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O Curso Normal da Esef e a formação pioneira de professores(as) de Educação Física no Rio Grande do Sul (1940- 1956) 1 1 Normalização, preparação e revisão textual: Mônica Silva (Tikinet) – revisão@tikinet.com.br.

The Normal Course of the Esef and the pioneering formation of Physical Education teachers in Rio Grande do Sul (1940-1956)

Resumo

O presente estudo tem por objetivo compreender como ocorreu a formação de professores(as) no Curso Normal da Escola Superior de Educação Física (Esef), no estado do Rio Grande do Sul, entre 1940 e 1956, período em que o referido curso se manteve em funcionamento. A construção do texto histórico foi orientada pelos pressupostos teórico-metodológicos da História Cultural, mobilizando os conceitos de práticas, representações e apropriação e compreendendo os indícios segundo o entendimento de “paradigma indiciário”. Ao cotejar e analisar os documentos de pesquisa foi possível adentrar os espaços simbólicos da Esef, demarcando o Curso Normal de Educação Física como um local de formação permeado por representações provindas de distintos grupos, que buscavam, através de suas práticas, legitimar seus discursos. Neste cenário, as mulheres passaram a ocupar diferentes posições, imprimindo sua identidade em um ambiente permeado por representações predominantemente militares e médicas.

Palavras-chave
Curso Normal de Educação Física; formação de professores(as); Escola Superior de Educação Física; história da educação física; mulheres

Abstract

The present study aims to understand how the formation of teachers occurred in the Normal Course of the School of Physical Education (SPE) in the state of Rio Grande do Sul (RS), during the period in which it remained in operation (1940-1956). The construction of the historical text was guided by the theoretical and methodological assumptions of Cultural History, mobilizing the concepts of practices, representations and appropriation and, understanding the evidence according to the understanding of the “indiciary paradigm”. Through the collating and analysis of the research documents, it was possible to enter into the symbolic spaces of the SPE, demarcating the Normal Course as a place of formation permeated by representations from different groups that sought, through their practices, to legitimize their discourses. In this scenario, women began to occupy different positions, imprinting their identity to an environment permeated by representations predominantly military and medical.

Keywords
Normal Course of Physical Education; teacher qualification; School of Physical Education; History of Physical Education; Women

Introdução

A formação de professores(as) de educação física foi impulsionada no Brasil a partir da prescrição de novas convicções políticas, levadas a feito durante as décadas de 1930 e 1940. Nesta época foi instituído um regime conhecido como Estado Novo (1937-1945), no qual se estabeleceram medidas que repercutiram em diversas dimensões do contexto nacional, dentre elas, a educacional. Nesse cenário ressoou a promulgação do Decreto-Lei nº 1.212, de 17 de abril de 1939Decreto-Lei nº 1.212, de 17 de abril de 1939 (1939, 24 de abril). Dispõe sobre a criação da Escola Nacional de Educação Física e Desportos. Diário Oficial da União, seção 1, p. 49. Recuperado de http://www2.camara.leg.br/legin/fed/declei/1930-1939/decreto-lei-1212-17-abril-1939-349332-norma-pe.html
http://www2.camara.leg.br/legin/fed/decl...
, cujos desígnios determinavam, além da criação da Escola Nacional de Educação Física e Desportos (ENEFD) – atual Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) –, a organização de outras instituições de ensino superior em estados brasileiros.

No Rio Grande do Sul, em 6 de maio de 1940, foi oficialmente instituída a Escola Superior de Educação Física (Esef), atual Escola de Educação Física, Fisioterapia e Dança (Esefid), da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). No caminho por delinear sua representatividade para o estado, constatamos que a Esef foi a primeira instituição estabelecida com a finalidade de formar professores(as) de educação física (Mazo & Pereira, 2005Mazo, J. Z., & Pereira, P. G. (Orgs.). (2005). Escola de Educação Física da Universidade Federal do Rio Grande do Sul – Esef-UFRGS. Atlas do Esporte no Brasil. Recuperado de http://www.crefrs.org.br/atlas/cd/texto/esef.pdf
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). Nesta mesma direção, ressaltamos que se manteve como a única instituição a desempenhar tal função pelos 30 anos que se seguiram após sua criação (Lyra, 2013Lyra, V. B. (2013). A criação da Escola Superior de Educação Física do Rio Grande do Sul: Formação de professoras(es) para a construção do campo (1940-1970). Tese de Doutorado. Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre.).

A entrada da Esef no campo da formação do professorado sul-rio-grandense se fez sólida a partir do oferecimento do Curso Normal de Educação Física, sendo este o primeiro curso de formação a ser oferecido pela instituição. Assim, tendo por desígnio preparar professores(as) para atuar na educação física escolar, o Curso Normal representou uma das iniciativas de maior relevância para a construção do campo da educação física no Rio Grande do Sul. Tal assertiva é reafirmada a partir do momento em que a Esef foi reconhecida pelo Governo Federal, no ano de 1939, como a única instituição apta no estado a emitir diplomas de formação profissional na área. Diante dessas proposições, o presente estudo tem por objetivo compreender como ocorreu a formação de professores(as) no Curso Normal da Esef do estado do Rio Grande do Sul, no período em que este se manteve em funcionamento (1940-1956)2 2 A partir de 1957, iniciou-se na Esef o Curso de Educação Física Infantil, que assumiu o papel até então desempenhado pelo Curso Normal, ou seja, o de habilitar professores(as) de educação física para o magistério primário. .

Para tanto, o estudo está sustentado no referencial teórico-metodológico da História Cultural, especialmente por mobilizar os conceitos de práticas, representações e de apropriação (Chartier, 1988Chartier, R. (1988). A História Cultural: entre práticas e representações (M. M. Galhardo, trad.). Lisboa: Difusão., 2009; Hunt, 1992Hunt, L. (1992). A nova história cultural. São Paulo: Martins Fontes.). Para Chartier (1988, pp. 16-17), a história cultural tem por objetivo “identificar o modo como em diferentes lugares e momentos uma determinada realidade social é construída, pensada e dada a ler”. Assim, a construção deste texto histórico foi orientado no sentido de compreender o Curso Normal da Esef como um ambiente de práticas, legitimadas e representadas por distintos discursos que coexistiam no cenário investigado. Estes, por sua vez, foram apropriados por sujeitos que vivenciaram, de diferentes posições, aquele espaço formativo.

De tal modo, a escrita deste texto histórico foi norteada por proposições de Certeau (2017, p. 46)Certeau, M. (2017). A escrita da história (M. L. Menezes, trad.). Rio de Janeiro: Forense., que considera a história como uma operação. Desta forma, buscamos, “de maneira necessariamente limitada, compreendê-la como a relação de um lugar, procedimentos de análise e a construção de um texto”. O discurso historiográfico produzido, além de fabricar uma realidade, também faz parte desta, uma vez que “uma leitura do passado, por mais controlada que seja pela análise dos documentos, é sempre dirigida por uma leitura do presente” (Certeau, 2017Certeau, M. (2017). A escrita da história (M. L. Menezes, trad.). Rio de Janeiro: Forense., p. 8). Neste sentido o historiador, enquanto sujeito da operação, manipula indícios do passado para produzir documentos ou, conforme Certeau (2017, p. 69)Certeau, M. (2017). A escrita da história (M. L. Menezes, trad.). Rio de Janeiro: Forense., “transforma alguma coisa, que tinha sua posição e seu papel, em alguma outra coisa que funciona diferentemente”.

