danos ambientais causados pela sociedade.

Nesse contexto, muitos estudos detectaram o engajamento ambiental como fator essencial no desenvolvimento sustentável (Bawakyillenuo & Agbelie, 2021; Kaiser & Byrka, 2011; Piyapong, 2020). Alguns deles também o associam a questões de educação (Bawakyillenuo & Agbelie, 2021). No que diz respeito ao ecoempreendedorismo, o estudo de Gu e Wang (2022) concluiu que os empreendedores ambientalmente conscientes prestam mais atenção às questões ecológicas nas suas decisões de produção e gestão.

O engajamento ambiental também é abordado pelos pesquisadores como resultado dos valores ambientais dos indivíduos (Annamdevula et al., 2023; Bouman et al., 2020; Yeow & Loo, 2022). Vários estudos anteriores também relataram que os valores ambientais estão associados ao engajamento dos indivíduos em prol do meio-ambiente (Bouman et al., 2020; Manoj et al., 2020). Yasir et al. (2023) descobriram que os valores ambientais como o universalismo, o altruísmo e a empatia caracterizam as ações altruístas dos indivíduos que os levam a proteger com entusiasmo o seu ecossistema local e os seus semelhantes. Na mesma linha desses autores, consideramos que os ecoempreendedores ambientalmente engajados apresentam níveis mais elevados de empatia pela natureza e pela sociedade. Como consequência, apresenta-se a nossa quarta hipótese de pesquisa (H4):

• H4: O engajamento ambiental influencia positivamente a empatia.

O engajamento ambiental está relacionado com o político, que também pode promover ou sustentar um empreendimento. Nesse caso, o envolvimento ambiental dá suporte na manutenção de objetivos ambientais (To et al., 2020). Além disso, empreendedores ambientalmente engajados apresentam melhores níveis de autoeficácia e estão menos preocupados com incertezas e irregularidades (To et al., 2020). Com base nesses argumentos, propomos nossa quinta hipótese de pesquisa (H5):

• H5: O engajamento ambiental influencia positivamente a autoeficácia ecoempreendedora.

Finalmente, conforme já abordado, o engajamento ambiental tem relação com valores ambientais individuais. Na pesquisa realizada por Xu et al. (2022), os autores observaram que o engajamento ambiental pode afetar o nível de envolvimento de um empreendimento em atividades sustentáveis que criam valor para além da esfera econômica. Significa que a implementação da criação de valor ambiental depende da interpretação empresarial das questões de sustentabilidade como uma oportunidade de mercado ou como uma ameaça ambiental. Neste contexto, a nossa última hipótese de investigação, H6, tem a ver com a influência do engajamento ambiental dos ecoempreendedores na criação de valor ambiental:

• H6: O engajamento ambiental influencia positivamente a criação de valor ambiental.

A Figura 1 mostra o modelo conceitual construído a partir das seis hipóteses.

Figura 1
Modelo Conceitual

O modelo foi adaptado de Hockerts (2017) (Figura 1). Propomos uma nova configuração para avaliar a influência da obrigação moral e do engajamento ambiental na percepção de empatia, autoeficácia ecoempreendedora e criação de valor ambiental. Além disso, foi adicionado o construto “engajamento ambiental” com base em Kaida e Kaida (2019).

Em relação aos itens de medição, eles foram adaptados da seguinte forma: autoeficácia ecoempreendedora, empatia e obrigações morais foram adaptados de Hockerts (2017), enquanto a criação de valor ambiental foi baseada em Bojica et al. (2018) e Domenico et al. (2010). Por fim, os itens de engajamento ambiental foram adaptados de Kaida e Kaida (2019).

ABORDAGEM METODOLÓGICA

O presente estudo possui abordagem quantitativa e é de natureza aplicada. A análise e o tratamento dos dados foram apoiados na análise multivariada dos dados, especificamente através da análise fatorial confirmatória (AFC) e da modelagem de equações estruturais de mínimos quadrados parciais (PLS-SEM).

