Acessibilidade / Reportar erro

Terrorismos e pontes do musicar local: Linn da Quebrada e seu artivismo de reXistência e desidentificação

TERRORISMS AND BRIDGES OF LOCAL MUSIC: LINN DA QUEBRADA AND HER ARTIVISM OF RESISTANCE AND DISIDENTIFICATION

RESUMO

Este artigo se insere em um conjunto de elucubrações sobre arte e política que venho realizando ao longo da última década. Diversamente de outras publicações, meu foco aqui é a relação entre música e política ou, antes, o musicar terrorista de uma artista específica, Linn da Quebrada. Interessa-me como esse musicar afeta a construção de uma localidade e é construído mutuamente por ela, criando coalizões que servem de semente para comunidades imaginadas dissidentes que são também comunidades de prática. Posteriormente, utilizo tanto desidentificação, tal como conceituada por José Estebán Muñoz, quanto a noção de reXistência (nossa, política, cotidiana) para refletir sobre algumas motivações inerentes a esse musicar, atentando de que maneira a aproximação entre música e política faz qualquer sentido formalista de estilo musical hesitar. Por fim, em minhas alucinações finais, aciono questões relacionadas à colonialidade do pensamento e dos corpos para pensar que musicar e localidade confluem na criação de esferas públicas éticas e estéticas na qual a lógica dominante do CIStema colonial e necropolítico não é régua comum.

PALAVRAS-CHAVE:
Música; política; reXistência; desidentificação; artivismo

ABSTRACT

This article is part of a set of elaborations on art and politics that I have been carrying out over the last decade. Unlike other publications, my focus here is the relationship between music and politics or, rather, the terrorist musicking of a specific artist, Linn da Quebrada. I am interested in how this musicking affects the construction of a locality and is mutually constructed by it, creating coalitions that serve as seed for imagined dissident communities that are also communities of practice. Subsequently, I use both disidentification, as conceptualized by José Estebán Muñoz, and the notion of reXistence (ours, political, daily) to reflect on some motivations inherent in this musicking, paying attention to how the approximation between music and politics makes any formalist sense of musical style falter. Finally, in my final hallucinations, I bring questions related to the coloniality of thought and bodies to think that musicking and locality converge in the creation of ethical and aesthetic public spheres in which the dominant logic of the necropolitical colonial CIStem is not a common rule.

KEYWORDS:
Music; politics; reXistence; disidentification; artivism

À Kaciano Gadelha, amada Kaci, como uma mínima homenagem possível diante do fato eternamente enlutável de que ele se foi cedo demais.1 1 Muitas das questões colocadas e pensadas aqui tem, de fato, como pano de fundo, suas pungentes provocações.

Sai da frente / Que a gente tá passando DJ aumenta o som / Pois na pista eu comando Hoje eu vou me divertir / Com as amigas travestis Recalcadas estão de cara / Isso não vai me atingir Trinks, Danna Lisboa Levantarnos para honrarnos, ser la carne innegable, ser la cuerpa que no entienden, ser en vida resistencia, ser y hacer herencia. Y ser el grito, un grito en cuerpo, la marea de todo eso que quisieran dar por muerto. El grito, Eme, cantautor peruano.

Este artigo se insere em um conjunto de elucubrações que, desde o início dos anos 2010, tenho desenvolvido entre arte, política e antropologia e que, mais recentemente, tem apontado para dois eixos. O primeiro - que não tratarei aqui - se refere às minhas experimentações práticas e reflexões teórico-metodológicas concernentes à aproximação entre arte e antropologia do ponto de vista de seus fazeres. Por um lado, na década de 1990, ocorreu o que o crítico de arte Hal Foster (1995FOSTER, Hal. 1995. “The Artist as Ethnographer?”. In: Marcus, George; Myers, Fred (Eds.). The Traffic in Culture. Refiguring Art and Anthropology. Berkeley, Los Angeles, London, University of California Press.) denominou virada etnográfica ou social na arte. Foster emprega o termo na introdução da clássica coletânea The Traffic in Culture, organizada por George Marcus e Fred Myers, e o utilizada em respeito à apropriação de metodologias e práticas antropológicas por artistas. Por outro lado, somente a partir dos anos 2000, ocorre uma intensificação do processo inverso, isto é, antropólogos passam, cada vez mais intensamente, a se apropriarem de metodologias e práticas artísticas para o fazer antropológico.2 2 Digo intensificar pois, de meu ponto de vista, foi somente nessa década que essas apropriações deixaram de se constituir como exceções que, de fato, sempre existiram no campo antropológico (Schneider, 2011) e passaram a contar, adicionalmente, com um conjunto mais sistemático não apenas de experimentações práticas de aproximação entre arte e antropologia, mas também de reflexão sobre essa relação (Schneider e Wright, 2006; 2010; 2013).

O segundo eixo, por sua vez, divide-se em caminhos. O primeiro costura os modos pelos quais a arte tem sido apropriada por grupos conservadores na tentativa de construir o que pode ser caracterizado como cruzada sexogenérica3 3 A expressão sexogenérica é mais comum no mundo hispanohablante. Mas não a uso por maneirismo. Todas sabemos como há línguas que emanam, como nenhuma outra, alguns sentidos específicos. A condensação dos dois vocábulos em uma única unidade de sentido não poderia ser mais apropriada. Aplicada às questões de sexo e gênero, o termo é uma transposição perfeita do que, alhures (Grunvald, 2009a; 2009b), chamei de sócio-natural, pois “homem e natureza não são dois termos distintos, um em face do outro, ainda que tomados numa relação de causação, de compreensão ou de expressão (causa/efeito, sujeito/objeto etc.), mas uma só e mesma realidade essencial: a do produtor e do produto. A produção como um processo não cabe nas categorias ideais e forma um ciclo cujo princípio imanente é o desejo” (Deleuze e Guattari, 2004[1972], p.10). Marco Aurélio Maximo Prado e Sonia Correa (2018) utilizam também a expressão “cruzadas antigênero” para se referir a esse conjunto de investidas. em torno da qual se mobilizam determinados regimes de moralidade para construção de pânicos sociais. Os casos privilegiados analiticamente, nesse âmbito, são tanto o Queermuseu (sobre o qual refleti em parceria com Jorge Leite Junior4 4 Essa reflexão conjunta foi fruto, inicialmente, de uma mesa organizada pelo Centro de Pesquisa e Formação do SESC que, devido ao recente escândalo envolvendo o QueerMuseu, convidou o Prof. Jorge Leite Junior e eu para uma conversa sobre Obscenidade, arte e teoria queer, no dia 19 de setembro de 2017. Posteriormente, produzimos uma reflexão a quatro mãos por ocasião de nossa apresentação conjunta no Seminário Temático 38 - Sexualidade e gênero: política, agenciamentos e direitos em disputa, coordenado por Regina Facchini (Unicamp) e Roberto Marques (UECE) no 43º Encontro Anual da ANPOCS (2019). E está para ser publicada como artigo em coletânea a ser organizada pelo Comitê Gênero e Sexualidade da Associação Brasileira de Antropologia nas pessoas de Heloísa Buarque de Almeida (USP) e Carlos Eduardo Henning (UFG). ), quanto o “escândalo” que envolveu a performance La bête de Wagner Schwartz no MAM e a peça O Evangelho segundo Jesus Rainha do Céu.5 5 Reflexões sobre esses dois casos foram produzidas por ocasião de minha participação no Simpósio Especial 08 - Desafios e Resistências no campo de Gênero e Sexualidade no Brasil Contemporâneo da 32ª Reunião Brasileira de Antropologia também organizado pelo referido Comitê na nota 1 deste artigo. Essa e a nota anterior, para além de qualquer etiqueta acadêmica, são também políticas, pois visam marcar a vivacidade das mobilizações em torno da discussão e reflexão pública, informada e embasada sobre temas importantes para a sociedade brasileira contemporânea.

O segundo caminho - que é o que seguirei aqui - enfoca as complexas e variadas relações entre arte e política do ponto de vista de práticas de reXistência, tanto associadas a coletivos artivistas como Revolta da Lâmpada (Grunvald, 2019GRUNVALD, V. 2019. “Lâmpadas, corpos e cidades: reflexões acadêmicoativistas sobre arte, dissidência e a ocupação do espaço público”. Horizontes Antropológicos, n. 55: 263-290. DOI 10.1590/S0104-71832019000300010
https://doi.org/10.1590/S0104-7183201900...
) quanto a certos sentidos corporificados nas ações de artistas da cena musical brasileira contemporânea que operam a música como arma apara desafiar normas sexogenéricas e, em especial, o trabalho de Linn da Quebrada.6 6 Tanto as reflexões sobre a coletiva Revolta da Lâmpada (Grunvald, 2019) quanto estas que vos apresento foram tributárias de pesquisa de pós-doutorado desenvolvida no PPGAS-USP a partir de auxílio concedido pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP nº 2017/20849-1) entre 01/03/2018 e 30/06/2019. Esta pesquisa estava ligada, no âmbito da FAPESP, ao Projeto Temático O Musicar Local - novas trilhas para a etnomusicologia (FAPESP nº 2016/05318-7), coordenado pelas professoras Suzel Reilly (IA-Unicamp), Flavia Camargo Toni (IEB-USP) e Rose Satiko Gitirana Hikiji (DA-USP).

PRIMEIRA CENA

No dia 03 de fevereiro de 2017, aconteceu, no Mundo Pensante, o I Festival de Arte Transartivista, organizado pelo coletivo Transidentidades7 7 Transidentidades foi um coletivo composto de pessoas trans e cis que lutavam pelos direitos de pessoas trans. Surgiu, inicialmente, como um “organizativo” cujo objetivo era realizar uma série de ações em torno do Dia da Visibilidade Trans (29 de janeiro). Fiz parte deste coletivo como colaboradora, além de ser membra de outro coletivo artivista de inspiração queer (ou cuir como, às vezes, falamos pelas bandas de cá) e interseccional chamado Revolta da Lâmpada (Grunvald, 2019). No momento de escrita deste artigo, o Transidentidades não se encontra mais ativo. , cujo objetivo era realizar uma série de ações em torno do Dia da Visibilidade Trans.

Cheguei no evento por volta das 21h e me surpreendi com a casa cheia. Não esperávamos tanta gente. O público era bastante heterogêneo, mas, em geral, saltava aos olhos a quantidade de pessoas trans e outras que, seja pela expressão, seja pela performance de gênero, não se adequavam a padrões hegemônicos de comportamento e expressões cishtnormativos8 8 Cishtnormativo é diminutivo de cisheteronormativo e termo muito usado no movimento social de pessoas LGBTQIA+ para marcar cisgeneridade e heterossexualidade como normas sócio-políticas e não apenas como identidade de gênero ou prática sexual. A cishtnormatividade implica na existência de um tipo de colonialidade do pensamento e dos corpos que, na esteira das reflexões de feministas materialistas lésbicas como Adrienne Rich e Monique Wittig, “nos nega toda possibilidade de falar [e sentir?] senão em seus próprios termos” ( Wittig, 2006 [1980]: 49). Quando utilizo esse termo, tenho em mente as provocações de María Lugones (2015 [2010]:948): “Compreende-se a colonialidade do gênero como exercícios de poder concretos, intrincadamente relacionados, alguns corpo a corpo, alguns legalistas, alguns dentro de uma sala onde as mulheres indígenas fêmeas-bestiais-não-civilizadas são obrigadas a tecer dia e noite, outros no confessionário. As diferenças na concretude e na complexidade do poder sempre circulando não são compreendidas como níveis de generalidade; a subjetividade corporificada e o institucional são igualmente concretos.” : homens cis de vestido e salto, homens trans de peito e barba, mulheres trans negras, brancas, altas, baixas, loiras e morenas.

O Festival foi organizado de maneira a dar protagonismo artístico para pessoas trans e não-binárias. As apresentações iam desde leitura de poesias e exibição de curtas, até performances de drags, leituras dramáticas, shows de bandas, cantoras/es e DJs.9 9 Para a programação completa, cf. https://www.facebook.com/events/1724355704547337/ Artistas como Danna Lisboa10 10 Cantora e compositora de hip hop. Para suas produções, cf., por exemplo, os videoclipes de Cidade Neon (https://www.youtube.com/watch?v=jfoKc9kyEFg) e Trinks (https://www.youtube.com/watch?v=Mfv2kcp3_Rs), no qual a artista dá o tom que aparece como epígrafe desse texto. e o rapper Tiely Queen11 11 Cantor e compositor de rap. Para produções que englobam não apenas videoclipes, mas performances em eventos de ativismos relativo à gênero, sexualidade e raça, cf. seu canal no Youtube: https://www.youtube.com/channel/UCM2x0ow-zepJ4c44OemhZcA , que faziam parte da programação, já eram reconhecidas/os profissionalmente por seus trabalhos, ainda que sua popularidade se desse de maneira mais circunscrita ao que Leandro Colling (2019COLLING, Leandro. 2019. “A emergência e algumas características da cena artivista das dissidências sexuais e de gênero no Brasil da atualidade”. In: (Ed.). Artivismos das dissidências sexuais e de gênero. Salvador, EDUFBA, pp. 11-40.) chamou de “cena artivista das dissidências sexuais e de gênero”.12 12 Rose de Melo Rocha (2019), ao tratar do trabalho da cantora Gloria Groove em artigo escrito com Thiago Santos, usa a noção de drag-artivismo. Já em artigo escrito com Aline Rezende (2019) sobre a obra de Linn da Quebrada, alarga um pouco a noção e fala em “artivismo musical de gênero”. Neste artigo, estou mais próximo da definição mais ampla proposta por Leandro Colling senão porque o artivismo musical - que poderia, em meu registro analítico, ser pensado como um musicar engajado e não apenas político (todos o são!) - se conecta com outras práticas éticas e estéticas. Estas vão desde espaços produzidos pelo movimento social quanto o âmbito mercadológico... e esse musicar engajado, essa aproximação intrínseca e abissal entre musicar e política, tanto constitui outras comunidades de prática quanto é constituído por elas. Para artigos programáticos sobre a noção de artivismo, ver Di Giovanni (2015) e Raposo (2015).

Outras eram artistas amadoras de ocasião ou início de carreira. Algumas profissionalmente trabalhavam como atrizes e/ou performers e fizeram também apresentações musicais a partir de canções de outras artistas já bastante conhecidas dessa cena, como a própria Linn da Quebrada.

Durante essas performances musicais - em geral, mais participativas que apresentacionais (Turino, 2008TURINO, Thomas. 2008. Music as Social Life: the politics of participation. Chicago, The University of Chicago Press., 2009TURINO, Thomas. 2009. “Four Fields of Music Making and Sustainable Living”. The World of Music, vol. 51, n. 1: 95-117.) -, o público cantava e dançava, demonstrando, às vezes de forma bastante exacerbada, o conhecimento de suas letras e indicando, em uníssono, através desse musicar13 13 A noção de musicar é tradução do neologismo musicking proposto por Christopher Small (1998). Para a noção de “musicar local” ver, adicionalmente, Brucher, Reily (2018), Villela, Toni, Muniagurria, Grunvald (2019), Giesbrecht, Hikiji, Grunvald (2021) e Reilly (2021). , a construção de uma localidade que, na esteira de Appadurai (1996APPADURAI, Arjun. 1996. “The Production of Locality”. In: Modernity at Large: Cultural Dimensions of Globalization. Minneapolis: University of Minnesota Press.), assenta-se como “estrutura de sentimentos”.