A partir de tais prerrogativas, os vestígios localizados foram compreendidos segundo o entendimento de “paradigma indiciário” de Carlo Ginzburg (1989)Ginzburg, C. (1989). Mitos, emblemas, sinais: morfologia e história (F. Carotti, trad.). São Paulo: Companhia das Letras., buscando interpretá-los em suas particularidades e pormenores. De modo pontual, foram analisados os seguintes documentos: Regimento do Departamento Estadual de Educação Física (Deef); Histórico da Esef, Programas de Ensino referentes às disciplinas do Curso Normal da Esef, Relação de matrículas do Curso Normal de Educação Física da Esef (1940-1956), Quadros docentes (1940/1941 e 1955), dispositivos legais, além de um grupo de “documentos orais” (Alberti, 2005Alberti, V. (2005). Manual de história oral. Rio de Janeiro: Editora FGV., p. 24). Estes, embora não tenham sido produzidos especificamente para o estudo, nos auxiliaram sobremaneira na compreensão das singularidades da formação ocorrida no Curso Normal da Esef, a partir das representações construídas pelos sujeitos que vivenciaram aquele ambiente. Para Alberti (2005)Alberti, V. (2005). Manual de história oral. Rio de Janeiro: Editora FGV., as entrevistas depois de transcritas, transformam-se em documentos orais, os quais passam a representar uma interpretação do passado, atualizada através da linguagem falada.

Os referidos materiais de pesquisa foram cotejados com estudos particulares que se aproximam da temática tratada neste artigo. Tais produções foram localizadas a partir de um “estudo da questão”, o qual, segundo Certeau (2017)Certeau, M. (2017). A escrita da história (M. L. Menezes, trad.). Rio de Janeiro: Forense., diz respeito à relação que o texto histórico em construção mantém com “as problemáticas exploradas pelo grupo e os pontos estratégicos que os constituem”. Desta forma, “cada resultado individual se inscreve numa rede cujos elementos dependem estritamente uns dos outros, e cuja combinação dinâmica forma a história num momento dado” (p. 57). Ao relacionarmos tais conceitos teóricos e orientações com os indícios e fragmentos selecionados à pesquisa, construímos um texto histórico, cujos resultados são apresentados nos tópicos que seguem.

Particularidades da formação docente no Curso Normal da Esef

A Esef, criada no Rio Grande do Sul no princípio da década de 1940, pode ser considerada parte de um projeto de desenvolvimento do ensino superior, levado a feito durante o contexto político conhecido como Estado Novo (1937-1945) (Bomeny, 1999Bomeny, H. M. B. (1999). Três decretos e um mistério: a propósito da educação no Estado Novo. In D. Pandolfi (Org.), Repensando o Estado Novo (pp. 137-166). Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas.). Permeados por uma concepção unitária e pela normatização de procedimentos, os discursos enunciados do ponto de vista legal buscavam reorganizar inúmeras esferas sociais do país, dentre as quais, a educativa. A educação física, como parte do projeto de reforma educacional, precisou moldar-se aos novos preceitos, sobretudo no que se referia à expansão da formação profissional em nível superior.

Esses discursos ressoaram em diversos estados brasileiros, portando enunciados que solicitavam a concretização dos anseios pretendidos. Diante disso, embora a Esef tenha sido criada oficialmente no dia 6 de maio de 1940, as articulações políticas e organizacionais para instituí-la foram delineadas anteriormente. Dentre as medidas que podem ser demarcadas como bases para estruturar uma escola de formação no cenário sul-rio-grandense, está uma proposta para criação do Departamento Estadual de Educação Física (Deef), no ano de 1939.

Essa solicitação partiu do dr. José Pedro Coelho de Souza e buscava atender as determinações provindas do general Oswaldo Cordeiro de Farias, então interventor federal no Rio Grande do Sul. Contudo, antes que o Deef fosse instituído na estrutura administrativa estadual, foi preciso reorganizar secretarias e departamentos que compunham este arranjo. Acerca desta questão, as informações localizadas nos documentos legais, especialmente no Decreto-Lei nº 31, de 6 de setembro de 1940Decreto-lei nº 31, de 6 de setembro de 1940 (1940, 6 de setembro). Desmembra a Secretaria de Estado dos Negócios da Educação e Saúde Pública, em Secretaria da Educação do Rio Grande do Sul e Departamento Estadual de Saúde. Diário Oficial do estado do Rio Grande do Sul, seção 1., nos levaram a crer que, para o Deef ser vinculado à Secretaria de Educação, antes foi preciso desmembrar a então Secretaria de Estado dos Negócios da Educação e Saúde Pública, na Secretaria da Educação e no Departamento Estadual de Saúde (Rio Grande do Sul, 1940, pp. 289-291).

Podemos conjecturar que, a despeito de a proposta de criação do Deef ser norteada pelo anseio primeiro de estruturar e orientar a educação física do estado, tal proposição precisou ser inserida em uma estrutura administrativa já consolidada. Por conta disso, solicitou-se, mesmo que indiretamente, a remodelação de um quadro para inserir o novo departamento. Desta forma, o Rio Grande de Sul, ao se apropriar dos discursos proferidos em âmbito federal em prol da formação superior em educação física, sentiu as ressonâncias deste movimento em diversas esferas, sobretudo naquela que deveria comportar a estruturação e inclusão de um novo órgão administrativo.

Em meio ao processo de reconstrução nacional e reorganização de instâncias administrativas do estado, a Esef foi posta em funcionamento. De modo paralelo, o Deef também iniciou suas atividades no ano de 1940, como órgão que regulamentava as práticas da Escola. Para o cargo de diretor de ambas as instituições – que, embora distintas, confundiam-se em seus limites administrativos – foi nomeado o capitão da Brigada Militar, Olavo Amaro da Silveira. Ao que parece, o Deef, enquanto órgão regulador, e a Esef, como local prescrito, assumiram um sentido compartilhado em suas organizações.

Após assumir a direção do Deef e da Esef, o capitão Silveira tratou de montar um grupo de trabalho, composto pelos professores Waldir Calvet Echart, Frederico Guilherme Gaelzer, João Gomes Moreira Filho e Max Hebert Hanke (Gutierrez, 1971Gutierrez, W. (1971). Histórico da Escola Superior de Educação Física da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre. Recuperado de http://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/123456789/471/RV00177.pdf
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). Dentre os atributos que aproximaram quase todos esses nomes, à exceção apenas do professor Gaelzer, estava a atuação na Brigada Militar de Porto Alegre (RS). Esta característica, além de estar registrada no Histórico da Escola Superior de Educação Física da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, produzido pelo professor Washington Gutierrez quando do 32º aniversário da instituição (1971), também permaneceu nas lembranças de pessoas que vivenciaram de alguma forma a Escola durante o período.

Como exemplo do exposto, destacamos o depoimento de Olga Kroeff Echart, que experienciou a Esef de diferentes ângulos, especialmente por ter ocupado distintos lugares dentro da instituição. Aluna da primeira turma do Curso Normal de Educação Física, ex-professora e também esposa de Waldir Echart, seu depoimento externalizou o que sua memória julgou significativo reter ao longo dos anos, afinal, conforme Chartier (2009, p. 21)Chartier, R. (2009). A história ou a leitura do tempo (C. Antunes, trad.). Belo Horizonte: Autêntica., a memória “dá acesso a acontecimentos que se consideram históricos e que nunca foram a recordação de ninguém”. Desta forma, partindo da compreensão de que cada sujeito significa os acontecimentos conforme constrói a própria representação sobre eles, em depoimento Olga destacou que seu marido atuava na Brigada Militar de Porto Alegre quando fora cedido para trabalhar na instituição que estava sendo criada. Antes disso, todavia, cursou Educação Física na ENEFD (Echart, 2004Echart, O. V. K. (2004). Olga Valéria Kroeff Echart: depoimento (K. Dalsin, & G. Frizzo, Entrevistadores). Porto Alegre: Centro de Memória do Esporte/UFRGS. Recuperado de http://www.lume.ufrgs.br/handle/10183/50000
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).

