Acessibilidade / Reportar erro

Crescimento e produtividade de cultivares e linhagens de amendoim submetidas a déficit hídrico1 1 Trabalho recebido em mai./2014 e aceito para publicação em abr./2015 (http://dx.doi.org/10.1590/1983-40632015v4529652).

RESUMO

O déficit hídrico durante o desenvolvimento do amendoinzeiro prejudica vários processos fisiológicos da planta e reduz sua produtividade. Este estudo objetivou avaliar o rendimento de grãos, componentes de produção e crescimento de cultivares e linhagens de amendoim submetidas a déficit hídrico, em condições de campo. O delineamento experimental foi o de blocos ao acaso, com parcelas subdivididas e três repetições. Os tratamentos de déficit hídrico (com e sem) constituíram as parcelas e os genótipos avaliados (IAC Tatu ST, BR1, BRS Havana, Col 72 e Col 82) as subparcelas. A irrigação foi suspensa nas parcelas submetidas à deficiência hídrica entre 35 e 75 dias após a emergência. O crescimento das plantas, massa seca da parte aérea e área foliar foram afetados negativamente pelo déficit hídrico. Verificou-se incremento da diferença entre as parcelas com e sem deficiência hídrica, conforme o aumento do período de supressão de água. A cultivar BRS Havana e a linhagem Col 82 apresentaram tolerância moderada à seca, com os maiores rendimentos de grãos em condição de déficit hídrico. O déficit hídrico foi responsável por redução de 68 % no rendimento de grãos na cultivar IAC Tatu ST, 44 % no número de vagens por planta na linhagem Col 82, 11 % no número de sementes por vagem na linhagem Col 72 e 11 % na massa de 100 sementes na cultivar BRS1.

PALAVRAS-CHAVE:
Arachis hypogaea L.; tolerância à seca; deficiência hídrica

ABSTRACT

Water deficit throughout the peanut plant development negatively affects physiological processes and reduces its yield. This study aimed to evaluate grain yield, yield components and plant growth of peanut cultivars and breeding lines subjected to water deficit under field conditions. The experimental design was split-plot randomized blocks with three replications. Water deficit treatments (with and without irrigation) were considered the plots and genotypes (IAC Tatu ST, BR1, BRS Havana, Col 72 and Col 82) the subplots. Irrigation was discontinued between 35 and 75 days after emergence on plots subjected to water stress. Plant growth, shoot dry matter and leaf area were negatively affected by drought stress. The difference between plots with and without water stress increased proportionally to the increase in the period of water suppression. The BRS Havana cultivar and the Col 82 breeding line were moderately tolerant to water deficit, with the highest grain yields under stress conditions. Water deficit caused a 68 % reduction in grain yield for the IAC Tatu ST cultivar, 44 % in number of pods per plant for the Col 82 breeding line, 11 % in number of seeds per pod for the Col 72 breeding line and 11 % in the 100 seeds weight for the BRS1 cultivar.

KEY-WORDS:
Arachis hypogaea L.; drought tolerance; water deficit

ABSTRACT

Water deficit throughout the peanut plant development negatively affects physiological processes and reduces its yield. This study aimed to evaluate grain yield, yield components and plant growth of peanut cultivars and breeding lines subjected to water deficit under field conditions. The experimental design was split-plot randomized blocks with three replications. Water deficit treatments (with and without irrigation) were considered the plots and genotypes (IAC Tatu ST, BR1, BRS Havana, Col 72 and Col 82) the subplots. Irrigation was discontinued between 35 and 75 days after emergence on plots subjected to water stress. Plant growth, shoot dry matter and leaf area were negatively affected by drought stress. The difference between plots with and without water stress increased proportionally to the increase in the period of water suppression. The BRS Havana cultivar and the Col 82 breeding line were moderately tolerant to water deficit, with the highest grain yields under stress conditions. Water deficit caused a 68 % reduction in grain yield for the IAC Tatu ST cultivar, 44 % in number of pods per plant for the Col 82 breeding line, 11 % in number of seeds per pod for the Col 72 breeding line and 11 % in the 100 seeds weight for the BRS1 cultivar.