As opressões e preconceitos tantas vezes vividos por corpos dissidentes de gênero e sexualidade e pessoas racializadas, mesmo cantadas e tematizadas na música, eram ali torcidas em uma malha de segurança costurada por sonoridades que lhes eram comuns e familiares. E aí o pertencimento se sobrepôs à segregação, o bem-estar e alegria ao sofrimento e ao medo.

E, não menos importante, claro, a corpa que, em estado de raba co-bailante, se liberou da retidão que, segundo prescrições de uma sociedade cishtnormativa e racista, deve se ajustar a padrões de comportamento para circular no espaço citadino sem sofrer sanções (Grunvald, 2019GRUNVALD, V. 2019. “Lâmpadas, corpos e cidades: reflexões acadêmicoativistas sobre arte, dissidência e a ocupação do espaço público”. Horizontes Antropológicos, n. 55: 263-290. DOI 10.1590/S0104-71832019000300010
https://doi.org/10.1590/S0104-7183201900...
). Essa movimentação de corpas mobilizada pela dança que deve ser entendida, como sugere André Lepecki (2011/2012)LEPECKI, André. 2011/2012. “Coreopolítica e coreopolícia”. Ilha, vol.13, n.1: .41-60. DOI 10.5007/2175-8034.2011v13n1-2p41
https://doi.org/10.5007/2175-8034.2011v1...
, tanto como teoria social da ação, quanto como teoria social em ação: uma coreopolítica instaurada contra uma coreopolícia.

Numa resenha do livro Queer Episodes in Music and Modern Identity, publicada em 2005 no Journal of the American Musicological Society, Martha Mockus (2005MOCKUS, Martha. 2005. “Resenha de Queer Episodes in Music and Modern Identity ”. Journal of the American Musicological Society, vol. 58, n. 3: 730-736.:.730) argumenta que a intersecção entre música e queerness14 14 Queer é um vocábulo que, em inglês, significa estranho, esquisito. Ao longo dos últimos séculos, foi sendo progressivamente associado a pessoas cujos comportamentos e expressões sexuais e de gênero não estão em conformidade com os padrões socialmente estabelecidos como legítimos, normais e desejáveis. Queerness, portanto, remeteria à não-normatividade mas, antes, à contranormatividade - expressão que vem de minha leitura de Preciado (2014[2004]), mas que poderia ser pensada como contra-hegemonia -, esta que, caracteristicamente, adere à experiência viva dessas pessoas como efeito de uma norma que é, ao mesmo tempo, cisht e racista. Devido à difícil tradução da palavra, resolvi deixá-la em inglês no texto. estrutura questões epistemológicas que são recíprocas: “O que a música nos diz sobre queerness e o que queerness nos diz sobre música? Qual a relação entre musicologia e sexologia? Para quem essas questões são não apenas relevantes, mas centrais e por quê? A sobrevivência de quem está em jogo?”. Retenho essas perguntas como horizonte de minhas reflexões e ensaio alguns caminhos que vão ao encontro de suas preocupações.

De fato, já na introdução do livro, Sophie Fuller e Lloyd Whitesell (2002FULLER, Sophie; WHITESELL, Lloyd. 2002. Queer Episodes in Music and Modern Identity. Urbana: University of Illinois Press.: 6-7) atentam para a existência de “comunidades e indivíduos queer” cuja compreensão apresenta “um aspecto necessário e envolvente da musicologia queer”. No contexto dessa pesquisa, a que poderia se referir essa comunidade? Por quais corpos e éticas ela opera? Que musicares a constituem e são constituídos por ela?

Para responder essas questões, falarei sobre Linn da Quebrada, importante referência do que passou a se chamar de MPBicha, segmento da música popular brasileira que trabalha explicitamente com questões relacionadas a gênero e sexualidade.15 15 A categoria MPBicha é utilizada pela própria Linn da Quebrada como termo relacionado (intercambiável?) com Geração Tombamento e MPBeau. Cf. https://saopaulosao.com.br/%E2%80%98%E2%80%99/% E2%80%98%E2%80%99/nossas-pessoas/2711-batemos-um-papo-reto-com-a-mc-linn-da-quebrada.html. Acessado em 05 de abril de 2021.

Desde o início de sua carreira, a artista se apresentava, alternadamente, como bicha (ou bixa), travesti, bixa preta ou trans e afirmave que: “Eu não sou nem homem, nem mulher. Mas ocupo um lugar e um espaço que é o feminino” (cf. Finco, 2017FINCO, Nina. “Mc Linn e a geração que usa a MPB para desconstruir os preconceitos sexuais”. Revista Época Online. São Paulo, 13 jan 2017. Disponível em Disponível em http://epoca.globo.com/cultura/noticia/2017/01/mc-linn-e-geracao-que-usa-mpb-para-desconstruir-os-preconceitos-sexuais.html Acesso em 14/05/2022
http://epoca.globo.com/cultura/noticia/2...
). Linn da Quebrada cresceu no interior paulista, vivendo entre Votuporanga e São José do Rio Preto, até retornar à zona leste de São Paulo. É de uma família religiosa de testemunhas de Jeová e sua mãe, alagoana, sempre trabalhou como empregada doméstica.

A vivência na periferia delineou, segundo ela, os caminhos musicais de sua trajetória pois “lá a música comunica - música como o funk, o samba, de preto e preta, de linguagem direta, que movimentam o corpo” (cf. Pereira, 2016PEREIRA, Neli. “De testemunha de Jeová a voz do funk LGBT, MC Linn da Quebrada se diz ‘terrorista de gênero’”. G1 Notícias. São Paulo, G1, 12 set 2016. Disponível em Disponível em https://g1.globo.com/musica/noticia/2016/09/de-testemunha-de-jeova-voz-do-funk-lgbt-mc-linn-da-quebrada-se-diz-terrorista-de-genero.html último acesso em 14/05/2022
https://g1.globo.com/musica/noticia/2016...
). Autoidentifica-se como periférica e, inicialmente, seu nome vinha acompanhado da alcunha MC, depois abandonada, ainda que o funk siga sendo sua forma de expressão musical.

Na coletânea Music Cultures in the United States, organizada por Ellen Koskoff, Reyes et al. (2005REYES, Adelaida et al. 2005. “Social and musical identities”. In: KOSKOFF, Ellen (Ed.). Music cultures in the United States. An introduction. Nova York e Londres: Routledge.: 75-76) argumentam que “como estilo musical, o funk representa a resiliência e criatividade de afroamericanos/as sob condições de mudança social, transformando-se em uma expressão da mudança social, liberação cultural e experimentação musical”.

Como corolário, é importante ponderar que a própria questão da determinação de um estilo é mais complexa do que supõe qualquer discussão meramente formalista. E um dos argumentos aqui sustentados é que a própria noção de estilo musical está, no contexto da aproximação entre música e política, deformada por sentidos que não são propriamente musicais e/ou formais. Artistas que se entendem como participando de uma mesma luta social e política contra opressões de gênero, sexualidade, raça e classe, por vezes, acabam por se engajar em produções e práticas musicais que falam mais desse lugar político do que da adesão formal à um estilo musical específico e identificável.16 16 Importante também frisar que as histórias do funk no Estados Unidos e Brasil são bastante diversas. Para ficar apenas em um paralelo: toda diferença do mundo, como diria Guimarães Rosa, entre experiências como o P-funk preconizado por George Clinton na segunda metade da década de 1970, banhado como era nas orientações éticas do movimento Black Power, e os bailes de funk cariocas que passaram a se proliferar nessa mesa época no Rio de Janeiro. O que não significa dizer, é claro, que não haja política e engajamento nesse último caso. Nesse sentido, é possível dizermos que há estilos dentro de um estilo musical pensando como gênero transnacional e formal. Para discussões gerais sobre estilo musical cf., adicionalmente, Neubauer (1992 [1986]). Escusado dizer que tratamentos da noção de estilo mais próximos do de Hebdige (1979) ou, para citar um caso brasileiro, de Braga (2018), ainda que se articulem com as questões aqui discutidas, discutem o termo como algo mais relativo ao que é usualmente referido como estilo de vida, aproximando-se de uma concepção de estilo que Facchini (2011) marca como “operador da diferença”.

Linn também se identifica, em diversas entrevistas, como terrorista de gênero, pois, segundo argumenta, “algumas vezes é preciso agir aterrorizando a norma e seus efeitos. Usando meu corpo como arma para colocar em xeque um sistema que torna invisíveis corpos como o meu” (cf. Serafim, 2017SERAFIM, Isabela. “‘Precisamos levar a discussão de gênero para a rua’, diz Linn da Quebrada”. O Estado de S. Paulo (Online). São Paulo, 06 abr 2017. Disponível em http://emais.estadao.com.br/noticias/moda-e-beleza,precisamos-levar-a-discussao-de-genero-para-a-rua-diz-linn-da-quebrada,70001729044
http://emais.estadao.com.br/noticias/mod...
). Essa invisibilidade e exclusão é algo que não acontece apenas socialmente, mas também musicalmente. E o machismo que muitas/os associam ao funk é foco explícito de problematização da artista:

O funk faz parte do meu contexto. Ele movimenta, é a poesia da quebrada. Fala de realidades marginalizadas que não são levadas em conta [...] Mais explicitamente e de forma corajosa, o funk produz sexualidade e desejo, e isso não é necessariamente “de boa”, livre do machismo, muito pelo contrário. E, como estava querendo falar sobre os meus afetos, me colocando em questão de forma relevante, uso o funk para construir novas pontes. (ênfase adicional) (Linn da Quebrada em entrevista a Rafael Balsemão, 2017BALSEMÃO, Rafael. “Conheça Linn da Quebrada, multiartista travesti que se apresenta em noite feminista no Opinião”. GZH - Cultura e Lazer. Porto Alegre, 25 abr 2017. Disponível em Disponível em https://gauchazh.clicrbs.com.br/cultura-e-lazer/noticia/2017/04/conheca-linn-da-quebrada-multiartista-travesti-que-se-apresenta-em-noite-feminista-no-opiniao-9780263.html Acesso em 14/05/2022
https://gauchazh.clicrbs.com.br/cultura-...
)

O estilo musical não é, portanto, abandonado às mãos de pessoas que fazem dele um instrumento de machismo e opressão. Muito pelo contrário. Retomando as reflexões de Thomas Turino (2008TURINO, Thomas. 2008. Music as Social Life: the politics of participation. Chicago, The University of Chicago Press.) quando se indaga se produções musicais com sonoridades similares, mas geradas por práticas distintas, não deveriam também ser consideradas estilos musicais diferentes, podemos pensar que, talvez, o estilo musical de Linn não se aproxime, de forma tão óbvia, do funk comercialmente (e, portanto, socialmente) estabelecido.

Ao recorrer aos trabalhos de Laing (1985LAING, Dave. 1985. One Chord Wonders: Power and Meaning in Punk Rock. Milton Keynes: Open University Press.) e Gillet (1991), Bennet (2004BENNET, Andy. 2004. “New Tales from Caterbury: the making of a virtual scene”. In: BENNET, Andy; PETERSON, Andy. Music Scenes. Local, translocal, and virtual . Nashville, Vanderbilt University Press ., p.216), em importante livro sobre cenas musicais organizado por ele e Richard Peterson, retoma que o sentido de desenvolvimento histórico é de importância central para as discussões de fãs de qualquer estilo musical. Colocando-se fora do cânone machista e sexista do funk tradicional, portanto, essa própria filiação a um estilo determinado é também confundida. Simultaneamente, ocorre uma sugestão de aproximação com outras artistas que também têm utilizado a música como arma política para desafiar normas de gênero, sexualidade e padrões racistas de pensamento e ação social.17 17 A pluralidade de percepções capazes de consolidar socialmente um estilo musical é também discutida em Turino (1993).

Subvertendo expectativas sexuais de uma parte significativa do funk comercial, com suas conotações de objetificação dos corpos da mulher, o trabalho de Linn pode ser lido como prática de desidentificação (Muñoz, 1999MUÑOZ, José Esteban. 1999. Desidentifications. Queers of color and the performance of politics. Minneapolis, London: University of Minnesota Press.) que se vale desse estilo, propício como é para exposição de afetos, para adiantar agenda ético-estética própria.

Após retomar o clássico The Anthropology of Music, de Alan Merriam (1964), John Blacking argumenta que

etnomusicólogos ainda tem que produzir análises culturais sistemáticas da música que expliquem como um sistema musical é parte de outros sistemas de relações dentro da cultura. Não basta identificar um estilo musical característico em seus próprios termos e examiná-lo em relação à sua sociedade [...]. Devemos reconhecer que nenhum estilo musical tem “seus próprios termos”: seus termos são os de sua sociedade e cultura, bem como os dos corpos dos seres humanos que a ouvem, criam e performam. (Blacking, 1973BLACKING, John. 1973. How musical is man? Seattle e London, University of Washington Press.: 25)

Os termos aos quais Blacking se refere, no contexto dessa reflexão, são indissociáveis da percepção de que a música - como também insiste Teresa de Lauretis (1987)DE LAURETIS, Teresa. 1987. Technologies of Gender: Essays on Theory, Film, and Ficction. Bloomington, Indianapolis. Indiana University Press. em relação a audiovisualidades pensadas como tecnologias de gênero - não é apenas representação, mas (perform)ação, pois, como esclarece Linn, “as pessoas não matam só com facas ou com balas. O discurso também mata” (Pereira, 2016PEREIRA, Neli. “De testemunha de Jeová a voz do funk LGBT, MC Linn da Quebrada se diz ‘terrorista de gênero’”. G1 Notícias. São Paulo, G1, 12 set 2016. Disponível em Disponível em https://g1.globo.com/musica/noticia/2016/09/de-testemunha-de-jeova-voz-do-funk-lgbt-mc-linn-da-quebrada-se-diz-terrorista-de-genero.html último acesso em 14/05/2022
https://g1.globo.com/musica/noticia/2016...
). E se mata, pode também fazer viver e construir redes de afeto e reXistência ou, como diz, “construir pontes.

A noção de reXistência que utilizo para qualificar o musicar de Linn é um neologismo nascido e criado nas ruas e lutas emancipatórias que amalgama sentidos de resistência e existência. A resistência é política e também física por contraposição a uma noção tomada como puramente simbólica. Trata-se da insistência de corpas no mundo a despeito de uma necropolítica que quer eliminá-las e que se coaduna com a violência institucional e de Estado que acomete, diariamente, corpas sexo-gênero dissidentes, racializadas e precarizadas.18 18 Para discussões sobre violência de Estado e corpas tidas como descartáveis no contexto brasileiro, cf. Vianna, Farias (2011) e Grunvald (no prelo). A existência é, por sua vez, um escracho de vida, uma celebração de outras formas de co-habitar o mundo e construir relações outras que não aquelas marcadas pela cishtnormatividade, racismo, classismo e outras opressões que permitem com que o próprio direito à existência seja diferencialmente distribuído e franqueado a depender desses marcadores sociais da diferença e desigualdade social.19 19 A distribuição diferencial a que me referi também não é apenas relacionada ao campo dos direitos, mas igualmente do próprio uso legítimo da violência. Daí porque, pensadoras, ativistas e artistas têm reivindicado uma “redistribuição desobediente de gênero e anticolonial da violência” (Mombaça, s/d).