Olga ainda menciona que “a maioria dos professores de educação física do Rio Grande do Sul, naquela época [início da década de 1940], eram militares e eles eram mandados ‘a tirar’ o curso de Educação Física no Rio [Rio de Janeiro]. Foram poucos professores leigos que atuaram na Esef” (Echart, 2004Echart, O. V. K. (2004). Olga Valéria Kroeff Echart: depoimento (K. Dalsin, & G. Frizzo, Entrevistadores). Porto Alegre: Centro de Memória do Esporte/UFRGS. Recuperado de http://www.lume.ufrgs.br/handle/10183/50000
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, p. 8)3 3 Ressaltamos que nos mantivemos fiéis às transcrições dos depoimentos consultados. Portanto, não alteramos a escrita, apenas complementamos as falas com pequenos apontamentos entre colchetes. . Esse trecho nos leva a pensar que, ao posicionar os professores militares em lugar distinto daqueles considerados “leigos”, Olga demonstra sua percepção sobre os atores que possuíam certa legitimidade no trato da educação física no período. Talvez os “leigos” a quem se refere em sua formulação sejam os professores civis, que posteriormente vieram a se formar em Educação Física em instituições de ensino superior e que não possuíam experiência militar prévia.

Ao percorrermos os rastros do passado por meio dos materiais de pesquisa (Ginzburg, 1989Ginzburg, C. (1989). Mitos, emblemas, sinais: morfologia e história (F. Carotti, trad.). São Paulo: Companhia das Letras.), percebemos que, além de Waldir Echart, os tenentes Moreira Filho e Hanke também desempenhavam funções na Brigada Militar de Porto Alegre. Estes, por sua vez, obtiveram formação superior na Escola de Educação Física do Exército (Esefex)4 4 A Esefex foi criada em 1933, sendo estabelecida a partir do Centro Militar de Educação Física (CMEF), que havia sido fundado na Vila Militar, no ano de 1922. Para Ferreira Neto (1999, p. 50), a Esefex representa a “célula mater” da formação de profissionais de educação física no país. . Na interpretação de Ferreira Neto (1998)Ferreira Neto, A. (1999). A pedagogia do exército e na escola: a Educação Física brasileira (1880-1950). Vitória: Facha., a ação mais efetiva da Esefex consistiu em preparar professores civis para atuação na área. Segundo o autor, os profissionais formados pela instituição contribuíram para estruturar novos cursos de formação em educação física, em diversos estados do país, a partir da década de 19305 5 No período destacaram-se ações desta natureza nos seguintes estados: Espírito Santo, São Paulo, Minas Gerais, Pernambuco, Pará, Bahia, Santa Catarina e Rio Grande do Sul (Ferreira Neto, 1998). .

Além dos nomes mencionados, os tenentes auxiliares da Divisão Técnica do Deef, Nelson Futuro Rocha e Flory Viterbo Barbosa, também se formaram na Esefex. Seus nomes estão igualmente registrados no quadro de docentes da Esef de 1940, ou seja, ambos exerciam dupla função, como auxiliares técnicos do Deef e docentes da Esef. O médico capitão Ruy Gaspar Martins, que compunha a Divisão de Biologia do Deef e, ainda, o quadro de professores da Esef, também se formou na Esefex. Integravam, ainda, a Divisão de Biologia o médico capitão Raymundo Bezerra de Menezes, o médico Poli Marcellino Espírito e o médico capitão Adhemar Pinto Torelly (Decreto nº 811/1943; Gutierrez, 1971Gutierrez, W. (1971). Histórico da Escola Superior de Educação Física da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre. Recuperado de http://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/123456789/471/RV00177.pdf
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).

Diante do exposto na documentação consultada, foi possível estabelecer pontos de interlocução entre o Deef e a Esef. Além de o diretor exercer função administrativa em ambas as organizações, outros recursos humanos dividiam cargas horárias entre as tarefas burocráticas do Deef e as atividades de ensino na Esef. Conforme se tornou perceptível, a maioria desses personagens pertencia a dois grupos, a saber: médicos e militares. Para Castellani Filho (1988)Castellani Filho, L. (1988). Educação Física no Brasil: a história que não se conta. Campinas: Papirus., tanto as instituições militares quanto a categoria médica contribuíram para construir o campo da educação física no Brasil, em diferentes momentos históricos.

Todavia, embora ambos os grupos estivessem presentes nas estruturas do Deef e da Esef, suas posições e atividades eram distintas. No Deef, os médicos compunham, sobretudo a Divisão de Biologia, enquanto na Esef assumiram o ensino das disciplinas de caráter predominantemente teórico e biológico. Os militares, por sua vez, vinculavam-se à Divisão Técnica do Deef e, na Esef, responsabilizavam-se pelo ensino de saberes disciplinares predominantemente práticos (Begossi, 2017Begossi, T. D. (2017). A construção dos saberes disciplinares do Curso Normal da Escola Superior de Educação Física do estado do Rio Grande do Sul. Dissertação de Mestrado. Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre.).

Nesta direção, é possível pensar a Esef como ambiente de formação permeado por representações provindas de distintos grupos, os quais buscavam, através de suas práticas, legitimar seus discursos. Para Chartier (1988, p. 17)Chartier, R. (2009). A história ou a leitura do tempo (C. Antunes, trad.). Belo Horizonte: Autêntica. “as representações do mundo social …, embora aspirem à universalidade de um diagnóstico fundado na razão, são sempre determinadas pelos interesses de grupo que as forjam”. Deste modo, os discursos proferidos estão relacionados, sobretudo à posição ocupada por quem os utiliza ou mesmo por quem os constrói. Assim, a análise dos indícios nos documentos consultados permitiu assinalar determinados pressupostos vinculados a estes grupos, os quais buscavam orientar a formação profissional que estava sendo posta no Curso Normal de Educação Física.

Ao comparar a carga horária de cada disciplina vinculada à Divisão de Biologia do Deef6 6 A saber: anatomia humana aplicada, biometria, cinesiologia aplicada, fisioterapia, higiene aplicada e socorros de urgência. com a daquelas atreladas à Divisão Técnica do mesmo órgão7 7 A saber: canto coral, desportos aquáticos, desportos de ataque e defesa, desportos terrestres coletivos, desportos terrestres individuais, educação física geral feminina, ginástica rítmica, história da educação física e dos desportos, metodologia da educação física, organização da educação física e dos desportos, ritmo e tênis feminino. , foi possível demarcar numericamente a superioridade de aulas destinadas aos saberes deste último grupo. Assim, enquanto as matérias predominantemente práticas, ministradas pelos militares, perfaziam um total de 646 aulas/sessões, os saberes teóricos, orientados na Esef pelos médicos, computavam 175 aulas/sessões (Esef, 1940).

Essas características nos permitem refletir acerca do predomínio de um caráter prático e técnico manifesto nos Programas de Ensino das disciplinas do Curso Normal da Esef, especialmente nas disposições de tempo para cada saber disciplinar. Ao considerarmos os Programas de Ensino como documentos que descrevem ações simbólicas do passado, nossas interpretações se apoiam nos argumentos de Hunt (1992, p. 18)Hunt, L. (1992). A nova história cultural. São Paulo: Martins Fontes., para quem os textos do passado “não são inocentes e transparentes; foram escritos por autores com diferentes intenções e estratégias”. Diante dessas proposições, podemos ponderar que os Programas de Ensino representavam um artefato de disputa simbólica, expondo as delimitações de conteúdo, sequências pedagógicas e carga horária de cada saber vinculado à formação no Curso Normal da Esef.

