Acessibilidade / Reportar erro

NÍVEL DE DISCLOSURE AMBIENTAL: POSTURA PROATIVA OU DEFENSIVA DAS EMPRESAS

Nivel de divulgación ambiental: ¿Una postura proactiva o defensiva de las empresas?

RESUMO

Este trabalho investiga qual teoria melhor explica a motivação das empresas para o disclosure ambiental: a teoria da imagem (proxy: adesão ao Índice de Sustentabilidade Empresarial - ISE) ou a teoria da legitimação (proxy: materialidade de provisões para danos ambientais no balanço - MatPA). São analisadas as empresas brasileiras não financeiras com Environmental Disclosure Score (EDS) disponível na Bloomberg no período 2010-2018. A análise de dados em painel indica que, entre empresas não potencialmente poluidoras, ISE é significativo para explicar o disclosure ambiental e MatPA não; já nas potencialmente poluidoras, MatPA é significativa, mas ISE não. Isso sugere a coexistência de duas motivações antagônicas para divulgar: entre empresas não potencialmente poluidoras prevalece a estratégia proativa de criar valor e diferenciação mediante disclosure ambiental (teoria da imagem); já nas potencialmente poluidoras, prevalece uma postura reativa de divulgar visando autolegitimação diante dos stakeholders, após danos provocados ao ambiente (teoria da legitimação).

Palavras-chave:
divulgação ambiental; provisão ambiental; ESG; teoria da imagem; teoria da legitimação

RESUMEN

Este artículo investiga qué teoría explica mejor la motivación de las empresas para la divulgación ambiental: la teoría de la imagen (proxy: adhesión al Índice de Sostenibilidad Empresarial - ISE), o la teoría de la legitimidad (proxy: materialidad de las provisiones por daños ambientales en el balance - MatPA). Se analizan las empresas brasileñas no financieras con Environmental Disclosure Score (EDS) disponible en Bloomberg del período 2010-2018. El análisis de datos de panel indica que entre empresas no potencialmente contaminantes, el ISE es significativo para explicar la divulgación ambiental y la MatPA no; y en las potencialmente contaminantes, la MatPA es significativa, pero el ISE no. Esto sugiere la coexistencia de dos motivaciones antagónicas para la divulgación: entre empresas no potencialmente contaminantes prevalece la estrategia proactiva de creación de valor y diferenciación mediante la divulgación ambiental (teoría de la imagen); por otro lado, entre las potencialmente contaminantes, prevalece una postura reactiva de divulgación, con miras a la autolegitimación ante los stakeholders después del daño al medio ambiente (teoría de la legitimación).

Palabras clave:
divulgación ambiental; provisión ambiental; ESG; teoría de la imagen; teoría de la legitimación

ABSTRACT

This paper investigated which theory best explains companies’ motivation for environmental disclosure: the image theory (proxy: adherence to the Corporate Sustainability Index - ISE), or the legitimacy theory (proxy: materiality of provisions for environmental damage in the Balance Sheet - MatPA). Listed non-financial Brazilian companies with Environmental Disclosure Score (EDS) available on Bloomberg for the period 2010-2018 were analyzed. The panel data analysis indicated that among non-potentially polluting companies, ISE is significant to explain environmental disclosure and MatPA is not; among potentially polluting firms, MatPA is significant, but ISE is not. This suggests the coexistence of two antagonistic motivations for disclosure: the proactive strategy of creating value and differentiation through environmental disclosure prevails (image theory) in non-potentially polluting companies, whereas potentially polluters primarily adopt a reactive attitude toward disclosure, seeking self-legitimation with stakeholders after causing damage to the environment (legitimacy theory).

Keywords:
environmental disclosure; environmental provision; ESG; image theory; legitimacy theory.

INTRODUÇÃO

Nas últimas décadas, vem se desenvolvendo o Corporate Social Responsibility (CSR) reporting como estratégia de diferenciação mediante boas práticas ambientais, sociais e de governança (Bebbington, Larinagga, & Moneva, 2008Bebbington, G., Larrinaga, C., & Moneva, J. M. (2008). Corporate social reporting and reputation risk management. Accounting, Auditing & Accountability Journal, 21(3), 337-361. doi: 10.1108/09513570810863932
https://doi.org/10.1108/0951357081086393...
; Cormier & Magnan, 2015Cormier, D, & Magnan, M. (2015). The economic relevance of environmental disclosure and its impact on corporate legitimacy: An empirical investigation. Business Strategy and the Environment, 24(6), 431-450. doi: 10.1002/bse.1829
https://doi.org/10.1002/bse.1829...
; Hooghiemstra, 2000Hooghiemstra, R. (2000). Corporate communication and impression management: New perspectives why companies engage in corporate social reporting. Journal of Business Ethics, 27(1/2), 55-68. doi: 10.1007/978-94-011-4311-0_7
https://doi.org/10.1007/978-94-011-4311-...
; McBrayer, 2018McBrayer, G. A. (2018). Does persistence explain ESG disclosure decisions?. Corporate Social Responsibility and Environmental Management, 25(6), 1074-1086. doi: 10.1002/csr.1521
https://doi.org/10.1002/csr.1521...
, Minutolo, Kristjanpoller, & Stakeley, 2019Minutolo, M. C, Kristjanpoller, W. D., & Stakeley. (2019). Exploring environmental, social, and governance disclosure effects on the S&P 500 financial performance. Business Strategy and the Environment, 28(6), 1083-1095. doi: 10.1002/bse.2303
https://doi.org/10.1002/bse.2303...
; entre outros). Tal estratégia é incentivada pela existência de carteiras de empresas diferenciadas pela sustentabilidade em bolsas como: Dow Jones Sustainability World Index (DJSI World) nos Estados Unidos; FTSE4Good Index Series no Reino Unido; Socially Responsible Investment (SRI) na África do Sul; e Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE) no Brasil. Também é estimulada por diretrizes de divulgação, como a Global Reporting Initiative (GRI), o Pacto Global da Organização das Nações Unidas (ONU), o AA 1000, a ISO 14000, o Relato Integrado do International Integrated Reporting Council (IIRC), a junção deste com o Sustainability Accounting Standards Board (SASB) americano em 2020, e o conselho de sustentabilidade do International Accounting Standard Board (IASB).

Uma fundamentação dessa estratégia de CSR reporting é a teoria da imagem (Bebbington et al., 2008Bebbington, G., Larrinaga, C., & Moneva, J. M. (2008). Corporate social reporting and reputation risk management. Accounting, Auditing & Accountability Journal, 21(3), 337-361. doi: 10.1108/09513570810863932
https://doi.org/10.1108/0951357081086393...
; Hooghiemstra, 2000Hooghiemstra, R. (2000). Corporate communication and impression management: New perspectives why companies engage in corporate social reporting. Journal of Business Ethics, 27(1/2), 55-68. doi: 10.1007/978-94-011-4311-0_7
https://doi.org/10.1007/978-94-011-4311-...
), pela qual as empresas buscam proativamente criar valor via divulgação de boas práticas sustentáveis. Essa teoria contrapõe-se a uma teoria anterior, a da legitimação (Gray, Kouhy, & Lavers, 1995Gray, R., Kouhy, R., & Lavers, S. (1995). Corporate, social and environmental reporting: A review of literature and a longitudinal study of UK disclosure. Accounting, Auditing & Accountability Journal, 8(2), 47-77. doi: 10.1108/09513579510146996
https://doi.org/10.1108/0951357951014699...
), pela qual as empresas divulgam informações ambientais não proativamente para criar valor, mas como reação aos impactos negativos de desastres ambientais (como o da Exxon Valdez) ou de más práticas (Deegan, Rankin, & Voght, 2000Deegan, C., Rankin, M., & Voght, P. (2000). Firms' disclosure reactions to major social incidents: Australian evidence. Accounting Forum, 24(1), 101-130. doi: 10.1111/1467-6303.00031
https://doi.org/10.1111/1467-6303.00031...
; Walden & Schwartz, 1998Walden, W. D., & Schwartz, B. N. (1998). Environmental disclosures and public policy pressure. Journal of Accounting and Public Policy, 16, 125-154. doi: 10.1016/S0278-4254(96)00015-4
https://doi.org/10.1016/S0278-4254(96)00...
).

No contexto atual, em que coexistem a crescente busca por divulgação de boas práticas ambientais e a ocorrência de desastres socioambientais ruidosos (como os das empresas Samarco e Vale), reacende-se o debate sobre qual teoria melhor explica a divulgação ambiental das empresas: a adoção de uma estratégia proativa para criar valor e diferenciação socioambiental (como a adesão ao ISE), ou a busca por autolegitimação como reação a eventos ambientais adversos (como a existência de provisões para danos ambientais em seu balanço patrimonial). Mais especificamente, qual o poder explicativo dessas teorias sobre a motivação para divulgar de empresas potencialmente poluidoras versus não poluidoras?

