Acessibilidade / Reportar erro

AUTORIA DE MULHERES E DESIGUALDADE DE GÊNERO NO ENSINO SUPERIOR

Women’s Authorship and Gender Inequality in Higher Education

Autoría de mujeres y desigualdad de género en la educación superior

Resumo

Neste artigo, toma-se como dado discursivo a ementa e a bibliografia obrigatória de planos de ensino superior, visando contribuir ao debate sobre assimetrias de gênero na divulgação de conhecimento científico. A abordagem se insere nos estudos críticos discursivos de práticas institucionalizadas, cotidianas e naturalizadas que reafirmam desigualdades sociais no campo acadêmico. A proposta teórico-metodológica baseia-se nos conceitos de androcentrismo, despatriarcalização, paridade de gênero e pensamento latino-americano. Considerando o conceito básico de gênero situado, utilizam-se as categorias analíticas de léxico, interdiscursividade e intertextualidade. Como resultado, mapeiam-se formas de manutenção da primazia masculina e da sub-representação de mulheres, além de subordinações do gênero acadêmico ao burocrático.

Palavras-chave:
Androcentrismo; Pensamento latino-americano; Estudos críticos do discurso

Abstract

In this paper, we take syllabus and the required bibliography from a higher education curriculum as our corpus of discourse data. We aim to contribute to the discussion about asymmetries of gender in the divulgation of scientific knowledge. Our approach falls within the scope of critical discourse studies of institutionalized daily practices, which are naturalized and reassure social inequality in the academic field. We base our theoretical-methodological proposal on the concepts of androcentrism, depatriarchization, gender equality, and Latin American thought. Because of the situated genre concept, we apply analytical categories of lexicon, interdiscursivity, and intertextuality. Our analysis indicates forms of men authorship primacy and underrepresentation of women, besides subordination of the academic gender to the bureaucratic.

Keywords:
Androcentrism; Latin American Thought; Critical Discourse Studies

Resumen

Este artículo toma como dato discursivo el plan de studios y la bibliografía obligatoria de un plan de asignatura universitaria buscando contribuir con el debate sobre la asimetría de género en la divulgación de conocimiento científico. La propuesta se localiza en los estudios críticos discursivos de prácticas institucionalizadas, cotidianas y naturalizadas reafirmadoras de desigualdades sociales en el campo académico. El desarrollo teórico-metodológico se basa en los conceptos de androcentrismo, despatriarcalización, paridad de género y pensamiento latino americano. Considerando el concepto de género situado, se utilizan las categorías analíticas de léxico, interdiscursividad e intertextualidad. Como resultando se mapearon las formas de manutención de la primacía masculina e de subrepresentación de las mujeres, además la subordinación del género académico al burocrático.

Palabras clave:
Androcentrismo; Pensamento latino-americano; Estudios críticos del discurso

1 INTRODUÇÃO

Neste texto, analisamos planos de ensino da disciplina universitária optativa Pensamento Social e Político na América Latina, direcionada a discentes do curso de graduação em Ciências Sociais, enquanto textos-discursos, almejando contribuir ao conhecimento sobre o androcentrismo acadêmico. O potencial dessa análise reside em desvendar práticas androcêntricas naturalizadas em decisões consideradas relevantes para o processo de ensino-aprendizagem (Ruano-Ibarra; Resende, 2023). Esses documentos institucionais habitualmente incluem as seções de identificação, objetivos, ementa, conteúdo programático, técnicas, avaliação, bibliografia e cronograma (Malusá, 2003MALUSÁ, S. A prática da docência universitária. São Paulo: Factash, 2003.).

Mais do que sua natureza operacional, importa-nos seu potencial elucidador como gênero de discurso dos campos burocrático e acadêmico. Para tanto, indagamos sobre reiterações, supressões, tensionamentos, valores ou interpretações subjacentes a sua elaboração e execução. De acordo com Pardo Abril (2013), analista do discurso colombiana, desnaturalizar práticas sociais faz emergirem indagações sobre os efeitos sociais, conscientes ou não, dos processos estudados. Assim, a análise nos serve ao propósito maior de discutir modos como se plasmam colonialidades e, às vezes sorrateiramente, em nossas dinâmicas rotineiras.

Organizamos o artigo em quatro seções, além desta introdução e das considerações finais. Na primeira, explicamos a relevância de discurso e gênero para nosso propósito neste estudo. Na segunda seção, detalhamos a composição do corpus e as categorias empregadas. As duas seções seguintes são analíticas: primeiro, analisamos a ementa a partir da categoria lexical e, na sequência, analisamos as referências de autoria de mulheres incluídas nos planos em questão.

2 DISCURSO E GÊNERO COMO REFERENCIAIS PARA O ESTUDO DO ANDROCENTRISMO ACADÊMICO

O androcentrismo acadêmico é um dos frutos do patriarcado, uma disposição enraizada que reproduz a hegemonia masculina. A ideia ocidental de ciência e universalidade privilegia sujeitos biologicamente masculinos. Travestidas de cientificidade (Sánchez, 1999SÁNCHEZ, D. Androcentrismo en la ciencia. Una perspectiva desde el análisis crítico del discurso. In: BARRAL, M.; MAGALLÓN, C.; MIQUEO, C.; SÁNCHEZ, D. (eds.). Interacciones ciencia y género: discursos y prácticas científicas de mujeres. Barcelona: Icaria, 1999. p. 161-184.), a invisibilidade e o silenciamento das contribuições de mulheres são expressões androcêntricas (Baeta, 2015BAETA, M. Misoginia en el mundo científico: cultura androcentrista. Estúdios, v. 8, n. 15, p. 71-83, jan./jun. 2015.) a serviço da naturalização do campo acadêmico como lugar masculino. Desse privilégio decorre a subordinação de gênero que aliena e coisifica as existências das mulheres. O androcentrismo opera como cativeiro da voz das mulheres para desconsiderar sua relevância (Blazquez, Flores; Ríos, 2012).

Tornar-se feminista é fazer teoria do discurso (Colaizzi, 1992COLAIZZI, G. Feminismo y teoría del discurso: razones para un debate. Debate feminista, v. 5, p. 105-119, jan./jun. 1992.), pois ambas as dinâmicas propiciam a tomada de consciência sobre o caráter discursivo ou histórico-político das opressões. Os feminismos, enquanto prática política, decodificam e questionam as estruturas, os mandatos, as lógicas e os sentidos da dominação patriarcal. Trata-se de despatriarcalizar, conceito nascido no processo constituinte boliviano de 2008, como iniciativa da coletiva Mujeres Creando. Segundo Maria Galindo (2013GALINDO, M. ¿Qué es la despatriarcalización? In: GALINDO, M. No se puede descolonizar sin despatriarcalizar. Teoría y propuesta de la despatriarcalización. La Paz: Mujeres creando, 2013, p. 131-178.; 2018), esse termo promove o desmonte das camadas de opressão que assujeitam as mulheres. Os feminismos permitem às mulheres compreenderem a opressão sem sucumbirem (Lugones, 2012LUGONES, M. Subjetividad esclava, colonialidad de género, marginalidad y opresiones múltiples. Pensando los feminismos en Bolivia. In: MONTES, P. Pensando los feminismos en Bolivia. La Paz: Conexión Fondo de Emancipación, 2012, p. 129-140.).

A epistemologia feminista revelou o emaranhado material e simbólico da hegemonia masculina, explicitando-o mediante as seguintes metáforas: teto de cristal - denotando a invisibilidade dos constrangimentos que limitam a ascensão socioprofissional; chão escorregadio - mostrando a demora para acessar o emprego estável; escadas resvaladias - tratando dos empecilhos à mobilidade hierárquica; muros de cristal - significando os entraves para conseguir deslocamentos horizontais no interior de um mesmo nível hierárquico; cano furado - indicando que apesar de quantidade paritária de ingressantes as exigências institucionais incidem desigualmente sobre as mulheres estimulando sua deserção; e fronteiras de cristal - referindo-se aos obstáculos para beneficiar-se de incentivos fora do país de origem.

A homossociabilidade (De Armas; Venegas, 2016) nutre o pacto masculino ou comunidade de interesses (Mendoza, 2010MENDOZA, B. La epistemología del sur, la colonialidad del género y el feminismo latinoamericano. In. ESPINOSA, Y; DE LEONE, L. Aproximaciones críticas a las prácticas teórico-políticas del feminismo latinoamericano. Buenos Aires: En la Frontera. 2010, p. 19-36.) mediante práticas naturalizadas, como o viés sexista na seleção prioritariamente masculina para ocupar cargos de destaque, integrar grupos de pesquisa ou convites para publicações ou eventos. Trata-se da preferência por membros poderosos, com capacidade de influência ou melhor posicição para troca de favores como critérios para a consolidação de redes sociais e profissionais. Essa distinção sexual introduzida pela modernidade colonial é política, oculta as contradições do capitalismo e do sistema de gênero (Lugones, 2012LUGONES, M. Subjetividad esclava, colonialidad de género, marginalidad y opresiones múltiples. Pensando los feminismos en Bolivia. In: MONTES, P. Pensando los feminismos en Bolivia. La Paz: Conexión Fondo de Emancipación, 2012, p. 129-140.).