KEY-WORDS:
Arachis hypogaea L.; drought tolerance; water deficit

INTRODUÇÃO

O amendoim (Arachis hypogaea L.) é uma leguminosa originária da América do Sul, sendo a quarta oleaginosa mais cultivada no mundo, superada apenas pela soja, algodão e canola. Os maiores produtores mundiais encontram-se na Ásia, onde se concentra mais da metade da produção mundial (FAO 2013FOOD AND AGRICULTURE ORGANIZATION (FAO). Year book. 2013. Disponível em: <http//www.fao.org/inicio.html>. Acesso em: 25 out. 2013.
http//www.fao.org/inicio.html...
). No Brasil, o Estado de São Paulo foi responsável por 89 % da produção nacional, na safra 2013/2014 (Conab 2014COMPANHIA NACIONAL DE ABASTECIMENTO (Conab). Acompanhamento da safra brasileira de grãos. 2014. Disponível em: <http://www.conab.gov.br/OlalaCMS/uploads/arquivos/14_03_12_08_41_24_boletim_graos_marco_2014.pdf>. Acesso em: 24 fev. 2015.
http://www.conab.gov.br/OlalaCMS/uploads...
).

Essa leguminosa é utilizada principalmente na alimentação humana, in natura ou processada, ou para a produção de óleo. Atualmente, estuda-se o amendoim como matéria-prima promissora para a produção de biodiesel, devido ao alto teor de óleo em suas sementes (Gonçalves et al. 2004GONÇAVES, J. A. et al. Componentes de produção de amendoim em diferentes arranjos espaciais no Recôncavo Baiano. Revista Brasileira de Oleaginosas e Fibrosas, Campina Grande, v. 8, n. 2/3, p. 801-812, 2004., Nakagawa & Rosolém 2011NAKAGAWA, J.; ROSOLÉM, C. A. O amendoim: tecnologia de produção. Bauru: Fepaf, 2011.).

A cultura do amendoim está sujeita a múltiplos estresses abióticos, dentre eles a deficiência hídrica provocada por períodos sem precipitação, ou com precipitações abaixo da demanda da cultura. O adequado suprimento de água e nutrientes são fatores que afetam diretamente o desenvolvimento e a produtividade das culturas agrícolas (Cattivelli et al. 2008CATIVELLI, L. et al. Drought tolerance improvement in crop plants: an integrated view from breeding to genomics. Field Crops Research, Amsterdam, v. 105, n. 1, p. 1-14, 2008., Anjum et al. 2011ANJUM, S. A. et al. Morphological, physiological and biochemical responses of plants to drought stress. African Journal of Agricultural Research, Victoria Island, v. 6, n. 9, p. 2026-2032, 2011.). O nível de dano provocado pela deficiência hídrica é determinado pela intensidade, período de duração do estresse e estádio fenológico no qual a cultura se encontra (Chaves & Oliveira 2004CHAVES, M. M.; OLIVEIRA, M. M. Mechanisms underlying plant resilience to water defecits: prospects for water-saving agriculture. Journal of Experimental Botany, Lancaster, v. 55, n. 407, p. 2365-2384, 2004.).

O aumento na frequência e na intensidade de períodos de seca, associados a altas temperaturas, é esperado em futuro próximo, como consequência das mudanças climáticas, causando perdas substanciais em áreas agrícolas. Assim, torna-se necessário desenvolver estratégias de adaptação e políticas agrícolas capazes de mitigar os impactos negativos sobre a oferta de alimentos (Sheffield et al. 2012SHEFFIELD, J. et al. Little change in global drought over the past 60 years. Nature, London, v. 491, n. 7424, p. 435-438, 2012., Teixeira et al. 2013TEIXEIRA, E. I. et al. Global hot-spots of heat stress on agricultural crops due to climate change. Agricultural and Forest Meteorology, Amsterdam, v. 170, n. 1, p. 206-215, 2013.).

Os períodos de seca prejudicam as funções vitais da planta e estimulam as reações de adaptação (Graciano 2009GRACIANO, E. S. A. Estudos fisiológicos e bioquímicos de cultivares de amendoim (Arachis hypogaea L.) submetidas à deficiência hídrica. 2009. 66 f. Dissertação (Mestrado em Botânica) - Universidade Federal Rural de Pernambuco, Recife, 2009.). A estratégia adotada pela planta para minimizar os danos provocados pela deficiência hídrica envolve ações complexas relacionadas à sensibilidade e à tolerância a outros estresses, o que pode variar entre os genótipos (Chaves et al. 2002CHAVES, M. M. et al. How plants cope with water stress in the field. Annals of Botany, Exeter, v. 89, n. 6, p. 907-916, 2002.).