Neste estudo, o nível de disclosure ambiental das empresas é medido pelo Environmental Disclosure Score (aqui EDS), o componente “E” do Environmental, Social and Governance (ESG) disclosure score da base Bloomberg. Pertencer ao ISE - carteira de empresas da B3 diferenciadas por práticas sustentáveis - é utilizado como proxy da postura proativa da empresa que adota o disclosure ambiental como estratégia para criar valor (teoria da imagem). A existência de provisão para danos ambientais reconhecida no balanço é utilizada como proxy de evento ambiental adverso que ensejaria maior disclosure ambiental (teoria da legitimação).

A amostra abrange todas as empresas brasileiras não financeiras com EDS disponível na base Bloomberg em pelo menos dois anos do período analisado, de 2010 a 2018, as quais foram classificadas em pertencentes ou não a setores ambientalmente sensíveis (ou potencialmente poluidores): óleo e gás, químico, mineração, metalurgia, produtos florestais e utilities, seguindo Clarkson, Li, Richardson e Vasvari (2008)Clarkson, P. M., Li, Y., Richardson, G. D., & Vasvari, F. P. (2008). Revisiting the relation between environmental performance and environmental disclosure: An empirical analysis. Accounting, Organizations and Society, 33(4/5), 303-327. doi: 10.1016/j.aos.2007.05.003
https://doi.org/10.1016/j.aos.2007.05.00...
e Deegan e Gordon (1996)Deegan, C., & Gordon, B. (1996). A study of the environmental disclosure practices of Australian corporations. Accounting and Business Research, 26(3), 187-199. doi: 10.1080/00014788.1996.9729510
https://doi.org/10.1080/00014788.1996.97...
, entre outros.

Este trabalho agrega a pesquisas brasileiras que examinaram o ISE como fator explicativo do nível de disclosure ambiental (como Coelho, Ott, Pires, & Alves, 2013Coelho, F. Q., Ott, E., Pires, C. B., & Alves, T. W. (2013). Uma análise dos fatores diferenciadores na divulgação de informações voluntárias sobre o meio ambiente. Contabilidade Vista & Revista, 24(1), 112-130. Recuperado de https://revistas.face.ufmg.br/index.php/contabilidadevistaerevista/article/view/1290
https://revistas.face.ufmg.br/index.php/...
; Rosa, Guesser, Hein, Pfitischer, & Lunkes, 2015Rosa, F. S., Guesser, T., Hein, N., Pfitscher, E. D., & Lunkes, R. J. (2015). Environmental impact management of Brazilian companies: Analyzing factors that influence disclosure of waste, emissions, effluents, and other impacts. Journal of Cleaner Production, 96, 148-160. doi: 10.1016/j.jclepro.2013.10.035
https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2013.1...
; Rover, Tomazzia, Murcia, & Borba, 2012Rover, S., Tomazzia, E. C., Murcia, F. D.-R., & Borba, J. A. (2012). Explicações para a divulgação voluntária ambiental no Brasil utilizando análise de regressão em painel. Revista de Administração, 47(2), 217-230. doi: 10.5700/rausp1035
https://doi.org/10.5700/rausp1035...
). Poder-se-ia argumentar que o fato de esses estudos terem encontrado associação positiva com o ISE já sinalizaria a validade da teoria da imagem para explicar os níveis de disclosure ambiental. Contudo, nenhum desses estudos confrontou pertencer ao ISE com a existência de provisões ambientais no balanço para testar a prevalência de uma das duas teorias na explicação do nível de disclosure ambiental, nem testou diferenças de comportamento entre empresas de setores poluidores versus não poluidores.

A relevância de se examinar a provisão ambiental como proxy de eventos ambientais adversos - que, segundo a teoria da legitimação, ensejariam incremento do nível de disclosure - reside em que uma provisão ambiental no balanço representa má notícia evidente, já que reporta o valor mensurado do dano, com aumento no passivo e diminuição no lucro, impactando vários indicadores financeiros da empresa. Ademais, a provisão ambiental constitui a única evidência contábil obrigatória, diretamente identificável, do dano provocado - o que levou Barth, McNichols e Wilson (1997)Barth, M. E., McNichols, M. F., & Wilson, G. P. (1997). Factors influencing firm’s disclosures about environmental liabilities. Review of Accounting Studies, 2(1), 35-64. doi: 10.1023/A:1018321610509
https://doi.org/10.1023/A:1018321610509...
a analisá-la como fator explicativo da divulgação de obrigações ambientais determinada pela agência de proteção ambiental norte-americana em 1980. Provisões ambientais incluem desde gastos estimados com a reparação voluntária ou obrigatória de danos ambientais gerados pelas atividades normais da empresa até ações judiciais por infrações ambientais, desde as menores e mais frequentes até grandes desastres ambientais.

De fato, há literatura internacional e brasileira sobre fatores explicativos, seja da performance ESG (Garcia, Mendes-Da-Silva, & Orsato, 2017Garcia, A. S., Mendes-Da-Silva, W., & Orsato, R. (2017). Sensitive industries produce better ESG performance: evidence from emerging markets. Journal of Cleaner Production, 150, 135-147. doi: 10.1016/j.jclepro.2017.02.180
https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2017.0...
; Lourenço & Branco, 2013Lourenço, I. C., & Branco, M. C. (2013). Determinants of corporate sustainability performance in emerging markets: the Brazilian case. Journal of Cleaner Production, 57, 134-141. doi: 10.1016/j.jclepro.2013.06.013
https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2013.0...
; Miralles-Quirós, Miralles-Quirós, & Gonçalves, 2018Miralles-Quirós, M. M., Miralles-Quirós, J. L., & Gonçalves, L. M. V. (2018). The value relevance of environmental, social, and governance performance. The Brazilian case Sustainability, 10, 574. doi: 10.3390/su10030574
https://doi.org/10.3390/su10030574...
), seja do nível de disclosure ESG como um todo (McBrayer, 2018)McBrayer, G. A. (2018). Does persistence explain ESG disclosure decisions?. Corporate Social Responsibility and Environmental Management, 25(6), 1074-1086. doi: 10.1002/csr.1521
https://doi.org/10.1002/csr.1521...
. Também há estudos focados apenas na dimensão ambiental do disclosure, seja obrigatório (Barth et al.,1997Barth, M. E., McNichols, M. F., & Wilson, G. P. (1997). Factors influencing firm’s disclosures about environmental liabilities. Review of Accounting Studies, 2(1), 35-64. doi: 10.1023/A:1018321610509
https://doi.org/10.1023/A:1018321610509...
; Chen, Cho, & Patten, 2014Chen, J. C., Cho, C. H., & Patten, D. M. (2014). Initiating disclosure of environmental liability information: An empirical analysis of firm choice. Journal of Business Ethics, 125(4), 681-692. doi: 10.1007/s10551-013-1939-0
https://doi.org/10.1007/s10551-013-1939-...
; Leal, Costa, Oliveira, & Rebouças, 2018Leal, P. H., Costa, B. M. do N., Oliveira, M. C., & Rebouças, S. M. D. P. (2018). Divulgação de provisões e passivos contingentes ambientais sob a ótica da teoria institucional. Enfoque: Reflexão Contábil, 37(3), 37-54. doi: 10.4025/enfoque.v37i3.39477
https://doi.org/10.4025/enfoque.v37i3.39...
) ou voluntário (Cormier & Magnan, 2015Cormier, D, & Magnan, M. (2015). The economic relevance of environmental disclosure and its impact on corporate legitimacy: An empirical investigation. Business Strategy and the Environment, 24(6), 431-450. doi: 10.1002/bse.1829
https://doi.org/10.1002/bse.1829...
; Cormier, Magnan, & Velthoven, 2005Cormier, D., Magnan, M., & Velthoven, B. V. (2005). Environmental disclosure quality inlarge German companies: Economicincentives, public pressures orinstitutional conditions? European Accounting Review, 14(1), 3-39. doi: 10.1080/0963818042000339617
https://doi.org/10.1080/0963818042000339...
; Kim, Ryou, & Yang, 2020Kim, I., Ryou, J. W., & Yang, R. (2020). The color of shareholders' money: Institutional shareholders'political values and corporate environmental disclosure. Journal of Corporate Finance, 64. doi: 10.1016/j.jcorpfin.2020.101704
https://doi.org/10.1016/j.jcorpfin.2020....
). No entanto, esses estudos não abordam a questão desta pesquisa.