Maria Lugones (2012LUGONES, M. Subjetividad esclava, colonialidad de género, marginalidad y opresiones múltiples. Pensando los feminismos en Bolivia. In: MONTES, P. Pensando los feminismos en Bolivia. La Paz: Conexión Fondo de Emancipación, 2012, p. 129-140.), filósofa argentina, e Breny Mendoza (2010MENDOZA, B. La epistemología del sur, la colonialidad del género y el feminismo latinoamericano. In. ESPINOSA, Y; DE LEONE, L. Aproximaciones críticas a las prácticas teórico-políticas del feminismo latinoamericano. Buenos Aires: En la Frontera. 2010, p. 19-36.), acadêmica e feminista hondurenha, contribuíram ao debate do androcentrismo acadêmico a partir da noção de colonialidade de gênero. Para Lugones, esse conceito permite revelar um ser negado pela categoria mulher que ideologicamente remete à irracionalidade, fragilidade e ausência de papel público, desse modo relegada à domesticidade. Porém, esse conceito não se fundamenta na América Latina, mas na teoria feminista indígena estadunidense e africana. Assim, não pode esgrimir-se como aporte latino-americano nem consegue apreender a experiência das mulheres latino-americanas. Desse modo, a articulação teórica feminista latino-americana é uma pauta política em aberto contra o silenciamento (Mendoza, 2010) das contribuições das mulheres no discurso acadêmico.

Por discurso acadêmico-científico entendemos a produção e divulgação de textos situados que defendem atributos de rigor, clareza, formato genérico e estruturas léxico-gramaticais orientados para propósitos comunicativos específicos da academia (Bolívar, 2004BOLÍVAR, A. Análisis crítico del discurso de los académicos. Rev. Signos, v. 37, n. 55, p. 7-18, set./dez. 2004.; Bolívar; Parodi, 2014). Os gêneros acadêmicos tratam das práticas linguísticas e discursivas em contextos geralmente delimitados disciplinarmente (Bolívar; Parodi, 2014). Esses gêneros atrelam-se a uma perspectiva de ciência e conhecimento ancorada no eurocentrismo, padrão de poder colonial e capitalista que derivou na colonialidade do poder-saber. Trata-se de um padrão cognitivo, no qual o não-europeu ou, ampliando para o imperialismo, o não-estadunidense, é constituído como inferior, “sempre primitivo”, enquanto a Europa atribuiu para si o estatuto da racionalidade pretensamente universal. A colonialidade, enquanto legado epistemológico eurocêntrico instalado pela invasão colonial ibérica, impede-nos a compreensão a partir de epistemes próprias. É um espelho “onde nossa imagem é sempre, necessariamente, distorcida” (Quijano, 1992QUIJANO, A. Colonialidad y modernidade/racionalidade. Perú Indígena, v. 13, n. 29, p. 11-20, 1992., 116 e 126).

Resende e Silva (2017RESENDE, V.; SILVA, R. (Org.) Diálogos sobre resistência: organização coletiva e produção do conhecimento engajado. Campinas: Pontes, 2017., p. 59), analistas do discurso brasileiros, lembram que:

Alguns dos intelectuais homens do projeto Modernidade/Colonialidade eram tomados como “porta-vozes” da decolonialidade e, embora involuntariamente, poderiam estar repetindo um padrão de opressão machista, que, por meio do monopólio da fala, aumenta o silêncio de vários movimentos decoloniais liderados por mulheres negras e indígenas em diferentes locais da América Latina.

Apesar do pioneirismo do debate sobre a colonialidade do poder no trabalho de Quijano, por exemplo, consideramos mais pertinente aos objetivos deste texto o conceito de colonialidade de gênero de Lugones (2012LUGONES, M. Subjetividad esclava, colonialidad de género, marginalidad y opresiones múltiples. Pensando los feminismos en Bolivia. In: MONTES, P. Pensando los feminismos en Bolivia. La Paz: Conexión Fondo de Emancipación, 2012, p. 129-140.). Fazemos isso devido à ausência, nos trabalhos mais citados no âmbito do pensamento decolonial, da discussão das desigualdades denunciadas pelos feminismos e à pouca visibilidade que se confere às contribuições feministas latino-americanas em contraste com a autoria majoritária de homens brancos-mestiços, presumidamente heterossexuais e de classe média (Mendoza, 2010MENDOZA, B. La epistemología del sur, la colonialidad del género y el feminismo latinoamericano. In. ESPINOSA, Y; DE LEONE, L. Aproximaciones críticas a las prácticas teórico-políticas del feminismo latinoamericano. Buenos Aires: En la Frontera. 2010, p. 19-36.). Na contramão, a decolonialidade de gênero é ingrediente ativo na história de resistência ao sistema patriarcal, binário e heteronormativo. Lugones (2014, p. 948) propõe refletir sobre a construção de um feminismo decolonial, e define a colonialidade de gênero como

exercícios de poder concretos, intrincadamente relacionados, alguns corpo a corpo, alguns legalistas, alguns dentro de uma sala onde as mulheres indígenas fêmeas-bestiais-não-civilizadas são obrigadas a tecer dia e noite, outros no confessionário. As diferenças na concretude e na complexidade do poder sempre circulando não são compreendidas como níveis de generalidade; a subjetividade corporificada e o institucional são igualmente concretos.

Para Resende e Silva (2017RESENDE, V.; SILVA, R. (Org.) Diálogos sobre resistência: organização coletiva e produção do conhecimento engajado. Campinas: Pontes, 2017.), a ênfase no aspecto discursivo da colonialidade de gênero sustenta relevância de análises discursivas para compreender e desafiar modos de perpetuação desses exercícios de poder, como buscamos fazer neste estudo.

3 CONSTRUÇÃO DO CORPUS E OUTROS DETALHES METODOLÓGICOS

O corpus da pesquisa é formado por nove edições do plano de ensino da disciplina Pensamento Social e Político na América Latina, ofertada desde o primeiro semestre de 2015 no Departamento de Estudos Latino-americanos (ELA), do Instituto de Ciências Sociais (ICS), da Universidade de Brasília (UnB). As edições aqui consideradas referem-se às ofertas ministradas entre o primeiro semestre de 2015 e o segundo semestre de 2019. Ademais, investigamos as 81 referências bibliográficas1 1 Preliminarmente as organizamos numa matriz Excel mediante as categorias de autoria, gênero acadêmico e historicidade e nelas alocamos 10 subcategorias. Na primeira, incluímos as subcategorias identificação pessoal, sexo e localização disciplinar e institucional. Na segunda as subcategorias título, gênero textual, indexação e editorial. Na terceira, as subcategorias idioma, ano de publicação e tema. incluídas como literatura obrigatória desse curso. Essa disciplina foi priorizada neste estudo em decorrência do silenciamento das contribuições de mulheres na bibliografia. A propósito, vale destacar que foram estudantes graduandas, participantes de rodas de conversa idealizadas para vivenciar coletivamente o luto pelo feminicídio da estudante Louise Ribeiro nas dependências da UnB, em 2016, que instigaram o desenvolvimento de pesquisa sobre a paridade bibliográfica visando desnaturalizar a hegemonia da autoria masculina.

Nas nove edições da disciplina ministradas por professores do sexo masculino, somente 11% da bibliografia é de autoria de mulheres2 2 Inferida a partir da subcategoria ‘nome’. Como costumeiramente os nomes se configuram binariamente como masculinos ou femininos, essa inferência se fez necessária porque, salvo raras excepções, o sexo da autoria não se declara nas credenciais acadêmicas. Reconhecemos que o binarismo apaga identidades sexuais e de gênero e remete a entramados de violência hetero patriarcal. . Comparativamente, os índices de viés masculinizado apresentam-se mais dramáticos no contexto brasileiro. Em disciplinas de graduação em Relações Internacionais em universidades estadunidenses, por exemplo, a autoria masculina representa 79,1% quando ministradas por docentes homens. O viés diminui para 71,5% quando se trata de professoras (Colgan, 2017COLGAN, J. Gender Bias in International Relations Graduate Education? New Evidence from Syllabi. Political Science and Politics v. 50, n. 2, p. 456-460, ago./out. 2017.).

Nossa análise focaliza a ementa e a bibliografia, duas seções de seis que compõem os planos de ensino estudados - as restantes são: dados de identificação da disciplina, como nome da universidade, curso, disciplina, período, créditos, carga horária, docente responsável, horário e local; apresentação; avaliação e cronograma ou desagregação das unidades temáticas, que neste caso específico comporta a bibliografia para cada aula.

Nesse processo, nós nos guiamos pelas seguintes questões. O que diz fazer e o que efetivamente faz esta ementa? A priorização desta bibliografia adequa-se ao critério de paridade autoral de gênero? Por paridade autoral entendemos a equivalência quantitativa e qualitativa, que rompa com a segregação (Ruano-Ibarra; Araújo, 2019), o caráter de “exceção honrosa” e a “situação excêntrica” (Marc; Oñoro, 2021MARC, I; OÑORO, C. Introducción: transformaciones de la teoría y la crítica literaria feminista: del pensamiento a la acción. Tropelías: Revista de Teoría de la Literatura y Literatura Comparada, n. 36, p. 1-19, 2021.) sobre as contribuições das mulheres.

As categorias analíticas empregadas advêm dos estudos do discurso. A categoria de análise lexical nos interessou para este estudo, porque toma por base as palavras em seu contexto, iluminando os discursos a que remetem. Trata-se de desvendar os sentidos implicados nos vocábulos escolhidos e a implicação desse processo de escolha terminológica. A categoria de intertextualidade em textos acadêmicos se verifica na frequência de citações, configurando traço ou suporte disciplinar (Bolívar, 2004BOLÍVAR, A. Análisis crítico del discurso de los académicos. Rev. Signos, v. 37, n. 55, p. 7-18, set./dez. 2004.), estabelece diálogo direto ou indireto com textos e autorias, interpretando ou integrando, usando paráfrases, alusões ou repetições. “A intertextualidade é a combinação da voz de quem pronuncia um enunciado com outras vozes que lhe são articuladas. Essas vozes podem ser articuladas não apenas em discurso direto, quando se atualizam as palavras exatas do texto anterior, mas também em discurso indireto, parafraseando, resumindo, ecoando” (Ramalho; Resende, 2011RAMALHO, V; RESENDE, V. Análise de discurso (para a) crítica: o texto como material de pesquisa. Campinas: Pontes Editores, 2011., p. 134).