O estresse hídrico provoca alterações nas propriedades das membranas, aumento da respiração, inibição da fotossíntese, menor produção de matéria seca, senescência prematura e redução na produção e seus componentes (Upadhyay et al. 2011UPADHYAY, A. et al. Inheritance of drought resistance related traits in two crosses of groundnut (Arachis hypogaea L.). Euphytica, Wageningen, v. 177, n. 1, p. 55-66, 2011., Pereira et al. 2012PEREIRA, J. W. L. et al. Mudanças bioquímicas em genótipos de amendoim submetidos a déficit hídrico moderado. Revista Ciência Agronômica, Fortaleza, v. 43, n. 4, p. 766-773, 2012., Duarte et al. 2013DUARTE, E. A. A. et al. Características agronômicas e índice de colheita de diferentes genótipos de amendoim submetidos a estresse hídrico. Revista Brasileira de Engenharia Agrícola e Ambiental, Campina Grande, v. 17, n. 8, p. 843-847, 2013.).

Visando a quantificar os danos que o estresse hídrico provoca em genótipos de amendoim, o presente trabalho objetivou avaliar o rendimento de grãos, componentes de produção e crescimento de cinco genótipos de amendoim submetidos a déficit hídrico, em condições de campo.

MATERIAL E MÉTODOS

O experimento foi conduzido no ano agrícola 2012/2013, na Estação Experimental do Instituto Agronômico do Paraná (Iapar), em Londrina (PR) (23º22’S, 51º10’W e altitude de 585 m), com as seguintes médias climáticas anuais: temperatura de 20,3 ºC, umidade relativa de 69 % e precipitação de 1.728 mm. A classificação climática da região é Cfa (clima subtropical), segundo Köppen (Iapar 1994INSTITUTO AGRONÔMICO DO PARANÁ (Iapar). Cartas climáticas do Estado do Paraná. Londrina: Iapar, 1994.). O solo da área é classificado como Latossolo Vermelho distrófico, cujas características foram descritas por Faria & Madramootoo (1996)FARIA, R. T.; MADRAMOOTOO, C. A. Simulation of soil moisture profiles for wheat in Brazil. Agricultural Water Management, Amsterdam, v. 31, n. 1, p. 35-49, 1996..

O ensaio foi estabelecido em três canteiros, com laterais de concreto e dimensões de 100 m de comprimento x 5 m de largura x 1 m de profundidade. O delineamento experimental foi o de blocos ao acaso, com três repetições e parcelas subdivididas. Os tratamentos de déficit hídrico (com e sem) constituíram as parcelas e os genótipos avaliados (IAC Tatu ST, BR1, BRS Havana, Col 72 e Col 82) as subparcelas. Estas foram compostas por quatro linhas de 5,0 m, espaçadas em 0,5 m, com densidade de semeadura de 16 sementes viáveis por metro.

A semeadura foi realizada em 27 de dezembro de 2012, com adubação de base no solo, utilizando-se o produto formulado 4-30-10 (N-P2O5-K2O). O controle de plantas invasoras foi realizado com os herbicidas sistêmicos bentazona (720 g i. a. ha-1) e quisalofope-p-metílico (75 g i. a. ha-1), aplicando-se controle manual para as plantas invasoras remanescentes. Uma aplicação de tiametoxam (14,1 g i. a. ha-1) foi efetuada para controlar tripes-do-bronzeamento (Enneothips flavens). Para o controle de manchas foliares (Cercospora arachidicola e Pseudocercospora personata), foram feitas três aplicações de fungicida sistêmico piraclostrobina (150 g i. a. ha-1).

Todas as parcelas foram irrigadas por aspersão até os 35 dias após a emergência (DAE), recebendo 300 mm de lâmina de água, nesse primeiro período. No entanto, as parcelas submetidas ao déficit hídrico não foram irrigadas dos 36 aos 75 DAE, totalizando um período de 40 dias sem irrigação.

Para evitar o fornecimento de água da chuva às parcelas submetidas ao déficit hídrico, foram utilizados abrigos móveis com sistema de roldanas deslizantes sobre trilhos de ferro, acoplados às laterais dos canteiros. Os abrigos foram construídos em ferro, com cobertura e laterais de polietileno transparente, com dimensões de 10 m de comprimento x 5 m de largura x 2,8 m de altura. As parcelas que não foram submetidas ao déficit hídrico foram irrigadas por aspersão de duas a três vezes por semana, conforme o índice de chuva, durante todo o ciclo de desenvolvimento, totalizando 600 mm de lâmina de água durante todo o ciclo.