Outro diferencial deste estudo é a utilização do EDS da base Bloomberg como proxy de disclosure ambiental, o que facilita a replicação do estudo e mitiga possível viés do pesquisador inerente à construção de um índice próprio. Além disso, esse índice é abrangente, pois inclui informações obrigatórias e voluntárias, positivas e negativas, obtidas de fontes publicamente disponíveis e de questionários aplicados às empresas, abrangendo mais de 10 mil empresas de vários países. O índice ESG da Bloomberg é utilizado em pesquisas internacionais, tanto no seu todo (Albitar, Hussainey, Kolade, & Gerged, 2020Albitar, K., Hussainey, K. Kolade, N., & Gerged, A. M. (2020). ESG disclosure and firm performance before and after IR: The moderating role of governance mechanisms. International Journal of Accounting & Information Management, 28(30), 429-444. doi: 10.1108/IJAIM-09-2019-0108
https://doi.org/10.1108/IJAIM-09-2019-01...
; McBrayer, 2018McBrayer, G. A. (2018). Does persistence explain ESG disclosure decisions?. Corporate Social Responsibility and Environmental Management, 25(6), 1074-1086. doi: 10.1002/csr.1521
https://doi.org/10.1002/csr.1521...
) como focado na sua dimensão ambiental (Aragón-Correa, Marcus, & Hurtado-Torres, 2016Aragón-Correa, J. A., Marcus, A., & Hurtado-Torres, N. (2016). The natural environmental strategies of international firms: Old controversies and new evidence on performance and disclosure. Academy of Management Perspectives, 30(1), 24-39. doi: 10.5465/amp.2014.0043
https://doi.org/10.5465/amp.2014.0043...
; Bellamy, Dhanorkar, & Subramanian, 2020Bellamy, M. A., Dhanorkar, S., & Subramanian, R. (2020). Administrative environmental innovations, supply network structure, and environmental disclosure. Journal of Operations Management, 66(7/8), 895-932. doi: 10.1002/joom.1114
https://doi.org/10.1002/joom.1114...
; Qiu, Shaukat, & Tharyan, 2016Qiu, Y., Shaukat, A., & Tharyan, R. (2016). Environmental and social disclosures: Link with corporate financial performance. The British Accounting Review, 48(1), 102-116. doi: 10.1016/j.bar.2014.10.007
https://doi.org/10.1016/j.bar.2014.10.00...
; entre outros). Entretanto, esse índice ainda não foi utilizado no contexto brasileiro, nem em estudos internacionais que tenham analisado o problema desta pesquisa.

Os resultados desta pesquisa indicam que, entre empresas de setores não potencialmente poluidores, pertencer ao ISE é significativo para explicar o nível de disclosure ambiental, mas a materialidade das provisões ambientais (MatPA) não. No entanto, o oposto ocorre entre empresas potencialmente poluidoras: contrariando outros estudos (Coelho et al., 2013Coelho, F. Q., Ott, E., Pires, C. B., & Alves, T. W. (2013). Uma análise dos fatores diferenciadores na divulgação de informações voluntárias sobre o meio ambiente. Contabilidade Vista & Revista, 24(1), 112-130. Recuperado de https://revistas.face.ufmg.br/index.php/contabilidadevistaerevista/article/view/1290
https://revistas.face.ufmg.br/index.php/...
; Rosa et al., 2015Rosa, F. S., Guesser, T., Hein, N., Pfitscher, E. D., & Lunkes, R. J. (2015). Environmental impact management of Brazilian companies: Analyzing factors that influence disclosure of waste, emissions, effluents, and other impacts. Journal of Cleaner Production, 96, 148-160. doi: 10.1016/j.jclepro.2013.10.035
https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2013.1...
; Rover et al., 2012Rover, S., Tomazzia, E. C., Murcia, F. D.-R., & Borba, J. A. (2012). Explicações para a divulgação voluntária ambiental no Brasil utilizando análise de regressão em painel. Revista de Administração, 47(2), 217-230. doi: 10.5700/rausp1035
https://doi.org/10.5700/rausp1035...
), ISE não têm significância estatística, mas MatPA sim.

Esses resultados contribuem para a literatura ao confirmarem a coexistência de teorias antagônicas para explicar a divulgação ambiental, mas em contextos distintos: a teoria da imagem explica a motivação de empresas não potencialmente poluidoras (proxy: pertencer ao ISE), e a teoria da legitimação, a motivação de empresas potencialmente poluidoras (proxy: MatPA). Também contribuem para a prática, ao possibilitar a consumidores, investidores, reguladores e sociedade melhor interpretar uma elevada divulgação ambiental: é sinalização de boas práticas, atraindo reconhecimento e investimentos, ou, pelo contrário, é autolegitimação diante de danos provocados ao meio ambiente?

BASE TEÓRICA E HIPÓTESES

O disclosure ambiental voluntário insere-se nos parâmetros gerais da divulgação voluntária, estudados por Verrecchia (2001)Verrecchia, R. E. (2001). Essays on disclosure. Journal of Accounting and Economics, 32, 97-180. doi: 10.1016/S0165-4101(01)00025-8
https://doi.org/10.1016/S0165-4101(01)00...
, Dye (2001)Dye, R. A. (2001). An evaluation of “essays on disclosure” and the disclosure literature in accounting. Journal of Accounting and Economics, 31(1/3), 181-185. doi: 10.1016/S0165-4101(01)00024-6
https://doi.org/10.1016/S0165-4101(01)00...
e Healy e Palepu (2001)Healy, P. M., & Palepu, K. G. (2001). Information asymmetry, corporate disclosure, and the capital markets: A review of the empirical disclosure literature. Journal of Accounting and Economics, 31(1/3), 405-440. doi: 10.1016/S0165-4101(01)00018-0
https://doi.org/10.1016/S0165-4101(01)00...
, pelos quais as empresas ponderam os benefícios do disclosure com seus custos e riscos, inclusive da não divulgação. A precificação negativa do silêncio (Dye, 2001Dye, R. A. (2001). An evaluation of “essays on disclosure” and the disclosure literature in accounting. Journal of Accounting and Economics, 31(1/3), 181-185. doi: 10.1016/S0165-4101(01)00024-6
https://doi.org/10.1016/S0165-4101(01)00...
) pela não divulgação de más notícias pode fazer generalizar, por overshooting, a perda de reputação de todos os agentes (Akerlof, 1970Akerlof, G. A. (1970). The Market for “Lemons”: Quality uncertainty and the market mechanism. The Quarterly Journal of Economics, 84(3), 488. doi: 10.2307/1879431
https://doi.org/10.2307/1879431...
) - o que é oportunidade para bons agentes se diferenciarem por sua transparência.

Como mencionado, novas demandas da sociedade vêm estimulando a divulgação voluntária de informações não financeiras pelas empresas, caracterizando o CSR ou ESG reporting, que inclui disclosure sobre meio ambiente, ética, governança, direitos humanos, trabalho, gênero, combate à corrupção e outros (Aguinis & Glavas, 2012Aguinis, H., & Glavas, A. (2012). What we know and don’t know about corporate social responsibility: A review and research agenda. Journal of Management, 38(4), 932-968. doi: 10.1177/0149206311436079
https://doi.org/10.1177/0149206311436079...
; Gray et al., 1995Gray, R., Kouhy, R., & Lavers, S. (1995). Corporate, social and environmental reporting: A review of literature and a longitudinal study of UK disclosure. Accounting, Auditing & Accountability Journal, 8(2), 47-77. doi: 10.1108/09513579510146996
https://doi.org/10.1108/0951357951014699...
).

A literatura sobre determinantes do disclosure ambiental apresenta duas abordagens teóricas antagônicas no contexto mais amplo do CSR reporting: a teoria da legitimação (Gray et al., 1995Gray, R., Kouhy, R., & Lavers, S. (1995). Corporate, social and environmental reporting: A review of literature and a longitudinal study of UK disclosure. Accounting, Auditing & Accountability Journal, 8(2), 47-77. doi: 10.1108/09513579510146996
https://doi.org/10.1108/0951357951014699...
) e a teoria da imagem (Bebbington et al., 2008Bebbington, G., Larrinaga, C., & Moneva, J. M. (2008). Corporate social reporting and reputation risk management. Accounting, Auditing & Accountability Journal, 21(3), 337-361. doi: 10.1108/09513570810863932
https://doi.org/10.1108/0951357081086393...
; Hooghiemstra, 2000Hooghiemstra, R. (2000). Corporate communication and impression management: New perspectives why companies engage in corporate social reporting. Journal of Business Ethics, 27(1/2), 55-68. doi: 10.1007/978-94-011-4311-0_7
https://doi.org/10.1007/978-94-011-4311-...
).

Segundo Gray et al. (1995, p. 54)Gray, R., Kouhy, R., & Lavers, S. (1995). Corporate, social and environmental reporting: A review of literature and a longitudinal study of UK disclosure. Accounting, Auditing & Accountability Journal, 8(2), 47-77. doi: 10.1108/09513579510146996
https://doi.org/10.1108/0951357951014699...
, a teoria da legitimação (definida por Lindblom, 1994Lindblom, C. K. (1994). The implications of organisational legitimacy for corporate social performance and disclosure. Critical Perspectives on Accounting Conference, New York, USA) fundamenta a postura da empresa que busca tornar seu sistema de valores congruente com o sistema de valores da comunidade e, assim, obter legitimidade, particularmente quando há ruptura dessa congruência por problemas socioambientais. Os autores identificam quatro estratégias que as empresas podem adotar para recuperar legitimidade: 1) reconhecer que a ruptura se originou de falhas próprias e informar sobre as mudanças reais na organização; 2) tentar mudar percepções negativas do público (consideradas pela empresa como percepções errôneas), mas sem modificar seu próprio comportamento; 3) manipular a percepção do público, desviando a atenção, inclusive mediante símbolos emocionais - por exemplo, em vez de corrigir um processo industrial poluidor, criar uma iniciativa social; e 4) mudar as expectativas do público sobre a empresa, ao considerá-las incorretas.