Do ponto de vista teórico-analítico, para além do território das lutas de corpas como as referidas nesse artigo, a noção de reXistência foi também usada, recentemente, por Eduardo Viveiros de Castro (2017VIVEIROS DE CASTRO, Eduardo. 2017. Os involuntários da pátria: elogio do subdesenvolvimento. Chão da Feira, caderno 65.; 2020VIVEIROS DE CASTRO, Eduardo. 2020. “Sobre la noción de etnocidio, con especial atención al caso brasileño”. Estudios de História Moderna y Contemporánea de México, vol. 60: 111-144.) para pensar a questão indígena e por Enrique Leff (2016LEFF. Enrique. 2016. A aposta pela vida: imaginação sociológica e imaginários sociais nos territórios ambientais do Sul. Petrópolis, Vozes. [2014]) para pensar a questão ambiental. Adolfo Achinte, ao falar a propósito de artistas indígenas e afrocolombianos, pensa seus trabalhos como “pedagogías da re-existência” e toma essa noção a partir de sentidos que interessam à minha argumentação:

O ato criativo é uma pedagogia da existência, na medida em que deve desatar os nós que a narrativa ocidental estabeleceu em cada um de nós, e talvez reproduzamos inconscientemente por não saber que quando estamos na escola, em casa ou em qualquer outro espaço sociocultural que defendemos a certeza, estamos apenas construindo medos que nos prendem na maravilhosa jaula de suas próprias imagens fantasmagóricas. Enfrentar os medos é trabalhar o lado oculto da presunção de estabilidade e equilíbrio, é entrar nas águas turbulentas da abnegação imposta pelo discurso da lógica, que nos privou da experiência de vida. (Achinte, 2013ACHINTE, Adolfo. 2013. “Pedagogías de la re-existencia. Artistas indígenas y afrocolombianos”. In: WALSH, Catherine. (Ed.). Pedagogías decoloniales: Prácticas insurgentes de resistir, (re)existir, y (re)vivir, Tomo I. Quito, Ediciones Abya Yala, pp.443-468.: 450)

Linn costuma(va) dizer que não é cantora, está cantora. E espera que sua música “consiga ser ouvida e com isso, outras pessoas possam ter a coragem de ser, de existir, e a gente possa estabelecer esses vínculos para sobreviver” (Pereira, 2016PEREIRA, Neli. “De testemunha de Jeová a voz do funk LGBT, MC Linn da Quebrada se diz ‘terrorista de gênero’”. G1 Notícias. São Paulo, G1, 12 set 2016. Disponível em Disponível em https://g1.globo.com/musica/noticia/2016/09/de-testemunha-de-jeova-voz-do-funk-lgbt-mc-linn-da-quebrada-se-diz-terrorista-de-genero.html último acesso em 14/05/2022
https://g1.globo.com/musica/noticia/2016...
). Não sei se ainda se reivindica como estando cantora. Mas o fato é que diversas artistas dessa cena musical artivista passaram, ao longo dos últimos anos, a demandar que suas práticas fossem reconhecidas como profissionais. Tal como os grupos de rock da periferia de Liverpool estudados por Sara Cohen (1991COHEN, Sara. 1991. Rock culture in Liverpool. Popular Music in the making. Oxford: Claredon Press.: 198), nutrem “ideais de profissionalismo em sua produção musical e queriam se divertir com sua música e obter respeito por sua habilidade musical”. Ou, para usar a expressão do The Jactars and Crikey it’s the Cromptons! lembrada pela autora, querem “estar no jogo” - algo que, de fato e de direito, deve estar acessível a elas.

Como dito, as músicas e videoclipes de Linn da Quebrada são artefatos que almejam agência, ação social e, nesse sentido, funcionam como parte de sua pessoa distribuída tal como proposto por Alfred Gell em seu livro Arte e agência. Essa agência LGBTQIA+ e terrorista na cena musical brasileira tem, inclusive, sido um importante disseminador de categorias como trans, travesti, nao-binárie, queer, mas também de um conjunto de experiências e éticas contra-hegemônicas associadas a esses corpos.

E é justamente em ambientes como o Festival de Arte Transartivista que, recorrendo às teorizações Appadurai (1996APPADURAI, Arjun. 1996. “The Production of Locality”. In: Modernity at Large: Cultural Dimensions of Globalization. Minneapolis: University of Minnesota Press.), se produz uma “localidade [...] concebida como propriedade da vida social, [...] estrutura de sentimentos produzida e reproduzida por um grupo situado para garantir um espaço onde possa viver, produzir e reproduzir-se num ambiente de segurança moral” (Projeto TemáticoPROJETO TEMÁTICO. 2016. O Musicar Local - novas trilhas para a etnomusicologia. Fapesp: 2016/05318-7. Coordenação de Suzel Reily. Unicamp/ Usp.: 20). “A ‘localidade’ enquanto estrutura de sentimentos”, segue a reflexão proposta no projeto aludido, “é compreendida como valor que se realiza nas interações sociais e suas formas de mediação (como a música), criando - e sendo criada por - relações entre pessoas e os espaços em que atuam e transitam, seja fisicamente, seja de forma imaginária” (Projeto TemáticoPROJETO TEMÁTICO. 2016. O Musicar Local - novas trilhas para a etnomusicologia. Fapesp: 2016/05318-7. Coordenação de Suzel Reily. Unicamp/ Usp.: 5). Não seria essa localidade enquanto estrutura de sentimentos a própria raison d’être explicitada pela artista preta e periférica?20 20 Importante notar que a localidade, no sentido aqui compreendido, não necessariamente se sobrepõe à noção de cena musical (Benett, Peterson, 2004). Para uma discussão mais específica sobre outros possíveis sentidos atribuídos à localidade e a noção de cena cf., mais especificamente, Hodgkinson (2004).

O estar cantora por oposição ao ser cantora também indica aspectos importantes da prática musical de Linn da Quebrada. Sugere que ela não imagina sua arte como um domínio autocontido e um fim em si mesmo nos moldes do projeto artístico modernista tão veemente defendido por críticos da arte como Clement Greenberg. Linn a situa como um empreendimento político, pois, como afirma, “[t]udo que a gente faz é politica. A roupa que eu escolho para sair na rua é política, a escolha de sair maquiada ou não também. Cada palavra que eu digo numa música ou numa conversa informal é política, tem efeitos e diz respeito a uma atitude, a um posicionamento” (Pereira, 2016PEREIRA, Neli. “De testemunha de Jeová a voz do funk LGBT, MC Linn da Quebrada se diz ‘terrorista de gênero’”. G1 Notícias. São Paulo, G1, 12 set 2016. Disponível em Disponível em https://g1.globo.com/musica/noticia/2016/09/de-testemunha-de-jeova-voz-do-funk-lgbt-mc-linn-da-quebrada-se-diz-terrorista-de-genero.html último acesso em 14/05/2022
https://g1.globo.com/musica/noticia/2016...
).

A negação inicial da categoria de cantora como identidade definidora se coaduna, nesse sentido, com os intuitos políticos de desconstrução dos padrões sociais de gênero e sexualidade normativos, seu terrorismo de gênero, mas também com a ativa negação da normatividade do próprio mundo da arte, visto por ela como demasiado elitista: outro fluxo de desidentificação.

Não é à toa que, ao ser indagada sobre sua participação na SP-Arte, importante evento do mercado artístico, Linn retrucou: “Pra mim, estar na SP-Arte é mais uma invasão e ocupação por parte dos nossos saberes, pretos e transviados, nesses espaços de Arte com ‘A’ maiúsculo, na maioria das vezes excessivamente limpos, brancos e elitizados. Para dar pinta e escurecer um pouco mais as coisas.” (Serafim, 2017SERAFIM, Isabela. “‘Precisamos levar a discussão de gênero para a rua’, diz Linn da Quebrada”. O Estado de S. Paulo (Online). São Paulo, 06 abr 2017. Disponível em http://emais.estadao.com.br/noticias/moda-e-beleza,precisamos-levar-a-discussao-de-genero-para-a-rua-diz-linn-da-quebrada,70001729044
http://emais.estadao.com.br/noticias/mod...
).

SEGUNDA CENA

No dia 04 de abril de 2019, ocorreu, em São Paulo, um show na Casa Natura Musical, na qual Linn da Quebrada apresentou o seu primeiro álbum, Pajubá, acompanhada por BadSista (DJ e produtora musical), Jup do Bairro (cantora), Pininga (DJ) e Dominique Vieira (percussão). Seu primeiro single, Enviadescer, foi o evento que colocou Linn na mídia e passou a difundir seu nome e carreira já marcados pela ênfase em desafiar concepções normativas de gênero e sexualidade apresentando, em suas imagens, protagonismo de corpas trans/travestis, afeminadas e dissidentes - tons e cores que também marcaram produções seguintes, Talento e Bixa Preta.

O álbum apresentado no show foi inteiramente bancado por financiamento coletivo possibilitado por uma plataforma de crowdfunding na internet, indicando como a agência possibilitada pelas mídias e redes sociais não pode ser negligenciada apenas como ágora digital onde ocorre uma disputa pelas representações, apresentando-se também como importante vetor de rearticulação das maneiras como a produção musical tem se articulado nos últimos anos em suas relações com o mercado.21 21 Uma crescente bibliografia, no campo da administração e dos negócios, tem discutido a importância do crowdfunding na reconfiguração de relações de mercado (Howe, 2009; Lawtom, Maron, 2010; Schwienbacher, Larralde, 2010), com discussões específicas sobre o mercado musical (Scherer, Winter, 2015; Galuszka, Bystrov, 2014; Galuszka, Brzozowska, 2017; Gamble, Brennan, Mcadam, 2017) que apontam para certa democratização promovida por essas tecnologias. Sobre diversos aspectos desse novo modelo de produção cultural a partir de uma plataforma específica, o Spotify, cf. Eriksson et al (2019). Para uma análise crítica da produção musical e sonora, cf. Bennet e Bates (2018).

Com uma performatividade escrachada, mais bem caracterizada como o que Leandro Colling, Murilo Arruda e Murilo Nonato (2019COLLING, Leandro; ARRUDA, Murilo; NONATO, Murilo. 2019. “Perfechatividades de gênero: a contribuição das fechativas e afeminadas à teoria da performatividade de gênero”. Cadernos Pagu, n. 57:.1-34. DOI 10.1590/18094449201900570002
https://doi.org/10.1590/1809444920190057...
) chamam de perfechatividade de gênero, Linn da Quebrada e Jup do Bairro conduziam o espetáculo de maneira a causar frisson mesmo aos corpos mais apáticos. No meio do show, Linn pediu para que todas se agachassem, incluindo, disse ela, seguranças e outros funcionário da casa. Aos poucos, os altivos e excitados corpos foram se curvando e baixando diante de sua requisição. Ao que pronuncia, na medida em que baixavam: “senta... senta... senta...”. E, por fim, iniciando a canção Bixa Preta, completou: “senta e observa a sua destruição”.

Pensada a partir de sua prática musical, seguindo a sugestão de Thomas Turino, as performances de Linn operam no limiar da diferença entre música apresentacional e participativa, já que, a todo momento, os corpos são convocados a fazer parte de seu musicar que assim se transforma em processo de implicação corporal coletiva.

O corpo - essa “arma, bomba e pólvora”, essa “ferramenta política para colocar em xeque e aterrorizar o que está posto como norma”(Balsemão, 2017BALSEMÃO, Rafael. “Conheça Linn da Quebrada, multiartista travesti que se apresenta em noite feminista no Opinião”. GZH - Cultura e Lazer. Porto Alegre, 25 abr 2017. Disponível em Disponível em https://gauchazh.clicrbs.com.br/cultura-e-lazer/noticia/2017/04/conheca-linn-da-quebrada-multiartista-travesti-que-se-apresenta-em-noite-feminista-no-opiniao-9780263.html Acesso em 14/05/2022
https://gauchazh.clicrbs.com.br/cultura-...
) - aparece, em suas falas, como linha que costura sujeitos que produzem o que está sendo conhecido como MPBicha entre si e as/os conecta com outras pessoas que compartem experiências não-normativas de gênero e sexualidade.

O corpo, a costura. Mas são as mídias digitais, especialmente as redes sociais como Facebook, que oferecem o meio de conexão. Como esclarece Linn da Quebrada:

Estamoszcoisas. A diferença é que hoje nós conseguimos ser vistas: consigo ver que tem trans lá no Nordeste fazendo coisas maravilhosas de que eu não iria saber antes. Eu mesma, bicha da favela, consigo ser vista e conhecida pelo meu trabalho. (Entrevista concedida por Linn da Quebrada à Nila Pereira, 2016 PEREIRA, Neli. “De testemunha de Jeová a voz do funk LGBT, MC Linn da Quebrada se diz ‘terrorista de gênero’”. G1 Notícias. São Paulo, G1, 12 set 2016. Disponível em Disponível em https://g1.globo.com/musica/noticia/2016/09/de-testemunha-de-jeova-voz-do-funk-lgbt-mc-linn-da-quebrada-se-diz-terrorista-de-genero.html último acesso em 14/05/2022
https://g1.globo.com/musica/noticia/2016...
).

Assim, não apenas a música e as práticas musicais devem ser entendidas como “tecnologias de interatividade” (Appadurai, 1996APPADURAI, Arjun. 1996. “The Production of Locality”. In: Modernity at Large: Cultural Dimensions of Globalization. Minneapolis: University of Minnesota Press.) que produzem localidades como estrutura de sentimentos. A própria internet é tomada, explicitamente, como forma de mediação na construção dessas redes e sentidos de pertencimento.

Autoras como Paula Guerra (2021GUERRA, Paula. 2021. “So close yet so far: DIY cultures in Portugal and Brazil”. Cultural Trends, vol. 30, n. 2: 122-138 DOI: 10.1080/09548963.2021.1877085
https://doi.org/10.1080/09548963.2021.18...
) tem entendido cenas como essa - a pesquisadora explicitamente discute Linn da Quebrada em seu texto - a partir da noção de “DIY cultures” (culturas faça-você-mesmo).22 22 Sobre cenas musicais DIY, cf. a coletânea DIY Cultures and Underground Musical Scenes, organizada por Andy Bennet e Paula Guerra (2008). Ligada a essa chave analítica, emergem também importantes discussões que borram o foco de uma oposição rígida entre profissionalismo e amadorismo na cena musical.

Ótimas discussões sobre amadorismo e profissionalização no campo musical já foram produzidas, a exemplo do trabalho de Ruth Finnegan (1989FINNEGAN, Ruth. The Hidden Musicians: Music-making in an English town. Cambridge: Cambridge University Press, 1989.), e o artigo de Trevor Herbert (2018HERBERT, Trevor. 2018. “Foreword: amateur bands, their localities, and their challenges - the lessons of history”. In: REILY, Suzel; BRUCHER, Katherine (Eds.). The Routledge Companion to the Study of Local Musicking . Nova York e Londres, Routledge, pp.xv-xxiv.) sobre músicos amadores e suas comunidades a partir da noção de musicar local acionada nesta análise. O que me interessa pensar, contudo, é como essa profissionalização é fruto de uma comunidade de prática (Wenger, 1998WENGER, Etienne. 1998. Communities of Practice: learning, meaning and identity. Cambridge: Cambridge University Press .) que se situa na intersecção de diferentes práxis (artístico-musical, ativista, mercadológica, etc.) e, portanto, são diversas as aprendizagens que esse musicar constitui e por meio das quais é também constituído.