4 INDAGANDO A EMENTA A PARTIR DA ANÁLISE LEXICAL

Segundo Eliana Zanata, Maria Minguili e Ana Daibem (2013ZANATA, E.; MINGUILI, M.; DAIBEM, A. Orientações teórico-práticas sobre Projeto Político-Pedagógico: conceituações. São Paulo: CENEPP - UNESP. 2013.), educadoras brasileiras, a ementa subordina-se a diretrizes institucionais relativamente estáveis no tempo e ratificadas em instâncias superiores de gestão, delimitando e articulando o conteúdo na área específica de conhecimento da disciplina em questão. Ementas e planos de ensino podem ser considerados produções discursivas entrelaçando os gêneros burocrático e acadêmico.

De acordo com Griselda Casabone (2016CASABONE, G. El lenguaje burocrático como género. Una lectura crítica sobre las escrituras de la modernidad. Oficios Terrestres, n. 35, p. 1-21, set./dez. 2016.), educadora argentina, os traços próprios e específicos desse gênero excedem o âmbito da administração pública. Sua função primordial é deslindar responsabilidades mediante trâmites e expedientes que afetam agentes e dinâmicas sociais, sendo, portanto, um gênero de governança (Fairclough, 2003FAIRCLOUGH, N. Analysing Discourse: Textual Analysis for Social Research. London; New York: Routledge, 2003.). Na Universidade de Brasília (UnB), a ementa não é suscetível a mudanças discricionárias de quem estiver responsável por ministrar uma oferta específica. Alterações podem ser incluídas somente por decisão colegiada. Em função disso, a ementa é sempre a mesma nas ofertas estudadas, mas o plano de ensino e a bibliografia se alteram. Por norma superior, ao início de cada oferta na Universidade, docentes devem compartilhar com estudantes a ementa do curso, acrescida de plano de ensino detalhado, bibliografia e ferramentas de avaliação.

Vejamos a ementa da disciplina Pensamento Social e Político na América Latina3 3 A numeração de linhas foi acrescentada para nossos propósitos analíticos. :

1 2 3 4 5 6 7 A presente disciplina busca oferecer ao estudante de Graduação em Ciências Sociais uma observação acerca do Pensamento Social e Político Latino-americano. A disciplina tem como objetivo apresentar a historicidade e a diversidade de pensamentos e teorias produzidas sobre a realidade latino-americana. Um olhar de longa duração que evidencia uma solida e ampla trajetória de produção intelectual na região, evidências de uma identidade. Estudos, observações, ensaios, pesquisas, centradas na análise da realidade local, regional e global, em tempos e espaços específicos, com temas e centralidades próprias (UnB, 2015, p. 1).

Na análise dessa ementa, indagamos primeiramente quais são os objetivos declarados da disciplina e sua expressão lexical. A ementa sugere dois objetivos, embora apenas um se expresse como tal. O primeiro, descrito na primeira e segunda linhas, se expressa com “busca oferecer”. A opção por oferecer ativa o sentido de “propor para aceitar4 4 Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], https://dicionario.priberam.org/oferecer [consultado em 10-04-2021]. ”. Afirma-se assim que será oferecida “uma observação acerca do Pensamento Social e Político Latino-americano”. O termo observação denota preocupação por delimitar a abrangência temática e os limites, temporais e humanos, de docentes e discentes, para apreender esse campo de estudos no espaço-tempo da disciplina. À luz da categoria de interdiscursividade, pode-se frisar que esse objetivo evoca a impossibilidade humana de aceder à totalidade.

O segundo objetivo da disciplina se expressa de forma mais direta ao final da segunda linha com continuação na terceira: “apresentar a historicidade e a diversidade de pensamentos e teorias produzidas sobre a realidade latino-americana”. A opção pelo termo “apresentar” indica, conforme a primeira acepção desse vocábulo, “1. Pôr na presença de”, e na segunda acepção, “2. Estender-se para ser tomado5 5 Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2021. Disponível em: https://dicionario.priberam.org/apresentar. Acesso em: 29 set. 2021. ”. Ambas as acepções alertam sobre a presença tácita dos sujeitos do ensino-aprendizagem. Nessa trilha, cabe desvendar a audiência específica dessa ementa, sujeitos relativamente encobertos. A pessoa docente se encontra totalmente oculta. Contudo, sabemos que é encarnada por quem ministra a disciplina e sem ela a dinâmica de ensino aprendizagem não se completa.

Na primeira linha do excerto, descrito no singular e no masculino genérico, encontra-se a referência ao “estudante de Graduação em Ciências Sociais”. A opção pelo expressão “ao estudante” demarca a preferência pela linguagem binaria. O uso desse pronome oculta identidades de gênero e reforça o equívoco entendimento de que a universidade é um espaço preferentemente masculino. A simbologia implícita no uso institucional de pronomes binários se torna ofensiva e violenta para sujeitos que reivindicam a superação da linguagem heteronormativa. Essa constatação revela que as escolhas linguísticas na elaboração de documentos institucionais, especificamente as ementas de um plano de ensino, implicam decisões políticas situadas em disputas mais amplas, especificamente a prevalência do masculino genérico enquanto estratégia linguística de cunho patriarcal.

Assim, aderir ao uso de pronomes e vocábulos neutros implica reconhecer o caráter plural dos corpos discente e docente, e compreendê-los como sujeitos coletivos possuidores de diferenças, embora delimitados circunstancialmente ao espectro universitário. Os estudos feministas apontam que o dito binarismo de gênero é herança colonial ibérica instrumentalizada como marcadores sociais que apagam a pluralidade de gêneros - terceiros ou fluidos. Essa prática social vulnera direitos, dado que o gênero binário atribui funções sociais, possibilitando oportunidades ao universo masculino e negando-as a outras identidades. Porém, essa mudança sociolinguística enfrenta como percalços a eficácia de estratégias de desinformação6 6 Oposições defendem a tradição-imutabilidade linguística e negam as atribuições semânticas binárias para argumentar a incompatibilidade de uso de artigos e pronomes neutros para fins de compreensão. Os meios de comunicação ecoam-nos qualificando de complicador para quem faz leitura labial, lê braile ou sofre de dislexia. , proibição7 7 A Portaria nº 604 de 27, de outubro de 2021, da Secretaria Nacional Especial da Cultura, e dispositivos dos estados de Santa Catarina, em junho de 2021, e de Rondônia, em outubro de 2021, e do município de Divinópolis, em setembro de 2021 exemplificam a proibição da linguagem neutra nos textos oficiais como documentos escolares, provas, materiais didáticos, comunicados e editais. e ridicularização8 8 Em 2020, o humorista brasileiro Gregório Duvivier protagonizou um episódio, veiculado no youtube, ridicularizando-o. Como estratégia ético-política não citamos outras intervenções similares que travestem de humor, retórica da piada, da ironia e do sarcasmo a violência simbólica e androcêntrica. . Decodificar criticamente esses usos, lógicas e sentidos linguísticos e discursivos é situar-se nas lutas pela despatriarcalização e descolonialidade.

Os vocábulos “teorias” na segunda linha, “historicidade”, “diversidade” e as expressões “longa duração” e “ampla trajetória” na quarta linha, e as palavras “estudos, observações, ensaios, [e] pesquisas”, na quinta linha, apontam uma conceituação sobre o pensamento político e social Latino-americano fincada no campo acadêmico. Esse alinhamento parece aproximar-se das contribuições de Zea (1976ZEA, L. El pensamiento latino americano. 1976. Barcelona: Ariel.) e Marini (1994MARINI, R. M. Las raíces del pensamiento social latinoamericano. In: MARINI, R. M.; MILLÁN, M. La Teoria Social Latinoamericana. Los Orígenes Tomo II. Ciuda de México: El Caballito, 1994. p. 17-36.), que defenderam respectivamente o enquadramento filosófico e sociológico na definição sobre pensamento latino-americano.

Responsável pela concepção teórica e profissionalização desse campo, o filosofo mexicano Leopoldo Zea tem reconhecida influência. Zea (1976ZEA, L. El pensamiento latino americano. 1976. Barcelona: Ariel.) enfatizou a originalidade e a independência desse pensar, destacou como fundacional a ideologia de unidade latino-americana promovida por Simón Bolívar, enquanto silenciou a Manuela Sáenz (voltaremos a este assunto na próxima seção). De outra parte, o economista e sociólogo brasileiro Ruy Mauro Marini (1994MARINI, R. M. Las raíces del pensamiento social latinoamericano. In: MARINI, R. M.; MILLÁN, M. La Teoria Social Latinoamericana. Los Orígenes Tomo II. Ciuda de México: El Caballito, 1994. p. 17-36.) delimitou seu surgimento na formação dos Estados-nacionais independentes do colonialismo ibérico.

Esse alinhamento conceitual característico do discurso acadêmico, esperado por delimitação genérica, imprime tradições e rotinas que são apreendidas cotidianamente. Essa tradição discursiva apresenta marcas linguísticas diferenciadoras, como a conformação canônica e o vocabulário especifico de cada campo de estudos. O cânone não somente tem a função de criar adesão, coesão, imaginários e reconhecimento de determinadas tradições (Mignolo, 1994MIGNOLO, W. Entre el canon y el corpus: alternativas para los estudios literarios y culturales en y sobre América Latina. Nuevo texto crítico, v. 7, n. 1, p. 23-36, 1994.), mas também, assim como o jargão especializado, se fundamenta em sua lógica excludente e refratária.