A AFC refere-se à qualidade de mensuração de cada construto. A técnica testa a representatividade de cada variável do construto da mesma forma que permite confirmar o grau de ajuste dos dados observados à teoria hipotética (Hair et al., 2019). A modelagem de equações estruturais (SEM), no entanto, é capaz de analisar simultaneamente múltiplas medidas sobre objetos de estudo, além de avaliar a qualidade da medida e testar relações entre variáveis latentes, ou seja, fenômenos não diretamente observáveis (Hair et al., 2019).

No presente estudo, o SEM foi desenvolvido com estimação de mínimos quadrados parciais (PLS), o que normalmente utiliza a representação de diagramas para ilustrar um modelo hipotético composto por caminhos (path models) que exibem visualmente as relações teóricas entre as variáveis (Manley et al., 2021). O PLS-SEM, portanto, é comumente utilizado para modelar relações complexas com múltiplas relações de dependência e independência entre variáveis latentes, ou seja, para identificar graus de predição e explicação dos construtos apresentados (Hair et al., 2019).

De acordo com Manley et al. (2021), pesquisadores da área de empreendedorismo comumente utilizam essa técnica para avaliar relações entre múltiplas variáveis, tipicamente medidas com mais de um item, caracterizando uma abordagem que vai além dos preceitos da regressão múltipla. Portanto, a utilização do PLS-SEM é adequada para mensurar os antecedentes das variáveis dependentes “Empatia”, “Autoeficácia Ecoempreendedora” e “Criação de Valor Ambiental”, propostas nesse estudo.

O objeto de estudo foi uma amostra de ecoempreendedores participantes do Projeto Conexão Mata Atlântica, iniciativa do governo federal brasileiro realizada nos estados do Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais e que tem por objetivo promover a conservação da biodiversidade e da água e combater as mudanças climáticas (Infraestrutura e Meio Ambiente, 2020). O bioma Mata Atlântica é reconhecido mundialmente e de grande importância por abrigar uma grande diversidade de flora e fauna. Como resultado do projeto, foram criados programas para restaurar a biodiversidade original da Mata Atlântica.

Os participantes do Projeto Conexão Mata Atlântica são exemplos de ecoempreendedores. De acordo com Sun et al. (2020), eles ajudam a conter o aquecimento global, a reduzir a desflorestamento e a degradação ambiental, a manter a biodiversidade e a melhorar o abastecimento de água e as práticas agrícolas.

A coleta de dados primários foi realizada em campo por meio de questionário, cujos itens foram respondidos por meio de uma escala do tipo Likert com cinco pontos, sendo 1 (discordo totalmente) e 5 (concordo totalmente). O instrumento de medida foi submetido ao Comitê de Ética da Universidade. Também foi realizado um pré-teste, com dez especialistas em metodologias, conceitos e aspectos técnicos. Como resultado do pré-teste foram identificadas eventuais dúvidas conceituais, estruturais e de escala e feitas adaptações para que o instrumento tivesse o mínimo de duplicidade possível. Além disso, as questões extraídas da revisão de literatura foram traduzidas para o português e adaptadas durante a validação.

O questionário foi aplicado por técnicos agrícolas do Instituto BioSistêmico (IBS) sob nossa supervisão e apoio. Eles visitaram propriedades rurais para aplicação dos questionários e fizeram reuniões semanais conosco para acompanhar e alinhar o andamento da coleta de dados. Os participantes foram selecionados aleatoriamente e esse processo ocorreu de janeiro a abril de 2021.

Em relação à adequação da amostra, o software GPower 3.1 apontou um tamanho amostral mínimo de 92 para os 359 agricultores participantes do Projeto Conexão Mata Atlântica. Obtivemos 130 respondentes (aproximadamente 40% dos participantes), portanto a amostra foi considerada adequada para a condução do PLS-SEM (Hair et al., 2019).

RESULTADOS

A análise dos dados foi realizada em quatro etapas. Primeiro, utilizou-se estatística descritiva para compreender o perfil do objeto de estudo. Em relação ao gênero, 78% dos inquiridos eram do sexo masculino e 22% do sexo feminino, com idade média de 56 anos, sendo 80% casados. A renda familiar mensal ficou entre R$ 3.134,41 e R$ 6.601,06. Do total da amostra, 33% possuíam ensino médio completo. A Tabela 1 destaca as estatísticas descritivas dos participantes da pesquisa.

