Acessibilidade / Reportar erro

A natureza da magia no De arte magica de Francisco de Vitoria

The nature of magic in De arte magica of Francisco de Vitoria

RESUMO

Este artigo tem como objetivo mostrar a concepção histórico-teológica acerca da natureza e os fundamentos da magia no contexto da Relectio de arte magica (1540) de Francisco de Vitoria (1486-1546). O interesse devotado pelas ciências ocultas por parte dos homens e mulheres do Renascimento é um fato histórico inquestionável. Decorrendo daí o interesse e, por vezes, o combate por parte de teólogos contrários a tais conhecimentos considerados heterodoxos, fantasiosos, imorais e sem fundamento. Neste trabalho, busca-se mostrar a visão de Vitoria; como sua opinião pode apresentar certa concessão a tais conhecimentos ocultos, partindo da investigação de seus fundamentos históricos e filosóficos que determinam a natureza da magia. Se essa concessão otimista, i.e., moderada e não combativa proceder, caberá a pergunta: por que um teólogo operando dentro da ortodoxia teológica pode fazer concessões e considerar o conhecimento da magia, i.e., o conjunto de crenças como sujeito à fundamentação e especulação racionais? Uma solução seria afirmar que a ideia geral de fundo em tal postura intelectual consiste em sua visão universalista das ideias teológicas aplicadas às grandes questões humanas.

Palavras-chave:
Filosofia da natureza; epistemologia; teoria da magia; crença

ABSTRACT

This article aims to show the historical-theological conception about the nature and fundamentals of magic in the context of the Relectio de arte magica (1540) by Francisco de Vitoria (1486-1546). The devoted interest in the occult sciences on the part of Renaissance men and women is an unquestionable historical fact. Hence the interest and, at times, the fight by theologians against such knowledge, considered to be heterodox, fanciful, immoral and without foundation. This paper seeks to show Vitoria’s view; how his opinion may present a certain concession to such occult knowledge, starting from the investigation of its historical and philosophical foundations that determine the nature of magic. If this optimistic, i.e., moderate and non-combative concession is to be made, the question arises: why should a theologian operating within theological orthodoxy make concessions and consider the knowledge of magic, i.e., the set of beliefs as subject to rational foundation and speculation? One solution would be to claim that the general background idea in such an intellectual stance consists in its universalistic view of theological ideas as applied to the great human questions.

Keywords:
Philosophy of nature; epistemology; theory of magic; belief

Maius miraculum videtur quod canis loquatur vel canet, quam quod mutus loquatur.

(Francisco de Vitoria. De arte magica, § 18)

Introdução

O leitor de Francisco de Vitoria (1486-1586)1 1 Veja-se, e.g., dois clássicos e indispensáveis estudos elaborados por Getino (1930; 1914). acostumado com os temas clássicos do colonialismo, da guerra (Vitoria, 1960aVITORIA, F. 1960a. Relecciones teológicas. De indis, sive de iure belli hispanorum in barbaros, relectio posterior. Edición crítica del texto latino, versión española, introducción general e introducciones de su doctrina teológico-jurídica por Teófilo Urdanoz, O.P. Madrid, B.A.C, 1386 p.), dos índios (Vitoria,1960bVITORIA, F. 1960b. Relecciones teológicas. Relectio de indis prior. Edición crítica del texto latino, versión española, introducción general e introducciones de su doctrina teológico-jurídica por Teófilo Urdanoz, O.P. Madrid, B.A.C , 1386 p.), do direito internacional encontrados nas Relectiones theologicae (Vitoria, 1557VITORIA, F. 1557. Relectiones theologicae XII. Jacob Boyer, Lyon, 1557, 936 p.); das questões antropológicas, dos temas da natureza do direito (Vitoria, 2013VITORIA, Francisco. 2013. De la loi, Commentaire de la Somme théologique (Ia-IIae, q. 90-108). Traduction, introduction et notes de Gaëlle Demelemestre. Paris, Ed. du Cerf, 178 p.; 2010VITORIA, Francisco. 2010. De legibus. 1a ed. Estudio introductorio: Simona Langella, transcripción y notas del texto latino: José Barrientos García y Simona Langella, traducción al español: Pablo García Castillo, traducción al italiano: Simona Langella. Salamanca, Ediciones Universidad de Salamanca - Università degli studi di Genova, 291 p.), da doutrina tomasiana expressa em suas Lectiones e todo o universo semântico que constitui - por vezes de modo até equívoco - o conjunto do pensamento teológico de Vitoria, sem dúvida poderá ficar surpreso ou decepcionado com este trabalho, pois ele apresenta, de certo modo, a mudança de temas empreendida pelo mestre salmanticense quase ao final de sua vida. Trata-se do tema da magia no contexto de sua última Relectio, chamada De arte magica (1960c VITORIA, F. 1960c. De arte magica. De la Magia. Obras de Francisco de Vitoria: Relecciones Teológicas, Edición crítica del texto latino, versión española, introducción general e introducciones de su doctrina teológico-jurídica por Teófilo Urdanoz, O.P. Madrid, Ed. Católica B.A.C., 1386 p.; 1557VITORIA, F. 1557. Relectiones theologicae XII. Jacob Boyer, Lyon, 1557, 936 p.). De acordo com a edição de Getino (1933GETINO, A. 1933. Relecciones teológicas del Maestro Fray Francisco de Vitoria, Edición crítica, con facsimil de códices y ediciones príncipes, variantes, versión castellana, notas e introducción por el Fr. Luis G. Alonso Getino, Tomo 1. Madrid, Publicaciones de la Asociación Francisco de Vitoria - Biblioteca Internacionalista de clássicos españoles, 368 p., p. 15), sendo essa a última Relectio de Vitoria, esse promete outra sobre a mesma matéria. Na primeira, Vitoria menciona sua intenção de continuar o assunto em outra Relectio - cujo trabalho permaneceu inconcluso -, no intuito de completar a matéria por ele já abordada: Sed quia puto me nunc satis dixisse de hac materia, reservamus hoc in aliam ejusdem materiae Relectionem (Vitoria, 1960cVITORIA, F. 1960c. De arte magica. De la Magia. Obras de Francisco de Vitoria: Relecciones Teológicas, Edición crítica del texto latino, versión española, introducción general e introducciones de su doctrina teológico-jurídica por Teófilo Urdanoz, O.P. Madrid, Ed. Católica B.A.C., 1386 p., p. 1291).