Em estreita conexão com a teoria da legitimação, a teoria dos stakeholders enfatiza que a continuidade da existência de uma corporação requer o apoio dos seus stakeholders e que o CSR reporting depende de um diálogo constante com esses stakeholders (Gray et al., 1995Gray, R., Kouhy, R., & Lavers, S. (1995). Corporate, social and environmental reporting: A review of literature and a longitudinal study of UK disclosure. Accounting, Auditing & Accountability Journal, 8(2), 47-77. doi: 10.1108/09513579510146996
https://doi.org/10.1108/0951357951014699...
, p. 53). Considerando as sobreposições entre essas teorias, elas serão aqui consideradas em conjunto.

Assim, a teoria da legitimação/dos stakeholders assume uma postura reativa e defensiva da empresa, ao fundamentar a divulgação ambiental como uma reação a problemas enfrentados, ou seja, como contramedida diante de eventos adversos à sua legitimidade diante dos stakeholders. Essa é a visão subjacente a estudos que testam hipóteses de que empresas que sofreram grandes incidentes, ou pertencentes a setores ambientalmente sensíveis, possuem maior nível de divulgação ambiental (Chen et al., 2014Chen, J. C., Cho, C. H., & Patten, D. M. (2014). Initiating disclosure of environmental liability information: An empirical analysis of firm choice. Journal of Business Ethics, 125(4), 681-692. doi: 10.1007/s10551-013-1939-0
https://doi.org/10.1007/s10551-013-1939-...
; Clarkson et al., 2008Clarkson, P. M., Li, Y., Richardson, G. D., & Vasvari, F. P. (2008). Revisiting the relation between environmental performance and environmental disclosure: An empirical analysis. Accounting, Organizations and Society, 33(4/5), 303-327. doi: 10.1016/j.aos.2007.05.003
https://doi.org/10.1016/j.aos.2007.05.00...
; Deegan et al., 2000Deegan, C., Rankin, M., & Voght, P. (2000). Firms' disclosure reactions to major social incidents: Australian evidence. Accounting Forum, 24(1), 101-130. doi: 10.1111/1467-6303.00031
https://doi.org/10.1111/1467-6303.00031...
; Walden & Schwartz, 1998Walden, W. D., & Schwartz, B. N. (1998). Environmental disclosures and public policy pressure. Journal of Accounting and Public Policy, 16, 125-154. doi: 10.1016/S0278-4254(96)00015-4
https://doi.org/10.1016/S0278-4254(96)00...
; entre outros).

Já a teoria da imagem ou reputação - exposta por Hooghiemstra (2000)Hooghiemstra, R. (2000). Corporate communication and impression management: New perspectives why companies engage in corporate social reporting. Journal of Business Ethics, 27(1/2), 55-68. doi: 10.1007/978-94-011-4311-0_7
https://doi.org/10.1007/978-94-011-4311-...
e retomada por Bebbington et al. (2008)Bebbington, G., Larrinaga, C., & Moneva, J. M. (2008). Corporate social reporting and reputation risk management. Accounting, Auditing & Accountability Journal, 21(3), 337-361. doi: 10.1108/09513570810863932
https://doi.org/10.1108/0951357081086393...
como “reputation risk management” - enfoca o CSR reporting no âmbito mais amplo da comunicação, como apresentação da identidade da empresa, na promoção de sua imagem e reputação. Trata-se de uma visão mais proativa do CSR reporting, que objetiva interagir com a sociedade, divulgando valores comuns da empresa e dos integrantes do público como “parceiros da comunicação”, cujas percepções e expectativas podem, inclusive, modificar a própria identidade da empresa (Bebbington et al, 2008Bebbington, G., Larrinaga, C., & Moneva, J. M. (2008). Corporate social reporting and reputation risk management. Accounting, Auditing & Accountability Journal, 21(3), 337-361. doi: 10.1108/09513570810863932
https://doi.org/10.1108/0951357081086393...
, p. 59).

Assim, enfatiza-se aqui uma postura mais positiva, de adotar uma estratégia proativa de buscar criar valor pela divulgação, como assumem estudos que relacionam a divulgação à performance financeira, ganhos de imagem e pertencimento a carteiras de ações diferenciadas (Bellamy et al., 2020Bellamy, M. A., Dhanorkar, S., & Subramanian, R. (2020). Administrative environmental innovations, supply network structure, and environmental disclosure. Journal of Operations Management, 66(7/8), 895-932. doi: 10.1002/joom.1114
https://doi.org/10.1002/joom.1114...
; Cormier & Magnan, 2015Cormier, D, & Magnan, M. (2015). The economic relevance of environmental disclosure and its impact on corporate legitimacy: An empirical investigation. Business Strategy and the Environment, 24(6), 431-450. doi: 10.1002/bse.1829
https://doi.org/10.1002/bse.1829...
; Minutolo et al., 2019Minutolo, M. C, Kristjanpoller, W. D., & Stakeley. (2019). Exploring environmental, social, and governance disclosure effects on the S&P 500 financial performance. Business Strategy and the Environment, 28(6), 1083-1095. doi: 10.1002/bse.2303
https://doi.org/10.1002/bse.2303...
; Qiu et al., 2016Qiu, Y., Shaukat, A., & Tharyan, R. (2016). Environmental and social disclosures: Link with corporate financial performance. The British Accounting Review, 48(1), 102-116. doi: 10.1016/j.bar.2014.10.007
https://doi.org/10.1016/j.bar.2014.10.00...
; Rosa et al., 2015Rosa, F. S., Guesser, T., Hein, N., Pfitscher, E. D., & Lunkes, R. J. (2015). Environmental impact management of Brazilian companies: Analyzing factors that influence disclosure of waste, emissions, effluents, and other impacts. Journal of Cleaner Production, 96, 148-160. doi: 10.1016/j.jclepro.2013.10.035
https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2013.1...
; entre outros).

Vale destacar que ambas as teorias se desenvolveram no contexto de grandes desastres ambientais. Por exemplo, Hooghiemstra (2000)Hooghiemstra, R. (2000). Corporate communication and impression management: New perspectives why companies engage in corporate social reporting. Journal of Business Ethics, 27(1/2), 55-68. doi: 10.1007/978-94-011-4311-0_7
https://doi.org/10.1007/978-94-011-4311-...
analisa a transformação da linguagem CSR da Shell, começando com a abordagem de legitimação diante de acidentes e passando a uma comunicação proativa e criativa, voltada a valores do público.

À luz dessa literatura mais recente, este estudo testa a predominância da teoria da imagem para explicar a divulgação ambiental das empresas, formulando a Hipótese 1:

  • H1: A teoria proativa da imagem (proxy: pertencer ao ISE) explica o nível de divulgação ambiental tanto em empresas ambientalmente sensíveis como não sensíveis.

Por outro lado, como empresas potencialmente poluidoras têm maior propensão a gerar danos ambientais, também se formula a Hipótese 2:

  • H2: A teoria defensiva da legitimação (proxy: MatPA) explica mais o nível de divulgação ambiental em empresas potencialmente poluidoras do que a teoria proativa da imagem.

DADOS E MÉTODO

A amostra compreende as empresas brasileiras não financeiras com EDS disponível na Bloomberg Database em pelo menos dois dos anos analisados, de 2010 a 2018, totalizando 107 empresas, e caracterizando um painel desbalanceado com 839 observações. O período inicia-se em 2010, o primeiro ano de adoção completa das International Financial Reporting Standards (IFRSs), para assegurar homogeneidade normativa ao tratamento das provisões, e finda em 2018, último ano com EDS disponível no momento da coleta (dezembro de 2020).

O Environmental Disclosure Score (EDS) é proxy para a variável dependente, divulgação ambiental. O EDS é um dos componentes do índice ESG da Bloomberg e mede, numa escala de 0,1 a 100, o grau de disclosure de informações sobre gestão ambiental. Abrange mais de 120 indicadores de disclosure ambiental padronizados por setor e inclui dados de mais de 10 mil empresas, sendo usado por mais de 320 mil assinantes globalmente. Os dados são coletados de múltiplas fontes, como relatórios de CSR, demonstrações financeiras, informações sobre geração de carbono e de resíduos, consumo de água, de energia e outros, mediante questionário proprietário (Bellamy et al., 2020Bellamy, M. A., Dhanorkar, S., & Subramanian, R. (2020). Administrative environmental innovations, supply network structure, and environmental disclosure. Journal of Operations Management, 66(7/8), 895-932. doi: 10.1002/joom.1114
https://doi.org/10.1002/joom.1114...
). Note-se que o índice ESG da Bloomberg mede o nível de divulgação, ou seja, a quantidade de informações fornecidas pelas empresas nessas categorias, e não a performance ESG das empresas, como ocorre com outros índices.

As variáveis de interesse principais são: (i) pertencer à carteira do Índice de Sustentabilidade Empresarial da B3 (ISE) e (ii) a materialidade do montante de provisões ambientais (MatPA).