Tabela 1
Estatísticas Descritivas da Amostra

Característica		%
Gênero	Feminino	21,67
	Masculino	78,33
Idade	< 30 anos de idade	2,36
	31 - 60 anos de idade	62,99
	61 anos de idade +	34,65
Educação	Analfabeto	0,79
	Ensino primário incompleto	6,30
	Ensino primário completo	8,66
	Ensino médio incompleto	11,81
	Ensino médio completo	33,07
	Ensino superior incompleto	11,81
	Ensino superior completo	17,32
	Pós-graduação	10,24
Estado Civil	Solteiro	11,72
	Casado	80,47
	Divorciado	5,47
	Outro estado civil	2,34
Renda mensal da família	Até R$ 1.045,00	4,65
	De R$ 1.045,01 até R$ 2.089,60	17,05
	De R$ 2.089,61 até R$ 3.134,40	25,58
	De R$ 3.134,41 até R$ 6.601,06	28,68
	De R$ 6.101,07 até R$ 10.448,00	23,26
	Acima de R$ 10.448,01	0,78

Após a análise descritiva, foi realizada a etapa empírica do estudo, que iniciou com a avaliação das medidas incluídas no modelo conceitual. Hair et al. (2019), recomendam analisar a validade convergente, a validade discriminante e a confiabilidade, pois todos os construtos são reflexivos. Assim, a Tabela 2 apresenta os resultados da AFC e a análise descritiva dos indicadores, mostrando as questões excluídas. A Tabela 3 apresenta os indicadores para as análises sugeridas, demonstrando que todos os valores estão dentro dos apontados por Hair et al. (2019).