CENAS (TEXTUAIS) FINAIS: A POESIA TERRORISTA COMO PRÁTICA DE DESIDENTIFICAÇÃO RADICAL

Se Teresa de Lauretis (1987)DE LAURETIS, Teresa. 1987. Technologies of Gender: Essays on Theory, Film, and Ficction. Bloomington, Indianapolis. Indiana University Press. utilizou o conceito de tecnologias de gênero para falar sobre esse aparato de construção do que Donna Haraway (2004HARAWAY, Donna. 2004 [1991]. “‘Gênero’ para um dicionário marxista: a política sexual de uma palavra”. Cadernos Pagu , n..22: 201-246. [1991]: 233) chamou de “experiência semiótica corporificada”, então, Linn, talvez, esteja operando uma espécie contratecnologia de gênero ou, se quiserem acompanhar Preciado (2002PRECIADO, Beatriz. 2002. Manifiesto contra-sexual. Madrid: Opera Prima.), uma tecnologia contrassexual que visa deformar arte, política e cishtnormatividade a partir de um ponto de vista que coaduna essas questões em um único enunciado ético-estético.

No cruzamento das discussões entre arte e queer, foi o cubano-americano José Estebán Muñoz quem discutiu, profundamente, o que chamou de “poder de performances desidentificatórias para criar mundos” (1999:ix). Nas “estórias de transformação e reformulação política” que trata em seu livro, “[d]esidentificação destina-se a descrever estratégias de sobrevivência que os sujeitos minoritários praticam para negociar uma esfera pública majoritária e fóbica que constinuamente omite ou pune a existência de sujeitos que não se conformam ao fantasma da cidadania normativa.” (1999: 4)

Nas letras que escreve, Linn constrói poderosas imagens sexogenéricas que funcionam como catalisadoras da destruição/construção de imaginações político-corporais. Isso é fundamental, porque não basta considerar artes e imagens como agentivas, na esteira de Gell (1998GELL, Alfred. 1998. Art and agency. An anthropological theory. Oxford: Clarendon Press.). Esse é o início e não o fim da conversa. É preciso postular a que se propõe essa agência e, se possível, pensar/potencializar seus efeitos.

No mundo antecipado pela poética de Linn da Quebrada, trata-se - essa é minha sugestão - de um sopro de mundo em direção à autodeterminação corpo-política de sujeitas dissidentes em relação às cishtnormas. Seu horizonte propriamente conceitual é aquele no qual nossas corpas não se dizem mais da generização e sexualização colonial, mas possuem consistência própria em termos estético-ontológicos, ético-políticos e epistemológicos. Como tão bem nos ensina Silvia Rivera Cusicanqui (2010)RIVERA CUSICANQUI, Silvia. 2010. Ch’ixinakax utxiwa: una reflexión sobre prácticas y discursos descolonizadores. Buenos Aires: Tinta Limón, 2010., a autodeterminação significa a retomada de uma historicidade própria e apenas nesse sentido é que produz a descolonização de imaginários e formas de representação.

Por Linn, com Linn, em Linn, algumas figuras emergem como artifícios capazes de condensar um conjunto de condutas sexuais aqui entendidas como “realizações sociais ordinárias resultantes de negociações diante das definições sociais e que se cristalizam em escolhas e práticas na vida cotidiana”, conforme elaboração de Júlio Simões (2009SIMÕES, Júlio. 2009. “Identidades Sexuais”. In: SOUZA LIMA, Antônio Carlos (Ed). Antropologia e Direito: Temas Antropológicos para Debates Jurídicos. Brasília/Blumenau: ABA/Nova Letra.apudGregori, 2010GREGORI, Maria Filomena. 2010. Prazeres perigosos: erotismo, gênero e limites da sexualidade. Campinas, Tese de livre docência, Universidade Estadual de Campinas.: 128) a partir da teoria dos roteiros sexuais de Simon e Gagnon (1973SIMON, William; GAGNON, John. 1973. The Sexual Conduct: The Social Sources of Human Sexuality. Chicago: Aldine.).

Vários estudos têm enfatizado o privilégio da masculinidade no mercado brasileiro de afetos e prazeres homoeróticos (Braz, 2010BRAZ, Camilo Albuquerque de. 2010. À Meia-Luz: uma etnografia imprópria em clubes de sexo masculinos. Campinas, Tese de doutorado, Universidade Estadual de Campinas.) e o personagem que encarna essa inclinação sócio-sexual para Linn é o macho, em geral acompanhado da alcunha discreto. Discreto, nesse contexto, quer dizer másculo e viril, sem marcação de feminilidade aparente. A esse personagem é contraposta a bixa afeminada que, a partir dos roteiros sexuais hegemônicos e marcados pelo binarismo de gênero, seria seu oposto complementar.

São as práticas sexuais entre essas figuras ou, antes, sua contestação que aparecem como centro de gravidade privilegiado das elucubrações ético-estéticas de Linn e, nesse sentido, a sexualidade é o nódulo não apenas de crítica de um padrão cishtnormativo e excludente de erotismo, mas, como espero ter mostrado, de constituição de novos lugares do desejo e do sujeito ou, para falar com Wittgenstein, novas formas de vida.

Indagado pela questão da significação ou do sentido atribuído às palavras, este filósofo responde com seu mais conhecido aforismo: se quiser realmente saber o sentido de uma palavra “não pergunte pelo significado, pergunte pelo seu uso”. Ideia que fica mais clara na medida em que compreendemos a que se refere certa diferença entre sentido e significado. Sigo aqui José Saramago no romance Todos os nomes:

Ao contrário do que em geral se crê, sentido e significado nunca foram a mesma coisa, o significado fica-se logo por aí, é directo, literal, explícito, fechado em si mesmo, unívoco, por assim dizer; ao passo que o sentido não é capaz de permanecer quieto, fervilha de sentidos segundos, terceiros e quartos, de direções irradiantes que vão se dividindo e subdividindo em ramos e ramilhos, até se perderem de vista, o sentido de cada palavra parece-se com uma estrela quando se põe a projectar marés vivas pelo espaço a fora, ventos cósmicos, perturbações magnéticas, aflições. (1997: 135)

Wittgenstein afirma que “denominar algo é semelhante a colocar uma etiqueta numa coisa” (1979WITTGENSTEIN, Ludwig. 1979 [1953]. Investigações Filosóficas. Os Pensadores. São Paulo: Abril Cultural.: 15). Isto equivaleria ao significado de Saramago. Poderíamos relacionar esta ideia também ao processo de tipificação social, classicamente pensado por Berger e Luckmann (1996BERGER, Peter; LUCKMANN, Thomas. 1996 [1966]. A construção social da realidade. Petrópolis: Vozes.[1966]) como mecanismo a partir do qual os indivíduos são percebidos por meio de tipos sociais pré-estabelecidos.

No entanto, tal como se encontra expresso em nas Investigações Filosóficas de Wittgenstein, denominar, ou seja, pregar uma etiqueta numa coisa, é apenas a preparação para o uso de uma palavra e, por si só, não constitui o fenômeno da linguagem, já que não é suficiente para atribuir significação a elas. “A significação de uma palavra é seu uso na linguagem” (Wittgenstein, 1979WITTGENSTEIN, Ludwig. 1979 [1953]. Investigações Filosóficas. Os Pensadores. São Paulo: Abril Cultural. [1953]: 43). Assim como, ainda que admitamos o pressuposto da tipificação social de Berger e Luckmann, deve-se sempre ter em mente que ele é, no máximo, uma primeira impressão. A construção de eus, outros, assim como a significação das palavras, é tributária de um sentido encarnado e situacional que depende não apenas de contextos no qual estes atores estão inseridos, mas, igualmente, das corpas de enunciam esses sentidos. Nunca se trata apenas de tipos pré-estabelecidos que se/nos constituem pela linguagem. Como tanto insistem Deleuze e Guattari em seus Mil Platôs, o mundo escapa por todos os lados.

Enquanto condensações que conectam umbilicalmente gênero e sexualidade, o macho e a bixa evocadas por Linn, de fato, acionam os estereótipos daquilo que, em clássico artigo sobre a homossexualidade no Brasil, Peter Fry (1982FRY, Peter. 1982. “Da hierarquia à igualdade: a construção histórica da homossexualidade no Brasil”. In: Para inglês ver: identidade e política na cultura brasileira. Rio de Janeiro: Zahar, pp.87-115.) chamou de modelo hierárquico. Esse modelo associa homossexualidade, feminilidade e passividade na figura da “bicha” e, como contraponto sexual, tem o “bofe” másculo, ativo e, nos casos discutidos por Fry, heterossexual.

Esse modelo, segundo o próprio autor, foi sendo melindrado na consideração de um modelo mais igualitário, moderno, cujo principal expoente era, naquele momento, o “entendido”, tal como discutido por Carmen Dora Guimarães (2004GUIMARÃES, Carmen Dora. 2004. O homossexual visto por entendidos. Rio de Janeiro: Garamond .). Entre esses gays entendidos e modernos, diversamente do que acontecia com a díade bicha/bofe, se nutria a ideia de que o que estava em jogo na experiência homoerótica não era aproximação com a mulher, mas o desejo por um homem.

O cenário de desejos e interações erótico-sexuais emergido por Linn da Quebrada em sua obra é, contudo, diferente de ambos os modelos. Diferencia-se do modelo hierárquico na medida em que a masculinidade, tendo sido incorporada como valor ao universo de interação homossexual masculino, deixa de ser prerrogativa da heterossexualidade. Mas se diferencia também do modelo igualitário por evidenciar como a absorção da masculinidade como valor que determina a performance erótica ideal entre gays acabou alijando social e sexualmente aqueles corpos de homem, mas não de macho, isto é, as corpas que “deveriam ser masculinos”, mas que são marcadas como femininas e, portanto, não desejáveis.

Dessa maneira, se, por um lado, Linn reconhece a existência desses roteiros sexuais, por outro, é minuciosa na construção de espécies de contrarroteiros que orientam tanto sua poesia quanto sua política a partir dessas imagens emblemáticas. Em Enviadescer, a artista chama o macho discreto para conversar. Invoca-o e o objetifica na imagem de seu pau grande e ereto. Mas o faz apenas no sentido de o recusar como objeto de desejo preferencial em favor da bixa, das corpas que são afeminadas, que rebolam e se maquiam. E termina intimidando: “se quiser ficar comigo, boy, vai ter que enviadescer!”.

Em blasFêmea, obra audiovisual realizada pela artista em 2017, Linn recupera imagens e histórias que apontam tanto para a violência que se acomete sobre essas corpas quanto pela reXistência que elas oferecem a um conjunto de opressões CIStêmicas (Vergueiro, 2015VERGUEIRO, Viviane. 2015. Por inflexões decoloniais de corpos e identidades de gênero inconformes: uma análise autoetnográfica da cisgeneridade como normatividade. Salvador, Dissertação de Mestrado, Universidade Federal da Bahia.) que são cotidianas em suas (nossas?) vidas. Se a blasfêmia de Haraway, como escreve em seu Manifesto Cyborg, é construir um mito político fiel ao feminismo, socialismo e materialismo, a blasFêmea de Linn é a bixa que desafia os padrões normativos de gênero e os roteiros sexuais hegemônicos, incluindo no conjunto de movimentos que orientam sua imaginação política questões que são problematizadas pelo fervilhante transfeminismo brasileiro.23 23 Para perspectivas transfeministas, bem como imbróglios desta com outras correntes do feminismo e o cenário brasileiro, cf. Preciado (2010), Jesus (2015), Valencia (2018), Vieira, Bagagli (2019), Bagagli (2019). Para um trabalho sobre o ativismo trans brasileiro, cf. Carvalho e Carrara (2013; 2015). Talvez, contudo, as provocações de Linn estejam mais próximas do terrorismo de Hija de Perra (2012; 2014).

Essa imaginação política e poética de Linn, toma o cu como eixo dos enunciados a partir dos quais é possível erigir propostas sexuais de desidentifiquem a complementaridade sexual pau-vagina. De fato, como enfatizado, não é apenas desidentificação de estratégias pautadas na heterossexualidade, mas a cishtnormatividade de práticas sexuais que se tornam centros normativos mesmo dentro de populações LGBTQIA+.

Em seu texto Terror Anal, escrito e publicado na reedição espanhola de O desejo homossexual, de Guy Hocquenghem, Paul Preciado (2009PRECIADO, Paul B. 2009. “Terror anal: apuntes sobre los primeiros días de la revolución sexual”. In: HOCQUENGUEM, Guy. El deseo homosexual. Madrid: Melusina, pp.133-172.) argumenta que, em certo sentido, a heterossexualidade se funda sobre a castração anal, a interdição do ânus. Dessa maneira, não é de se estranhar que o cu seja ativado nas composições de Linn. Contudo, na perspectiva aberta por ela e por diversas outras experiências sexuais não marcadas pela cishtnormatividade, não se trata de desautorizar práticas heterossexuais per se.

Diversamente, o foco é, por meio de práticas de desidentificação político-poéticas, detonar a própria noção de complementaridade sexual. E, nesse sentido, pau e cu também não estabelecem relações de complementaridade, posto que o par cu-dedos, às vezes, aparece como o par privilegiado, centro de gravidade de uma sexualidade que só se diz de si mesma e só se faz em si mesma. Na canção, Dedo nucué, isso já é exaltado no título. Em outra canção, Necomancia (neca é pau em pajubá e brinca aqui com sua associação com a morte), Linn ironiza o medo do macho. E prescinde dele: “para que quero sua pica, se eu tenho todos esses dedos?”

Aqui, de fato, podemos acionar o argumento de Roy Wagner (1986WAGNER, Roy. 1986. Symbols that stand for themselves. Chicago, London: The University of Chicago Press.: 9) em Symbols that stand for themselves para postular “uma perspectiva relativa no âmbito da construção cultural, [pois] tomar o referencialismo do símbolo, o ‘é’ de uma convenção, como uma espécie de subjuntivo é entrar em uma suspensão provisória o mundo de Vaihinger do ‘como se’”. Victor Turner (1974TURNER, Victor. 1974 [1969]. O processo ritual. Estrutura e antiestrutura. Petrópolis: Vozes . [1969]) também fala desse modo subjuntivo e o associa ao conceito de communitas. Seria a localidade criada por esses musicares artivistas, no que concerne a cishtnormatividade, um domínio consolidado e estendido de “modalidade ‘extra’-estrutural”, para usar os termos desse autor?