Ao adotar esses termos inequívocos do fazer científico, a ementa situa-se na disputa conceitual desse pensamento. As fronteiras entre disciplinas apresentam tensionamentos, conflitos de autoridade e diferenças de valoração simbólica e institucional dos saberes Conforme defende Nelly Richard (2003), pesquisadora argentina, o saber acadêmico usufrui privilégios negados a campos historicamente estigmatizados sob o signo do ‘inútil’, o que ilustra com os exemplos da arte e da literatura.

Hierarquias disciplinares obedecem a violências implícitas, isto é, são balizadas por diferentes coeficientes de poder. Essa inequidade entre os saberes aparece diluída na conceituação de Ianni (2000IANNI, O. Enigmas do Pensamento Latino-Americano. São Paulo: Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo, 2000.) sobre pensamento latino-americano. A inclusão de música, poesia, fotografia, pintura e produção audiovisual em pé de igualdade com contribuições do gênero acadêmico radicalizou o caráter plural desse campo de estudos. Assim se tensiona a conceituação convencional que restringe o pensamento latino-americano à filosofia e à sociologia.

A presença de citações indiretas sobre as definições de Zea (1976ZEA, L. El pensamiento latino americano. 1976. Barcelona: Ariel.) e Marini (1994MARINI, R. M. Las raíces del pensamiento social latinoamericano. In: MARINI, R. M.; MILLÁN, M. La Teoria Social Latinoamericana. Los Orígenes Tomo II. Ciuda de México: El Caballito, 1994. p. 17-36.) na ementa remete à problematização teórica entre intertextualidade e interdiscursividade. Sabe-se que o mapeamento de relações intertextuais em textos específicos conduz a relações identificáveis de texto a texto. Na análise da ementa, o caminho contrário também se mostrou útil. O conhecimento prévio das palavras-chave do discurso estudado possibilitou o mapeamento interdiscursivo a partir da análise das escolhas lexicais, e o reconhecimento dos textos indiretamente pressupostos na ementa.

Salientamos que a definição de pensamento latino-americano também ganhou amplitude a partir do filósofo chileno Eduardo Valdés, para quem, até a primeira metade do século 20, esse pensamento tomou a forma de uma ampla rede de intelectuais que fez circular temas, problemas e conceitos de forma espontânea, sem planejamento propriamente dito (Valdés, 1997). Ao defini-lo como rede, ampliou o escopo conceitual, afastando-se do foco nos produtos e priorizando os sujeitos cognoscentes e as práticas colaborativas de produção. Duas décadas depois, enfatizou o crescimento dessas redes e a carência de concretização atribuída, em parte, a deficiências de reconhecimento e financiamento (Valdés, 2017).

Segundo Ianni, nas diferentes modalidades do pensamento latino-americano, subsiste a impressão de que “não apreende o que realmente está ocorrendo [nem] os problemas e os dilemas cruciais [...] os impasses, as condições e as possibilidades” que inquietam aos povos e nações latino-americanas. “[Enquanto] forma de autoconsciência e, simultaneamente, constitutivo dessa realidade, o pensamento tateia errático, ao acaso do jogo das forças sociais internas e externas [...] continua buscando conhecer-se, reconhecer-se, configurar-se, mover-se ou inserir-se” (Ianni, 2000, p. 1-6).

A partir dessa definição, destacamos o caráter dinâmico, situado e inacabado do pensamento em geral e do latino-americano em particular. Ainda com Ianni (2000IANNI, O. Enigmas do Pensamento Latino-Americano. São Paulo: Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo, 2000., p. 12), cumpre lembrar que o sujeito cognoscente ao pensar nomeia, constitui, significa e confere modos de ser e devir. Esse “pensamento que descreve, compreende, explica ou nomeia, participa decisivamente da constituição do objeto, seja este coisa, gente ou ideia [...]. A mesma razão que esclarece, compreende e explica, recobre, mutila, obscurece”. Os encobrimentos, as mutilações e apagamentos atrelam-se a delimitações e escolhas que se impõem ao ato de conhecer calcado em paradigmas ocidentais.

A repetição dos termos “evidências” (linha 4) e “evidencia” (linha 5) revela questões estilísticas. Entretanto, o vocábulo se repete tanto para afirmar a solidez da trajetória desse pensamento como para atribuir-lhe peso de traço identitário. A opção discursiva pelo termo evidenciar sugere uma situação ou fato invisibilizado, que se tornará evidente por meio de determinada ação. Isto é, a ementa não considera visível a trajetória intelectual desse pensamento, para tanto os termos “sólida” e “amplo” cumprem função avaliativa. De outra parte, se aponta uma identidade, no singular, escolha que indica subordinação ao paradigma monolítico da identidade nacional.

Questões de acentuação, estilística e sintaxe entre a quarta e a sexta linhas sugerem uma elipse ou estilo lacônico que comprometem a qualidade da redação. Por outro lado, apontam para dimensões, eventos e práticas de linguagem acopladas à criação do Departamento de Estudos Latino-americanos (ELA) da UnB em janeiro de 20199 9 Data de transferência integral da coordenação acadêmica da habilitação em Ciências Sociais, a habilitação em Estudos Latino-americanos ocorrerá com a implementação da reforma dos cursos de graduação do Instituto de Ciências Sociais (ICS). . A ementa se revela enquanto objeto textual atravessado por abordagens teórico-conceituais diversas e por embates, disputas e pressões impostas pelos tempos exíguos da gestão universitária.

As debilidades de acentuação, estilística e sintaxe referidas podem associar-se a dita coação temporal. Também podem ser indicativas de insuficiente entrosamento entre as pessoas responsáveis por redigir um corpo textual complexo integrado por ementas, planos de ensino, currículo, regulamentos e normativas, dentre outros, para efetivar a criação desse departamento e de um curso pioneiro no Brasil. Salientamos que essa demanda institucional se adicionou a metas de desempenho docente nos âmbitos de ensino, pesquisa e extensão universitária. Decorrente disso, emerge a exaustão do corpo docente, que sobrecarregado revela o depauperamento dessa profissão ou trabalho. Nessa afirmativa, o termo corpo sugere ambiguidade útil, pois refere tanto o coletivo de docentes como os corpos biológicos das pessoas que compõem dita coletividade, também exaustos.

À luz da análise lexical, em interface com as categorias de intertextualidade e interdiscursividade, mostramos que a ementa se desloca da fronteira atribuída no cotidiano de gestão e docência universitária. Embora as rotinas burocráticas e institucionais incidam em torná-la artefato reificado ou diminuído a mero procedimento da gestão educacional nossa análise sinaliza, em primeiro lugar, que ao alinhar-se a definições e vertentes do pensamento latino-americano situadas no campo acadêmico, a ementa impõe exclusões. A priorização bibliográfica atua na consolidação de referências e autorias canônicas. De outro lado, o predomínio lexical do masculino pretensamente universal referenda práticas discursivas sexistas e androcêntricas. Assim, uma ementa de disciplina, ainda que texto curto e aparentemente simples e burocrático, pode contribuir para reificar a colonialidade de gênero.

Em nosso estudo, um limite tênue separa o gênero burocrático do acadêmico diferindo principalmente em função dos objetivos, interações e processos desencadeados. Trata-se de práticas discursivas no contexto de uma instituição pública de ensino superior da qual participam sujeitos que encarnam uma variedade de posições e funções simultaneamente. Por exemplo, a professora que dirige um instituto ou departamento universitário, lidera a confecção do plano de ensino de determinado curso, ministra-o e produz pesquisas e publicações no campo em que a disciplina se insere. Essa justaposição de posições encarnadas transparece na forma de interdiscursividade, como mostramos ao referir as definições implícitas na ementa.

5 ANÁLISE INTERDISCURSIVA DA BIBLIOGRAFIA DE AUTORIA DE MULHERES

O quadro 1, mais adiante, mostra as categorias - autoria, gênero acadêmico e historicidade - e subcategorias a partir das quais indagamos a bibliografia de autoria de mulheres incluída nos planos de ensino. Por autoria de mulheres, entendemos as diversas visões de mundo que ganham forma na produção autoral situada em uma pluralidade de profissões e ofícios como, dentre outras, docência, crítica literária, literatura, música, artes, cinema e variados campos de conhecimento científico (Wuensch, 2015WUENSCH, A. Acerca da existência de pensadoras no Brasil e na América Latina. Problemata: R. Intern. Fil., v. 6, n. 1, p. 113-150. 2015.; Rossini, 2016ROSSINI, T. A construção do feminino na literatura: representando a diferença. Dossiê Literatura de Autoria feminina. Trem das Letras, v. 1, n. 3, p. 97-111, 2016.) 10 10 Essa noção requer atualização que reconheça os avanços informacionais impostos pelo capitalismo cognitivo, como o compartilhamento de dados na internet e os movimentos pelo livre acesso a bens imateriais (Pires; Lima, 2020). . Dessa polifonia emergem formas de compreensão que tensionam a subordinação epistêmica das mulheres.

A pessoa autora assume a função social a partir de suas representações sócio subjetivas e da situação concreta de enunciação. Níveis de autoria inter-relacionam-se com âmbitos de responsabilidade enunciativo-discursiva em relação aos discursos de outrem, como transcrição ipsis litteris; parafraseio formal ou mudança restrita a ordem de palavras; parafraseio semântico ou preservação do conteúdo citado; parafraseio mediante as próprias palavras; posicionamento valorativo sobre a citação; reinterpretação dentro ou fora do domínio discursivo de origem do enunciado citado, e questionamento e modificação, dentro e fora do domínio discursivo de origem da citação (Pereira; Leitão, 2015PEREIRA, R.; LEITÃO, P. Apreensão do discurso de outrem e autoria em gêneros acadêmico-científicos. Veredas-Revista de Estudos Linguísticos, v. 19, n. 2, p. 195-208, 2015.).