Diretamente relacionado a essas disputas estava o fato de a elaboração do Programa de Ensino ser responsabilidade do professor da matéria. Esta orientação havia sido prevista pelo Decreto-Lei 1.212/1939, especificamente no artigo 29º, que destacava: “para cada disciplina haverá um programa que será elaborado pelo professor catedrático dela encarregado e deverá ter a aprovação do Conselho Técnico Administrativo” (p. 5, ênfase adicionada). Isso nos permite posicionar os professores do Curso Normal de Educação Física, inicialmente médicos e militares, como sujeitos autorizados a determinar os conhecimentos que seriam dispostos ao ensino, bem como a quantidade de aulas para cada um. Neste campo de disputas simbólicas, onde se buscava legitimar os conhecimentos tidos como essenciais à formação profissional recém-criada, as práticas provindas de ambos os grupos “exibiam maneiras próprias de estar no mundo”, buscando “significar simbolicamente um estatuto e uma posição” (Chartier, 1988Chartier, R. (1988). A História Cultural: entre práticas e representações (M. M. Galhardo, trad.). Lisboa: Difusão., p. 23).

As disputas internas pela legitimação das posições ocupadas por médicos e militares no Curso Normal da Esef talvez tenham passado despercebidas no ponto de vista de ex-estudantes da instituição, durante seus anos iniciais de atividade. Todavia, a demarcação de suas presenças parece ter sido significativa, a ponto de permanecer na memória dos sujeitos formados. Nos discursos proferidos por ex-alunas do Curso Normal tornaram-se notórios enunciados comuns que demarcavam práticas com viés médico e militar. Nas narrativas de Ilse Guterres (2004)Guterres, I. E. (2004). Ilse Engel Guterres: depoimento (K. Dalsin, Entrevistadora). Porto Alegre: Centro de Memória do Esporte/UFRGS. Recuperado de http://www.lume.ufrgs.br/handle/10183/50017
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, Yula Green Hervé (2004)Hervé, I. M. G. (2004). Iula Maria Green Hervé: depoimento (K. Dalsin, Entrevistadora). Porto Alegre: Centro de Memória do Esporte/UFRGS. Recuperado de http://www.lume.ufrgs.br/handle/10183/50015
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e Ademira Tagliare (2010)Tagliare, A. (2010). Ademira Tagliare: depoimento (V. Lyra, Entrevistadora). Porto Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul. figuraram representações acerca da organização das práticas e dos tempos que perpassavam o ambiente de ensino. Segundo elas, antes mesmo de iniciarem as aulas, todos(as) os(as) discentes precisavam posicionar-se em frente ao pavilhão para cantar o Hino Nacional. Posteriormente, iniciavam-se as aulas teóricas e práticas. De modo detalhado, a aluna Zilca Rossi Montanari (2011)Montanari, Z. R. (2011). Zilca Rossi Montanari: depoimento (V. Lyra, Entrevistadora). Caxias do Sul: Universidade Federal do Rio Grande do Sul. descreve sua percepção da rotina vivenciada na Esef:

De início, de manhã, tinham as aulas práticas. Sete e meia, o Tenente Moreira, a lá moda de soldado ia para o meio do campo e soava o apito. A turma toda lá, em ordem, cumprindo com seus monitores. Ali, então, trazia uma tabela com o que nós íamos receber. Se era Educação Física Geral, se era Atletismo, se era Jogo. Cada horário estava ali. Eram três aulas. Sete e meia em ponto começava, até as dez “e pouco”. Nesse tempo, tínhamos três aulas práticas. Após, tinha um pequeno recreio. Depois, íamos lá para o pavilhão, onde tinha duas aulas teóricas. Também lá, de acordo com a tabela, nós víamos se hoje era cinesiologia, amanhã anatomia, história… Nós íamos lá naquele quadro, exposto logo na entrada, para ver o que nós tínhamos no dia. Se nós tivéssemos, por exemplo, Ginástica Rítmica, tinha que estar com o uniforme de Ginástica Rítmica. Semanalmente tinha lá, a previsão do trabalho.

(Montanari, 2011Montanari, Z. R. (2011). Zilca Rossi Montanari: depoimento (V. Lyra, Entrevistadora). Caxias do Sul: Universidade Federal do Rio Grande do Sul., p. 8, ênfase adicionada)

Além de demarcar a organização dos tempos da Esef, esse trecho revela as percepções da ex-aluna sobre as estratégias de organização do ensino. Em seu depoimento, Montanari (2011)Montanari, Z. R. (2011). Zilca Rossi Montanari: depoimento (V. Lyra, Entrevistadora). Caxias do Sul: Universidade Federal do Rio Grande do Sul. destaca a presença de um quadro localizado na entrada do pavilhão de aulas, onde se expunham a grade horária e as disciplinas de cada dia da semana. Essa prática era de responsabilidade da Seção Didática do Deef e estava prevista no Regimento Interno do referido órgão. Em seu artigo 12, da Seção III, o documento descrevia que era competência da Seção Didática “confeccionar os quadros horários semanais, planos e horários de exames, de acôrdo8 8 Optamos por manter a grafia das palavras conforme os documentos consultados nos apresentaram. com os esboços ou instruções do Chefe da Divisão” (Decreto 811/1943Decreto nº 811, de 2 de agosto de 1943 (1943, 2 de agosto). Aprova o Regimento Interno do Departamento de Educação Física. Diário Oficial do estado do Rio Grande do Sul, seção 1.).

Ainda, no discurso da ex-aluna do Curso Normal (Montanari, 2011Montanari, Z. R. (2011). Zilca Rossi Montanari: depoimento (V. Lyra, Entrevistadora). Caxias do Sul: Universidade Federal do Rio Grande do Sul., p. 8) foi possível identificar algumas expressões que nos remetem a práticas com características militares, tais como “a lá moda de soldado”, “soava o apito”, “A turma toda lá, em ordem”, “tinha que estar com o uniforme”. Por meio dessas evidências notamos que, apesar de a Esef ter sido estabelecida como a primeira instituição voltada à formação de professores civis de educação física no estado, suas práticas durante os primeiros anos portavam representações militares, as quais foram resguardadas nas memórias de ex-alunas do Curso Normal. Tais representações são evidenciadas por seus discursos, os quais demarcam a rigidez com que eram tratados os hábitos, as organizações internas da instituição e seus espaços.

A formulação narrada pela ex-aluna Anna Tereza Morais (2010)Morais, A. T. (2010). Anna Thereza Morais: depoimento (V. Lyra, Entrevistadora). Porto Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul. abona a presença expressiva de médicos e militares. Ao discorrer sobre o período em que frequentara a instituição, no ano de 1941, Anna mencionou que “na escola eram só militares no primeiro ano. No segundo, já tinha uma ou duas professoras, mas só na ‘parte física’. Na teoria eram somente os militares, além dos médicos” (p. 5). Diante do exposto, o relato da ex-aluna (2010), parece reiterar a posição hegemônica ocupada por médicos e militares no quadro docente da Esef, revelando que, a partir do segundo ano de atividades, a instituição incluiu em seu grupo de docentes novos nomes.