Outros tempos. James Green (2000GREEN, James. 2000 [1999]. Além do carnaval. A homossexualidade masculina do Brasil do século XX. São Paulo: Editora UNESP. [1999]: 302), em seu estudo sobre homossexualidade no Brasil no século XX, escreve que “quando dois homens reconheciam que ambos eram homossexuais e queriam ter relações um com o outro, isso era incompreensível para muitas bonecas [termo de referência a homossexuais afeminados e/ ou travestis]”. Essa ideia é reiterada pelo dito corrente de que duas passivas não podem trepar. Mas, para Linn e muitas outras de nós, pessoas sexo-gênero dissidentes, hoje em dia, no Brasil, afeminação e passividade versus atividade não são lugares necessários de construção da sexualidade.

A experiência anal, antes de ser subsumida pelo desejo de pau, desdobra-se em sua complexidade sem estabelecer posições estáveis de complementaridade sexual. Como argumentaram Jeffrey Weeks (1977WEEKS, Jeffrey. 1977. Coming out: homosexual politics in Britain, from the Nineteenth Century to the present. London: Quartet.; 1985WEEKS, Jeffrey. 1985. Sexuality and its Discontents: Meanings, Myths and Modern Sexualities. Londres: Routledge & Kegan Paul.; 2000WEEKS, Jeffrey. 2000. Making Sexual History, Cambridge: Polity Press.) e Michel Foucault (2007FOUCAULT, Michel. 2007 [1976]. História da sexualidade I: A vontade de saber. Rio de Janeiro: Edições Graal. [1976]), a sexualidade é um dispositivo historicamente situado (e não natural!) e o modelo médico de heterossexualidade versus homossexualidade que passou a orientar os roteiros sexuais euroestadunidenses foi forjado no fim do século XIX. Mas, como tão bem colocou Larissa Pelúcio em diversos momentos, esse modelo encontra dificuldades para se atualizar no século XXI, em parte pela emergência, nesse espaço público de aparição (Arendt, 2007ARENDT, Hannah. 2007 [1958]. A condição humana. Rio de Janeiro, Forense Universitária. [1958]), de corpos falantes a partir dos quais esses contradiscursos sexuais estão sendo elaborados.

Nessa desroteirização sexual que é também uma desidentificação com experiências homo e trans eróticas que conferem privilégio máximo ao pau, trata-se, assim, de minar padrões da masculinidade hegemônica, para utilizar o conceito trabalhado por autoras como Raewyn Connell e James Masserschmidt (2013CONNELL, Raywyn; MESSERSCHMIDT, James. 2013 [2005]. “Masculinidade hegemônica: repensando o conceito”. Estudos feministas, vol. 21, n.1: 241-282. DOI 10.1590/S0104-026X2013000100014
https://doi.org/10.1590/S0104-026X201300...
), e Miguel Vale de Almeida que, em texto de 1996, adverte que a “masculinidade hegemónica é um modelo cultural ideal que, não sendo atingível - na prática e de forma consistente e inalterada - por nenhum homem, exerce sobre todos os homens e sobre as mulheres um efeito controlador (Almeida, 1996ALMEIDA, Miguel Vale de. 1996. “Género, masculinidade e poder. Revendo um caso do Sul de Portugal”. Anuário Antropológico, n. 95:161-190.: 3). Assim, negar o privilégio ontológico do macho e um conjunto de práticas sexuais e orientações do desejo que passaram a ser denunciadas como homonormativas (Duggan, 2003DUGGAN, Lisa. 2003. The twilight of equality? Neoliberalism, cultural politics and the attack on democracy. Boston: Beacon Press.) e às quais é contraposta uma sexualidade bixa e travesti é desidentificar-se com um CISstema que mata corpas e desejos - assumindo, como o fez Jack Smith, que “normalidade é o lado mal da homossexualidade”.

Mais fácil falar que fazer, né, bunyta? Um comentário recente feito por uma gata trans no Facebook se conecta fortemente com o campo problemático que essas experiências e encontros sexuais fazem emergir. Assim dizia: “Quando um homem trans me cobra relacionamentos transcentrados (isto é, entre pessoas trans), já penso que outra mulher cis rejeitou ele”. Conheço lindos e felizes casais transcentrados e não se trata se dizer que tragédia ou romance é destino necessário, pois todas temos direito a complexidade. Mas o desejo, talvez, seja passível de desconstrução num ritmo muito menor do que gostaria nossa intencionalidade, arbítrio e nossas motivações políticas.

Em entrevista publicada no livro Vozes transcendentes (2018DA QUEBRADA, Linn. 2018. “Linn da Quebrada: Bixa Preta TRÁ TRÁ TRÁ e Transviada”. In: MOREIRA, Larissa Ibúmi. Vozes transcendentes: os novos gêneros na música brasileira. São Paulo: Hoo Editora.: 89), Linn da Quebrada fala que: “O funk era, mais uma vez, em função do homem e de um tipo de homem, do grande macho com a pica gotejante, forte e viril. Percebi como ali também se desviava o desejo para esse macho. Eu queria negar isso. Queria negar para que eu também não precisasse sentir mais aquilo nem continuar refém do meu próprio desejo”(ênfase adicional).

Quando li pela primeira vez o livro El Postporno era eso de Maria Llopis (2010LLOPIS, Maria. 2010. El postporno era eso. Santa Cruz de Tenerife: Melusina.), intrigou-me que começasse falando de amor. Mas não é de afeto e desejo que está também falando Linn, ainda a partir de uma outra prática transformada terrorista, nesse caso a própria música como arma política de contrapedagogia sexual? Quais os limites de transformação do desejo a partir de posicionamentos políticos?

Em um primeiro momento, nossos desejos, tidos como naturais, foram desconstruídos a partir da crítica aos princípios biologicistas. Mas agora é a própria cultura, racista e cishtnormativa, que entra na mira de fogo. E, talvez, haja chegado o momento de fazermos como Linn com sua música. E nós, também, antropólogas que discutimos as relações entre arte e política, escrevermos não a cultura, como queria Geertz, mas contra a cultura, como conclama Lila Abu-Lughod (1991)ABU-LUGHOD, Lila. 1991. “Writing against culture”. In: FOX, Richard (Ed.). Recapturing Anthropology: working in the present. Santa Fe, School of American Research Press, pp.137-162..

ALUCINAÇÕES FINAIS: COALIZÃO DE CORPAS CONTRA O CAPETALISMO

Volto, então, às perguntas de Martha Mockus (2005)MOCKUS, Martha. 2005. “Resenha de Queer Episodes in Music and Modern Identity ”. Journal of the American Musicological Society, vol. 58, n. 3: 730-736. com as quais iniciei. As pessoas com as quais Linn da Quebrada quer construir pontes e vínculos para sobreviver não são, de forma marcada, pessoas implicadas no mundo artístico da música, mas no mundo das lutas corporificadas que formam coalização com sua própria reXistência em uma localidade que tanto afeta seu musicar quanto é construído por ele.

Gostaria, para finalizar, de sugerir que essa localidade também constitui, potencialmente, uma esfera pública. Etienne Balibar e Immanuel Wallerstein argumentam que é importante entender “a nação e o povo como construções históricas, graças às quais as instituições e os antagonismos atuais podem ser projetados no passado, para conferir uma relativa estabilidade às ‘comunidades’ das quais depende o sentimento de identidade ‘individual” (1991[1988]WALLERSTEIN, Immanuel; Etienne Balibar. 1991[1988]. Raza, Nación y Clase. Madrid: IEPALA.: 2425).

Contudo, como marcam autoras como María Lugones (2010LUGONES, María. 2010. “Toward a decolonial feminism”. Hypatia, vol.25, n.4: 742-759.) e Rita Segato (2011SEGATO, Rita Laura. 2011. “Género y colonialidad: en busca de claves de lectura y de un vocabulario estratégico descolonial”. In: BIDASECA, Karina (Ed.). Feminismos y poscolonialidad. Descolonizando el feminismo desde y en América Latina. Buenos Aires: Ediciones Godot.), no seio dessa construção colonial de identidades nacionais, há um duplo processo: primeiro de articulação da nação a partir de posicionalidades de raça, gênero e classe e, em seguida, indissociavelmente, um processo de apagamento desses pertencimentos nessa espécie de egrégora nacional que Benedict Anderson (1983ANDERSON, Benedict. 1983. Imagined Communities: Reflections on the Origin and Spread of Nationalism. Revised edition. Londres, Verso.) chamou de comunidade imaginada.

Essa ficção colonial proposta pela ideia de nação depende, igualmente, da instauração de uma esfera pública que, apenas na excepcionalidade, se parece com os cafés e salões do século XVIII discutidos por Habermas (1984HABERMAS, Jürgen. 1984 [1962]. Mudança estrutural da esfera pública. Rio de Janeiro, Tempo Brasileiro.[1962]) no seu relato sobre a ascensão da esfera pública burguesa. Os espaços descritos pelo autor se apresentavam como espaços de discurso e argumentação formais, nos quais deviam ser observadas atitudes corporais específicas e regras bastante restritas. Teoricamente, todos os seus participantes estavam profundamente engajados numa cultura letrada e na redenção pela razão iluminista que o discurso formal encarnava. Contraposta a essa imagem, Mike Featherstone propõe que o que ocorre nas cidades modernas é uma

(...).“estetização geral das paisagens urbanas” que torna “difícil [...] ver onde se poderiam desenvolver novos espaços que favoreçam as interações da esfera pública buscadas por Habermas, que tendia a ver a estética como um desvio do discurso público mais sério [...] [E]m geral, a noção de esfera pública parece valorizar o raciocínio linear mais que a vida cotidiana, com suas discussões a esmo; o consenso mais que a sociabilidade; a ética comunicativa mais que a estética; a mente mais que o corpo. (Featherstone: 2001FEATHERSTONE, Mike. 2001. “Vida pública, informática e cidade global: novas possibilidades de formação de identidades e cidadanias”. Interseções - Revista de Estudos Interdisciplinares. ano3, n. 1.: 49)

Nesse sentido, alguns pensadores começaram a se tecer críticas à ideia de uma única esfera pública universal, acenando para a existência, ao lado desta, uma “esfera pública plebeia”. Nestor Garcia Canclini (1997CANCLINI, Néstor García. 1997 [1995]. Consumidores e cidadãos: conflitos multiculturais da globalização. Rio de Janeiro: UFRJ.), retoma que:

Uns poucos intelectuais e políticos (por exemplo, Mikhail Bakhtin, Antonio Gramsci, Raymond Williams, Richard Hoggart) foram admitindo a existência paralela de culturas populares que constituíam “uma esfera pública plebeia”, informal, organizada por meio de comunicações orais e visuais mais do que escritas. Em muitos casos tendiam a vê-la à maneira de Günther Lottes - como uma “variante da esfera pública burguesa”, cujo “potencial emancipador” e seus pressupostos sociais foram suspensos. Alguns autores latino-americanos, nos quais me incluo têm trabalhado no estudo e reconhecimento cultural destas modalidades diversas de comunicação, mas têm feito pouco pela valorização teórica destes circuitos populares como foros onde se desenvolvem redes de intercâmbio de informações e aprendizagem da cidadania em relação ao consumo dos meios de comunicação de massa contemporâneas, para além das idealizações fáceis do populismo político e comunicacional. (Canclini, 1997CANCLINI, Néstor García. 1997 [1995]. Consumidores e cidadãos: conflitos multiculturais da globalização. Rio de Janeiro: UFRJ.: 22)

Rivera Cusicanqui (2015RIVERA CUSICANQUI, Silvia. 2015. Sociología de la imagen: ensayos. Miradas ch’ixi desde la historia andina. Ciudad Autónoma de Buenos Aires: Tinta Limón , 2015.: 254) fala de uma “esfera pública convulsionada e em crise” ao analisar contendas que envolvem a presença/ocultamento de pensamentos e práticas indígenasnaconsciênciacidadã. Masessasde/formaçõessãotambémsexogenéricas. A esse propósito, Tertuliana Lustosa, em seu Manifesto traveco-terrorista, aponta como intelectualismos brancos e cishtnormativos colonizaram e construíram nossos corpos. “Produções marginais de mendigos, putas, pretas e travestis que fraturam a universalização do ‘nós’ brasileiro, em contrapartida, foram recorrentemente consideradas como crime, obscenidade ou falta de sofisticação e, justo por não adentrarem os espaços intelectuais da sociedade brasileira, foram estrategicamente manipuladas, apagadas e distorcidas” (Lustosa, 2016LUSTOSA, Tertuliana. 2016. “Manifesto traveco-terrorista”. Concinnitas, vol. 1, n. 28: 384-409.: 388-389).

Contudo, não é apenas a urgência desses pensamentos de que se trata aqui. Mas igualmente a insurgência - nesse espaço público que Hannah Arendt tão bem caracterizada como espaço de aparição - de corpas, descartáveis, matáveis e não enlutáveis, mas potentes em suas fodas, rabas, cheiros, estados alterados de consciência, cores, imagens e, como não poderia faltar, sonoridades. Para muito além ou, antes, muito aquém de logocentrismo colonial-ocidental.

Jota Mombaça (2016MOMBAÇA, Jota. 2016. “Rastros de uma submetodologia indisciplinada”. Concinnitas , vol.1, n. 28: 341-354.: 343), ao lembrar o trabalho de Renato Cohen (1999COHEN, Renato. Work in Progress na Cena Contemporânea: criação, encenação e recepção. São Paulo: Perspectiva, 1999.), retoma a “estratégia de criação centrada na ‘dinamicidade de sistemas’, na qual uma proliferação de ‘modelos fracos’ propicia a ‘queda’ de paradigmas generalizantes e unívocos. Toda uma contra-conduta criativa ‘irracionalista’ que tende ao rompimento com o modelo racional cartesiano que foi consolidado no Ocidente.”

Minha sugestão é que os trabalhos de Linn - espécie de “arma de clandestinidade intelectual” para seguir ainda o manifesto de Lustosa - se inserem na empreitada de levarmos a cabo - segurando pelos chifres, como diria Guimarães Rosa -, outras configurações de esfera pública menos marcadas pela violência de um CIStema colonial e necropolítico para o qual nossas corpas são descartáveis e não passíveis de luto.

Trata-se de seguir algumas pistas para habitar o fim do mundo em sua ruínas, tramando um outro mundo cuja ética de co-habitação não seja marcada, como Viviane Vergueiro (2015VERGUEIRO, Viviane. 2015. Por inflexões decoloniais de corpos e identidades de gênero inconformes: uma análise autoetnográfica da cisgeneridade como normatividade. Salvador, Dissertação de Mestrado, Universidade Federal da Bahia.: 229) tão bem elabora, por “relações de poder desiguais são estabelecidas a partir de colonialidades cisnormativas, cistemas socioculturais institucionalizados e não institucionalizados que inferiorizam, apagam e violentam, interseccionalmente, as diversidades corporais e de identidades de gênero”.