As oito autoras cujas contribuições foram incluídas na bibliografia se localizam disciplinarmente nas áreas de sociologia, história, antropologia, ciências sociais, direito e economia. Institucionalmente comportam vínculos com instituições latino-americanas de ensino superior de Argentina, Brasil, Chile e México, apenas uma declarou pertencimento a uma organização da sociedade civil. Esta constatação confirma nosso argumento sobre o predomínio do gênero situado acadêmico, o que não surpreende no domínio discursivo de nosso objeto. Essa prevalência, contudo, revela a colonialidade do saber: denota quais dispositivos são considerados legítimos para serem ensinados e aprendidos.

Essas referências enquadram gêneros situados acadêmicos, podendo ser assim agrupadas: artigo publicado em revista científica, capítulo de livro, capítulo de tese, resenha publicada em revista científica e manuscrito divulgado em site especializado. Artigos científicos e capítulos de livro concentram dois terços das referências, cada gênero com igual quantidade. Esse dado indica que, apesar da crescente relevância do artigo como instrumento de disseminação e divulgação do conhecimento científico, a presença de capítulos de livros teria contornado o questionamento, segundo Alda Alves (1992ALVES, A. A “revisão da bibliografia” em teses e dissertações: meus tipos inesquecíveis. Cad. Pesp. São Paulo, n. 81, p. 53-60, set./dez. 1992.), educadora brasileira, de que os livros se comparados aos artigos refletem com certo atraso o estado da arte do campo em questão.

A categoria historicidade permite problematizar o idioma e a dimensão histórico-temporal dessa bibliografia. Mais da metade dessas referências está escrita em língua portuguesa, aspecto acorde com as normativas brasileiras que estabelecem predominância da língua oficial quando se trata de cursos de graduação. De outra parte, a inclusão somente das línguas ibéricas oculta o pensamento latino-americano escrito em francês, para os casos de Haiti e Guianas, e as mais de 420 línguas indígenas11 11 O subcontinente possui 99 famílias linguísticas, tornando-se a região linguística mais rica do planeta. A Arawak é a família linguística mais extensa abrange desde Centro América até a Amazonia, dela procedem 40 línguas. Dentre 103 idiomas nativos transfronteiriços, o quíchua é falado na Argentina, Bolívia, Colômbia, Chile, Equador e Peru (UNICEF, 2007). desconhecidas na divulgação científica. Essa hegemonia linguística revela a colonialidade constitutiva do saber científico. Cecilia Rivera (2013RIVERA, C. Las lenguas de la ciencia y la academia… No son las lenguas de la inclusión. In: ZAPATA, M.; GARCÍA, S.; CHAN, J. La interseccionalidad en debate. Actas del Congreso Internacional “Indicadores Interseccionales y Medidas de Inclusión Social en Instituciones de Educación Superior”. Berlín: Instituto de Estudios Latinoamericanos, 2013. p. 207-222.), antropóloga peruana, trata da escala de dominação e prestígio linguístico para denunciar a marginalização e estigmatização das línguas nativas e as pessoas falantes.

Quadro 1
Perfil da autoria de mulheres na bibliografia do plano de ensino da disciplina Pensamento Social e Político na América Latina

Considerando a definição de Marini (1994MARINI, R. M. Las raíces del pensamiento social latinoamericano. In: MARINI, R. M.; MILLÁN, M. La Teoria Social Latinoamericana. Los Orígenes Tomo II. Ciuda de México: El Caballito, 1994. p. 17-36.) que associou o pensamento latino-americano à formação dos estados nacionais no século XIX, o fato da referência mais antiga do corpus ser de 2005 instigou a indagarmos sobre a autoria de mulheres pioneiras. Identificamos 24 pensadoras, situadas em onze países - Argentina, Brasil, Chile, Colômbia, Cuba, Equador, México, Peru, Porto Rico, Uruguai e Venezuela. Essas pensadoras contribuíram formando um amplo e heterogêneo corpus para, desde perspectivas ecléticas, questionar diferentes assuntos, entre eles as ideologias patriarcais.

Fazemos questão de aqui referi-las por seus nomes, em ordem cronológica pelo ano de nascimento: a) Manuela Sáenz de Vergara e Aizpuru (1797-1856), escritora, política mulher-soldado, general equatoriana; b) Josefa Acevedo de Gómez (1803-1861), escritora colombiana; c) Juana Manuela Gorriti Zuviria (1818-1892), escritora argentina; d) Juana Manso (1819-1875), escritora e educadora argentina; e) Maria Firmina dos Reis (1825-1917) Escritora negra, abolicionista e educadora brasileira concursada de educação primaria; f) Dolores Veintimilla (1829-1857) poetisa equatoriana; g) Soledad Acosta de Samper (1833- 1913), escritora colombiana; h) Carolina Freyre de Jaimes (1844-1916), escritora peruana; i) Mercedes Cabello de Carbonera (1845- 1909), escritora peruana; j) Clorinda Matto de Turner (1852-1909), escritora e indigenista peruana; k) Ignez Sabino (1853-1911), escritora, integrante da sociedade abolicionista brasileira Aves Libertas; l) Marieta Veintimilla (1858-1907), escritora e política equatoriana; m) Luisa Capetillo (1879-1922) escritora, periodista, sindicalista obreira e feminista porto-riquenha; 14) Maria Dulce Borrero (1883-1945), escritora e pedagoga cubana; n) Alicia Moreau de Justo (1885- 1986), médica e política argentina; o) Amanda Labarca (1886-1975), educadora chilena; p) Delmira Agustini (1886-1914), escritora uruguaia; q) Gabriela Mistral (1889-1957), escritora chilena, prêmio Nobel de literatura12 12 Primeira e única mulher latino-americana do continente em conquistá-lo. Após Mistral, foram agraciados o guatemalteco Miguel Ángel Asturias (1967), o chileno Pablo Neruda (1971), o colombiano Gabriel García Márquez (1982), o mexicano Octavio Paz (1990) e o peruano Mario Vargas Llosa (2010). Essa premiação confirma a potência da literatura latino-americana e sua eficácia para tornar universais os dilemas idiossincráticos desta região. em 1945; r) Teresa de La Parra (1889-1936), escritora venezuelana; s) Matilde Hidalgo (1889- 1974), Poeta, médica pediatra, feminista, política- eleita Deputada Suplente em 1941; t) Victoria Ocampo (1890-1979), escritora argentina; u) Alfonsina Storni (1892-1938), poetisa argentina; v) Juana de Ibarbourou (1892-1979), poetisa uruguaia; e w) Concha Meléndez (1895-1983), educadora e escritora porto-riquenha.

Antes de pretender uma lista exaustiva ao nomeá-las, alertarmos para o ocultamento da autoria de mulheres como prática que compromete a cientificidade. Sua exclusão de uma disciplina dedicada ao pensamento latino-americano aponta o androcentrismo mascarado em definições canônicas sobre o que seja o pensamento latino-americano. Sua localização na literatura, poesia, jornalismo, educação, medicina, sindicalismo e campo político-partidário atesta a relevância de seus pensamentos latino-americanos e indica que o silenciamento da autoria de mulheres não se limita aos campos historicamente estigmatizados - arte e literatura cuja estigmatização também problematizamos.

As intelectuais latino-americanas do século XIX escreveram numa pluralidade de gêneros discursivos e se envolveram ativamente nos assuntos públicos. Nesses textos, foram compelidas a nomear o patriarcado para questioná-lo (Pratt, 2000PRATT, M. L. “No me interrumpas”: las mujeres y el ensayo latinoamericano. Debate Feminista, v. 21, p. 70-88, 2000.). Todavia, a cidadania das mulheres foi apenas uma de suas principais preocupações. Por isso, a bibliografia canônica exige ser pensada dialeticamente. Por exemplo, numa disciplina de Pensamento Social e Político Latino-americano, seria relevante alertar para o caráter androcêntrico do destaque fundacional atribuído por Zea (1976ZEA, L. El pensamiento latino americano. 1976. Barcelona: Ariel.) a Simón Bolívar, considerando a Carta de Jamaica. O caráter androcêntrico dessa atribuição repousa no esquecimento da autoridade histórica e política de Manuela Sáenz e seu “aprimorado senso geopolítico e perspectiva transfronteiriça latino-americana, além de ser a primeira exilada política do continente” (Ruano-Ibarra; Resende, 2022, 419).

Focalizemos os agrupamentos temáticos construídos a partir das palavras-chave que compõem os títulos analisados: sistematização do pensamento social e político latino-americano, capital-imperialismo, capitalismo dependente petroleiro-rentista, dominação geopolítica, estudos de gênero, zapatismo, afrodescendentes, América Latina e Caribe, e Cone Sul. Os cinco primeiros agrupamentos referem campos de estudo ou conceitos; zapatismo e afrodescendentes indicam categorias sociopolíticas; já os últimos termos, além de categorias geográficas, referem objetos analíticos. A partir disso e do critério de proximidade temática, esse agrupamento inicial desdobrou-se no enquadramento temático apresentado no quadro 2.