ISE é uma dummy que assume valor “1” para a empresa i que pertenceu à carteira do ISE no ano t e “0”, caso contrário. O índice reflete o desempenho médio das cotações das ações das empresas, selecionadas principalmente a partir de um questionário que mede seu comprometimento com a sustentabilidade empresarial. O questionário abrange centenas de perguntas organizadas nas dimensões operação da empresa, sustentabilidade e governança corporativa.

MatPA é uma variável quantitativa que expressa a materialidade das provisões ambientais em relação ao ativo total da empresa i no ano t. PA representa a obrigação ambiental reconhecida no balanço patrimonial da empresa i no ano t. Conforme a norma contábil internacional IAS 37 (IASB, 2001International Accounting Standard Board. (2001). International Accounting Standard 37 - Provisions, Contingent Liabilities and Contingent Assets. London, UK: IFRS Foundation) (e sua correspondente brasileira, CPC 25), uma empresa precisa reconhecer uma provisão (isto é, registrar imediatamente uma perda em seu resultado e um passivo correspondente em seu balanço patrimonial) no momento de ocorrência do fato gerador de um dano que implicará desembolso de recursos provável e mensurável com razoável precisão. Esse registro distingue-se claramente da mera divulgação obrigatória em notas explicativas (NEs) de um dano cujo desembolso de recursos é apenas possível ou de difícil mensuração - denominado passivo contingente. Este estudo foca sua análise no efeito de uma provisão ambiental contabilmente reconhecida porque, ao aumentar o passivo e diminuir o resultado da empresa, gera efeito em vários de seus indicadores financeiros. Não inclui os passivos contingentes, já que não impactam os indicadores, sendo apenas divulgados nas NEs.

O montante de PA foi coletado manualmente das NEs às Demonstrações Financeiras Padronizadas (DFPs) das empresas da amostra. A coleta manual foi necessária porque, embora o plano de contas da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) preveja que as empresas abram as provisões no balanço patrimonial por categoria (via subcontas específicas), frequentemente as empresas divulgam as provisões no balanço apenas no seu total, deixando as categorias em branco. Por outro lado, as companhias abrem esse valor total de provisões por categoria (tributárias, trabalhistas, ambientais etc.) em uma tabela nas NEs. São esses valores de provisão da categoria ambiental que foram coletados manualmente e usados para calcular a variável de interesse deste estudo. No processo de coleta, as empresas que, mesmo em NEs, apresentavam a provisão ambiental sem o detalhamento dos valores envolvidos, de modo a não permitir identificar o valor da obrigação (exemplo: “provisões cíveis e ambientais”), foram consideradas sem provisão ambiental.

Considerando que alguns setores estão mais sujeitos a ter danos ambientais e, portanto, possuir mais provisões ambientais, foi inserida a variável EnvSens, com valor “1” para as empresas pertencentes a setores ambientalmente sensíveis e “0”, caso contrário, seguindo Clarkson et al. (2008)Clarkson, P. M., Li, Y., Richardson, G. D., & Vasvari, F. P. (2008). Revisiting the relation between environmental performance and environmental disclosure: An empirical analysis. Accounting, Organizations and Society, 33(4/5), 303-327. doi: 10.1016/j.aos.2007.05.003
https://doi.org/10.1016/j.aos.2007.05.00...
e Deegan e Gordon (1996)Deegan, C., & Gordon, B. (1996). A study of the environmental disclosure practices of Australian corporations. Accounting and Business Research, 26(3), 187-199. doi: 10.1080/00014788.1996.9729510
https://doi.org/10.1080/00014788.1996.97...
: Oil, Gas & Consumable Fuels; Chemical; Metals & Mining; Paper & Forest Products; Independent Power and Renewables; Electric Utilities; Gas Utilities; e Water Utilities, conforme o nível Industry do Global Industry Classification Standard (GICS) obtido da Bloomberg.

O Quadro 1 elenca as variáveis deste estudo e a literatura relacionada. Além das variáveis de interesse, são tomadas como variáveis de controle aquelas identificadas na literatura (descrita na tabela) como relevantes para explicar o nível de divulgação ambiental: Tamanho (Receita Líquida), Rentabilidade (Margem Líquida) e Endividamento (relação Passivo Oneroso/Ativo). As variáveis expressas em R$ mil foram corrigidas pela inflação em função do extenso período de análise, e a variável Tamanho foi transformada em logaritmo neperiano para reduzir efeitos de viés. As variáveis de controle foram winsorizadas em 1%.

Quadro 1
Variáveis utilizadas nos modelos econométricos

Ao utilizar toda a população de empresas brasileiras não financeiras com EDS disponível na Bloomberg, a amostra não é aleatória, podendo não garantir a representatividade de setores econômicos. Considerando o nível Sectors (mais agregado que o nível Industry) da classificação GICS, que agrupa as empresas em 10 setores, a amostra está assim distribuída: 31 empresas do setor Utilities (das quais 22 são de energia elétrica), 17 de Consumer Discretionary, 15 de Industrials, 13 de Materials, 11 de Consumer Staples e 20 distribuídas nos demais cinco setores. Em função de tal diversidade, optou-se pela criação da variável EnvSens, seguindo Miralles-Quirós et al. (2018)Miralles-Quirós, M. M., Miralles-Quirós, J. L., & Gonçalves, L. M. V. (2018). The value relevance of environmental, social, and governance performance. The Brazilian case Sustainability, 10, 574. doi: 10.3390/su10030574
https://doi.org/10.3390/su10030574...
, em vez de dummies específicas para cada setor, evitando a redução de graus de liberdade dos modelos.

Para testar as hipóteses, a análise foi organizada em duas fases: (1) análise gráfica e descritiva, incluindo testes de diferença entre grupos para identificar se as variáveis de interesse diferenciam níveis de divulgação ambiental na amostra; e (2) análise de regressão com dados em painel, modelo que combina características de séries temporais com corte transversal, permitindo a observação da evolução dos dados ao longo do tempo de maneira comparativa e simultânea. As análises estatísticas foram realizadas usando os softwares SPSS e Stata.

Para identificar o melhor modelo de painel, foram realizados os testes iniciais de heteroscedasticidade (teste de Breusch-Pagan/Cook-Weisberg), multicolinearidade (teste VIF), autocorrelação de primeira ordem (teste Wooldridge para dados em painel) e teste de omissão de variável relevante (teste de Ramsey). Os testes indicaram problemas de autocorrelação e variáveis omitidas. Também foram aplicados os testes de Breusch-Pagan, Chow, Hausman e Hausman Robusto usando as variáveis da Equação 1 (sem a variável EDS defasada), que indicaram o modelo de Efeitos Fixos como o melhor ajuste. Após a definição pelo modelo de Efeitos Fixos, os testes de robustez reforçaram presença de autocorrelação dos resíduos e heteroscedasticidade (teste de autocorrelação de Wooldridge e teste modificado de Wald, respectivamente). O problema foi confirmado com o teste de Fisher, que mostrou estacionariedade da variável dependente em todas as séries analisadas.

Para mitigar possíveis efeitos da endogeneidade dos regressores, foi utilizado o modelo de dados em painel da metodologia System GMM de Arellano-Bover/Blundell-Bond, que incorpora no modelo a variável dependente defasada, além das variáveis explicativas já apresentadas. A adequação do modelo foi testada pelo teste Chi2 de Wald. Os testes de Arellano-Bond AR (1) e AR (2) foram usados para verificar autocorrelação de primeira e segunda ordens entre os termos de erro e validade dos instrumentos, e o teste de Sargan, para checar overidentification das restrições.

A Equação (1) apresenta o modelo a ser testado usando dados em painel.

(1)EDSi,t=β0+β1EDSi,t1+β2ISEi,t+β3 MatP i,t+β4 EnvSens i,t+β5 Tam i,t+β6 End i,t+β7Renti,t+μi,t

Para testar H1, foi usado o modelo da Equação (1) para a amostra completa. A seguir, para testar H2, o modelo foi aplicado separadamente para os grupos de empresas ambientalmente sensíveis versus as demais, omitindo a variável EnvSens. Como os grupos separados apresentaram heteroscedasticidade, foi usado o modelo com estimação robusta.

Para avaliar a robustez dos achados, o comportamento das variáveis de interesse foi testado em quatro outros formatos, utilizando-se as seguintes subamostras: (A) balanceando mais o painel, mantendo apenas as empresas que apresentaram dados em pelo menos seis dos nove anos estudados (exclusão de 17 empresas); (B) mantendo a amostra de A e substituindo a inserção da variável dependente defasada pelo controle de endogeneidade mediante a consideração de componentes autorregressivos (AR[1]) para os resíduos; (C) encurtando t para os quatro anos mais recentes; e (D) abrangendo apenas empresas não pertencentes ao ISE. Os testes foram repetidos para cada subamostra.

RESULTADOS

Análise descritiva

A Tabela 1 apresenta as características descritivas das variáveis quantitativas (para a amostra total e para a amostra subdividida entre empresas ambientalmente sensíveis versus demais) e a Tabela 2, das variáveis dummy.