Para terminar com outra citação da letra de Danna Lisboa da qual a epígrafe deste texto é tirada:

Foge se você dá dois e não mantém respeito (posso)

Posso fazer rima pois meu berço vem do gueto (eu ando)

Eu ando pelos becos (eu vou)

Eu vou de coletivo

Cabeça sempre erguida porque eu sei que tenho amigos

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

  • ABU-LUGHOD, Lila. 1991. “Writing against culture”. In: FOX, Richard (Ed.). Recapturing Anthropology: working in the present. Santa Fe, School of American Research Press, pp.137-162.
  • ACHINTE, Adolfo. 2013. “Pedagogías de la re-existencia. Artistas indígenas y afrocolombianos”. In: WALSH, Catherine. (Ed.). Pedagogías decoloniales: Prácticas insurgentes de resistir, (re)existir, y (re)vivir, Tomo I. Quito, Ediciones Abya Yala, pp.443-468.
  • ALMEIDA, Miguel Vale de. 1996. “Género, masculinidade e poder. Revendo um caso do Sul de Portugal”. Anuário Antropológico, n. 95:161-190.
  • ANDERSON, Benedict. 1983. Imagined Communities: Reflections on the Origin and Spread of Nationalism. Revised edition. Londres, Verso.
  • APPADURAI, Arjun. 1996. “The Production of Locality”. In: Modernity at Large: Cultural Dimensions of Globalization. Minneapolis: University of Minnesota Press.
  • ARENDT, Hannah. 2007 [1958]. A condição humana. Rio de Janeiro, Forense Universitária.
  • BAGAGLI, Beatriz. 2019. Discursos transfeministas e feministas radicais: disputas pela significação da mulher no feminismo. Campinas, Dissertação de mestrado, Universidade Estadual de Campinas.
  • BENNET, Andy; PETERSON, Andy. 2004. Music Scenes. Local, translocal, and virtual. Nashville, Vanderbilt University Press.
  • BENNET, Andy. 2004. “New Tales from Caterbury: the making of a virtual scene”. In: BENNET, Andy; PETERSON, Andy. Music Scenes. Local, translocal, and virtual . Nashville, Vanderbilt University Press .
  • BENNET, Samantha; BATES, Eliot. 2018. Critical approaches to the production of music and sound. New York, Bloomsbury.
  • BENNETT, Andy; GUERRA, Paula (Eds.). 2019. DIY Cultures and Underground Music Scenes. Londres e Nova York, Routledge.
  • BERGER, Peter; LUCKMANN, Thomas. 1996 [1966]. A construção social da realidade. Petrópolis: Vozes.
  • BLACKING, John. 1973. How musical is man? Seattle e London, University of Washington Press.
  • BRAGA, Gibran. 2018. “O fervo e a luta”: políticas do corpo e do prazer em festas de São Paulo e Berlim. São Paulo, Tese de doutorado, Universidade de São Paulo.
  • BRAZ, Camilo Albuquerque de. 2010. À Meia-Luz: uma etnografia imprópria em clubes de sexo masculinos. Campinas, Tese de doutorado, Universidade Estadual de Campinas.
  • BRUCHER, Katherine; REILY, Suzel. (Ed.). 2018. The Routledge Companion to the Study of Local Musicking. Nova York, London: Routledge.
  • CANCLINI, Néstor García. 1997 [1995]. Consumidores e cidadãos: conflitos multiculturais da globalização. Rio de Janeiro: UFRJ.
  • CARVALHO, Mario F. L.; CARRARA, Sérgio. 2013. “Em direção a um futuro trans? Contribuição para a história do movimento de travestis e transexuais no Brasil”. Sexualidad, Salud y Sociedad - Revista Latinoamericana, n.14:319-351. DOI 10.1590/S1984-64872013000200015
    » https://doi.org/10.1590/S1984-64872013000200015
  • CARVALHO, Mario F. L.; CARRARA, Sérgio. 2015. “Ciberativismo trans: considerações sobre uma nova geração militante”. Contemporânea. Comunicação e cultura, v.13, n.2: 382-400. DOI 10.9771/contemporanea.v13i2.13865
    » https://doi.org/10.9771/contemporanea.v13i2.13865
  • COHEN, Renato. Work in Progress na Cena Contemporânea: criação, encenação e recepção. São Paulo: Perspectiva, 1999.
  • COHEN, Sara. 1991. Rock culture in Liverpool. Popular Music in the making. Oxford: Claredon Press.
  • COLLING, Leandro; ARRUDA, Murilo; NONATO, Murilo. 2019. “Perfechatividades de gênero: a contribuição das fechativas e afeminadas à teoria da performatividade de gênero”. Cadernos Pagu, n. 57:.1-34. DOI 10.1590/18094449201900570002
    » https://doi.org/10.1590/18094449201900570002
  • COLLING, Leandro. 2019. “A emergência e algumas características da cena artivista das dissidências sexuais e de gênero no Brasil da atualidade”. In: (Ed.). Artivismos das dissidências sexuais e de gênero. Salvador, EDUFBA, pp. 11-40.
  • CONNELL, Raywyn; MESSERSCHMIDT, James. 2013 [2005]. “Masculinidade hegemônica: repensando o conceito”. Estudos feministas, vol. 21, n.1: 241-282. DOI 10.1590/S0104-026X2013000100014
    » https://doi.org/10.1590/S0104-026X2013000100014
  • CORREA, Sonia; PRADO, Marco Aurélio Máximo. 2018. “Retratos transnacionais e nacionais das cruzadas antigênero”. Revista de Psicologia Política, vol.18, n.43: 444-448.
  • DA QUEBRADA, Linn. 2018. “Linn da Quebrada: Bixa Preta TRÁ TRÁ TRÁ e Transviada”. In: MOREIRA, Larissa Ibúmi. Vozes transcendentes: os novos gêneros na música brasileira. São Paulo: Hoo Editora.
  • DE LAURETIS, Teresa. 1987. Technologies of Gender: Essays on Theory, Film, and Ficction. Bloomington, Indianapolis. Indiana University Press.
  • DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. 2004 [1972]. O Anti-Édipo: capitalismo e esquizofrenia. Lisboa, Assirio e Alvim
  • DI GIOVANNI, Julia Ruiz. 2015. “Artes de abrir espaço. Apontamentos para a análise de práticas em trânsito entre arte e ativismo”. Cadernos de Arte e Antropologia, vol.4 n.2:13-27. DOI 10.4000/cadernosaa.911
    » https://doi.org/10.4000/cadernosaa.911
  • DUGGAN, Lisa. 2003. The twilight of equality? Neoliberalism, cultural politics and the attack on democracy. Boston: Beacon Press.
  • ERIKSSON, Maria et al. (Eds.). 2019. Spotify teardown. Inside the Black Box of Streaming Music. Cambridge, Londres: MIT Press.
  • FACCHINI, Regina. 2011. “‘Não faz mal pensar que não se está só ’: estilo, produção cultural e feminismo entre as minas do rock em São Paulo”. Cadernos Pagu , n. 36: 117-153. DOI 10.1590/S0104-83332011000100006
    » https://doi.org/10.1590/S0104-83332011000100006
  • FEATHERSTONE, Mike. 2001. “Vida pública, informática e cidade global: novas possibilidades de formação de identidades e cidadanias”. Interseções - Revista de Estudos Interdisciplinares. ano3, n. 1.
  • FINNEGAN, Ruth. The Hidden Musicians: Music-making in an English town. Cambridge: Cambridge University Press, 1989.
  • FOSTER, Hal. 1995. “The Artist as Ethnographer?”. In: Marcus, George; Myers, Fred (Eds.). The Traffic in Culture. Refiguring Art and Anthropology. Berkeley, Los Angeles, London, University of California Press.
  • FOUCAULT, Michel. 2007 [1976]. História da sexualidade I: A vontade de saber. Rio de Janeiro: Edições Graal.
  • FRY, Peter. 1982. “Da hierarquia à igualdade: a construção histórica da homossexualidade no Brasil”. In: Para inglês ver: identidade e política na cultura brasileira. Rio de Janeiro: Zahar, pp.87-115.
  • FULLER, Sophie; WHITESELL, Lloyd. 2002. Queer Episodes in Music and Modern Identity. Urbana: University of Illinois Press.
  • GALUSZKA, Patryk; BRZOZOWSKA, Blanka. 2017. “Crowdfunding and the democratization of the music market”. Media, culture and society, vol.39, n. 6: 833-849.
  • GALUSZKA, Patryk; BYSTROV, Victor. 2014. “A Case Study of a New Model of Financing Music Production”. Journal of Internet Commerce, vol. 13, n. 3-4: 233-252.
  • GAMBLE, Jordan; BRENNAN, Michael; MCADAM, Rodney. 2017. “A rewarding experience? Exploring how crowdfunding is affecting music industry business models”. Journal of Business Research, vol. 70: 25-36.
  • GELL, Alfred. 1998. Art and agency. An anthropological theory. Oxford: Clarendon Press.
  • Gillett, Charlie. 1983. The Sound of the City: The Rise of Rock and Roll. 2d. ed. London: Souvenir Press.
  • GREEN, James. 2000 [1999]. Além do carnaval. A homossexualidade masculina do Brasil do século XX. São Paulo: Editora UNESP.
  • GREGORI, Maria Filomena. 2010. Prazeres perigosos: erotismo, gênero e limites da sexualidade. Campinas, Tese de livre docência, Universidade Estadual de Campinas.
  • GRUNVALD, V. (prelo). “Urban experience, youth, gender and sexuality in a LGBT family on the periphery of São Paulo”. In: CAMPOS, Ricardo; NOFRE, Jordi (Eds.). Exploring IberoAmerican Youth Street Cultures in the 21st century. Creativity, Resistance and Transgression in the City. New York: Palgrave Macmillan.
  • GRUNVALD, V. 2019. “Lâmpadas, corpos e cidades: reflexões acadêmicoativistas sobre arte, dissidência e a ocupação do espaço público”. Horizontes Antropológicos, n. 55: 263-290. DOI 10.1590/S0104-71832019000300010
    » https://doi.org/10.1590/S0104-71832019000300010
  • GRUNVALD. V. 2009a. “Butler, a abjeção e seu esgotamento”. In: DÍAZ-BENÍTEZ, María Elvira e FÍGARI, Carlos (orgs.). Corpos, desejos, prazeres e práticas sexuais dissidentes. Rio de Janeiro: Garamond, pp.31-68.
  • GRUNVALD. V. 2009b. Teseu e o touro: algumas sugestões feministas para uma crítica da razão. Rio de Janeiro, dissertação de Mestrado, Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
  • GUERRA, Paula. 2021. “So close yet so far: DIY cultures in Portugal and Brazil”. Cultural Trends, vol. 30, n. 2: 122-138 DOI: 10.1080/09548963.2021.1877085
    » https://doi.org/10.1080/09548963.2021.1877085
  • GUIMARÃES, Carmen Dora. 2004. O homossexual visto por entendidos. Rio de Janeiro: Garamond .
  • HABERMAS, Jürgen. 1984 [1962]. Mudança estrutural da esfera pública. Rio de Janeiro, Tempo Brasileiro.
  • HARAWAY, Donna. 2004 [1991]. “‘Gênero’ para um dicionário marxista: a política sexual de uma palavra”. Cadernos Pagu , n..22: 201-246.
  • HEBDIGE, Dick. 1979. Subculture. The meaning of style. London, New York: Routledge.
  • HERBERT, Trevor. 2018. “Foreword: amateur bands, their localities, and their challenges - the lessons of history”. In: REILY, Suzel; BRUCHER, Katherine (Eds.). The Routledge Companion to the Study of Local Musicking . Nova York e Londres, Routledge, pp.xv-xxiv.
  • HIJA DE PERRA. 2012. “El fin de la idealización retrógrada de la sexualidad es el mágico espiral del apocalipsis multisexual eterno”. Revista Punto Género, n.2, p.223-230.
  • HIJA DE PERRA. 2014/2015. “Interpretações imundas de como a teoria queer coloniza nosso contexto sudaca, terceiro-mundista e pobre de aspirações, perturbando com novas construções de gênero aos humanos encantados pela heteronorma”. Periódicus, v.1, n.2: 1-8.
  • HODGKINSON, James. 2004. “The fanzine discourse over Post-rock”. In: BENNET, Andy; PETERSON, Andy. Music Scenes. Local, translocal, and virtual . Nashville: Vanderbilt University Press, pp.221-237.
  • HOWE, Jeff. 2009. Crowdsourcing: Why the Power of the Crowd Is Driving the Future of Business. Nova York, Crown Business Editors.
  • JESUS, Jaqueline Gomes de. 2015. Transfeminismo: teorias e práticas. Rio de Janeiro, Metanoia.
  • KOSKOFF, Ellen. 2014. A Feminist Ethnomusicology: Writing on Music and Gender. Urbana; Chicago; Springfield, University of Illinois Press.
  • LAING, Dave. 1985. One Chord Wonders: Power and Meaning in Punk Rock. Milton Keynes: Open University Press.
  • LAWTON, Kevin; MARON, Dan. 2010. The Crowdfunding Revolution: How to Raise Venture Capital Using Social Media. San Francisco, Mc-Graw Hill.
  • LEFF. Enrique. 2016. A aposta pela vida: imaginação sociológica e imaginários sociais nos territórios ambientais do Sul. Petrópolis, Vozes.
  • LEPECKI, André. 2011/2012. “Coreopolítica e coreopolícia”. Ilha, vol.13, n.1: .41-60. DOI 10.5007/2175-8034.2011v13n1-2p41
    » https://doi.org/10.5007/2175-8034.2011v13n1-2p41
  • LLOPIS, Maria. 2010. El postporno era eso. Santa Cruz de Tenerife: Melusina.
  • LUGONES, María. 2010. “Toward a decolonial feminism”. Hypatia, vol.25, n.4: 742-759.
  • LUGONES, María. 2015 [2010]. “Rumo a um feminismo descolonial”. Estudos Feministas, vol. 22, n.3: 935-952.
  • LUSTOSA, Tertuliana. 2016. “Manifesto traveco-terrorista”. Concinnitas, vol. 1, n. 28: 384-409.
  • MARCUS, George; MYERS, Fred (Eds.). 1995. The Traffic in Culture. Refiguring Art and Anthropology . Berkeley, Los Angeles, London: University of California Press.
  • MOCKUS, Martha. 2005. “Resenha de Queer Episodes in Music and Modern Identity ”. Journal of the American Musicological Society, vol. 58, n. 3: 730-736.
  • MOMBAÇA, Jota. 2016. “Rastros de uma submetodologia indisciplinada”. Concinnitas , vol.1, n. 28: 341-354.
  • MOMBAÇA, Jota. s/d. “Rumo a uma redistribuição desobediente de gênero e anticolonial da violência”. Disponível em: Disponível em: https://issuu.com/amilcarpacker/docs/rumo_a_uma_redistribuicao_da_vi Último acesso em: 05 de abril de 2021.
    » https://issuu.com/amilcarpacker/docs/rumo_a_uma_redistribuicao_da_vi
  • MUÑOZ, José Esteban. 1999. Desidentifications. Queers of color and the performance of politics. Minneapolis, London: University of Minnesota Press.
  • NEUBAUER, John. 1992 [1986]. La emancipación de la música. El alejamiento de la mímesis en la estética de siglo XVIII. Madrid, Visor.
  • PRECIADO, Beatriz. 2002. Manifiesto contra-sexual. Madrid: Opera Prima.
  • PRECIADO, Paul B. 2009. “Terror anal: apuntes sobre los primeiros días de la revolución sexual”. In: HOCQUENGUEM, Guy. El deseo homosexual. Madrid: Melusina, pp.133-172.
  • PRECIADO, Paul. 2010. “Transfeminismo do regime fármaco-pornográfico”, transcrição de fala em junho de 2010, em, Roma. Tradução de Thiago Coacci. Disponível em: Disponível em: http://www.sxpolitics.org/wp-content/uploads/2014/12/preciado_-_transfeminismo_no_regime_farmaco-pornografico-libre.pdf Último acesso: 05/05/21.
    » http://www.sxpolitics.org/wp-content/uploads/2014/12/preciado_-_transfeminismo_no_regime_farmaco-pornografico-libre.pdf
  • PROJETO TEMÁTICO. 2016. O Musicar Local - novas trilhas para a etnomusicologia. Fapesp: 2016/05318-7. Coordenação de Suzel Reily. Unicamp/ Usp.
  • RAPOSO, Paulo. 2015 “‘Artivismo’: articulando dissidências, criando insurgências”. Cadernos de Arte e Antropologia , vol. 4, n. 2: 3-12.
  • REYES, Adelaida et al. 2005. “Social and musical identities”. In: KOSKOFF, Ellen (Ed.). Music cultures in the United States. An introduction. Nova York e Londres: Routledge.
  • RIVERA CUSICANQUI, Silvia. 2010. Ch’ixinakax utxiwa: una reflexión sobre prácticas y discursos descolonizadores. Buenos Aires: Tinta Limón, 2010.
  • RIVERA CUSICANQUI, Silvia. 2015. Sociología de la imagen: ensayos. Miradas ch’ixi desde la historia andina. Ciudad Autónoma de Buenos Aires: Tinta Limón , 2015.
  • ROCHA, Rose de Melo; REZENDE, Aline. 2019. “‘Diva da Sarjeta’: ideologia enviadescida e blasfêmea pop-profana nas políticas de audiovisibilidade da travesti paulistana Linn da Quebrada”. Contracampo, vol. 38, n.1: 22-34.
  • ROCHA, Rose de Melo; SANTOS, Thiago Henrique Ribeiro. 2019. “Remediação com purpurina: bricolagens tecnoestéticas no drag-artivismo de Gloria Groove”. Revista Interin, vol. 23, n. 1: 205-220.
  • SARAMAGO, José. 1999. Todos os nomes. São Paulo: Cia. das Letras.
  • SCHERER, Helmut; WINTER, Carsten. 2015. “Success factors for music-based crowdfunding as a new means of financing music projects”. International Journal of Music Business Research, vol. 4, n. 1: 9-25.
  • SCHNEIDER, Arnd; WRIGHT, Christopher. 2013. Anthropology and Art Practice. Londres: Bloomsbury.
  • SCHNEIDER, Arnd; WRIGHT, Christopher. 2006. Contemporary art and anthropology. Oxford e NovaYork: Berg.
  • SCHNEIDER, Arnd; WRIGHT, Christopher. 2010. Between Art and Anthropology. Oxford, New York: Berg.
  • SCHNEIDER, Arnd. 2011. “Unfinished Dialogues: Notes Toward an Alternative History of Art and Anthropology”. In: BANKS, Marcus; RUBY, Jay. (Ed.). Made to be seen. Historical Perspectives on Visual Anthropology. Chicago, London: University of Chicago Press, pp.108-135.
  • SCHWIENBACHER, Armin; LARRALDE, Benjamin. 2010. “Crowdfunding of Small Entrepreneurial Ventures”. In: CUMMING, Douglas (Ed). The Oxford Handbook of Entrepreneurial Finance. Oxford: Oxford University Press.
  • SEGATO, Rita Laura. 2011. “Género y colonialidad: en busca de claves de lectura y de un vocabulario estratégico descolonial”. In: BIDASECA, Karina (Ed.). Feminismos y poscolonialidad. Descolonizando el feminismo desde y en América Latina. Buenos Aires: Ediciones Godot.
  • SIMÕES, Júlio. 2009. “Identidades Sexuais”. In: SOUZA LIMA, Antônio Carlos (Ed). Antropologia e Direito: Temas Antropológicos para Debates Jurídicos. Brasília/Blumenau: ABA/Nova Letra.
  • SIMON, William; GAGNON, John. 1973. The Sexual Conduct: The Social Sources of Human Sexuality. Chicago: Aldine.
  • TURINO, Thomas. 1993. Moving away from silence. Music of the Peruvian Altiplano and the experience of urban migration. Chicago, London: University of Chicago Press .
  • TURINO, Thomas. 2008. Music as Social Life: the politics of participation. Chicago, The University of Chicago Press.
  • TURINO, Thomas. 2009. “Four Fields of Music Making and Sustainable Living”. The World of Music, vol. 51, n. 1: 95-117.
  • TURNER, Victor. 1974 [1969]. O processo ritual. Estrutura e antiestrutura. Petrópolis: Vozes .
  • VALENCIA, Sayak. 2018. “El transfeminismo no es um generismo”. Pléyade, n. 22: 27-43.
  • VERGUEIRO, Viviane. 2015. Por inflexões decoloniais de corpos e identidades de gênero inconformes: uma análise autoetnográfica da cisgeneridade como normatividade. Salvador, Dissertação de Mestrado, Universidade Federal da Bahia.
  • VIANNA, Adriana; FARIAS, Juliana. 2011. “A guerra das mães: dor e política em situações de violência institucional”. Cadernos Pagu , n. 37: 79-116.
  • VIEIRA, Helena; Beatriz, BAGAGLI. 2019. “Transfeminismo”. In: HOLLANDA, Heloisa Buarque de (Ed.). Explosão feminista. São Paulo: Companhia das Letras.
  • VILLELA, Alice; TONI, Flavia Camargo; MUNIAGURRIA, Lorena Avellar de; GRUNVALD, Vitor. 2019. “O musicar como trilha para a etnomusicologia”. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros, n. 73: 17-26. 10.11606/issn.2316-901X.v0i73p17-26.
    » https://doi.org/10.11606/issn.2316-901X.v0i73p17-26
  • VIVEIROS DE CASTRO, Eduardo. 2017. Os involuntários da pátria: elogio do subdesenvolvimento. Chão da Feira, caderno 65.
  • VIVEIROS DE CASTRO, Eduardo. 2020. “Sobre la noción de etnocidio, con especial atención al caso brasileño”. Estudios de História Moderna y Contemporánea de México, vol. 60: 111-144.
  • WAGNER, Roy. 1986. Symbols that stand for themselves. Chicago, London: The University of Chicago Press.
  • WALLERSTEIN, Immanuel; Etienne Balibar. 1991[1988]. Raza, Nación y Clase. Madrid: IEPALA.
  • WEEKS, Jeffrey. 1985. Sexuality and its Discontents: Meanings, Myths and Modern Sexualities. Londres: Routledge & Kegan Paul.
  • WEEKS, Jeffrey. 2000. Making Sexual History, Cambridge: Polity Press.
  • WEEKS, Jeffrey. 1977. Coming out: homosexual politics in Britain, from the Nineteenth Century to the present. London: Quartet.
  • WENGER, Etienne. 1998. Communities of Practice: learning, meaning and identity. Cambridge: Cambridge University Press .
  • WITTGENSTEIN, Ludwig. 1979 [1953]. Investigações Filosóficas. Os Pensadores. São Paulo: Abril Cultural.
  • WITTIG, Monique. 2006 [1980]. “El pensamiento heterossexual”. In: El pensamiento heterosexual y otros ensayos. Barcelona, Madrid: Editorial Egales, pp.45-58.