A umidade do solo foi determinada em todos os tratamentos, utilizando-se o método gravimétrico, durante o período de déficit hídrico (35, 47, 54 e 70 DAE), à profundidade de 0-20 cm. O armazenamento de água no solo no perfil de 0-20 cm foi estimado de acordo com Faria & Madramootoo (1996)FARIA, R. T.; MADRAMOOTOO, C. A. Simulation of soil moisture profiles for wheat in Brazil. Agricultural Water Management, Amsterdam, v. 31, n. 1, p. 35-49, 1996., determinando-se a lâmina de água armazenada no solo em cada período avaliado.

Com a finalidade de estimar o efeito do déficit hídrico sobre o crescimento da planta, durante o ciclo da cultura, determinou-se a área foliar total (AF) e a matéria seca (MS). Selecionaram-se 10 plantas de cada parcela (com e sem déficit hídrico) ao acaso, em todos os genótipos (IAC Tatu ST, BR1, BRS Havana, Col 72 e Co 82), aos 35, 47, 54 e 70 DAE.

Para a estimativa da AF, realizou-se leitura da área de uma das folhas do terço médio de cada planta, com medidor portátil de área foliar (modelo LI-3000C Li-Cor, EUA), no qual os dois pares de folíolos passam por um scanner, para medir a área da folha. Determinou-se, também, o número total de folhas por planta. A AF total por hectare foi calculada multiplicando-se a AF (m2) de uma planta pelo número de plantas em 1,0 ha.

Para a avaliação da MS, as plantas selecionadas foram identificadas, acondicionadas em sacos de papel e secas em estufa de ventilação forçada de ar, à temperatura de 60 ºC ± 2 ºC, durante 72 horas. Após a secagem, as amostras foram retiradas e pesadas. A MS por hectare foi estimada multiplicando-se o número de plantas por hectare pela massa seca de uma planta.

No estádio de maturação fisiológica (94 DAE), foram amostradas 10 plantas da área útil de cada subparcela e avaliados os seguintes caracteres: número de nós (NN), altura da planta ou comprimento do caule principal (AP), número de vagens por planta (VP), número de sementes por vagem (SV), massa de 100 sementes (MC) e rendimento total de grãos (RT). Os dados referentes ao rendimento total de grãos foram obtidos após a colheita de cada subparcela, descartando-se 0,5 m de cada extremidade. A umidade e o peso dos grãos foram determinados após o beneficiamento, sendo os mesmos transformados em kg ha-1 e corrigidos para a umidade padrão de 10 %.

O índice de redução (IR), que fornece o valor em porcentagem da redução provocada pelo déficit hídrico, foi obtido para todas as variáveis avaliadas (MS, AF, NN, AP, VP, SV, MC e RT), utilizando-se a seguinte fórmula: IR (%) = 100 [(CSE- CCE)/ CSE], sendo CSE = característica no tratamento sem déficit hídrico e CCE = característica no tratamento com déficit hídrico.

Os dados referentes às características de crescimento de MS e AF foram submetidos à análise de regressão, selecionando-se os modelos que apresentaram os melhores níveis de significância e definindo-se o coeficiente de determinação (R2). Os dados obtidos para as variáveis NN, AP, VP, SV, MC e RT foram submetidos à análise de variância, considerando-se os efeitos de tratamentos e genótipos como fixos.

O modelo matemático utilizado foi o Yijk = m + Pi + Bj + (PB)ij + Sk + (PS)ik + Eijk, em que Yijk = valor observado no tratamento i, no genótipo k, na repetição j; m = média geral do ensaio; Pi = efeito do i-ésimo tratamento (i = 1 ou 2); Sk = efeito do k-ésimo genótipo (k = 1, 2, 3, 4 ou 5); Bj = efeito do j-ésimo bloco (j = 1, 2 ou 3); (PB)ij = erro aleatório a; (PS)ik = efeito da interação do i-ésimo tratamento com o k-ésimo genótipo; Eijk = erro aleatório b.

As estimativas dos componentes quadráticos, coeficientes de variação genética (CVg), coeficientes de variação ambiental (CVa e CVb) e índice B foram efetuadas utilizando-se as seguintes expressões: Φg = (QMS - QMEb)/ rp; CVg = (√Φg/ m) . 100; CVb= (√QMEb/ m) x 100; CVa = (√QMEa/ m) x 100; e índice B = CVg/ CVe, em que Φg = componente quadrático genético; QMS = quadrado médio de subparcela genótipo; QMEb = quadrado médio do erro b; r = número de repetições; p = número de genótipos; e m = média geral do ensaio.