Quadro 2
Enquadramento temático dos títulos

O quadro 2 permite tecer as seguintes inferências: a maioria dos textos se enquadra em duas temáticas; as três primeiras temáticas remetem à Teoria Social latino-americana, em que os estudos sobre o capitalismo13 13 Vania Bambirra (1940 -2015), economista, socióloga e cientista política brasileira é usualmente excluída das referências canônicas desta temática, dentre os mais conhecidos: 1. Ramiro Guerra (1880-1970), historiador, economista e pedagogo cubano; 2. José Carlos Mariátegui (1894-1930), escritor, jornalista e pensador político peruano; 3. Victor Raul Haya de la Torre (1895-1979), filósofo político peruano; 4. Caio Prado Junior (1907-1990), historiador brasileiro; 5. Sergio Bagú (1911-2002), jornalista, advogado, historiador e sociólogo argentino; 6. Julio César Jobet (1912-1980), historiador, político e intelectual chileno; 7. Rafael Ramos Pedrueza (1897-1943), intelectual mexicano; 8. Silvio Frondizi (1907-1974), advogado e intelectual marxista argentino; 9. José Revueltas (1914-1976), escritor e ativista político mexicano; 10. Pablo González Casanova (1922), sociólogo mexicano; 11. Raúl Prebisch (1901-1986), político, acadêmico e economista argentino; 12. Celso Furtado (1920-2004), economista brasileiro; 13. Aníbal Pinto (1825-1884), advogado e político chileno e 14. Gino Germani (1911-1979), sociólogo argentino. têm centralidade. Além disso, os títulos e gêneros - artigo de revisão e resenha - das duas referências que remetem à sistematização do pensamento latino-americano indicam que as autoras se debruçaram sobre contribuições de autoria masculina com certo caráter canônico.

Segundo Mary Louise Pratt (2000PRATT, M. L. “No me interrumpas”: las mujeres y el ensayo latinoamericano. Debate Feminista, v. 21, p. 70-88, 2000.), crítica literária e linguista estadunidense, sobre o cânone pesam determinações e hierarquias sociais de gênero, raça e classe, no entanto, os critérios de inclusão-exclusão são instáveis e passíveis de mudança. Nessa trilha, ganha destaque nosso questionamento à exclusão de contribuições da autoria das mulheres no século XIX. Nesse aspecto, salientamos que priorizar referências bibliográficas na composição de um plano de ensino é um ato de poder. Essa inclusão contribui para a divulgação e fidelização entre as nascentes comunidades intelectuais, pois as referências apresentadas constituirão o acervo bibliográfico das novas gerações de profissionais. Por isso, ponderamos que, ao definir prioridades bibliográficas, relegam-se tacitamente autorias, temáticas e debates. Assim entendemos a afirmativa da socióloga brasileira Maria Teresa Citeli (2015CITELI, M. T. Mulheres nas ciências: mapeando campos de estudo. Cadernos Pagu, n. 15, p. 39-75, set./dez. 2015.), quando afirma que a priorização bibliográfica se desdobra em ritualização discursiva, qualificação, fixação de autoridade e legitimação.

A incipiente inclusão da autoria de mulheres nos planos de ensino mostra que, apesar da crescente contribuição intelectual, as práticas excludentes mantêm as mulheres à margem. Isso se torna mais dramático porque, conforme Ribeiro et al (2017RIBEIRO, L. et. al. A saia justa da Arqueologia Brasileira: mulheres e feminismos em apuro bibliográfico. Estudos Feministas, v. 25, n. 3, p. 1093-1110, 2017., p. 1093), embora “uma não desprezível parcela de mulheres particip[e] da comunidade científica”, as assimetrias de gênero são naturalizadas. Por isso, o campo acadêmico apenas timidamente reflete sobre a equalização de gênero na produção e circulação de ideias. Nesse sentido, justifica-se a importância de indagar, por exemplo, sobre o porquê da carência de regras explícitas em relação à paridade na composição de gênero na bibliografia das diferentes disciplinas de ensino superior.

Partindo da premissa de que as práticas androcêntricas não são exclusivas do gênero masculino, mediante a categoria de intertextualidade nos debruçamos sobre as citações de autoria de mulheres e a autorreferenciação. Segundo Rosana Rodríguez (2021RODRÍGUEZ, R. Pasar la teoría por el propio cuerpo. Una herramienta descolonial contra el extractivismo metodológico. In: RODRÍGUEZ, R.; MARQUES, S.; BROZOVICH, V. Corpobiografías de sanación: escrituras, cuerpos y saberes de mujeres. Mendoza: Universidad del Cuyo, 2021. p. 19-46.), socióloga argentina, citações acadêmicas atribuem autoridade14 14 Apesar de nosso foco, cabe mencionar a existência de outras práticas como a citação-recompensa, a citação-agradecimento, a citação-política para incidir no aceite para publicação e a citação-álibi destinada a dissipar o ceticismo, por exemplo. discursiva aos saberes e vivências. Não encontramos citações cruzadas entre as referências em análise. Vale informar que duas publicações de Ceceña (2006; 2009), diferentes da estudada por nós, foram citadas por Fontes (2010). O quadro 3 mostra, em contraste com as porcentagens de citação acadêmica referidos por Colgan (2017COLGAN, J. Gender Bias in International Relations Graduate Education? New Evidence from Syllabi. Political Science and Politics v. 50, n. 2, p. 456-460, ago./out. 2017.), que a maioria das autoras utilizou mais de 20% de referências de autoria de mulheres. Esse dado poderia ser lido como indicativo de mudança favorável às mulheres, mas quando a indagação focaliza o regime de citações para cada tema ratifica-se a permanência das práticas androcêntricas.

Destacamos que dos quatro temas apresentados no quadro 3, maia adiente, capitalismo e sistematização do pensamento latino-americano abraçam os textos com menor porcentagem de autoria de mulheres. Vale lembrar que pontuamos que o cânone privilegia temáticas e debates, além de autorias. Essa afirmativa permite salientar que a temática do capitalismo é tributária do debate hegemônico na teoria social latino-americana - aqui nos referimos às construções sobre centro-periferia e dependência. Como dissemos, esses estudos projetaram a autoria masculina e o ocultamento das mulheres. Por isso, não surpreende que as publicações voltadas para sistematizar o pensamento latino-americano reincidam no regime androcêntrico de citações.

Observamos a utilização paritária de referências de autoria de mulheres na maioria dos textos da temática de minorias políticas. Essa constatação remete aos debates sobre a divisão sexual do trabalho intelectual e a feminização de certos campos de pesquisa, ambas manifestações androcêntricas. A autoria de mulheres alcançou 60% no texto de Teresa Valdés, cientista social argentina. Surpreende que esse índice não fosse maior, pois o texto se volta para os estudos de gênero no cone sul, campo em que habitualmente se desempenham mulheres e sujeitos com identidades de gênero não binarias. As referências masculinas citadas por Valdés são euro-estadunidenses de prestígio, porém sua contribuição ao argumento temático em tela é tênue, aspecto que sugere a colonialidade do saber e de gênero.

Quadro 3
Disparidade de gênero e autocitação na bibliografia de autoria de mulheres.

O índice de autocitação somente supera 50% em três das oito referências, Valdés (2007VALDÉS, T. Estudios de género: una mirada evaluativa desde el cono sur. In: ARANGO, L.; PUYANA, H. Género, mujeres y saberes en América Latina: entre el movimiento social, la academia y el Estado. Bogotá: UNAL. 2007. p. 47-62.), Ceceña (2016) e van der Haar (2005). Como essa expressividade se localiza na temática voltada para minorias, inferimos que esse dado também sinaliza as consequências do androcentrismo intelectual. Focalizar a autorreferenciação é relevante porque essa prática demonstra suficiência para acrescer o estado da arte do assunto desenvolvido. Além disso, mediante autocitações15 15 Não devemos esquecer, contudo, que a redundância superior a 20% (Saraiva; De Pádua Carrieri, 2009) e o autoplágio comprometem a cientificidade (Vazquez Moctezuma, 2016). se estabelecem elos entre produções acadêmicas próprias, revelando amadurecimento do raciocínio autoral. Acreditamos que a incipiente porcentagem no corpus estudado não se dissocia do contexto amplo de marginalização do trabalho científico das mulheres.

A ruptura desse contexto se potencializa quando refletimos sobre o lugar a partir do qual escrevemos, sobre como e para que criamos textos acadêmicos. Esses questionamentos refletem-se na noção de palavra-corpo-geografia (Sotelo, 2019SOTELO, H. Escritura crítica orgánica para deconstruir la opresión femenina: una propuesta feminista a revolucionar la pedagogía de la enseñanza en la creación literaria. 2019. Tese Doutoral. Departamento de Educação da Universidade de Texas. 240 p.) e na Escrita Crítica Orgânica (ECO), cunhada pelos estudos socioculturais e lutas feministas. Nesse processo reflexivo e criativo, sopesamos a imitação, a reprodução e a influência para assumir o sentido comunitário da criação intelectual (Anzaldúa, 2015ANZALDÚA, G. Light in the Dark/Luz en lo Oscuro: Rewriting Identity, Spirituality, Reality. Duke University Pres, 2015.). Desse modo, conforme a doutora em retórica e comunicação mexicana Clara Rojas (2016ROJAS, C. Andamiaje Retórico de Género: Un conocimiento situado en la Universidad (2008-2012). Ciudad de México: Publicaciones Universidad Autónoma de Ciudad Juárez, 2016.), damos espaço ao autorreconhecimento da voz própria e tensionamos a sutileza das práticas androcêntricas que configuram a gramática do silenciamento e a retórica da superioridade masculina.

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Neste artigo, guiamos nossas reflexões sobre práticas androcêntricas no campo acadêmico-burocrático analisando nove edições do plano de ensino da disciplina Pensamento Social e Político na América Latina, considerando as seguintes questões: O que diz fazer e o que efetivamente faz esta ementa? A priorização desta bibliografia adequa-se ao critério de paridade autoral de gênero? Para a primeira questão, estudamos a ementa em análise lexical, intertextual e interdiscursiva. As análises apontam deslocamento entre as fronteiras de gestão e docência: rotinas burocráticas fazem das ementas artefato reificado e reduzido a procedimento de gestão. No âmbito acadêmico, contudo, o alinhamento a definições e vertentes do pensamento latino-americano sugere exclusões, como sustentamos neste artigo. Quanto à bibliografia, ressaltamos a exclusão de referência ao pensamento de mulheres relevantes à formação do pensamento latino-americano, notadamente em produções do século XIX, e sustentamos que a definição de prioridades bibliográficas pode servir ao esquecimento de autorias, temáticas e debates.