Tabela 2
AFC e Análise Descritiva do Modelo de Mensuração

Questões	Carga de caminho padronizado	Média	Desvio padrão	T-valor	P-valor	Fonte
Autoeficácia ecoempreendedora
AEE1. Tenho convicção de que posso contribuir para o enfrentamento dos desafios (problemas) sociais e ambientais se me dedicar a isso.	0,812	0,811	0,036	22,634	0,000	Adaptado de Hockerts (2017)
AEE2. Posso encontrar uma maneira de ajudar a resolver os problemas sociais e ambientais da sociedade.	0,871	0,870	0,025	35,438	0,000
AEE3. Resolver problemas sociais e ambientais é algo com que posso contribuir.	0,837	0,836	0,029	28,958	0,000
AEE4. Sinto-me preparado para trabalhar em uma ecoempresa.	0,899	0,897	0,022	41,381	0,000
AEE5. Sinto-me capaz de trabalhar numa empresa para contribuir para a criação de valor ambiental.	0,903	0,901	0,021	42,564	0,000
Criação de Valor Ambiental
CVA1. Na minha ecoempresa, criamos novos produtos, processos, serviços ou modelos de negócios que não existiam.	0,791	0,789	0,058	13,601	0,000	Adaptado de Domenico et al. (2010)
CVA2. Na minha ecoempresa, utilizamos recursos descartados, em desuso ou indesejados para novos fins.	0,861	0,860	0,043	20,006	0,000
CVA3. Na minha eco-empresa, utilizamos recursos inexplorados que outras organizações não conseguem reconhecer, valorizar ou utilizar.	0,878	0,877	0,036	24,165	0,000
CVA4. Na minha ecoempresa, adaptamos, reorganizamos e improvisamos materiais conforme necessário.	0,928	0,927	0,027	34,346	0,000
CVA5. Estamos confiantes na nossa capacidade de encontrar soluções viáveis para novos desafios utilizando os recursos existentes.	0,916	0,914	0,026	34,785	0,000
CVA6. Utilizamos qualquer recurso existente que pareça útil para responder a um novo problema ou oportunidade.	0,900	0,900	0,031	29,152	0,000	Adaptado de Bojica et al. (2018)
CVA7. Enfrentamos novos desafios combinando recursos existentes e outros recursos disponíveis de forma rentável.	0,958	0,957	0,011	86,863	0,000
CVA8. Ao lidar com novos problemas ou oportunidades, agimos de forma ambientalmente correta, assumindo que encontraremos uma solução viável.	0,928	0,927	0,019	48,654	0,000
CVA9. Ao combinar as nossas capacidades existentes, enfrentamos uma variedade surpreendente de novos desafios.	0,935	0,934	0,020	46,408	0,000
CVA10. Ao enfrentar novos desafios, criamos soluções viáveis a partir dos nossos recursos existentes.	0,921	0,921	0,027	33,994	0,000
Engajamento Ambiental
ENG1. Nas compras levo minha própria sacola e evito usar sacolas plásticas fornecidas pelas lojas.	0,701	0,697	0,056	12,510	0,000	Adaptado de Kaida e Kaida (2019)
ENG2. Costumo fechar a torneira para economizar água (excluído).	0,452	-	-	-	-
ENG3. Apago as luzes que não estão em uso (excluído).	0,512	-	-	-	-
ENG4. Sempre que possível, prefiro comprar recargas a produtos novos.	0,805	0,804	0,036	22,205	0,000
ENG5. Sempre que possível, prefiro usar o transporte público ao invés do carro particular (excluído).	0,272	-	-	-	-
ENG6. Evito desperdiçar comida (excluído)	0,330	-	-	-	-
ENG7. Escolho comprar produtos ecológicos (sustentáveis).	0,817	0,814	0,044	18,457	0,000
ENG8. Reciclo resíduos em casa.	0,596	0,592	0,077	7,710	0,000
ENG9. Descarto os resíduos adequadamente em locais públicos.	0,747	0,745	0,043	17,531	0,000
Empatia
EMP1. Tento me colocar no lugar das pessoas socialmente desfavorecidas.	0,828	0,822	0,052	15,811	0,000	Adapted from Hockerts (2017)
EMP2. Ver pessoas socialmente desfavorecidas desencadeia uma resposta emocional em mim.	0,888	0,880	0,044	20,198	0,000
EMP3. Sinto compaixão pelas pessoas socialmente desfavorecidas.	0,901	0,896	0,039	23,262	0,000
EMP4. Estou disposto a lutar por mais igualdade social.	0,909	0,909	0,038	24,215	0,000
Obrigação Moral
OBM1. É uma responsabilidade ética ajudar pessoas menos afortunadas do que nós.	0,806	0,807	0,040	19,933	0,000	Adapted from Hockerts (2017)
OBM2. Somos moralmente obrigados a ajudar as pessoas socialmente desfavorecidas.	0,903	0,900	0,027	33,529	0,000
OBM3. A justiça social exige que ajudemos aqueles que são menos afortunados do que nós.	0,936	0,936	0,013	71,409	0,000
OBM4. É um dos princípios da nossa sociedade ajudar as pessoas socialmente desfavorecidas.	0,865	0,864	0,034	25,237	0,000

Tabela 3
Construtos Confiabilidade e Validade

Construtos	AEE	CVA	EMP	ENG	OBM
Autoeficácia do Ecoempreendedor	0,865
Criação de Valor Ambiental	0,628	0,903
Empatia	0,557	0,328	0,884
Engajamento Ambiental	0,515	0,572	0,301	0,738
Obrigação Moral	0,593	0,356	0,731	0,443	0,880
Alfa de Cronbach	0,916	0,974	0,907	0,787	0,901
Confiabilidade Composta	0,937	0,978	0,935	0,855	0,932
Variância Média Extraída	0,748	0,815	0,782	0,544	0,774

Além disso, para realizar a análise do viés do método comum, foram utilizadas três questões não relacionadas ao estudo e inseridas no questionário. Não foram encontrados valores de correlação significativos entre as variáveis dependentes e de controle, indicando ausência ou pouca influência do viés comum do método no estudo (Podsakoff et al., 2003).

A quarta e última etapa da análise empírica valida o modelo de mensuração e compreende a validação do modelo estrutural. Nesta fase, Hair et al. (2019) recomendam a análise da colinearidade, dos coeficientes estruturais e de determinação e da relevância preditiva. A colinearidade foi analisada por meio do fator de inflação da variância (VIF), onde todas as relações apresentaram valores de 1.244 dentro da faixa estabelecida. A Tabela 4 apresenta os testes T de Student e os valores de P.