Para a variável RT obtida em condições com e sem déficit hídrico, aplicou-se o teste de agrupamento de médias Scott-Knott, para separação das classes. As estimativas das correlações de Pearson (r) foram efetuadas entre as características avaliadas. Asignificância das correlações foi analisada pelo teste t, com n-2 graus de liberdade e a 5 % (p). Essas análises foram efetuadas com o auxílio do programa Genes (Cruz 2013CRUZ, C. D. GENES: a software package for analysis in experimental statistics and quantitative genetics. Acta Scientiarum, Maringá, v. 35, n. 3, p. 271-276, 2013.).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A quantidade de água disponível ao longo do ciclo de cultivo foi suficiente para suprir as necessidades da cultura do amendoim, no tratamento sem déficit hídrico. Porém, o mesmo não foi verificado nas parcelas submetidas à deficiência hídrica, cujos valores estiveram sempre abaixo do nível de 50 % de água disponível e acima do ponto de murcha permanente (Figura 1).

Figura 1
Armazenamento de água no perfil do solo, à profundidade de 0-20 cm (Londrina, PR, 2012/2013). CC: capacidade de campo; PMP: ponto de murcha permanente; DAE: dias após a emergência.

Em condições sem déficit hídrico, verificou-se que a variável MS ajustou-se ao modelo quadrático para todos os genótipos, exceto para a cultivar BR1, que apresentou ajuste linear para o modelo. Com déficit hídrico, todos os genótipos ajustaram-se ao modelo linear e apresentaram redução no acúmulo de matéria seca em todos os períodos avaliados (Figura 2). Esse fato era esperado, pois, segundo Larcher (2006)LARCHER, W. Ecofisiologia vegetal. São Carlos: RIMA, 2006., a primeira resposta das plantas à deficiência hídrica é a diminuição de turgescência, inibindo a fotossíntese e, consequentemente, o processo de crescimento, durante o seu desenvolvimento.

Figura 2
Matéria seca (MS) obtida aos 35, 47, 54 e 70 dias após a emergência, nos genótipos de amendoim avaliados em ambientes sem e com estresse hídrico (Londrina, PR, 2012/2013).

Verificou-se que a MS sem deficiência hídrica aos 54 DAE decresceu, em relação à MS obtida aos 47 DAE (Figura 2). Uma provável explicação para esse fato é que a curva da MS apresentou tendência similar à do armazenamento de água no perfil do solo (Figura 1). Ou seja, a diminuição da umidade disponível nesse período, provavelmente, levou a uma menor produção de fotoassimilados e queda da MS.

A intensidade na redução da variável MS, em condições de déficit hídrico, variou em função do genótipo avaliado. A linhagem Col 82 destacou-se por apresentar maior MS (7.003 kg ha-1), no tratamento com déficit hídrico, ao final do período de estresse (Figura 2), e também foi o único genótipo que não diminuiu a MS sem déficit hídrico, com o decréscimo de umidade do solo, aos 54 DAE. Na ausência de déficit hídrico, o genótipo que apresentou o maior acúmulo de MS foi o Col 72, com 11.147 kg ha-1, aos 70 DAE (Figura 2).

Em relação à AF, observou-se ajuste linear para todos os modelos, nos tratamentos com e sem déficit hídrico (Figura 3). Conforme o período de supressão hídrica aumentou, diferenças entre os tratamentos com e sem déficit foram observadas, porém, os genótipos apresentaram respostas com magnitudes diferentes (Figura 3).

Figura 3
Área foliar total (AF) obtida aos 35, 47, 54 e 70 dias após a emergência, em genótipos de amendoim avaliados em ambientes sem e com estresse hídrico (Londrina, PR, 2012/2013).

A redução na área foliar das plantas é considerada um mecanismo de defesa à deficiência hídrica, pois, com menor área foliar, a transpiração é reduzida, para que a planta não sofra murcha permanente. No entanto, a diminuição da área foliar implica na redução da produtividade, devido à menor interceptação da radiação solar, reduzindo a taxa fotossintética (Graciano 2009GRACIANO, E. S. A. Estudos fisiológicos e bioquímicos de cultivares de amendoim (Arachis hypogaea L.) submetidas à deficiência hídrica. 2009. 66 f. Dissertação (Mestrado em Botânica) - Universidade Federal Rural de Pernambuco, Recife, 2009.). Portanto, a redução da AF, em função do déficit hídrico, apresenta implicação na quantidade de MS produzida (Figura 2).