Tabela 1
Estatísticas descritivas das variáveis quantitativas
Tabela 2
Estatísticas de análise das variáveis qualitativas

A discrepância entre os valores máximo e médio de MatPA na Tabela 1 decorre da presença da Petrobrás, responsável pelos valores máximos em todos os anos analisados, os quais representam em média 66% de toda a somatória de provisões ambientais da amostra. Apesar de a MatPA situar-se entre zero e 12,7% do ativo total, sua média geral no período é inferior a 1%. Destaca-se também a discrepância da margem líquida em duas observações da empresa MMX, corrigida com a winsorização.

Nota-se, pela Tabela 2, que 29% das observações apresentam provisão ambiental, 28% pertencem ao ISE e 43% pertencem a setores ambientalmente sensíveis. Vale acrescentar que, entre as empresas ambientalmente sensíveis, 50% possuem PA, com valor médio de R$ 2,2 bilhões, enquanto entre as não ambientalmente sensíveis apenas 12% possuem PA, e seu valor médio é bem menor, de apenas R$ 130 milhões (valores não inseridos na tabela). Nota-se também uma média de EDS maior entre as empresas que pertencem ao ISE versus as demais, maior entre as empresas que possuem PA versus as demais, e maior entre as empresas potencialmente poluidoras versus as demais, sugerindo a relevância dessas variáveis para explicar o EDS. Finalmente, percebe-se que tanto empresas que pertencem ao ISE quanto aquelas que não pertencem possuem PA, mas a média da MatPA é maior entre as empresas que pertencem ao ISE do que nas demais.

O Gráfico 1 apresenta a evolução histórica das médias de EDS e PA, bem como do número de empresas com EDS, ISE e PA. Nota-se que o número de empresas nesta pesquisa (população com EDS disponível na Bloomberg) é crescente no período, variando de 80 a 103, mas o número de empresas com PA ou com ISE é relativamente estável (de 22 a 31 e de 23 a 30, respectivamente). A média anual do EDS é relativamente estável, variando entre 29,7% e 33,6%, um nível de divulgação ambiental considerado baixo (na escala de 0,1 a 100). Já a média anual da somatória de valores de PA da amostra (não reportada no gráfico) oscila bastante, entre R$ 17,7 bilhões e R$ 78,6 bilhões, com tendência de crescimento ao longo dos anos. A média anual da materialidade das PAs (PA/Ativo) oscila entre 0,49% (ou 4,9‰ no gráfico) e 1,2%, com tendência crescente até 2016 e decrescente após esse ano.

Gráfico 1
Evolução histórica das variáveis principais

O Gráfico 2 apresenta o comportamento da variável EDS ao longo do tempo em quatro painéis formados a partir das variáveis dummies: as observações sem agrupamento; as observações agrupadas entre as que possuem PA (1) e as que não possuem (0); agrupadas entre empresas ambientalmente sensíveis (1) e não (0), e agrupadas entre as que pertencem ao ISE (1) e as que não pertencem (0).

Gráfico 2
Evolução do nível de disclosure ambiental (EDS), com empresas agrupadas por atuarem em setores ambientalmente sensíveis (1) ou não, por presença de PA (1) ou não e por pertencer ao ISE ou não (Stata)

Obs.: A linha preta tracejada no gráfico agrupado por EnvSens mostra uma reta paralela ao eixo X para auxiliar a interpretação da linha preta.


O Gráfico 2 sugere que as variáveis de interesse deste estudo impactam o nível de divulgação ambiental. Enquanto o nível de divulgação médio de todas as empresas estudadas apresenta pouco crescimento no tempo, o nível de divulgação das empresas pertencentes ao ISE e das empresas que reconheceram alguma provisão ambiental é visivelmente diferente do grupo zero, tanto pelo maior nível de divulgação quanto pela inclinação da reta de ajuste, mostrando maior crescimento no tempo. Para o painel que separa as empresas que pertencem a setores ambientalmente sensíveis (EnvSens = 1) das demais, nota-se uma leve tendência de crescimento no EDS ao longo do tempo em ambos os grupos, mas no grupo de ambientalmente sensíveis o nível de divulgação é sempre maior, sugerindo que empresas potencialmente poluidoras tendem a apresentar maior nível de divulgação ambiental que as demais.

A partir desses gráficos, foram realizados testes estatísticos para checar o poder das variáveis de interesse para diferenciar o nível de evidenciação ambiental, reportados na Tabela 2 já apresentada. Como o EDS não apresenta distribuição normal, assim como as demais variáveis quantitativas do estudo, foi utilizado o teste de Mann-Whitney, cuja hipótese nula é que os grupos apresentam a mesma mediana. Para as três variáveis dummies testadas, ISE, DmyPA e EnvSens, a mediana de EDS no grupo zero é estatisticamente diferente da mediana de EDS no grupo 1, sugerindo que as variáveis de interesse podem ter poder explicativo nos modelos econométricos de previsão da variável dependente.

A Tabela 3 apresenta os índices de correlação para todos os pares de variáveis utilizadas na regressão. A metodologia de cálculo da correlação depende do tipo de variável: a correlação de Pearson para os pares de variáveis escalares, o Coeficiente Phi para os pares de variáveis nominais e a Correlação Ponto-bisserial para os pares com uma variável escalar e outra nominal. As maiores correlações com o EDS são ISE e Tam, sugerindo que essas variáveis serão significativas no modelo econométrico. Destaque-se a ausência de alta correlação entre as variáveis explicativas.

Tabela 3
Índices de correlação entre as variáveis estudadas

Análise de regressão

Para testar H1, de que pertencer ao ISE explica o nível de disclosure ambiental tanto em empresas potencialmente poluidoras quanto nas demais, e H2, de que a MatPA é mais relevante para explicar o nível de disclosure ambiental em empresas potencialmente poluidoras do que pertencer ao ISE, foi utilizado o modelo de Painel Dinâmico - GMM sistêmico, em três regressões: (1) considerando todas as observações, (2) tomando apenas o grupo das não poluidoras e (3) tomando o grupo das poluidoras. A Tabela 4 apresenta os resultados.

Tabela 4
Resultados das análises de dados em painel

Os três modelos mostraram significância ao nível de 5%, tanto para o Chi2 de Wald quanto para os testes de pressupostos (o modelo para as empresas potencialmente poluidoras apresentou baixo p-value no teste para presença de autocorrelação, mas significante).

Na Coluna 1, que abrange todas as observações, o modelo de Arellano-Bover/Blundell-Bond mostrou significância ao nível de 1% para a variável EDS defasada em um ano e para a variável ISE, enquanto Tam e End foram significativas ao nível de 5%. As variáveis MatPA, EnvSens e Rent não são significativas. Nota-se que cerca de 70% do comportamento de evidenciação ambiental do ano t tende a repetir-se no ano seguinte (EDS lag1), confirmando os achados de McBrayer (2018)McBrayer, G. A. (2018). Does persistence explain ESG disclosure decisions?. Corporate Social Responsibility and Environmental Management, 25(6), 1074-1086. doi: 10.1002/csr.1521
https://doi.org/10.1002/csr.1521...
, de persistência nas decisões de ESG disclosure. Esses resultados confirmam H1, indicando a prevalência da teoria proativa da imagem como explicação do nível de disclosure ambiental quando consideradas as empresas como um todo, já que a variável ISE foi significativa, enquanto as variáveis MatPA e EnvSens, não.

Pela Coluna 2, que considera apenas as empresas não potencialmente poluidoras, o resultado é semelhante ao modelo com todas as empresas, mas os valores dos coeficientes de ISE e EDS defasada são maiores, mostrando persistência ainda maior no comportamento de divulgação ambiental. Note-se o resultado diferente da variável endividamento: apresentou coeficiente negativo e com maior significância, indicando que empresas não potencialmente poluidoras mais endividadas tendem a divulgar menos.

Já na Coluna 3, focada nas empresas potencialmente poluidoras, o resultado foi notadamente diferente. Foram significativas apenas as variáveis EDS defasada e MatPA. Além disso, o coeficiente da variável defasada foi bem mais baixo que nos demais modelos: apenas cerca de 40% do valor de EDS em t são explicados pelo EDS em t-1 (versus 84% na Coluna 2), sugerindo que o nível de disclosure entre empresas potencialmente poluidoras não é tão persistente quanto entre as não poluidoras. Esses resultados confirmam parcialmente H2: por um lado, indicam a validade da teoria reativa da legitimação para explicar o nível de disclosure ambiental entre empresas potencialmente poluidoras, já que a variável MatPA foi significativa (ao nível de 10%); mas, por outro, refutam a validade da teoria proativa da imagem entre essas companhias, já que ISE não teve significância.

No entanto, o resultado desse modelo da Coluna 3 é menos robusto que os demais, já que, ao nível de significância de 11%, o modelo fere um de seus pressupostos. Assim, para avaliar a robustez desses resultados, as variáveis de interesse foram testadas usando mais quatro modelos diferentes, conforme definido na seção Métodos. Os resultados desses testes estão apresentados na Tabela 5 (focada nas variáveis de interesse).