O depoimento de Anna Tereza Morais (2010)Morais, A. T. (2010). Anna Thereza Morais: depoimento (V. Lyra, Entrevistadora). Porto Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul. refere-se à inclusão de professoras mulheres no quadro docente da Esef. Estas, por sua vez, faziam parte do primeiro grupo de professores(as) formadas pelo Curso Normal de Educação Física e que, depois de obterem seus diplomas, foram convidadas a fazer parte do corpo docente da instituição, ocupando inicialmente a posição de “professoras auxiliares”. Neste sentido, percebe-se que as mulheres ocuparam distintas posições na Esef, especificamente no Curso Normal.

As mulheres no Curso Normal de Educação Física da Esef

O Curso Normal de Educação Física da Esef foi frequentado por um número expressivamente superior de mulheres. Em sua primeira turma, por exemplo, matricularam-se 124 alunos, sendo 26 homens e 98 mulheres. Ressaltamos que esta característica se manteve nos anos subsequentes; durante todo o período de vigência do Curso Normal (1940-1956), a maior parte das matrículas foi preenchida por alunas. Estas análises foram possíveis pela consulta à relação completa dos nomes de estudantes matriculados(as) no Curso Normal da instituição9 9 Os dados numéricos relacionados à matrícula de alunos e alunas no Curso Normal da Esef foram os seguintes: 1940 – 98 mulheres (M), 26 homens (H); 1941 – 62 M, nenhum homem (NH); 1942 – 48 M, NH; 1943 – 43 M, NH; 1944 – 39 M, 1 H; 1945 – 19 M, NH; 1946 – 4 M, NH; 1947 – 7 M, NH; 1948 – 11 M, NH; 1949 – 4 M, NH; 1950 – 4 M, NH; 1951 – 3 M, 3 H; 1952 – 3 M, NH; 1953 – 3 M, NH; 1954 – 12 M, NH; 1955 – 14 M, NH; 1956 – 29 M, 4 H (Esef, 1956). .

Dentre as exigências para ingressar no Curso Normal da Esef estava a apresentação de diploma de normalista, documento que comprovava a conclusão dos estudos em escolas normais (Brasil, 1939). Neste sentido, além de firmar-se no campo sul-rio-grandense como precursora na formação de professores(as) da área, a Esef, através de seu Curso Normal, foi pioneira também “na emergência de um(a) novo(a) profissional: o(a) Normalista Especializado(a) em Educação Física” (Lyra, 2013Lyra, V. B. (2013). A criação da Escola Superior de Educação Física do Rio Grande do Sul: Formação de professoras(es) para a construção do campo (1940-1970). Tese de Doutorado. Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre., p. 149). De tal modo, esse curso não apenas interligou uma formação normalista obtida em escolas normais com uma superior, na Esef, mas também representou um ambiente onde se processavam diferentes discursos relacionados à educação física.

Ao lado dos já mencionados discursos médicos e militares que perpassavam as práticas educacionais da Esef, os(as) normalistas que ingressavam no Curso Normal de Educação Física também traziam um discurso já formulado acerca dessa disciplina. Este era sustentado por práticas apreendidas durante a formação obtida em escolas normais, visto que a “gymnastica sueca”, assim escrita em razão da grafia da época, compunha o grupo de conteúdos vinculados à matéria de Pedagogia destas instituições, desde o ano de 1909 (Decreto 1.479/1909Decreto nº 1.479, de 26 de maio de 1909 (1909, 26 de maio). Modifica o programma do ensino complementar e crea collegios elementares no estado. In Rio Grande do Sul. Leis, decretos e actos do Governo do Estado do Rio Grande do Sul (pp. 207-210). Porto Alegre.)10 10 Sobre a educação física no currículo da Escola Normal de Porto Alegre, consultar Lyra, Begossi & Mazo (2016); Lyra, Mazo & Begossi (2018) e Begossi, Mazo, Pereira & Silveira (2019). .

Aliada à formação em escolas normais – que incluía, conforme visto, a prática da ginástica sueca –, também ressaltamos como característica comum, especialmente entre as alunas normalistas, a experiência docente, obtida através do trabalho em escolas estaduais localizadas na região metropolitana ou no interior do Rio Grande do Sul. Assim, além dos discursos aprendidos e formulados acerca da educação física durante a formação em escolas normais, a maioria das alunas que passou a frequentar o Curso Normal da Esef também trouxe em sua bagagem conhecimentos docentes e pedagógicos, adquiridos na atuação em escolas estaduais.

Quanto às motivações que podem ter conduzido essas professoras normalistas a buscarem nova formação no Curso Normal de Educação Física da Esef, destaca-se a emergência de um ambiente de possibilidades que começou a ser estruturado a partir da promulgação da Constituição Federal de 1937Constituição dos Estados Unidos do Brasil, de 10 de novembro de 1937 (1937, 10 de novembro). Diário Oficial, seção 1. Recuperado de http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao37.htm
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Con...
. Esta normativa estabeleceu a obrigatoriedade da educação física em todos os níveis e graus de ensino do país, solicitando a formação de docentes para atuação com a disciplina. Nesta direção, as professoras normalistas provavelmente vislumbraram a possibilidade de se aperfeiçoarem na área e, na mesma medida, sanar a necessidade de professores(as) de educação física para as escolas primárias do estado.

As aulas do Curso Normal da Esef ocorriam durante um intenso ano de estudos. As alunas deveriam cumprir todo o programa de conteúdos, composto por cerca de 20 disciplinas principais, divididas em aulas teóricas e práticas. Para dar conta do aprendizado desses saberes, a grade horária foi distribuída, inicialmente, em turno integral. Cabe referir que a Esef não possuía sede própria durante seus primeiros anos de atividade, então as alunas precisavam se deslocar por diferentes espaços de Porto Alegre para cumprirem a rotina imposta pelo curso11 11 As aulas de educação física geral, desportos terrestres individuais e coletivos ocorriam no Estádio General Ramiro Souto, no Parque Farroupilha (Redenção); no Salão de Ginástica do Ginásio Bom Conselho eram ministradas as aulas de ginástica rítmica; no Lago do Parque Farroupilha aconteciam as aulas de canoagem; no Yatch Club e na piscina do Grêmio Náutico Gaúcho, as de natação; no Grupo Escolar Paula Soares eram ministradas as aulas de canto coral; e no Instituto de Química Industrial, da Universidade de Porto Alegre, as aulas teóricas (Gutierrez, 1971; Mazo, 2005). . Em razão disso, foi possível pontuar nas narrativas das ex-alunas lembranças do desgaste físico durante o período em que frequentaram o Curso Normal da Esef. Maria de Lourdes Fonseca (2010)Fonseca, M. L. (2010). Maria de Lourdes Fonseca: depoimento (V. Lyra, Entrevistadora). Porto Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul. declara não ter se arrependido de buscar a formação em educação física. Entretanto, recorda-se que durante o período de estudos emagrecera muito: “ora, perder 12 quilos em nove meses é um bocado, não é?” (p. 1). Tais palavras nos remetem ao teor das práticas educacionais do Curso Normal da Esef, sobretudo à exigência por uma boa condição física. Segundo a ex-aluna, “foi muito bruto o que nos fizeram. Em nove meses fazer o que foi feito após em três anos, não é? Nós éramos noventa, noventa e duas moças e tínhamos trinta e tantos professores” (Fonseca, 2010Fonseca, M. L. (2010). Maria de Lourdes Fonseca: depoimento (V. Lyra, Entrevistadora). Porto Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul., p. 2).