A análise de variância mostrou efeito significativo para o déficit hídrico para número de nós (p = 0,005), altura de planta (p = 0,008), número de vagens por planta (p = 0,020) e rendimento total (p = 0,016), demonstrando que a quantidade de água disponível para as plantas influenciou esses caracteres. Com relação ao efeito de genótipo, somente as características número de nós (p = 0,012) e número de sementes por vagem (p = 0,000) apresentaram significância, indicando que existe variabilidade genética entre os cinco genótipos avaliados para esses caracteres, quando submetidos a ambientes com e sem déficit hídrico. O efeito da interação déficit hídrico (D) x genótipo (G) foi não significativo para todas as variáveis estudadas (p > 0,05) (Tabela 1).

Tabela 1
Resumo da análise de variância e estimativas dos coeficientes de variação genética (CVg), coeficiente de variação ambiental do erro a (CVa), coeficiente de variação ambiental do erro b (CVb) e índice B (CVg/CVb), em genótipos de amendoim avaliados sem e com estresse hídrico (Londrina, PR, 2012/2013)

As estimativas dos coeficientes de variação genética (CVg) variaram de 3,1 %, para altura de planta, a 12,4 %, para número de sementes por vagem. Os valores dos coeficientes de variação ambiental (CVe) obtidos foram moderados a baixos, exceto para rendimento total, indicando, de modo geral, alta precisão experimental (Pimentel-Gomes 2000PIMENTEL-GOMES, F. Curso de estatística experimental. 14. ed. Piracicaba: Nobel, 2000.). O índice B, que trata da relação entre CVg e CVb, indica a influência da variabilidade genética, em relação à variância ambiental ou aleatória. Os valores de índice B obtidos estão abaixo de um (1), indicando que os efeitos ambientais sobressaíram, em relação aos efeitos genéticos, para todas as variáveis, exceto para o número de sementes por vagem (Tabela 1).

Para todas as características avaliadas, observaram-se valores positivos para os índices de redução (IR) na maioria dos genótipos, o que comprova que o déficit hídrico causou alterações fisiológicas nas plantas, provocando redução, principalmente, no número de vagens por planta e no rendimento total (Tabela 2).

Tabela 2
Médias para as características avaliadas e seus respectivos índices de redução (IR), em genótipos de amendoim avaliados em ambientes sem estresse (SE) e com estresse hídrico (CE) (Londrina, PR, 2012/2013)

Quando as plantas foram submetidas à deficiência hídrica, observou-se que o componente de produção mais afetado foi o número de vagens, entretanto, a cultivar BRS Havana e a linhagem Col 72 não apresentaram redução significativa. Por outro lado, verificou-se que os componentes massa de 100 sementes e número de sementes por vagem foram afetados em menor intensidade e, apesar de apresentarem valores de IR positivos para a maioria dos genótipos, as médias foram agrupadas em uma única classe, quando comparadas entre regimes hídricos, para o mesmo genótipo.

Períodos de déficit hídrico superiores a 35 dias provocaram redução no crescimento de plantas de amendoim, sem, contudo, paralisá-lo (Correia & Nogueira 2004CORREIA, K. G.; NOGUEIRA, R. J. M. C. Avaliação do crescimento do amendoim (Arachis hypogaea L.) submetido a déficit hídrico. Revista de Biologia e Ciências da Terra, Campina Grande, v. 4, n. 2, p. 1-7, 2004.). Com a deficiência hídrica, há diminuição na taxa fotossintética, ocasionando redução no crescimento da planta e afetando a formação e desenvolvimento de grãos, os quais influenciam diretamente na produção.

Os maiores valores de IR ocorreram nas características relacionadas aos componentes de produção de grãos, como o número de vagens por planta, que variou de 25,5 %, para a linhagem Col 72, a 44,8 %, para a Col 82. O rendimento total apresentou IR superior a 47 % em todos os genótipos, sendo que a cultivar IAC Tatu ST foi a mais sensível ao déficit hídrico, apresentando IR de 68 % (Tabela 2). Resultados semelhantes foram obtidos por Junjittakarn et al. (2014)JUNJITTAKARN J. et al. Response of root characteristics and yield in peanut under terminal drought condition. Chilean Journal of Agricultural Research, Chillán, v. 74, n. 3, p. 249-256, 2014., os quais observaram que o déficit hídrico ocorrido no final do ciclo do amendoim afetou características relacionadas ao rendimento, como massa seca de vagem e índice de colheita.