Tabela 5
Comportamento das variáveis de interesse em outros modelos de estimação

O primeiro teste abrange um conjunto mais balanceado de observações, após a exclusão de empresas sem EDS em pelo menos seis dos nove anos estudados. A subamostra de 90 empresas apresentou resultados semelhantes ao modelo original (Tabela 4): para as não potencialmente poluidoras, ISE é significativa e MatPA, não, enquanto, para as poluidoras, ISE não é significativa e MatPA, sim (agora ao nível de 5%). Em seguida, foram excluídas 18 empresas da subamostra, deixando o painel totalmente balanceado: 71 empresas por nove períodos (não apresentado na tabela). O comportamento das variáveis de interesse se manteve, melhorando o resultado de Abond AR(2) para 0,1631, reforçando os resultados anteriores.

O segundo teste, ainda com a subamostra de 90 empresas, foi realizado sem a inclusão da variável EDS defasada, mas com a inclusão de termos de erro AR(1), e usou o modelo de efeitos aleatórios, conforme indicação do teste de Hausman. O modelo apresentou significância, e o resultado pouco se alterou. A variável MatPA se manteve significativa apenas no grupo das potencialmente poluidoras (agora a 1%), mas ISE passou a ser significativa nesse grupo. Note-se, entretanto, que ISE é menos significativa que MatPA entre as poluidoras, o que também confirma H2.

O terceiro teste usou apenas os quatro anos mais recentes em um modelo de painel balanceado com efeitos aleatórios e correção de Driscoll-Kraay (indicados pelos testes). O comportamento das variáveis de interesse permaneceu semelhante ao da Tabela 4 e do teste 1. Esse teste foi realizado para melhor contrapor os achados de Coelho et al. (2013)Coelho, F. Q., Ott, E., Pires, C. B., & Alves, T. W. (2013). Uma análise dos fatores diferenciadores na divulgação de informações voluntárias sobre o meio ambiente. Contabilidade Vista & Revista, 24(1), 112-130. Recuperado de https://revistas.face.ufmg.br/index.php/contabilidadevistaerevista/article/view/1290
https://revistas.face.ufmg.br/index.php/...
, Rosa et al. (2015)Rosa, F. S., Guesser, T., Hein, N., Pfitscher, E. D., & Lunkes, R. J. (2015). Environmental impact management of Brazilian companies: Analyzing factors that influence disclosure of waste, emissions, effluents, and other impacts. Journal of Cleaner Production, 96, 148-160. doi: 10.1016/j.jclepro.2013.10.035
https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2013.1...
e Rover et al. (2012)Rover, S., Tomazzia, E. C., Murcia, F. D.-R., & Borba, J. A. (2012). Explicações para a divulgação voluntária ambiental no Brasil utilizando análise de regressão em painel. Revista de Administração, 47(2), 217-230. doi: 10.5700/rausp1035
https://doi.org/10.5700/rausp1035...
, que, estudando apenas empresas potencialmente poluidoras, contrariamente, encontraram significância do ISE (esses estudos abrangeram períodos mais curtos [até três anos] e anos mais antigos [no máximo até 2011]).

Por fim, para isolar o efeito de simultaneamente pertencer ao ISE (estratégia proativa de criar valor mediante diferenciação em práticas sustentáveis - teoria da imagem) e reconhecer no seu balanço ter gerado danos ambientais mediante PA (reagir a eventos ambientais adversos - teoria da legitimação), foi realizado o quarto teste, abrangendo apenas as empresas que não pertencem ao ISE. Ou seja, o objetivo é analisar o que motiva o disclosure ambiental em empresas que não adotam uma estratégia proativa de criar valor mediante práticas sustentáveis (não pertencem ao ISE). O modelo de painel com efeitos aleatórios indicado pelos testes estatísticos, em especial o teste de Hausman, mostrou que MatPA é significativa ao nível de 1% para explicar o nível de divulgação nessas empresas.

Vale destacar que os modelos apresentados no estudo foram rodados com e sem controle de setor e ano, mas não apresentaram diferença significativa.

Assim, tanto o modelo base quanto os testes de robustez realizados são coerentes em indicar que a adoção de uma estratégia proativa de criar valor mediante diferenciação em práticas sustentáveis (teoria da imagem, como proxy pertencer ao ISE) explica o nível de disclosure ambiental entre empresas de setores não poluidores. Já entre empresas potencialmente poluidoras, prevalece a teoria da legitimação para explicar o nível de disclosure ambiental, já que ISE não é significativa, mas MatPA sim (ISE aparece no teste 2, mas MatPA é mais significativa). Ou seja, em empresas potencialmente poluidoras, a motivação para aumentar o disclosure ambiental parece ser uma tentativa de autolegitimação em reação a danos provocados ao meio ambiente.

CONCLUSÃO

Este estudo investiga qual de duas teorias antagônicas melhor explica a motivação das empresas para a divulgação ambiental: a teoria da imagem, pela qual a empresa incrementa seu disclosure ambiental como estratégia proativa para criar valor via diferenciação em práticas socioambientais (proxy: adesão ao ISE); ou a teoria da legitimação, pela qual a empresa incrementa seu disclosure ambiental na busca por autolegitimação diante de seus stakeholders em reação a danos provocados ao ambiente (proxy: MatPA em seu balanço). Também investiga como essas teorias explicam o comportamento de empresas potencialmente poluidoras versus não poluidoras.

Realizando uma análise de dados em painel abrangendo as empresas brasileiras não financeiras com EDS disponível na Bloomberg, de 2010 a 2018, foi avaliado se há associação entre o nível de disclosure e as variáveis MatPA (proxy para a materialidade da provisão ambiental reconhecida na contabilidade) e ISE (dummy que sinaliza as empresas pertencentes à carteira do Índice de Sustentabilidade Empresarial da bolsa de valores brasileira), separando as empresas entre potencialmente poluidoras e não poluidoras.

Os resultados indicaram que, entre empresas não pertencentes a setores ambientalmente sensíveis, pertencer ao ISE é significativo para explicar o nível de disclosure ambiental, mas provisão ambiental não. No entanto, o oposto ocorre entre as empresas ambientalmente sensíveis: ISE não têm significância estatística, mas a materialidade das provisões ambientais sim. Em ambos os grupos, o nível de disclosure de determinado ano está significativamente associado ao do ano anterior.

Esses resultados contribuem para a literatura de CSR ou ESG reporting ao confirmar a coexistência de teorias antagônicas para explicar a divulgação ambiental, mas em contextos distintos: empresas não potencialmente poluidoras tendem a investir na divulgação como estratégia para criar valor e se diferenciar (proxy: pertencer ao ISE), corroborando a teoria da imagem; já as potencialmente poluidoras tendem a usar o disclosure ambiental como reação a eventos ambientais adversos (proxy: MatPA), numa estratégia defensiva de mitigação de danos em busca de autolegitimação diante dos seus stakeholders, confirmando a teoria da legitimação. Assim, ambas as teorias coexistem, mas cada teoria consegue explicar a motivação de um grupo distinto de empresas: a teoria da imagem explica a motivação das empresas não pertencentes a setores poluidores, enquanto a teoria da legitimação explica a motivação para divulgar das empresas potencialmente poluidoras.

Esses resultados também contribuem para a prática de CSR ou ESG reporting, ao alertar investidores e consumidores de que nem sempre elevada divulgação ambiental sinaliza alta performance ambiental, podendo indicar, ao contrário, uma tentativa de autolegitimação diante de danos provocados ao meio ambiente. Também mostram a necessidade, para empresas não poluidoras interessadas em diferenciação, de suas boas práticas ambientais estarem efetivamente incorporadas à sua identidade para assegurar credibilidade e evitar serem confundidas com as que buscam apenas recuperar legitimação diante de danos provocados ao ambiente.

Sugere-se precaução na interpretação desses resultados, a serem tomados como associação e não causalidade, apesar dos testes de robustez realizados. Também se recomenda cautela na extensão desses resultados para além da amostra estudada, focada no mercado brasileiro e em empresas maiores e mais relevantes para o mercado, já que apenas esse tipo de empresa possui índice ESG disponível na base Bloomberg.