Entrevistas e reportagens

  • 1
    Muitas das questões colocadas e pensadas aqui tem, de fato, como pano de fundo, suas pungentes provocações.
  • 2
    Digo intensificar pois, de meu ponto de vista, foi somente nessa década que essas apropriações deixaram de se constituir como exceções que, de fato, sempre existiram no campo antropológico (Schneider, 2011SCHNEIDER, Arnd. 2011. “Unfinished Dialogues: Notes Toward an Alternative History of Art and Anthropology”. In: BANKS, Marcus; RUBY, Jay. (Ed.). Made to be seen. Historical Perspectives on Visual Anthropology. Chicago, London: University of Chicago Press, pp.108-135.) e passaram a contar, adicionalmente, com um conjunto mais sistemático não apenas de experimentações práticas de aproximação entre arte e antropologia, mas também de reflexão sobre essa relação (Schneider e Wright, 2006SCHNEIDER, Arnd; WRIGHT, Christopher. 2006. Contemporary art and anthropology. Oxford e NovaYork: Berg.; 2010SCHNEIDER, Arnd; WRIGHT, Christopher. 2010. Between Art and Anthropology. Oxford, New York: Berg.; 2013SCHNEIDER, Arnd; WRIGHT, Christopher. 2013. Anthropology and Art Practice. Londres: Bloomsbury.).
  • 3
    A expressão sexogenérica é mais comum no mundo hispanohablante. Mas não a uso por maneirismo. Todas sabemos como há línguas que emanam, como nenhuma outra, alguns sentidos específicos. A condensação dos dois vocábulos em uma única unidade de sentido não poderia ser mais apropriada. Aplicada às questões de sexo e gênero, o termo é uma transposição perfeita do que, alhures (Grunvald, 2009aGRUNVALD. V. 2009a. “Butler, a abjeção e seu esgotamento”. In: DÍAZ-BENÍTEZ, María Elvira e FÍGARI, Carlos (orgs.). Corpos, desejos, prazeres e práticas sexuais dissidentes. Rio de Janeiro: Garamond, pp.31-68.; 2009bGRUNVALD. V. 2009b. Teseu e o touro: algumas sugestões feministas para uma crítica da razão. Rio de Janeiro, dissertação de Mestrado, Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro.), chamei de sócio-natural, pois “homem e natureza não são dois termos distintos, um em face do outro, ainda que tomados numa relação de causação, de compreensão ou de expressão (causa/efeito, sujeito/objeto etc.), mas uma só e mesma realidade essencial: a do produtor e do produto. A produção como um processo não cabe nas categorias ideais e forma um ciclo cujo princípio imanente é o desejo” (Deleuze e Guattari, 2004DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. 2004 [1972]. O Anti-Édipo: capitalismo e esquizofrenia. Lisboa, Assirio e Alvim[1972], p.10). Marco Aurélio Maximo Prado e Sonia Correa (2018)CORREA, Sonia; PRADO, Marco Aurélio Máximo. 2018. “Retratos transnacionais e nacionais das cruzadas antigênero”. Revista de Psicologia Política, vol.18, n.43: 444-448. utilizam também a expressão “cruzadas antigênero” para se referir a esse conjunto de investidas.
  • 4
    Essa reflexão conjunta foi fruto, inicialmente, de uma mesa organizada pelo Centro de Pesquisa e Formação do SESC que, devido ao recente escândalo envolvendo o QueerMuseu, convidou o Prof. Jorge Leite Junior e eu para uma conversa sobre Obscenidade, arte e teoria queer, no dia 19 de setembro de 2017. Posteriormente, produzimos uma reflexão a quatro mãos por ocasião de nossa apresentação conjunta no Seminário Temático 38 - Sexualidade e gênero: política, agenciamentos e direitos em disputa, coordenado por Regina Facchini (Unicamp) e Roberto Marques (UECE) no 43º Encontro Anual da ANPOCS (2019). E está para ser publicada como artigo em coletânea a ser organizada pelo Comitê Gênero e Sexualidade da Associação Brasileira de Antropologia nas pessoas de Heloísa Buarque de Almeida (USP) e Carlos Eduardo Henning (UFG).
  • 5
    Reflexões sobre esses dois casos foram produzidas por ocasião de minha participação no Simpósio Especial 08 - Desafios e Resistências no campo de Gênero e Sexualidade no Brasil Contemporâneo da 32ª Reunião Brasileira de Antropologia também organizado pelo referido Comitê na nota 1 deste artigo. Essa e a nota anterior, para além de qualquer etiqueta acadêmica, são também políticas, pois visam marcar a vivacidade das mobilizações em torno da discussão e reflexão pública, informada e embasada sobre temas importantes para a sociedade brasileira contemporânea.
  • 6
    Tanto as reflexões sobre a coletiva Revolta da Lâmpada (Grunvald, 2019GRUNVALD, V. 2019. “Lâmpadas, corpos e cidades: reflexões acadêmicoativistas sobre arte, dissidência e a ocupação do espaço público”. Horizontes Antropológicos, n. 55: 263-290. DOI 10.1590/S0104-71832019000300010
    https://doi.org/10.1590/S0104-7183201900...
    ) quanto estas que vos apresento foram tributárias de pesquisa de pós-doutorado desenvolvida no PPGAS-USP a partir de auxílio concedido pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP nº 2017/20849-1) entre 01/03/2018 e 30/06/2019. Esta pesquisa estava ligada, no âmbito da FAPESP, ao Projeto Temático O Musicar Local - novas trilhas para a etnomusicologia (FAPESP nº 2016/05318-7), coordenado pelas professoras Suzel Reilly (IA-Unicamp), Flavia Camargo Toni (IEB-USP) e Rose Satiko Gitirana Hikiji (DA-USP).
  • 7
    Transidentidades foi um coletivo composto de pessoas trans e cis que lutavam pelos direitos de pessoas trans. Surgiu, inicialmente, como um “organizativo” cujo objetivo era realizar uma série de ações em torno do Dia da Visibilidade Trans (29 de janeiro). Fiz parte deste coletivo como colaboradora, além de ser membra de outro coletivo artivista de inspiração queer (ou cuir como, às vezes, falamos pelas bandas de cá) e interseccional chamado Revolta da Lâmpada (Grunvald, 2019GRUNVALD, V. 2019. “Lâmpadas, corpos e cidades: reflexões acadêmicoativistas sobre arte, dissidência e a ocupação do espaço público”. Horizontes Antropológicos, n. 55: 263-290. DOI 10.1590/S0104-71832019000300010
    https://doi.org/10.1590/S0104-7183201900...
    ). No momento de escrita deste artigo, o Transidentidades não se encontra mais ativo.
  • 8
    Cishtnormativo é diminutivo de cisheteronormativo e termo muito usado no movimento social de pessoas LGBTQIA+ para marcar cisgeneridade e heterossexualidade como normas sócio-políticas e não apenas como identidade de gênero ou prática sexual. A cishtnormatividade implica na existência de um tipo de colonialidade do pensamento e dos corpos que, na esteira das reflexões de feministas materialistas lésbicas como Adrienne Rich e Monique Wittig, “nos nega toda possibilidade de falar [e sentir?] senão em seus próprios termos” ( Wittig, 2006 WITTIG, Monique. 2006 [1980]. “El pensamiento heterossexual”. In: El pensamiento heterosexual y otros ensayos. Barcelona, Madrid: Editorial Egales, pp.45-58. [1980]: 49). Quando utilizo esse termo, tenho em mente as provocações de María Lugones (2015 LUGONES, María. 2015 [2010]. “Rumo a um feminismo descolonial”. Estudos Feministas, vol. 22, n.3: 935-952. [2010]:948): “Compreende-se a colonialidade do gênero como exercícios de poder concretos, intrincadamente relacionados, alguns corpo a corpo, alguns legalistas, alguns dentro de uma sala onde as mulheres indígenas fêmeas-bestiais-não-civilizadas são obrigadas a tecer dia e noite, outros no confessionário. As diferenças na concretude e na complexidade do poder sempre circulando não são compreendidas como níveis de generalidade; a subjetividade corporificada e o institucional são igualmente concretos.”
  • 9
    Para a programação completa, cf. https://www.facebook.com/events/1724355704547337/
  • 10
    Cantora e compositora de hip hop. Para suas produções, cf., por exemplo, os videoclipes de Cidade Neon (https://www.youtube.com/watch?v=jfoKc9kyEFg) e Trinks (https://www.youtube.com/watch?v=Mfv2kcp3_Rs), no qual a artista dá o tom que aparece como epígrafe desse texto.
  • 11
    Cantor e compositor de rap. Para produções que englobam não apenas videoclipes, mas performances em eventos de ativismos relativo à gênero, sexualidade e raça, cf. seu canal no Youtube: https://www.youtube.com/channel/UCM2x0ow-zepJ4c44OemhZcA
  • 12
    Rose de Melo Rocha (2019)ROCHA, Rose de Melo; SANTOS, Thiago Henrique Ribeiro. 2019. “Remediação com purpurina: bricolagens tecnoestéticas no drag-artivismo de Gloria Groove”. Revista Interin, vol. 23, n. 1: 205-220., ao tratar do trabalho da cantora Gloria Groove em artigo escrito com Thiago Santos, usa a noção de drag-artivismo. Já em artigo escrito com Aline Rezende (2019ROCHA, Rose de Melo; REZENDE, Aline. 2019. “‘Diva da Sarjeta’: ideologia enviadescida e blasfêmea pop-profana nas políticas de audiovisibilidade da travesti paulistana Linn da Quebrada”. Contracampo, vol. 38, n.1: 22-34.) sobre a obra de Linn da Quebrada, alarga um pouco a noção e fala em “artivismo musical de gênero”. Neste artigo, estou mais próximo da definição mais ampla proposta por Leandro Colling senão porque o artivismo musical - que poderia, em meu registro analítico, ser pensado como um musicar engajado e não apenas político (todos o são!) - se conecta com outras práticas éticas e estéticas. Estas vão desde espaços produzidos pelo movimento social quanto o âmbito mercadológico... e esse musicar engajado, essa aproximação intrínseca e abissal entre musicar e política, tanto constitui outras comunidades de prática quanto é constituído por elas. Para artigos programáticos sobre a noção de artivismo, ver Di Giovanni (2015)DI GIOVANNI, Julia Ruiz. 2015. “Artes de abrir espaço. Apontamentos para a análise de práticas em trânsito entre arte e ativismo”. Cadernos de Arte e Antropologia, vol.4 n.2:13-27. DOI 10.4000/cadernosaa.911
    https://doi.org/10.4000/cadernosaa.911...
    e Raposo (2015)RAPOSO, Paulo. 2015 “‘Artivismo’: articulando dissidências, criando insurgências”. Cadernos de Arte e Antropologia , vol. 4, n. 2: 3-12..
  • 13
    A noção de musicar é tradução do neologismo musicking proposto por Christopher Small (1998). Para a noção de “musicar local” ver, adicionalmente, Brucher, Reily (2018)BRUCHER, Katherine; REILY, Suzel. (Ed.). 2018. The Routledge Companion to the Study of Local Musicking. Nova York, London: Routledge., Villela, Toni, Muniagurria, Grunvald (2019)VILLELA, Alice; TONI, Flavia Camargo; MUNIAGURRIA, Lorena Avellar de; GRUNVALD, Vitor. 2019. “O musicar como trilha para a etnomusicologia”. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros, n. 73: 17-26. 10.11606/issn.2316-901X.v0i73p17-26.
    https://doi.org/10.11606/issn.2316-901X....
    , Giesbrecht, Hikiji, Grunvald (2021) e Reilly (2021).
  • 14