Tabela 4
Indicadores de Análise do Modelo Estrutural

Hipóteses	Médias	Desvio Padrão	Coeficiente de caminho	T-valor	P-valor	Efeito Tamanho (f2)	Significância a 5%?
OBM → EMP	0,749	0,052	0,743	14,282	0,000	0,952	Yes
OBM → AEE	0,451	0,065	0,454	6,951	0,000	0,291	Yes
OBM → CVA	0,122	0,074	0,127	1,708	0,088	0,020	No
ENG → EMP	-0,025	0,061	-0,030	0,496	0,620	0,002	No
ENG → AEE	0,322	0,065	0,314	4,866	0,000	0,140	Yes
ENG → CVA	0,520	0,100	0,516	5,148	0,000	0,325	Yes

A Tabela 4 resume os resultados das hipóteses de pesquisa. Em outras palavras, eles indicam que a obrigação moral influencia a empatia e a autoeficácia ecoempreendedora, assim como o engajamento ambiental influencia a autoeficácia ecoempreendedora e a criação de valor ambiental, apoiando assim as hipóteses H1, H2, H5 e H6. Contudo, os mesmos resultados indicam que a obrigação moral não influencia a criação de valor ambiental e o engajamento ambiental não influencia a empatia, rejeitando assim as hipóteses H3 e H4.

Após examinar a significância das relações, o próximo passo diz respeito à avaliação da precisão do modelo (Hair et al., 2019). A Tabela 5 apresenta o R², o R² ajustado, uma versão modificada do R² para os preditores do modelo e os valores de Q².

Tabela 5
Coeficiente de Determinação e Relevância Preditiva

Construto	R2	R2 Ajustado	Q2
Autoeficácia Ecoempreededora	0,431	0,422	0,315
Criação de Valor Ambiental	0,341	0,330	0,274
Empatia	0,533	0,526	0,409

Tabela 6
Testes de Moderação com as Variáveis de Controle

Relações	Médias	Desvio padrão	T-valor	P-valor
Efeito de moderação IDADE - OBM -> EMP	-0,003	0,074	0,186	0,853
Efeito de moderação IDADE - ENG -> EMP	0,075	0,062	1190,000	0,234
Efeito de moderação IDADE - OBM -> AEE	0,020	0,123	0,073	0,942
Efeito de moderação IDADE - ENG -> AEE	-0,081	0,091	0,751	0,453
Efeito de moderação IDADE - OBM -> CVA	0,029	0,090	0,115	0,909
Efeito de moderação IDADE - ENG -> CVA	-0,016	0,089	0,176	0,860
Efeito de moderação EXPERIÊNCIA - OBM -> EMP	0,119	0,115	1,129	0,259
Efeito de moderação EXPERIÊNCIA - ENG -> EMP	-0,038	0,096	0,530	0,596
Efeito de moderação EXPERIÊNCIA - OBM -> AEE	-0,041	0,070	0,684	0,494
Efeito de moderação EXPERIÊNCIA - ENG -> AEE	-0,016	0,082	0,183	0,854
Efeito de moderação EXPERIÊNCIA - OBM -> CVA	0,060	0,068	0,780	0,436
Efeito de moderação EXPERIÊNCIA - ENG -> CVA	0,054	0,101	0,394	0,693

A Tabela 5 mostra que todos os valores R² são altos e explicados por obrigação moral e engajamento ambiental. Os valores Q² também estão entre as recomendações de Hair et al. (2019). A Figure 1 apresenta os indicadores de análise do modelo conceitual.

Para dar robustez aos resultados obtidos, foram realizados testes de moderação com duas variáveis de controle: idade e experiência como empreendedor. De acordo com os resultados apresentados na Tabela 5, não foi identificado efeito de moderação nos relacionamentos considerando essas duas variáveis.

DISCUSSÃO

Os negócios que prejudicam o meio ambiente devem passar por ajustes de maneira gradual. A pandemia da COVID-19 apresentou uma oportunidade e um incentivo para melhorar as práticas sustentáveis de produção e consumo (Galindo-Martín et al., 2021). O presente estudo tem como objetivo analisar a influência da obrigação moral e do engajamento ambiental na empatia, na autoeficácia ecoempreendedora e na criação de valor ambiental entre ecoempreendedores brasileiros durante a pandemia. Os achados empíricos lançam luz sobre as mudanças comportamentais nesse subtipo empreendedor, fornecendo insights valiosos para que gestores públicos e privados desenvolvam estratégias que promovam aspectos socioambientais na esfera empreendedora.