Ensinar Pensamento Latino-americano exige movimentos múltiplos: epistêmicos, disciplinares, geográficos, sendo o primeiro o mais desafiador. Trata-se de dispor-se à abertura para construções externas ao campo científico, incluindo poesia, literatura, fotografia, audiovisual e música - as últimas possibilitam a inclusão de registros orais, desafiando a supremacia da escrita no debate acadêmico. O baixo deslocamento disciplinar aparece atrelado à centralidade da bibliografia localizada na teoria sociológica latino-americana. No âmbito geográfico, impõe-se a urgência de tensionar o circuito hegemônico, reconhecendo e divulgando autorias situadas em países diferentes de Argentina, Brasil, Chile e México.

A análise discursiva da ementa de planos de ensino revela a subordinação do gênero acadêmico ao burocrático e a refração diante dos gêneros literários e artísticos. A sujeição de gêneros coloca em relevo os atravessamentos das posições encarnadas dos sujeitos discursivos, isto é, a autoria dos planos de ensino repousa em pessoas acadêmicas encarnando funções burocráticas. O prestígio da posição acadêmica exerce subordinação sobre outras situações que remetem a relações de poder. Essa influência no interior do campo acadêmico reproduz desigualdades, como observamos na análise da priorização de autorias masculinas, a qual incide na divulgação e consolidação de referências canônicas.