As lembranças externalizadas pela ex-aluna Quintina Paccini (2005)Paccini, Q. C. M. L. R. C. (2005). Quintina Cândida Marna Letícia Rachel Crocco Paccini: depoimento (K. Dalsin, Entrevistadora). Porto Alegre: Centro de Memória do Esporte/UFRGS. Recuperado de http://www.lume.ufrgs.br/handle/10183/50031
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retratam a presença de profissionais para atender estudantes que necessitavam de apoio no primeiro ano do curso. Entre eles figuravam os médicos, que, segundo Quintina, “assistiam as aulas e davam toda a assistência aos alunos”. Para ela, “o primeiro ano foi difícil, pois muitos alunos terminaram muito estressados. Primeiro porque era um acúmulo de matéria …. Não podia faltar à aula de maneira alguma. Um dia que faltasse era uma grande perda” (p. 10). Diante das compreensões enunciadas pelos depoimentos de Paccini (2005)Paccini, Q. C. M. L. R. C. (2005). Quintina Cândida Marna Letícia Rachel Crocco Paccini: depoimento (K. Dalsin, Entrevistadora). Porto Alegre: Centro de Memória do Esporte/UFRGS. Recuperado de http://www.lume.ufrgs.br/handle/10183/50031
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e Fonseca (2010)Fonseca, M. L. (2010). Maria de Lourdes Fonseca: depoimento (V. Lyra, Entrevistadora). Porto Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul., é possível pensar que nos primeiros anos do Curso Normal da Esef havia certo sentido de inauguração em suas práticas. As disciplinas com viés de ensino prático eram as que mais exigiam preparo físico das alunas, sobretudo pela exaustão relatada.

Neste caminho, se é compreensível que os atores sociais elaboram representações acerca dos acontecimentos que vivenciaram no passado, estas, por sua vez, “não são simples imagens, verdadeiras ou falsas, de uma realidade que lhes seria externa; elas possuem uma energia própria que leva a crer que o passado é, efetivamente, o que dizem que é” (Chartier, 2009Chartier, R. (2009). A história ou a leitura do tempo (C. Antunes, trad.). Belo Horizonte: Autêntica., pp. 51-52). E para as ex-alunas que narraram suas percepções do período em que frequentaram o Curso Normal da Esef, a solicitação de uma disciplina rígida, voltada à prática corporal, se sobressaiu às demais experiências vivenciadas a ponto de marcar suas lembranças e de ser relatada através da narrativa historiográfica. Tais representações, por sua vez, não foram formuladas necessariamente de modo similar entre as alunas que frequentaram a instituição, pois a realidade social é significada por cada sujeito, conforme suas posições e interesses (Chartier, 1988Chartier, R. (1988). A História Cultural: entre práticas e representações (M. M. Galhardo, trad.). Lisboa: Difusão.).

As mulheres ingressaram na Esef, pontualmente no Curso Normal, ocupando primeiro a posição de alunas. Apesar de portarem em sua bagagem intelectual conhecimentos incipientes sobre educação física, adquiridos na Escola Normal, e mesmo tendo experiência prática com o trabalho em escolas estaduais, o arranjo articulado nesse curso situava-as como receptoras de conteúdos. A transmissão desses ensinamentos estava a cargo dos professores médicos e militares, os quais detinham a legitimidade de ensinar os saberes do campo. Conforme já acenava Lyra (2013, p. 219)Lyra, V. B. (2013). A criação da Escola Superior de Educação Física do Rio Grande do Sul: Formação de professoras(es) para a construção do campo (1940-1970). Tese de Doutorado. Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre., “o quadro de soberania da presença de mulheres no grupo de alunos se invertia no grupo dos professores”, ou seja, se elas eram maioria no corpo discente do Curso Normal, a mesma lógica não se seguia no quadro docente, composto majoritariamente por homens.

Esta conformação começou a ser alterada quando a primeira turma se formou pelo Curso Normal de Educação Física da Esef. Se inicialmente as alunas ocupavam posição de ouvintes e executoras das práticas estabelecidas à formação, a partir de 1941 as estruturas educacionais foram remodeladas, e as mulheres passaram a desempenhar uma nova função no arranjo do Curso Normal. A pesquisa encontrou indícios de que, a partir daquele ano, foram incluídos novos nomes na relação de professores da Esef. Dentre eles, para ocupar cargos de “professores responsáveis”, foram incluídos o segundo-tenente Arthur Torriani; o professor Rubem Mylins; o médico Amadeu Faviero; o primeiro-tenente médico José Corrêa de Barros; o médico capitão Ary da Costa Mariante; o médico Hélio Barcelos Ferreira e o professor Karl Black (Esef, 1941).

De outro modo, para atuar na condição de “professoras auxiliares”, foram incluídas docentes com formação específica em educação física. As professoras Antônia Seitz Petzhold, Zaida Marques Pallarés, Lisarb Frota Coelho Vasconcellos, Yula Maria O. Green, Helena Dias Kurtz, Olga Valéria Kroeff e Elcy Dionéia Fernandes da Silva haviam se formado na primeira turma do Curso Normal (1940) e, após se graduarem12 12 A formatura da primeira turma do Curso Normal da Esef ocorreu no dia 31 de janeiro de 1941, no Teatro São Pedro, em Porto Alegre, com a presença de 107 estudantes aprovadas(os) (Gutierrez, 1971). , foram convidadas a lecionar na instituição (Esef, 1941). Essas professoras colaboravam com o ensino das disciplinas auxiliando o “professor responsável”.

A condição assumida por uma parcela das alunas nos permite refletir, primeiramente, acerca da (nova) posição ocupada por elas dentro de um arranjo em que as práticas eram determinadas por homens que possuíam a legitimidade do campo. Conforme delineamos neste estudo, à semelhança das demais instituições de formação superior em educação física criadas no país a partir da década de 1940, a Esef também fora orientada em suas bases por discursos que provinham de dois grupos: militares e médicos. Desta forma, mesmo que as mulheres tenham assumido função dentro da instituição, enquanto “professoras auxiliares” suas práticas dependiam da orientação dos “professores responsáveis”. É possível articular essa relação com o conceito de “lutas de representação”, descrito por Chartier (1988, p. 17)Chartier, R. (1988). A História Cultural: entre práticas e representações (M. M. Galhardo, trad.). Lisboa: Difusão., que nos permite compreender “os mecanismos pelos quais um grupo impõe, ou tenta impor, a sua concepção do mundo social, os valores que são os seus, e o seu domínio”.

De outro modo, é possível considerar que a inserção das mulheres em uma organização antes composta apenas por homens representava a possibilidade de modificar um contexto social vigente até então. Se “as percepções do social não são de forma alguma discursos neutros”, pois “produzem estratégias e práticas… colocadas num campo de concorrências e de competições” (Chartier, 1988Chartier, R. (1988). A História Cultural: entre práticas e representações (M. M. Galhardo, trad.). Lisboa: Difusão., p. 17), as mulheres que assumiram posição de “professoras auxiliares” na Esef podem ter se utilizado deste lugar para conquistar certa autonomia profissional, em um ambiente permeado por representações de uma hierarquia que as posicionava em um patamar distinto e menor daquele ocupado pelos homens. Contudo, se a presença das mulheres nas escolas estaduais estava autorizada, sua trilha na estrutura docente superior no campo da educação física estava apenas começando.

Ao ampliarmos o espectro de análise, com o intuito de compreender melhor as formulações do campo da formação de professores(as) de educação física que estava em desenvolvimento durante aquele contexto, voltamos nossa atenção aos documentos legais, especialmente para aquele que é considerado um marco para a organização inicial da formação superior da área, no país. O Decreto-Lei 1.212/1939, além de criar a ENEFD, na Universidade do Brasil (UB), anunciou em suas primeiras linhas (cap. 1, art. 1º) a finalidade da Escola de “imprimir ao ensino da educação física e dos desportos, em todo país, unidade teórica e prática”. O conteúdo da normativa legal enunciou certa unidade pedagógica às demais instituições de formação de professores civis de educação física, que viriam a ser criadas posteriormente.