    Queer é um vocábulo que, em inglês, significa estranho, esquisito. Ao longo dos últimos séculos, foi sendo progressivamente associado a pessoas cujos comportamentos e expressões sexuais e de gênero não estão em conformidade com os padrões socialmente estabelecidos como legítimos, normais e desejáveis. Queerness, portanto, remeteria à não-normatividade mas, antes, à contranormatividade - expressão que vem de minha leitura de Preciado (2014[2004]), mas que poderia ser pensada como contra-hegemonia -, esta que, caracteristicamente, adere à experiência viva dessas pessoas como efeito de uma norma que é, ao mesmo tempo, cisht e racista. Devido à difícil tradução da palavra, resolvi deixá-la em inglês no texto.
  • 15
    A categoria MPBicha é utilizada pela própria Linn da Quebrada como termo relacionado (intercambiável?) com Geração Tombamento e MPBeau. Cf. https://saopaulosao.com.br/%E2%80%98%E2%80%99/% E2%80%98%E2%80%99/nossas-pessoas/2711-batemos-um-papo-reto-com-a-mc-linn-da-quebrada.html. Acessado em 05 de abril de 2021.
  • 16
    Importante também frisar que as histórias do funk no Estados Unidos e Brasil são bastante diversas. Para ficar apenas em um paralelo: toda diferença do mundo, como diria Guimarães Rosa, entre experiências como o P-funk preconizado por George Clinton na segunda metade da década de 1970, banhado como era nas orientações éticas do movimento Black Power, e os bailes de funk cariocas que passaram a se proliferar nessa mesa época no Rio de Janeiro. O que não significa dizer, é claro, que não haja política e engajamento nesse último caso. Nesse sentido, é possível dizermos que há estilos dentro de um estilo musical pensando como gênero transnacional e formal. Para discussões gerais sobre estilo musical cf., adicionalmente, Neubauer (1992 [1986])NEUBAUER, John. 1992 [1986]. La emancipación de la música. El alejamiento de la mímesis en la estética de siglo XVIII. Madrid, Visor.. Escusado dizer que tratamentos da noção de estilo mais próximos do de Hebdige (1979)HEBDIGE, Dick. 1979. Subculture. The meaning of style. London, New York: Routledge. ou, para citar um caso brasileiro, de Braga (2018)BRAGA, Gibran. 2018. “O fervo e a luta”: políticas do corpo e do prazer em festas de São Paulo e Berlim. São Paulo, Tese de doutorado, Universidade de São Paulo., ainda que se articulem com as questões aqui discutidas, discutem o termo como algo mais relativo ao que é usualmente referido como estilo de vida, aproximando-se de uma concepção de estilo que Facchini (2011)FACCHINI, Regina. 2011. “‘Não faz mal pensar que não se está só ’: estilo, produção cultural e feminismo entre as minas do rock em São Paulo”. Cadernos Pagu , n. 36: 117-153. DOI 10.1590/S0104-83332011000100006
    https://doi.org/10.1590/S0104-8333201100...
    marca como “operador da diferença”.
  • 17
    A pluralidade de percepções capazes de consolidar socialmente um estilo musical é também discutida em Turino (1993)TURINO, Thomas. 1993. Moving away from silence. Music of the Peruvian Altiplano and the experience of urban migration. Chicago, London: University of Chicago Press ..
  • 18
    Para discussões sobre violência de Estado e corpas tidas como descartáveis no contexto brasileiro, cf. Vianna, Farias (2011)VIANNA, Adriana; FARIAS, Juliana. 2011. “A guerra das mães: dor e política em situações de violência institucional”. Cadernos Pagu , n. 37: 79-116. e Grunvald (no prelo)GRUNVALD, V. (prelo). “Urban experience, youth, gender and sexuality in a LGBT family on the periphery of São Paulo”. In: CAMPOS, Ricardo; NOFRE, Jordi (Eds.). Exploring IberoAmerican Youth Street Cultures in the 21st century. Creativity, Resistance and Transgression in the City. New York: Palgrave Macmillan..
  • 19
    A distribuição diferencial a que me referi também não é apenas relacionada ao campo dos direitos, mas igualmente do próprio uso legítimo da violência. Daí porque, pensadoras, ativistas e artistas têm reivindicado uma “redistribuição desobediente de gênero e anticolonial da violência” (Mombaça, s/dMOMBAÇA, Jota. s/d. “Rumo a uma redistribuição desobediente de gênero e anticolonial da violência”. Disponível em: Disponível em: https://issuu.com/amilcarpacker/docs/rumo_a_uma_redistribuicao_da_vi . Último acesso em: 05 de abril de 2021.
    https://issuu.com/amilcarpacker/docs/rum...
    ).
  • 20
    Importante notar que a localidade, no sentido aqui compreendido, não necessariamente se sobrepõe à noção de cena musical (Benett, Peterson, 2004BENNET, Andy; PETERSON, Andy. 2004. Music Scenes. Local, translocal, and virtual. Nashville, Vanderbilt University Press.). Para uma discussão mais específica sobre outros possíveis sentidos atribuídos à localidade e a noção de cena cf., mais especificamente, Hodgkinson (2004)HODGKINSON, James. 2004. “The fanzine discourse over Post-rock”. In: BENNET, Andy; PETERSON, Andy. Music Scenes. Local, translocal, and virtual . Nashville: Vanderbilt University Press, pp.221-237..
  • 21
    Uma crescente bibliografia, no campo da administração e dos negócios, tem discutido a importância do crowdfunding na reconfiguração de relações de mercado (Howe, 2009HOWE, Jeff. 2009. Crowdsourcing: Why the Power of the Crowd Is Driving the Future of Business. Nova York, Crown Business Editors.; Lawtom, Maron, 2010LAWTON, Kevin; MARON, Dan. 2010. The Crowdfunding Revolution: How to Raise Venture Capital Using Social Media. San Francisco, Mc-Graw Hill.; Schwienbacher, Larralde, 2010SCHWIENBACHER, Armin; LARRALDE, Benjamin. 2010. “Crowdfunding of Small Entrepreneurial Ventures”. In: CUMMING, Douglas (Ed). The Oxford Handbook of Entrepreneurial Finance. Oxford: Oxford University Press.), com discussões específicas sobre o mercado musical (Scherer, Winter, 2015SCHERER, Helmut; WINTER, Carsten. 2015. “Success factors for music-based crowdfunding as a new means of financing music projects”. International Journal of Music Business Research, vol. 4, n. 1: 9-25.; Galuszka, Bystrov, 2014GALUSZKA, Patryk; BYSTROV, Victor. 2014. “A Case Study of a New Model of Financing Music Production”. Journal of Internet Commerce, vol. 13, n. 3-4: 233-252.; Galuszka, Brzozowska, 2017GALUSZKA, Patryk; BRZOZOWSKA, Blanka. 2017. “Crowdfunding and the democratization of the music market”. Media, culture and society, vol.39, n. 6: 833-849.; Gamble, Brennan, Mcadam, 2017GAMBLE, Jordan; BRENNAN, Michael; MCADAM, Rodney. 2017. “A rewarding experience? Exploring how crowdfunding is affecting music industry business models”. Journal of Business Research, vol. 70: 25-36.) que apontam para certa democratização promovida por essas tecnologias. Sobre diversos aspectos desse novo modelo de produção cultural a partir de uma plataforma específica, o Spotify, cf. Eriksson et al (2019)ERIKSSON, Maria et al. (Eds.). 2019. Spotify teardown. Inside the Black Box of Streaming Music. Cambridge, Londres: MIT Press.. Para uma análise crítica da produção musical e sonora, cf. Bennet e Bates (2018)BENNET, Samantha; BATES, Eliot. 2018. Critical approaches to the production of music and sound. New York, Bloomsbury..
  • 22
    Sobre cenas musicais DIY, cf. a coletânea DIY Cultures and Underground Musical Scenes, organizada por Andy Bennet e Paula Guerra (2008)BENNETT, Andy; GUERRA, Paula (Eds.). 2019. DIY Cultures and Underground Music Scenes. Londres e Nova York, Routledge..
  • 23
    Para perspectivas transfeministas, bem como imbróglios desta com outras correntes do feminismo e o cenário brasileiro, cf. Preciado (2010)PRECIADO, Paul. 2010. “Transfeminismo do regime fármaco-pornográfico”, transcrição de fala em junho de 2010, em, Roma. Tradução de Thiago Coacci. Disponível em: Disponível em: http://www.sxpolitics.org/wp-content/uploads/2014/12/preciado_-_transfeminismo_no_regime_farmaco-pornografico-libre.pdf . Último acesso: 05/05/21.
    http://www.sxpolitics.org/wp-content/upl...
    , Jesus (2015)JESUS, Jaqueline Gomes de. 2015. Transfeminismo: teorias e práticas. Rio de Janeiro, Metanoia., Valencia (2018)VALENCIA, Sayak. 2018. “El transfeminismo no es um generismo”. Pléyade, n. 22: 27-43., Vieira, Bagagli (2019)VIEIRA, Helena; Beatriz, BAGAGLI. 2019. “Transfeminismo”. In: HOLLANDA, Heloisa Buarque de (Ed.). Explosão feminista. São Paulo: Companhia das Letras., Bagagli (2019)BAGAGLI, Beatriz. 2019. Discursos transfeministas e feministas radicais: disputas pela significação da mulher no feminismo. Campinas, Dissertação de mestrado, Universidade Estadual de Campinas.. Para um trabalho sobre o ativismo trans brasileiro, cf. Carvalho e Carrara (2013CARVALHO, Mario F. L.; CARRARA, Sérgio. 2013. “Em direção a um futuro trans? Contribuição para a história do movimento de travestis e transexuais no Brasil”. Sexualidad, Salud y Sociedad - Revista Latinoamericana, n.14:319-351. DOI 10.1590/S1984-64872013000200015
    https://doi.org/10.1590/S1984-6487201300...
    ; 2015CARVALHO, Mario F. L.; CARRARA, Sérgio. 2015. “Ciberativismo trans: considerações sobre uma nova geração militante”. Contemporânea. Comunicação e cultura, v.13, n.2: 382-400. DOI 10.9771/contemporanea.v13i2.13865
    https://doi.org/10.9771/contemporanea.v1...
    ). Talvez, contudo, as provocações de Linn estejam mais próximas do terrorismo de Hija de Perra (2012HIJA DE PERRA. 2012. “El fin de la idealización retrógrada de la sexualidad es el mágico espiral del apocalipsis multisexual eterno”. Revista Punto Género, n.2, p.223-230.; 2014HIJA DE PERRA. 2014/2015. “Interpretações imundas de como a teoria queer coloniza nosso contexto sudaca, terceiro-mundista e pobre de aspirações, perturbando com novas construções de gênero aos humanos encantados pela heteronorma”. Periódicus, v.1, n.2: 1-8.).
  • CONTRIBUIÇÃO DE AUTORIA:

    Não se aplica
  • FINANCIAMENTO:

    A pesquisa contou com financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo por meio da bolsa de pós-doutorado (FAPESP nº 2017/20849-1) vinculada ao Projeto Temático O Musicar Local novas trilhas para a etnomusicologia (FAPESP nº 2016/05318-7).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Nov 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    04 Jun 2021
  • Aceito
    29 Out 2021
Universidade de São Paulo - USP Departamento de Antropologia. Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas. Universidade de São Paulo. Prédio de Filosofia e Ciências Sociais - Sala 1062. Av. Prof. Luciano Gualberto, 315, Cidade Universitária. , Cep: 05508-900, São Paulo - SP / Brasil, Tel:+ 55 (11) 3091-3718 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revista.antropologia.usp@gmail.com