O estudo confirmou que níveis mais elevados de obrigação moral influenciam positivamente a empatia e a autoeficácia entre ecoempreendedores, confirmando as hipóteses H1 e H2. Isso indica que os ecoempreendedores sentem uma maior responsabilidade em ajudar indivíduos socialmente desfavorecidos e contribuir para a preservação ambiental (Kaiser & Byrka, 2011; Prado et al., 2022). Este resultado corrobora as teses de Tanveer et al. (2020) e Leviston e Walker (2021), que argumentam que a pandemia da COVID-19 alterou as normas sociais, levando os indivíduos a exibirem maior moralidade em circunstâncias disruptivas. Além disso, estes resultados são consistentes com pesquisas anteriores que demonstram que a obrigação moral promove a bondade ambiental e comunitária (Razzak & Riyami, 2023; Shuqair et al., 2022) e impulsiona a implementação de empreendimentos ecológicos (Annamdevula et al., 2023; Ogiemwonyi & Jan, 2023; Tan et al., 2021; Ukil et al., 2023).

Por outro lado, a premissa de que um sentido de moralidade poderia influenciar positivamente a criação de valor ambiental dentro das empresas foi contrariada, uma vez que a H3 não foi confirmada. É possível que a pandemia da COVID-19 tenha chamado a atenção dos empreendedores para a importância de entregar produtos que vão além das considerações econômicas e tenham impactos socioambientais. No entanto, os efeitos dessa criação de valor podem ainda não ser percebidos como uma obrigação moral, visto que requerem inovação e processos de produção mais limpos (Yi, 2021). Consequentemente, o impacto da pandemia na responsabilidade ecoempreendedora nesse contexto continua por ser plenamente compreendido.

Além disso, as conclusões do estudo mostram que os ecoempreendedores ambientalmente engajados apresentam níveis mais elevados de autoeficácia e estão mais propoensos a criar valor ambiental, apoiando as hipóteses H5 e H6. Isso sugere que os indivíduos que participam ativamente no ativismo ambiental se sentem preparados para implementar políticas e estratégias ambientais no seu ambiente de trabalho (Piyapong, 2020). Em outras palavras, a maior conscientização sobre as questões socioambientais leva a uma maior capacidade de resposta a tais demandas, o que corrobora os estudos anteriores de Alwakid et al. (2021) e Gu e Wang (2022).

Nossos resultados sugerem que o engajamento ambiental influencia os valores ambientais, de modo que os indivíduos acabam mantendo ofertas no mercado que abrangem objetivos e atividades pró-ambientais (To et al., 2020; Xu et al., 2022). Isso é um fenômeno relacionado ao efeito positivo do engajamento ambiental na autoeficácia ecoempreendedora e na criação de valor ambiental. Assim, podemos afirmar que os valores ambientais são essenciais para um modelo de ecoempreendedorismo que estabeleça soluções para processos produtivos e técnicos mais limpos (Yasir et al., 2023). Ainda, exerce influência na capacidade do ecoempreendedor de identificar oportunidades e incentiva a inovação verde (Hoogendoorn et al., 2020).

No entanto, a hipótese de que o engajamento ambiental influencia positivamente a empatia ecoempreendedora (H4) não foi confirmada. A rejeição da H4 pode ser explicada pelo fato de a empatia ser um preditor normalmente atribuído aos empreendedores sociais (Hockerts, 2017; Kim, 2022), e ainda pouco estudada em estudos no campo do ecoempreendedorimo.

A rejeição de dois efeitos do nosso modelo empírico, a obrigação moral na criação de valor ambiental e o envolvimento ambiental na empatia, também pode ser atribuída à nossa seleção da amostra. Neste estudo, focamos nos produtores rurais e na modalidade de empreendedorismo voltado para o meio ambiente. Assim, os produtores rurais podem não ver a sua atividade como um catalisador para a criação de valor ambiental (Manoj et al., 2020). Além disso, podem não perceber as exigências da comunidade em relação a suas atividades associadas à sustentabilidade (Bouman et al., 2020). Da mesma forma, o engajamento dos produtores rurais com o meio ambiente pode estar limitado à ecologia, ou seja, o engajamento ambiental não está relacionado à empatia com a sociedade (Yeow & Loo, 2022). Como consequência, os nossos resultados empíricos limitam-se à esfera ambiental, excluindo a relação do ecoempreendedorismo com as questões sociais.