REFERÊNCIAS

  • ALVES, A. A “revisão da bibliografia” em teses e dissertações: meus tipos inesquecíveis. Cad. Pesp. São Paulo, n. 81, p. 53-60, set./dez. 1992.
  • ANZALDÚA, G. Light in the Dark/Luz en lo Oscuro: Rewriting Identity, Spirituality, Reality. Duke University Pres, 2015.
  • BAETA, M. Misoginia en el mundo científico: cultura androcentrista. Estúdios, v. 8, n. 15, p. 71-83, jan./jun. 2015.
  • BLAZQUEZ GRAF, N; FLORES, F; RÍOS, M. Investigación feminista: epistemología, metodología y representaciones sociales. Ciudad de México: UNAM, 2012.
  • BOLÍVAR, A. Análisis crítico del discurso de los académicos. Rev. Signos, v. 37, n. 55, p. 7-18, set./dez. 2004.
  • BOLÍVAR, A; PARODI, G. Academic and Professional Discourse. In: PARODI, G. The Routledge Handbook of Hispanic Applied Linguistics. Abingdon: Routledge, 2014. p. 475-492.
  • CASABONE, G. El lenguaje burocrático como género. Una lectura crítica sobre las escrituras de la modernidad. Oficios Terrestres, n. 35, p. 1-21, set./dez. 2016.
  • CECEÑA, A. La dominación de espectro completo. Revista de Estudos e Pesquisas sobre as Américas, v. 8, n. 2, s/p. 2014.
  • CITELI, M. T. Mulheres nas ciências: mapeando campos de estudo. Cadernos Pagu, n. 15, p. 39-75, set./dez. 2015.
  • COLAIZZI, G. Feminismo y teoría del discurso: razones para un debate. Debate feminista, v. 5, p. 105-119, jan./jun. 1992.
  • COLGAN, J. Gender Bias in International Relations Graduate Education? New Evidence from Syllabi. Political Science and Politics v. 50, n. 2, p. 456-460, ago./out. 2017.
  • DE ARMAS, T.; VENEGAS, Cr. Patriarcado y capitalismo académico: la reproducción de las violencias. In: Red Chilena Contra la Violencia hacia las Mujeres. (Org.) Educación no sexista. Hacia una real transformación. Santiago: Red Chilena contra la Violencia hacia las Mujeres, 2016. p. 57-66.
  • FAIRCLOUGH, N. Analysing Discourse: Textual Analysis for Social Research. London; New York: Routledge, 2003.
  • GALINDO, M. ¿Qué es la despatriarcalización? In: GALINDO, M. No se puede descolonizar sin despatriarcalizar. Teoría y propuesta de la despatriarcalización. La Paz: Mujeres creando, 2013, p. 131-178.
  • GALINDO, M. La revolución feminista se llama despatriarcalización. In: BRENNA, J; CARBALLO, F. América Latina: de ruinas y horizontes. La política de nuestros días, un balance provisorio. Ciudad de México: Bonilla Artigas Editores, 2018, p. 611-628.
  • GARINO, A. Rodolfo Stavenhagen, las tesis latinoamericanas. Análisis Político, v. 31, n. 94, p. 206-208. 2018.
  • IANNI, O. Enigmas do Pensamento Latino-Americano. São Paulo: Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo, 2000.
  • IGREJA, R; AGUDELO, C. Afrodescendentes na América Latina e Caribe: novos caminhos, novas perspectivas em um contexto global multicultural. Revista de Estudos e Pesquisa sobre as Américas, v. 8, n. 1, p. 13-28, 2014.
  • LUGONES, M. Rumo a um feminismo descolonial. Revista Estudos Feministas, v. 22, n. 3, p. 935-52, 2014.
  • LUGONES, M. Subjetividad esclava, colonialidad de género, marginalidad y opresiones múltiples. Pensando los feminismos en Bolivia. In: MONTES, P. Pensando los feminismos en Bolivia. La Paz: Conexión Fondo de Emancipación, 2012, p. 129-140.
  • MALUSÁ, S. A prática da docência universitária. São Paulo: Factash, 2003.
  • MARC, I; OÑORO, C. Introducción: transformaciones de la teoría y la crítica literaria feminista: del pensamiento a la acción. Tropelías: Revista de Teoría de la Literatura y Literatura Comparada, n. 36, p. 1-19, 2021.
  • MARINI, R. M. Las raíces del pensamiento social latinoamericano. In: MARINI, R. M.; MILLÁN, M. La Teoria Social Latinoamericana. Los Orígenes Tomo II. Ciuda de México: El Caballito, 1994. p. 17-36.
  • MENDOZA, B. La epistemología del sur, la colonialidad del género y el feminismo latinoamericano. In. ESPINOSA, Y; DE LEONE, L. Aproximaciones críticas a las prácticas teórico-políticas del feminismo latinoamericano. Buenos Aires: En la Frontera. 2010, p. 19-36.
  • MIGNOLO, W. Entre el canon y el corpus: alternativas para los estudios literarios y culturales en y sobre América Latina. Nuevo texto crítico, v. 7, n. 1, p. 23-36, 1994.
  • MOTTA-ROTH, D; HENDGES, G. Produção textual na universidade. São Paulo: Parábola Editorial, 2010.
  • PARDO ABRIL, N. Cómo hacer análisis crítico del discurso. Una perspectiva latinoamericana. Bogotá: OPR Digital, 2013.
  • PEREIRA, R.; LEITÃO, P. Apreensão do discurso de outrem e autoria em gêneros acadêmico-científicos. Veredas-Revista de Estudos Linguísticos, v. 19, n. 2, p. 195-208, 2015.
  • PIRES, A.; LIMA, S. Função-autor de Foucault e comodificação discursiva no contexto do capitalismo cognitivo. Vialitterae, v. 12, p. 292-304, 2020.
  • PRATT, M. L. “No me interrumpas”: las mujeres y el ensayo latinoamericano. Debate Feminista, v. 21, p. 70-88, 2000.
  • QUIJANO, A. Colonialidad y modernidade/racionalidade. Perú Indígena, v. 13, n. 29, p. 11-20, 1992.
  • RAMALHO, V; RESENDE, V. Análise de discurso (para a) crítica: o texto como material de pesquisa. Campinas: Pontes Editores, 2011.
  • RESENDE, V.; SILVA, R. (Org.) Diálogos sobre resistência: organização coletiva e produção do conhecimento engajado. Campinas: Pontes, 2017.
  • RIBEIRO, L. et. al. A saia justa da Arqueologia Brasileira: mulheres e feminismos em apuro bibliográfico. Estudos Feministas, v. 25, n. 3, p. 1093-1110, 2017.
  • RIVERA, C. Las lenguas de la ciencia y la academia… No son las lenguas de la inclusión. In: ZAPATA, M.; GARCÍA, S.; CHAN, J. La interseccionalidad en debate. Actas del Congreso Internacional “Indicadores Interseccionales y Medidas de Inclusión Social en Instituciones de Educación Superior”. Berlín: Instituto de Estudios Latinoamericanos, 2013. p. 207-222.
  • RODRÍGUEZ, R. Pasar la teoría por el propio cuerpo. Una herramienta descolonial contra el extractivismo metodológico. In: RODRÍGUEZ, R.; MARQUES, S.; BROZOVICH, V. Corpobiografías de sanación: escrituras, cuerpos y saberes de mujeres. Mendoza: Universidad del Cuyo, 2021. p. 19-46.
  • ROJAS, C. Andamiaje Retórico de Género: Un conocimiento situado en la Universidad (2008-2012). Ciudad de México: Publicaciones Universidad Autónoma de Ciudad Juárez, 2016.
  • ROSSINI, T. A construção do feminino na literatura: representando a diferença. Dossiê Literatura de Autoria feminina. Trem das Letras, v. 1, n. 3, p. 97-111, 2016.
  • RUANO-IBARRA, E; ARAÚJO, J. Participação-autoria e coordenação liderança feminina nas reuniões anuais da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais (Anpocs). Millcayac Revista Digital de Ciencias Sociales, v. 6, n. 11, p. 31-62, 2019.
  • RUANO-IBARRA, E; RESENDE, V. A sub-representação da autoria de mulheres na bibliografia de disciplinas de ensino superior. RBPG, Revista Brasileira da Pós-Graduação, v. 18, p. 1-31, 2023.
  • RUANO-IBARRA, E; RESENDE, V. Agências de mulheres nas independências das lutas bolivarianas aos levantes brasileiros. Sociologias (UFRGS), v. 24, p. 416-441, 2022.
  • SÁNCHEZ, D. Androcentrismo en la ciencia. Una perspectiva desde el análisis crítico del discurso. In: BARRAL, M.; MAGALLÓN, C.; MIQUEO, C.; SÁNCHEZ, D. (eds.). Interacciones ciencia y género: discursos y prácticas científicas de mujeres. Barcelona: Icaria, 1999. p. 161-184.
  • SARAIVA, E.; DE PÁDUA CARRIERI, A. Citações e não citações na produção acadêmica de estratégia no Brasil: uma reflexão crítica. Revista de Administração-RAUSP, v. 44, n. 2, p. 158-166. 2009.
  • SOTELO, H. Escritura crítica orgánica para deconstruir la opresión femenina: una propuesta feminista a revolucionar la pedagogía de la enseñanza en la creación literaria. 2019. Tese Doutoral. Departamento de Educação da Universidade de Texas. 240 p.
  • UnB. Ementa da disciplina Pensamento Social e Político na América Latina. 2015. Disponível em: http://ela.unb.br/graduacao/disciplinas-graduacao Acesso em: 9 out. 2023.
    » http://ela.unb.br/graduacao/disciplinas-graduacao
  • VALDÉS, E. El pensamiento latinoamericano a comienzos del siglo XX: La reivindicación de la identidad. Anuario de Filosofía Argentina y Americana, v. 14, p. 11-76. 1997.
  • VALDÉS, E. Las investigaciones sobre el pensamiento sur americano y la circulación de los saberes. Ponencia presentada en la 21ª Jornada de Investigación y Extensión y Conocimiento de Paz. Universidad Tecnológica y Pedagógica de Colombia. 3 de octubre de 2017. Disponível em: https://youtu.be/NF9NcceIJrc Acesso em: 9 out. 2023.
    » https://youtu.be/NF9NcceIJrc
  • VALDÉS, T. Estudios de género: una mirada evaluativa desde el cono sur. In: ARANGO, L.; PUYANA, H. Género, mujeres y saberes en América Latina: entre el movimiento social, la academia y el Estado. Bogotá: UNAL. 2007. p. 47-62.
  • VAN DER HAAR, G. El movimiento zapatista en Chiapas: dimensiones de su lucha. Labour Again Publications. 2005. Disponível em: http://www.iisg.nl/labouragain/documents/vanderhaar.pdf Acesso em: 9 out. 2023.
    » http://www.iisg.nl/labouragain/documents/vanderhaar.pdf
  • VAZQUEZ MOCTEZUMA, S. Ética en la publicación de revistas académicas: percepción de los editores en ciencias sociales. Innov. educ., v. 16, n. 72, p. 53-74. 2016.
  • WUENSCH, A. Acerca da existência de pensadoras no Brasil e na América Latina. Problemata: R. Intern. Fil., v. 6, n. 1, p. 113-150. 2015.
  • ZANATA, E.; MINGUILI, M.; DAIBEM, A. Orientações teórico-práticas sobre Projeto Político-Pedagógico: conceituações. São Paulo: CENEPP - UNESP. 2013.
  • ZEA, L. El pensamiento latino americano. 1976. Barcelona: Ariel.
  • 1
    Preliminarmente as organizamos numa matriz Excel mediante as categorias de autoria, gênero acadêmico e historicidade e nelas alocamos 10 subcategorias. Na primeira, incluímos as subcategorias identificação pessoal, sexo e localização disciplinar e institucional. Na segunda as subcategorias título, gênero textual, indexação e editorial. Na terceira, as subcategorias idioma, ano de publicação e tema.
  • 2
    Inferida a partir da subcategoria ‘nome’. Como costumeiramente os nomes se configuram binariamente como masculinos ou femininos, essa inferência se fez necessária porque, salvo raras excepções, o sexo da autoria não se declara nas credenciais acadêmicas. Reconhecemos que o binarismo apaga identidades sexuais e de gênero e remete a entramados de violência hetero patriarcal.
  • 3
    A numeração de linhas foi acrescentada para nossos propósitos analíticos.
  • 4
    Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], https://dicionario.priberam.org/oferecer [consultado em 10-04-2021].
  • 5
    Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2021. Disponível em: https://dicionario.priberam.org/apresentar. Acesso em: 29 set. 2021.
  • 6
    Oposições defendem a tradição-imutabilidade linguística e negam as atribuições semânticas binárias para argumentar a incompatibilidade de uso de artigos e pronomes neutros para fins de compreensão. Os meios de comunicação ecoam-nos qualificando de complicador para quem faz leitura labial, lê braile ou sofre de dislexia.
  • 7
    A Portaria nº 604 de 27, de outubro de 2021, da Secretaria Nacional Especial da Cultura, e dispositivos dos estados de Santa Catarina, em junho de 2021, e de Rondônia, em outubro de 2021, e do município de Divinópolis, em setembro de 2021 exemplificam a proibição da linguagem neutra nos textos oficiais como documentos escolares, provas, materiais didáticos, comunicados e editais.
  • 8
    Em 2020, o humorista brasileiro Gregório Duvivier protagonizou um episódio, veiculado no youtube, ridicularizando-o. Como estratégia ético-política não citamos outras intervenções similares que travestem de humor, retórica da piada, da ironia e do sarcasmo a violência simbólica e androcêntrica.
  • 9
    Data de transferência integral da coordenação acadêmica da habilitação em Ciências Sociais, a habilitação em Estudos Latino-americanos ocorrerá com a implementação da reforma dos cursos de graduação do Instituto de Ciências Sociais (ICS).
  • 10
    Essa noção requer atualização que reconheça os avanços informacionais impostos pelo capitalismo cognitivo, como o compartilhamento de dados na internet e os movimentos pelo livre acesso a bens imateriais (Pires; Lima, 2020PIRES, A.; LIMA, S. Função-autor de Foucault e comodificação discursiva no contexto do capitalismo cognitivo. Vialitterae, v. 12, p. 292-304, 2020.).
  • 11
    O subcontinente possui 99 famílias linguísticas, tornando-se a região linguística mais rica do planeta. A Arawak é a família linguística mais extensa abrange desde Centro América até a Amazonia, dela procedem 40 línguas. Dentre 103 idiomas nativos transfronteiriços, o quíchua é falado na Argentina, Bolívia, Colômbia, Chile, Equador e Peru (UNICEF, 2007).
  • 12
    Primeira e única mulher latino-americana do continente em conquistá-lo. Após Mistral, foram agraciados o guatemalteco Miguel Ángel Asturias (1967), o chileno Pablo Neruda (1971), o colombiano Gabriel García Márquez (1982), o mexicano Octavio Paz (1990) e o peruano Mario Vargas Llosa (2010). Essa premiação confirma a potência da literatura latino-americana e sua eficácia para tornar universais os dilemas idiossincráticos desta região.
  • 13
    Vania Bambirra (1940 -2015), economista, socióloga e cientista política brasileira é usualmente excluída das referências canônicas desta temática, dentre os mais conhecidos: 1. Ramiro Guerra (1880-1970), historiador, economista e pedagogo cubano; 2. José Carlos Mariátegui (1894-1930), escritor, jornalista e pensador político peruano; 3. Victor Raul Haya de la Torre (1895-1979), filósofo político peruano; 4. Caio Prado Junior (1907-1990), historiador brasileiro; 5. Sergio Bagú (1911-2002), jornalista, advogado, historiador e sociólogo argentino; 6. Julio César Jobet (1912-1980), historiador, político e intelectual chileno; 7. Rafael Ramos Pedrueza (1897-1943), intelectual mexicano; 8. Silvio Frondizi (1907-1974), advogado e intelectual marxista argentino; 9. José Revueltas (1914-1976), escritor e ativista político mexicano; 10. Pablo González Casanova (1922), sociólogo mexicano; 11. Raúl Prebisch (1901-1986), político, acadêmico e economista argentino; 12. Celso Furtado (1920-2004), economista brasileiro; 13. Aníbal Pinto (1825-1884), advogado e político chileno e 14. Gino Germani (1911-1979), sociólogo argentino.
  • 14
    Apesar de nosso foco, cabe mencionar a existência de outras práticas como a citação-recompensa, a citação-agradecimento, a citação-política para incidir no aceite para publicação e a citação-álibi destinada a dissipar o ceticismo, por exemplo.
  • 15
    Não devemos esquecer, contudo, que a redundância superior a 20% (Saraiva; De Pádua Carrieri, 2009SARAIVA, E.; DE PÁDUA CARRIERI, A. Citações e não citações na produção acadêmica de estratégia no Brasil: uma reflexão crítica. Revista de Administração-RAUSP, v. 44, n. 2, p. 158-166. 2009.) e o autoplágio comprometem a cientificidade (Vazquez Moctezuma, 2016).

Editado por

Editor de Seção:

Fábio José Rauen

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Nov 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    22 Dez 2021
  • Aceito
    08 Out 2023
Universidade do Sul de Santa Catarina Av. José Acácio Moreira, 787 - Caixa Postal 370, Dehon - 88704.900 - Tubarão-SC- Brasil, Tel: (55 48) 3621-3369, Fax: (55 48) 3621-3036 - Tubarão - SC - Brazil
E-mail: lemd@unisul.br