Ao nos debruçarmos sobre esta normativa, buscávamos localizar pistas que demarcassem de alguma forma a inserção das mulheres enquanto professoras nas orientações voltadas à formação profissional. A análise permitiu sublinhar o conteúdo expresso no Capítulo III, intitulado “Das cadeiras e do pessoal docente e administrativo”, mais precisamente o artigo 17, o qual define que: “O professor catedrático da segunda cadeira de educação física geral e o professor de ginástica rítmica, bem como os assistentes de um outro serão do sexo feminino” (Decreto-Lei 1.212/1939, ênfase adicionada). Conforme revelam as linhas mencionadas, a legislação previa orientações distintas para o ensino de alunos e alunas dos cursos de formação, em disciplinas pontuais. Nesse caso, tal normativa parecia solicitar a presença de professoras mulheres no quadro docente das escolas superiores de educação física brasileiras.

Ao encontro do que proclamava o Decreto-Lei 1.212/1939, evidenciamos o exposto no estudo de Lyra (2013)Lyra, V. B. (2013). A criação da Escola Superior de Educação Física do Rio Grande do Sul: Formação de professoras(es) para a construção do campo (1940-1970). Tese de Doutorado. Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre., especialmente quando a autora se refere à atuação das professoras nos cursos de formação profissional da Esef13 13 A partir de 1941, além do Curso Normal de Educação Física, a Esef ofereceu os seguintes cursos: Medicina de Educação Física e dos Desportos, Técnica Desportiva, e Treinamento e Massagem, todos com duração de um ano cada. O Curso Superior de Educação Física inicialmente durava dois anos (Mazo, 2005). . Segundo a autora, “às professoras do corpo docente estava autorizado o trabalho prático apenas com os grupos femininos, os quais, em contrapartida, poderiam também ser conduzidos por um professor” (p. 219). Lyra ainda menciona que, de forma distinta, “o grupo masculino de alunos ficava, exclusivamente, ao encargo de um professor do mesmo sexo”. Diante das prerrogativas destacadas no referido Decreto-Lei bem como no estudo de Lyra (2013)Lyra, V. B. (2013). A criação da Escola Superior de Educação Física do Rio Grande do Sul: Formação de professoras(es) para a construção do campo (1940-1970). Tese de Doutorado. Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre., podemos pontuar que essa restrição se aplicava apenas às disciplinas de viés prático, não atingindo as aulas teóricas. Além disso, a ressalva era direcionada unicamente a docentes mulheres, uma vez que aos professores homens era permitida a atuação com alunos e alunas.

A mesma conjuntura foi relatada por Quintina Paccini (2005)Paccini, Q. C. M. L. R. C. (2005). Quintina Cândida Marna Letícia Rachel Crocco Paccini: depoimento (K. Dalsin, Entrevistadora). Porto Alegre: Centro de Memória do Esporte/UFRGS. Recuperado de http://www.lume.ufrgs.br/handle/10183/50031
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, que reafirmou a divisão entre homens e mulheres nas aulas práticas. Em suas palavras: “enquanto eu estive na Escola, durante 38 anos [como aluna e professora], … as aulas práticas eram só professoras mulheres que lecionavam para nós” (p. 3). Assim, se por um lado ajuizamos a inserção das mulheres em um lugar antes ocupado apenas por homens, por outro, podemos refletir acerca das posições que elas estavam aptas a ocupar, sendo tal demarcação ditada por aqueles que detinham certo domínio do campo. A conformação deste cenário nos leva a correlacioná-lo com as reflexões de Chartier (2009, p. 51)Chartier, R. (2009). A história ou a leitura do tempo (C. Antunes, trad.). Belo Horizonte: Autêntica., quando versa sobre a relevância de “compreender, ao mesmo tempo, como as representações e os discursos constroem as relações de dominação”. Estas representações, muitas vezes simbólicas, nos permitem pontuar determinados interesses, os quais “separam aqueles cuja potência legitimam daqueles ou daquelas cujas submissões asseguram (ou devem assegurar)” (p. 51).

As mulheres que ingressaram no Curso Normal da Esef como alunas, aos poucos passaram a ocupar posição também no quadro docente da instituição. Se inicialmente identificamos seus nomes entre as “professoras auxiliares” no arranjo curricular dos anos 1940 e 1941, um exercício comparativo mostrou que no ano de 1955 elas eram responsáveis pelo ensino de determinadas matérias (Esef, 1955). Esta condição foi motivada por mudanças em determinadas disciplinas do Curso Normal, as quais se subdividiram em “masculinas” e “femininas”, conforme assinalado no Quadro 1, elaborado com base nos quadros docentes desses anos.

Quadro 1
Disciplinas do Curso Normal

Para assumir a disciplina de Desportos Aquáticos Femininos, nomeou-se como professora responsável Antônia Seitz Petzhold, e como sua auxiliar a professora Iula Maria O. Green. Para professora responsável pela Educação Física Geral Feminina, indicou-se a professora Maria de Cesaro Pacini, e como suas auxiliares, as professoras Dinah Peçoits Targa e Antônia Seitz Petzhold (Lyra, 2013Lyra, V. B. (2013). A criação da Escola Superior de Educação Física do Rio Grande do Sul: Formação de professoras(es) para a construção do campo (1940-1970). Tese de Doutorado. Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre.). É válido ressaltar que determinadas disciplinas do Curso Normal da Esef foram oferecidas somente às alunas e, por conta disso, desde o início da formação tiveram como docentes professoras mulheres. É o caso de Canto Coral (1940/1941) e Canto Coral e Ritmo (1955), ministrados pela professora Maria Moritz. O mesmo ocorreu com o saber de Ginástica Rítmica, que teve como professoras responsáveis Lya Bastian Meyer Schmitz (1940/1941) e Zaida Marques Pallarés (1955) e, como auxiliar, Antônia Seitz Petzhold (1955). A disciplina de Música, presente na grade disciplinar de 1955, também teve uma mulher como responsável, a professora Regina Soares de Amaro.

O último grupo de saberes disciplinares descritos, os quais estavam incluídos somente na grade de formação das alunas do Curso Normal, apresentam características comuns. Ginástica Rítmica, por exemplo, se constituiu inicialmente como uma modalidade esportiva feminina, o que justifica sua prática apenas por mulheres. Ademais, canto, ritmo e música também se relacionam de modo direto com a expressão corporal e a dança, conteúdos unicamente direcionados às mulheres do Curso Normal da Esef.

Diante disso, além de pensarmos as distintas posições ocupadas por homens e mulheres na organização docente da instituição, refletimos também sobre os possíveis reflexos destas distinções para a formação docente. Ao que parece, o preparo de professores(as) no Curso Normal da Esef conformava, afinal, duas identidades profissionais: uma direcionada aos alunos e, outra, às alunas.

Considerações finais

O presente estudo buscou compreender como ocorreu a formação de professores(as) no Curso Normal da Esef entre 1940 e 1956, período em que o referido Curso se manteve em funcionamento. Cotejando e analisando documentos de pesquisa e amparadas pelos pressupostos teórico-metodológicos da História Cultural, construímos um texto histórico, buscando significar o Curso Normal de Educação Física enquanto ambiente de práticas legitimadas por distintos discursos que coexistiam no cenário de formação. Deste modo, pudemos posicionar os professores militares e médicos como sujeitos que possuíam a legitimidade do campo e que, por conta disso, exerciam influências significativas na formação dos(as) primeiros(as) professores(as) de educação física do estado.