Implicações e contribuições

A validação dos resultados desse trabalho é relevante, pois a amostra é composta por ecoempreendedores que foram investigados durante a Covid-19, o que sugere que as contribuições são viáveis e focam em quatro pontos principais. Primeiramente, o estudo valida um modelo teórico robusto e com alto poder explicativo para as variáveis dependentes (empatia, autoeficácia ecoempreendedora e criação de valor ambiental), o que auxilia na compreensão do comportamento ecoempreendedor. É importante ressaltar que validamos a medida e o modelo estrutural, testando normalidade, confiabilidade e consistência interna, assim como estudos anteriores (Severo et al., 2021). Assim, trazemos insights relevantes sobre o comportamento ecoempreendedor num momento em que o mundo caminha para uma economia sustentável (Dhahri et al., 2021; Gurău & Dana, 2018; Rodríguez-García et al., 2019). Além disso, propusemos uma combinação de efeitos de variáveis que normalmente são utilizadas como mediadoras e moderadoras, como obrigação moral e engajamento ambiental. Como resultado, avançamos no ecoempreendedorismo ao abrir uma nova direção de pesquisa para testar o poder explicativo de variáveis não testadas até agora no comportamento ecoempreendedor (Annamdevula et al., 2023; Hoogendoorn et al., 2020).

Em segundo lugar, este estudo demonstra a complexidade das relações entre as variáveis que medem o comportamento ecoempreendedor e a necessidade de examinar os determinantes destas características-chave. Os resultados indicam que a empatia e a autoeficácia, preditores da intenção empreendedora estabelecidos na literatura (Kim, 2022), podem ser potencializados quando o empreendedor possui altos níveis de obrigação moral. Da mesma forma, os empreendedores ambientalmente envolvidos aumentam a autoeficácia e a criação de valor. Assim, é possível reordenar e testar novas interações e efeitos de características e perspectivas empreendedoras, como observado no estudo de Leviston e Walker (2021), que testaram o efeito indireto da eficácia individual no comportamento pró-ambiental por meio do engajamento moral (mesmo que tal estudo não tenha sido realizado no contexto tão particular como o da pandemia da Covid-19).

Terceiro, o presente estudo oferece insights práticos para formuladores de políticas e educadores envolvidos com o ecoempreendedorismo. Os indivíduos em posição de tomar decisões públicas devem desenvolver um ambiente que promova a empatia, a autoeficácia e a criação de valor ambiental. Além disso, reforçar a importância da obrigação moral e incentivar o comportamento pró-ambiental pode aumentar as percepções em torno dessas três características. Ainda, os programas de sensibilização ajudarão os potenciais ecoempreendedores, aumentando as suas aspirações de sucesso e oferecendo um apoio significativo. Vale destacar que, ao mostrarem os benefícios econômicos de uma abordagem mais ecologicamente correta, os ecoempreendedores funcionam como um atrativo incentivando outras empresas a irem na mesma direção (Galindo-Martín et al., 2021; Rodríguez-García et al., 2019). Além disso, a pesquisa confirma que os ecoempreendedores possuem características empreendedoras semelhantes aos empreendedores de negócios tradicionais, como a autoeficácia; e aos empreendedores sociais, especialmente no que diz respeito à empatia e à obrigação moral. Assim, avaliar e desenvolver comportamentos voltados à sustentabilidade de potenciais empreendedores pode ser uma estratégia de desenvolvimento adequada para aumentar o número de ecoempreendedores (Tan et al., 2021).