REFERÊNCIAS

  • Aguinis, H., & Glavas, A. (2012). What we know and don’t know about corporate social responsibility: A review and research agenda. Journal of Management, 38(4), 932-968. doi: 10.1177/0149206311436079
    » https://doi.org/10.1177/0149206311436079
  • Akerlof, G. A. (1970). The Market for “Lemons”: Quality uncertainty and the market mechanism. The Quarterly Journal of Economics, 84(3), 488. doi: 10.2307/1879431
    » https://doi.org/10.2307/1879431
  • Albitar, K., Hussainey, K. Kolade, N., & Gerged, A. M. (2020). ESG disclosure and firm performance before and after IR: The moderating role of governance mechanisms. International Journal of Accounting & Information Management, 28(30), 429-444. doi: 10.1108/IJAIM-09-2019-0108
    » https://doi.org/10.1108/IJAIM-09-2019-0108
  • Aragón-Correa, J. A., Marcus, A., & Hurtado-Torres, N. (2016). The natural environmental strategies of international firms: Old controversies and new evidence on performance and disclosure. Academy of Management Perspectives, 30(1), 24-39. doi: 10.5465/amp.2014.0043
    » https://doi.org/10.5465/amp.2014.0043
  • Barth, M. E., McNichols, M. F., & Wilson, G. P. (1997). Factors influencing firm’s disclosures about environmental liabilities. Review of Accounting Studies, 2(1), 35-64. doi: 10.1023/A:1018321610509
    » https://doi.org/10.1023/A:1018321610509
  • Bebbington, G., Larrinaga, C., & Moneva, J. M. (2008). Corporate social reporting and reputation risk management. Accounting, Auditing & Accountability Journal, 21(3), 337-361. doi: 10.1108/09513570810863932
    » https://doi.org/10.1108/09513570810863932
  • Bellamy, M. A., Dhanorkar, S., & Subramanian, R. (2020). Administrative environmental innovations, supply network structure, and environmental disclosure. Journal of Operations Management, 66(7/8), 895-932. doi: 10.1002/joom.1114
    » https://doi.org/10.1002/joom.1114
  • Chen, J. C., Cho, C. H., & Patten, D. M. (2014). Initiating disclosure of environmental liability information: An empirical analysis of firm choice. Journal of Business Ethics, 125(4), 681-692. doi: 10.1007/s10551-013-1939-0
    » https://doi.org/10.1007/s10551-013-1939-0
  • Clarkson, P. M., Li, Y., Richardson, G. D., & Vasvari, F. P. (2008). Revisiting the relation between environmental performance and environmental disclosure: An empirical analysis. Accounting, Organizations and Society, 33(4/5), 303-327. doi: 10.1016/j.aos.2007.05.003
    » https://doi.org/10.1016/j.aos.2007.05.003
  • Coelho, F. Q., Ott, E., Pires, C. B., & Alves, T. W. (2013). Uma análise dos fatores diferenciadores na divulgação de informações voluntárias sobre o meio ambiente. Contabilidade Vista & Revista, 24(1), 112-130. Recuperado de https://revistas.face.ufmg.br/index.php/contabilidadevistaerevista/article/view/1290
    » https://revistas.face.ufmg.br/index.php/contabilidadevistaerevista/article/view/1290
  • Cormier, D, & Magnan, M. (2015). The economic relevance of environmental disclosure and its impact on corporate legitimacy: An empirical investigation. Business Strategy and the Environment, 24(6), 431-450. doi: 10.1002/bse.1829
    » https://doi.org/10.1002/bse.1829
  • Cormier, D., Magnan, M., & Velthoven, B. V. (2005). Environmental disclosure quality inlarge German companies: Economicincentives, public pressures orinstitutional conditions? European Accounting Review, 14(1), 3-39. doi: 10.1080/0963818042000339617
    » https://doi.org/10.1080/0963818042000339617
  • Deegan, C., & Gordon, B. (1996). A study of the environmental disclosure practices of Australian corporations. Accounting and Business Research, 26(3), 187-199. doi: 10.1080/00014788.1996.9729510
    » https://doi.org/10.1080/00014788.1996.9729510
  • Deegan, C., Rankin, M., & Voght, P. (2000). Firms' disclosure reactions to major social incidents: Australian evidence. Accounting Forum, 24(1), 101-130. doi: 10.1111/1467-6303.00031
    » https://doi.org/10.1111/1467-6303.00031
  • Dye, R. A. (2001). An evaluation of “essays on disclosure” and the disclosure literature in accounting. Journal of Accounting and Economics, 31(1/3), 181-185. doi: 10.1016/S0165-4101(01)00024-6
    » https://doi.org/10.1016/S0165-4101(01)00024-6
  • Garcia, A. S., Mendes-Da-Silva, W., & Orsato, R. (2017). Sensitive industries produce better ESG performance: evidence from emerging markets. Journal of Cleaner Production, 150, 135-147. doi: 10.1016/j.jclepro.2017.02.180
    » https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2017.02.180
  • Gray, R., Kouhy, R., & Lavers, S. (1995). Corporate, social and environmental reporting: A review of literature and a longitudinal study of UK disclosure. Accounting, Auditing & Accountability Journal, 8(2), 47-77. doi: 10.1108/09513579510146996
    » https://doi.org/10.1108/09513579510146996
  • Healy, P. M., & Palepu, K. G. (2001). Information asymmetry, corporate disclosure, and the capital markets: A review of the empirical disclosure literature. Journal of Accounting and Economics, 31(1/3), 405-440. doi: 10.1016/S0165-4101(01)00018-0
    » https://doi.org/10.1016/S0165-4101(01)00018-0
  • Hooghiemstra, R. (2000). Corporate communication and impression management: New perspectives why companies engage in corporate social reporting. Journal of Business Ethics, 27(1/2), 55-68. doi: 10.1007/978-94-011-4311-0_7
    » https://doi.org/10.1007/978-94-011-4311-0_7
  • International Accounting Standard Board. (2001). International Accounting Standard 37 - Provisions, Contingent Liabilities and Contingent Assets London, UK: IFRS Foundation
  • Kim, I., Ryou, J. W., & Yang, R. (2020). The color of shareholders' money: Institutional shareholders'political values and corporate environmental disclosure. Journal of Corporate Finance, 64 doi: 10.1016/j.jcorpfin.2020.101704
    » https://doi.org/10.1016/j.jcorpfin.2020.101704
  • Leal, P. H., Costa, B. M. do N., Oliveira, M. C., & Rebouças, S. M. D. P. (2018). Divulgação de provisões e passivos contingentes ambientais sob a ótica da teoria institucional. Enfoque: Reflexão Contábil, 37(3), 37-54. doi: 10.4025/enfoque.v37i3.39477
    » https://doi.org/10.4025/enfoque.v37i3.39477
  • Lindblom, C. K. (1994). The implications of organisational legitimacy for corporate social performance and disclosure. Critical Perspectives on Accounting Conference, New York, USA
  • Lourenço, I. C., & Branco, M. C. (2013). Determinants of corporate sustainability performance in emerging markets: the Brazilian case. Journal of Cleaner Production, 57, 134-141. doi: 10.1016/j.jclepro.2013.06.013
    » https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2013.06.013
  • McBrayer, G. A. (2018). Does persistence explain ESG disclosure decisions?. Corporate Social Responsibility and Environmental Management, 25(6), 1074-1086. doi: 10.1002/csr.1521
    » https://doi.org/10.1002/csr.1521
  • Minutolo, M. C, Kristjanpoller, W. D., & Stakeley. (2019). Exploring environmental, social, and governance disclosure effects on the S&P 500 financial performance. Business Strategy and the Environment, 28(6), 1083-1095. doi: 10.1002/bse.2303
    » https://doi.org/10.1002/bse.2303
  • Miralles-Quirós, M. M., Miralles-Quirós, J. L., & Gonçalves, L. M. V. (2018). The value relevance of environmental, social, and governance performance. The Brazilian case Sustainability, 10, 574. doi: 10.3390/su10030574
    » https://doi.org/10.3390/su10030574
  • Qiu, Y., Shaukat, A., & Tharyan, R. (2016). Environmental and social disclosures: Link with corporate financial performance. The British Accounting Review, 48(1), 102-116. doi: 10.1016/j.bar.2014.10.007
    » https://doi.org/10.1016/j.bar.2014.10.007
  • Rosa, F. S., Guesser, T., Hein, N., Pfitscher, E. D., & Lunkes, R. J. (2015). Environmental impact management of Brazilian companies: Analyzing factors that influence disclosure of waste, emissions, effluents, and other impacts. Journal of Cleaner Production, 96, 148-160. doi: 10.1016/j.jclepro.2013.10.035
    » https://doi.org/10.1016/j.jclepro.2013.10.035
  • Rover, S., Tomazzia, E. C., Murcia, F. D.-R., & Borba, J. A. (2012). Explicações para a divulgação voluntária ambiental no Brasil utilizando análise de regressão em painel. Revista de Administração, 47(2), 217-230. doi: 10.5700/rausp1035
    » https://doi.org/10.5700/rausp1035
  • Verrecchia, R. E. (2001). Essays on disclosure. Journal of Accounting and Economics, 32, 97-180. doi: 10.1016/S0165-4101(01)00025-8
    » https://doi.org/10.1016/S0165-4101(01)00025-8
  • Walden, W. D., & Schwartz, B. N. (1998). Environmental disclosures and public policy pressure. Journal of Accounting and Public Policy, 16, 125-154. doi: 10.1016/S0278-4254(96)00015-4
    » https://doi.org/10.1016/S0278-4254(96)00015-4

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Jul 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    29 Mar 2021
  • Aceito
    04 Nov 2021
Fundação Getulio Vargas, Escola de Administração de Empresas de S.Paulo Av 9 de Julho, 2029, 01313-902 S. Paulo - SP Brasil, Tel.: (55 11) 3799-7999, Fax: (55 11) 3799-7871 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: rae@fgv.br