De outro modo, nos indícios apresentados pelos documentos de pesquisa identificamos a presença das mulheres em diferentes posições no Curso Normal da Esef. Inicialmente elas figuraram como alunas, obtendo uma instrução que se diferenciava daquela posta aos alunos homens, sobretudo no que concerne às práticas corporais. Posteriormente, elas passaram a ocupar posições distintas no arranjo docente da instituição. Ainda que tenhamos conseguido traçar uma disputa simbólica pela conquista de um novo lugar dentro da Esef, demarcamos, de outra forma, que o acesso desse espaço era restrito a determinadas práticas. Todavia, mesmo figurando em lugares limitados por certa óptica, as mulheres podem ter se utilizado de ações para sustentar seus discursos e se firmar no campo da formação profissional enquanto docentes.

Destarte, compreender as ações relativas ao Curso Normal da Esef foi significativo na medida em que nos permitiu adentrar em um espaço educacional repleto de sentidos próprios a seu contexto. Além disso, esta investigação se justifica pelo esforço de reconstituir as memórias da formação profissional em educação física no estado do Rio Grande Sul. De tal forma, ao privilegiarmos um estudo histórico que reduz a escala de análise espacial para o âmbito regional, também almejamos contribuir para ampliar os enfoques sobre a história da educação física brasileira, além dos tradicionais centros de referência.

  • 1
    Normalização, preparação e revisão textual: Mônica Silva (Tikinet) – revisão@tikinet.com.br.
  • 2
    A partir de 1957, iniciou-se na Esef o Curso de Educação Física Infantil, que assumiu o papel até então desempenhado pelo Curso Normal, ou seja, o de habilitar professores(as) de educação física para o magistério primário.
  • 3
    Ressaltamos que nos mantivemos fiéis às transcrições dos depoimentos consultados. Portanto, não alteramos a escrita, apenas complementamos as falas com pequenos apontamentos entre colchetes.
  • 4
    A Esefex foi criada em 1933, sendo estabelecida a partir do Centro Militar de Educação Física (CMEF), que havia sido fundado na Vila Militar, no ano de 1922. Para Ferreira Neto (1999, p. 50)Ferreira Neto, A. (1999). A pedagogia do exército e na escola: a Educação Física brasileira (1880-1950). Vitória: Facha., a Esefex representa a “célula mater” da formação de profissionais de educação física no país.
  • 5
    No período destacaram-se ações desta natureza nos seguintes estados: Espírito Santo, São Paulo, Minas Gerais, Pernambuco, Pará, Bahia, Santa Catarina e Rio Grande do Sul (Ferreira Neto, 1998Ferreira Neto, A. (1998). Escola de Educação Física do Exército (1920-1945): origem e projeto político-pedagógico. In A. Ferreira Neto (Org.), Pesquisa Histórica na Educação Física (Vol. 3, pp. 69-95). Vitória: Faculdade de Ciências Humanas de Aracruz.).
  • 6
    A saber: anatomia humana aplicada, biometria, cinesiologia aplicada, fisioterapia, higiene aplicada e socorros de urgência.
  • 7
    A saber: canto coral, desportos aquáticos, desportos de ataque e defesa, desportos terrestres coletivos, desportos terrestres individuais, educação física geral feminina, ginástica rítmica, história da educação física e dos desportos, metodologia da educação física, organização da educação física e dos desportos, ritmo e tênis feminino.
  • 8
    Optamos por manter a grafia das palavras conforme os documentos consultados nos apresentaram.
  • 9
    Os dados numéricos relacionados à matrícula de alunos e alunas no Curso Normal da Esef foram os seguintes: 1940 – 98 mulheres (M), 26 homens (H); 1941 – 62 M, nenhum homem (NH); 1942 – 48 M, NH; 1943 – 43 M, NH; 1944 – 39 M, 1 H; 1945 – 19 M, NH; 1946 – 4 M, NH; 1947 – 7 M, NH; 1948 – 11 M, NH; 1949 – 4 M, NH; 1950 – 4 M, NH; 1951 – 3 M, 3 H; 1952 – 3 M, NH; 1953 – 3 M, NH; 1954 – 12 M, NH; 1955 – 14 M, NH; 1956 – 29 M, 4 H (Esef, 1956).
  • 10
    Sobre a educação física no currículo da Escola Normal de Porto Alegre, consultar Lyra, Begossi & Mazo (2016)Lyra, V. B., Begossi, T. D., & Mazo, J. Z. (2016). Da obrigatoriedade do ensino de educação física no estado do Rio Grande do Sul (1840-1937). Currículo sem Fronteiras, 16(2), 225-241.; Lyra, Mazo & Begossi (2018)Lyra, V. B., Mazo, J. Z., & Begossi, T. D. (2018). A educação física no currículo da formação de professores primários no Rio Grande do Sul (1877-1927). Revista Brasileira de Educação, 23(e230040), 1-20. e Begossi, Mazo, Pereira & Silveira (2019)Begossi, T. D., Mazo, J. Z., Pereira, E. L. & Silveira, R. (2019). “Gymnastica e Educação Physica”: saberes da Educação Física na Escola Normal, Elementar e Colégios Distritais do Rio Grande do Sul, em fins do século XIX e início do século XX. Revista Movimento, 16(e25035), 1-12..
  • 11
    As aulas de educação física geral, desportos terrestres individuais e coletivos ocorriam no Estádio General Ramiro Souto, no Parque Farroupilha (Redenção); no Salão de Ginástica do Ginásio Bom Conselho eram ministradas as aulas de ginástica rítmica; no Lago do Parque Farroupilha aconteciam as aulas de canoagem; no Yatch Club e na piscina do Grêmio Náutico Gaúcho, as de natação; no Grupo Escolar Paula Soares eram ministradas as aulas de canto coral; e no Instituto de Química Industrial, da Universidade de Porto Alegre, as aulas teóricas (Gutierrez, 1971Gutierrez, W. (1971). Histórico da Escola Superior de Educação Física da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre. Recuperado de http://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/123456789/471/RV00177.pdf
    http://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handl...
    ; Mazo, 2005Mazo, J. Z. (2005). Memórias da Escola Superior de Educação Física da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Esef/UFRGS): um estudo do período de sua fundação até a federalização (1940-1969). Revista Movimento, 11(1), 143-167.).
  • 12
    A formatura da primeira turma do Curso Normal da Esef ocorreu no dia 31 de janeiro de 1941, no Teatro São Pedro, em Porto Alegre, com a presença de 107 estudantes aprovadas(os) (Gutierrez, 1971Gutierrez, W. (1971). Histórico da Escola Superior de Educação Física da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre. Recuperado de http://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/123456789/471/RV00177.pdf
    http://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handl...
    ).
  • 13
    A partir de 1941, além do Curso Normal de Educação Física, a Esef ofereceu os seguintes cursos: Medicina de Educação Física e dos Desportos, Técnica Desportiva, e Treinamento e Massagem, todos com duração de um ano cada. O Curso Superior de Educação Física inicialmente durava dois anos (Mazo, 2005Mazo, J. Z., & Pereira, P. G. (Orgs.). (2005). Escola de Educação Física da Universidade Federal do Rio Grande do Sul – Esef-UFRGS. Atlas do Esporte no Brasil. Recuperado de http://www.crefrs.org.br/atlas/cd/texto/esef.pdf
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    02 Dez 2019
  • Data do Fascículo
    2019

Histórico

  • Recebido
    17 Abr 2018
  • Revisado
    27 Set 2018
  • Aceito
    05 Nov 2018
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