As estimativas das correlações fenotípicas, no tratamento com déficit hídrico, mostraram correlação positiva e significativa (p < 0,05) entre as variáveis rendimento total e massa de 100 sementes (0,52) (Tabela 3). Quando as estimativas foram realizadas na ausência de estresse hídrico, as correlações positivas e significativas (p < 0,01 ou p < 0,05) foram observadas entre as características número de nós e altura da planta (0,670), número de vagens por planta e massa de 100 sementes (0,62) e rendimento total e massa de 100 sementes (0,55). Já a característica altura da planta apresentou correlação negativa e significativa com o número de vagens por planta (-0,60) e massa de 100 sementes (-0,69) (Tabela 3).

Tabela 3
Estimativas das correlações fenotípicas para os caracteres avaliados em genótipos de amendoim, na presença (diagonal superior) e ausência (diagonal inferior) de déficit hídrico (Londrina, PR, 2012/2013)

Em situações com e sem déficit hídrico, esses caracteres e podendo ser utilizados na seleção observou-se que a massa de 100 sementes foi o com-de plantas, para maior produtividade. Considerandoponente de maior contribuição para o rendimento do -se o rendimento total de grãos sem déficit hídrico amendoim. Os valores das correlações entre essas e o IR para o caráter rendimento total, os genótipos duas variáveis, em ambas as condições, foram posi-avaliados foram classificados em quatro categorias tivos e significativos, evidenciando associação entre (Figura 4): 1) pouca tolerância à seca e alto potencial produtivo (quadrante I): a cultivar IAC Tatu ST está inserida nesse quadrante, com índice de redução igual a 68 %; 2) pouca tolerância à seca e baixo potencial produtivo (quadrante II): nenhum dos genótipos avaliados foi inserido nesse quadrante; 3) tolerância à seca e baixo potencial produtivo (quadrante III): a linhagem Col 72 e a cultivar BR1 apresentaram tolerância à seca, sendo que a BR1 obteve o menor índice de redução. No entanto, esses genótipos apresentam menor rendimento de grãos, quando comparados aos demais genótipos avaliados; 4) tolerância à seca e alto potencial produtivo (quadrante IV): a cultivar BRS Havana e a linhagem Col 82 estão inseridas nesse quadrante.

Figura 4
Relação entre rendimento total de grãos avaliados sem déficit hídrico e índice de redução para o rendimento de grãos, em genótipos de amendoim. Quadrante I: pouca tolerância à seca e alto potencial produtivo; quadrante II: pouca tolerância à seca e baixo potencial produtivo; quadrante III: tolerância à seca e baixo potencial produtivo; quadrante IV: tolerância à seca e alto potencial produtivo (Londrina, PR, 2012/2013).

Em estudos realizados por Pereira et al. (2012)PEREIRA, J. W. L. et al. Mudanças bioquímicas em genótipos de amendoim submetidos a déficit hídrico moderado. Revista Ciência Agronômica, Fortaleza, v. 43, n. 4, p. 766-773, 2012., as cultivares BR1 e BRS Havana também apresentaram tolerância à seca e habilidades para suportar escassez hídrica prolongada. Os genótipos com tolerância à seca têm potencial para o cultivo em regiões onde a ocorrência de veranicos é frequente.

CONCLUSÕES

  1. As variáveis massa seca e área foliar, relacionadas com o crescimento da planta, são afetadas negativamente pelo déficit hídrico. A intensidade do dano provocado apresenta resposta diferenciada entre os genótipos avaliados, sendo diretamente relacionada à duração do período de supressão de água.

  2. Na presença de estresse hídrico, há perdas no rendimento total e nos componentes de produção número de vagens por planta, número de sementes por vagem e massa de 100 sementes.

  3. A cultivar BRS Havana e a linhagem Col 82 apresentam tolerância moderada à seca e alto potencial de rendimento de grãos, podendo ser utilizadas em programas de melhoramento, visando ao desenvolvimento de cultivares tolerantes ao déficit hídrico.