Em quarto lugar, no que diz respeito aos produtores rurais, as nossas conclusões sugerem que a agricultura sustentável pode ser impulsionada por ecoempreendedores que são influenciados pelo sentido de obrigação moral para com a comunidade como um todo e pelo engajamento ambiental. A Covid-19 aumentou as necessidades de alimentos seguros e exige abordagens inovadoras capazes de abordar questões relacionadas com o ambiente, a saúde humana e o comércio justo no agronegócio (Lang et al., 2022). Demonstra também que o sector agrícola pode desempenhar um papel essencial na resposta a muitos dos desafios globais e deixa claro que existe uma oportunidade de mercado para atividades no campo (Barth et al., 2021). Especialmente no nosso contexto de investigação, promover o desenvolvimento empresarial e a sustentabilidade como um objetivo comum, através da agricultura, pode impactar o desenvolvimento da comunidade local como um todo (Barth et al., 2021).

Por fim, esta pesquisa apresenta contribuições diretamente relacionadas à Agenda dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas (ODS). Especialmente na dimensão ambiental, os presentes resultados corroboram o ODS 13 (ação contra a mudança global do clima) no que diz respeito à adoção de medidas urgentes para combater as mudanças climáticas e seus impactos; ODS 14 (vida na água), relativo à conservação e utilização sustentável dos oceanos, mares e recursos marinhos para o desenvolvimento sustentável; e ODS 15 (vida terrestre), referente à proteção, restauração e promoção do uso sustentável dos ecossistemas terrestres, geração sustentável de florestas, combate à desertificação, detenção e reversão da degradação do solo e detenção da perda de biodiversidade. No que diz respeito a questão econômica, o trabalho apresenta contribuições ao ODS 8, que se refere ao trabalho decente e ao crescimento econômico inclusivo e sustentável e ao ODS 12 de consumo e produção responsáveis, que indica padrões sustentáveis de consumo e produção.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este estudo apresentou um modelo inédito de comportamento de ecoempreendedores brasileiros, cujos dados foram coletados em meio a pandemia de Covid-19. Através de uma análise simétrica realizada pela técnica de modelagem de equações estruturais identificamos que o cenário disruptivo causado pelo novo coronavírus impulsionou os ecoempreendedores a se sentirem mais obrigados moralmente a responder ao mercado consumidor com maior empatia e autoeficácia à medida que se tornam mais engajados ambientalmente e, consequentemente, com maior percepção de autoeficácia ecoempreendedora e criação de valor ambiental em seus negócios.

O resultado obtido revela uma notável transformação nas perspectivas ecoempreendedoras devido a Covid-19. Isto indica que, apesar de certos desafios nas práticas empresariais orientadas para a sustentabilidade, particularmente aqueles relacionados a falta de saneamento básico em certas regiões (Alwakid et al., 2021; Tanveer et al., 2020), tanto os consumidores como os empreendedores nas economias emergentes estão cada vez mais inclinados a adotar comportamentos que promovam o desenvolvimento sustentável.

Ou seja, compreender que a empatia, a autoeficácia ecoempreendedora e a criação de valor ambiental podem ser ainda mais expressivas quando o indivíduo se sente moralmente obrigado a responder aos atuais desafios socioambientais, bem como a abster-se de comportamentos mais ambientalmente engajados, implica que os gestores e os decisores políticos trabalhem no sentido de reforçar o papel significativo que os empreendedores ecológicos desempenham na sociedade, especialmente em países cujas regulamentações não favorecem o empreendedorismo.

Apesar do rigor metodológico, temos aqui algumas limitações. Primeiro, o estudo propõe e valida um modelo que ainda necessita de embasamento teórico, dificultando a análise dos resultados justamente porque a literatura que sustenta o ecoempreendedorismo ainda precisa ser ampliada. Segundo, o modelo é composto pela interação de apenas cinco construtos. Terceiro, a amostra está limitada a um projeto governamental brasileiro.

Estudos futuros podem lidar com essas limitações acrescentando outros fatores que fortaleçam a empatia, a autoeficácia e a criação de valor ambiental no modelo empírico. Também podem ser realizados mais estudos incluindo outros subtipos de empreendedorismo orientados para a sustentabilidade, bem como novas amostras, períodos e locais.

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) 001 303924/2021-7 e à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo [Fapesp]) 2021/08267-2 pelo apoio à pesquisa.

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Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  19 Fev 2024
• Data do Fascículo
  2024

Histórico

• Recebido
  02 Fev 2023
• Aceito
  13 Nov 2023