REFERÊNCIAS

  • ANJUM, S. A. et al. Morphological, physiological and biochemical responses of plants to drought stress. African Journal of Agricultural Research, Victoria Island, v. 6, n. 9, p. 2026-2032, 2011.
  • CATIVELLI, L. et al. Drought tolerance improvement in crop plants: an integrated view from breeding to genomics. Field Crops Research, Amsterdam, v. 105, n. 1, p. 1-14, 2008.
  • CHAVES, M. M.; OLIVEIRA, M. M. Mechanisms underlying plant resilience to water defecits: prospects for water-saving agriculture. Journal of Experimental Botany, Lancaster, v. 55, n. 407, p. 2365-2384, 2004.
  • CHAVES, M. M. et al. How plants cope with water stress in the field. Annals of Botany, Exeter, v. 89, n. 6, p. 907-916, 2002.
  • COMPANHIA NACIONAL DE ABASTECIMENTO (Conab). Acompanhamento da safra brasileira de grãos 2014. Disponível em: <http://www.conab.gov.br/OlalaCMS/uploads/arquivos/14_03_12_08_41_24_boletim_graos_marco_2014.pdf>. Acesso em: 24 fev. 2015.
    » http://www.conab.gov.br/OlalaCMS/uploads/arquivos/14_03_12_08_41_24_boletim_graos_marco_2014.pdf
  • CORREIA, K. G.; NOGUEIRA, R. J. M. C. Avaliação do crescimento do amendoim (Arachis hypogaea L.) submetido a déficit hídrico. Revista de Biologia e Ciências da Terra, Campina Grande, v. 4, n. 2, p. 1-7, 2004.
  • CRUZ, C. D. GENES: a software package for analysis in experimental statistics and quantitative genetics. Acta Scientiarum, Maringá, v. 35, n. 3, p. 271-276, 2013.
  • DUARTE, E. A. A. et al. Características agronômicas e índice de colheita de diferentes genótipos de amendoim submetidos a estresse hídrico. Revista Brasileira de Engenharia Agrícola e Ambiental, Campina Grande, v. 17, n. 8, p. 843-847, 2013.
  • FARIA, R. T.; MADRAMOOTOO, C. A. Simulation of soil moisture profiles for wheat in Brazil. Agricultural Water Management, Amsterdam, v. 31, n. 1, p. 35-49, 1996.
  • FOOD AND AGRICULTURE ORGANIZATION (FAO). Year book 2013. Disponível em: <http//www.fao.org/inicio.html>. Acesso em: 25 out. 2013.
    » http//www.fao.org/inicio.html
  • GONÇAVES, J. A. et al. Componentes de produção de amendoim em diferentes arranjos espaciais no Recôncavo Baiano. Revista Brasileira de Oleaginosas e Fibrosas, Campina Grande, v. 8, n. 2/3, p. 801-812, 2004.
  • GRACIANO, E. S. A. Estudos fisiológicos e bioquímicos de cultivares de amendoim (Arachis hypogaea L.) submetidas à deficiência hídrica 2009. 66 f. Dissertação (Mestrado em Botânica) - Universidade Federal Rural de Pernambuco, Recife, 2009.
  • INSTITUTO AGRONÔMICO DO PARANÁ (Iapar). Cartas climáticas do Estado do Paraná Londrina: Iapar, 1994.
  • JUNJITTAKARN J. et al. Response of root characteristics and yield in peanut under terminal drought condition. Chilean Journal of Agricultural Research, Chillán, v. 74, n. 3, p. 249-256, 2014.
  • LARCHER, W. Ecofisiologia vegetal São Carlos: RIMA, 2006.
  • NAKAGAWA, J.; ROSOLÉM, C. A. O amendoim: tecnologia de produção. Bauru: Fepaf, 2011.
  • PEREIRA, J. W. L. et al. Mudanças bioquímicas em genótipos de amendoim submetidos a déficit hídrico moderado. Revista Ciência Agronômica, Fortaleza, v. 43, n. 4, p. 766-773, 2012.
  • PIMENTEL-GOMES, F. Curso de estatística experimental 14. ed. Piracicaba: Nobel, 2000.
  • SHEFFIELD, J. et al. Little change in global drought over the past 60 years. Nature, London, v. 491, n. 7424, p. 435-438, 2012.
  • TEIXEIRA, E. I. et al. Global hot-spots of heat stress on agricultural crops due to climate change. Agricultural and Forest Meteorology, Amsterdam, v. 170, n. 1, p. 206-215, 2013.
  • UPADHYAY, A. et al. Inheritance of drought resistance related traits in two crosses of groundnut (Arachis hypogaea L.). Euphytica, Wageningen, v. 177, n. 1, p. 55-66, 2011.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Apr-Jun 2015

Histórico

  • Recebido
    Maio 2014
  • Aceito
    Abr 2015
Escola de Agronomia/UFG Caixa Postal 131 - Campus II, 74001-970 Goiânia-GO / Brasil, 55 62 3521-1552 - Goiânia - GO - Brazil
E-mail: revistapat.agro@ufg.br