Isto posto, qual seria o motivo para Francisco de Vitoria afastar-se dos temas “jurídicos” por ele amplamente abordados referentes ao Novo Mundo, passando a examinar o assunto da natureza e da moralidade da magia em suas reflexões e aulas públicas na Universidade de Salamanca? Antes de oferecer uma possível resposta, cumpre, observar que o De arte magica é motivado por temas já tratados por Pedro Lombardo no segundo livro das Sentenças; na Cidade de Deus, VIII-X de Santo Agostinho e no livro III, capítulos de 104-109 da Suma contra os gentios de Tomás de Aquino.

Ora, uma primeira tentativa de resposta pode seguir o raciocínio de que nada escapa ao domínio da teologia2 2 “Officium ac munus theologi tam late patet, ut nullum argumentum, nulla disputatio, nullus locus alienus videatur a theologica professione et instituto” (...) “Tanta sit, ne plus exigam, theologorum bonorum inopia et solidorum. Est autem theologia omnium disciplinarum, studiorumque orbis prima, quam graeci ϑεολίαν vocant”. Cf., igualmente, Langella (2013, p. 138): Francisco de Vitoria, RB, ms. II/1735, Prólogo a la IIa pars de la Summa (1542), Apêndice, II. 7: “Nota ex doctore sancto prima parte, q. 2, quod intentio theologi et sacrae theologiae est tradere cognitionem de Deo, qui est subiectum circa quod tota versatur. Deus autem ut habetur Apocalypsi primo: est ‘rerum omnium principium et finis’, non solum secundum se, sed etiam in quantum est principium et finis creaturarum, et maxime creaturae rationalis; et ideo theologia est de Deo et de creaturis prout ordinantur in Deum”. (Adverte o que afirma o santo Doutor na Primeira Parte, questão 2, que a intenção do teólogo e da sagrada teologia é oferecer conhecimento sobre Deus, que é o sujeito sobre o que versa toda a teologia. Deus, como foi dito no Apocalipse, 1[8]: É o princípio e fim de todas as coisas, não somente por si, mas enquanto é princípio e fim das criaturas, e muito especialmente da criatura racional; e, por isso, a teologia trata de Deus e das criaturas enquanto se ordenam a Deus). (Vitoria, 1960d, p. 150). e, se o assunto foi por Vitoria tratado, certamente o fora por conta de sua candência e importância no mundo universitário e cristão do Renascimento Espanhol do século XVI. Apesar de apresentarem-se como sumamente relevantes os problemas teológicos-jurídicos do Novo Mundo, o problema das bases da fundamentação das ditas ciências ocultas, - estudadas, inclusive, no âmbito da filosofia da natureza - e da fundamentação das crenças supostamente concorrentes ao pensamento católico vigente não poderiam escapar da pena do mestre salmanticense. Não obstante seu novo trabalho de erudito na busca pela investigação do tratamento a partir da teologia ao tema da magia, ele não ignora o Novo Mundo no De arte magica, chegando a citar os índios como exemplo de sua etnografia (avant la lettre):

Os bárbaros (referindo-se também aos índios), possuem, de certo modo, uma crença e opinião sobre os demônios; os índios descobertos pelos espanhóis possuem uma crença geral na existência dos demônios ( Vitoria, 1960 VITORIA, F. 1960d. Relecciones teológicas. De potestate civili. Edición crítica del texto latino, versión española, introducción general e introducciones de su doctrina teológico-jurídica por Teófilo Urdanoz, O.P. Madrid, B.A.C , 1386 p. c, p. 1250). 3 3 “(...). Ergo oportet ea assignare daemonibus. Et certe, ut omittamus auctoritatem religionis et Scripturam, vehementer confirmatur haec sententia ex eo quod barbari homines, nec persuasi, nec decepti a philosophis, ut peripatetici calumniatur, eadem retinent fidem et opinionem. Nec dubiant daemones esse, quales sunt isti, qui ab hispanis ante aliquot annos reperti sunt, inter quos publica fama est daemones esse, et non raro aliquibus in ea regione apparuisse.” Sobre o contexto da complexidade das culturas e povos nativos das Américas, no tocante, inclusive, à sua religiosidade, dentre outros, vale conferir as páginas do trabalho de Todorov (1982).

Uma segunda tentativa de resposta consiste no fato de que, apesar do interesse da teologia por todas as áreas do saber, Vitoria mostra-se realmente atento aos eventos de seu tempo: a busca da explicação racional (filosófico-teológica) para a incontestável manifestação de fenômenos denominados de maravilhosos. Esta atitude do mestre salmanticense reflete o contexto histórico de um mundo cujo maravilhoso, o oculto cede paulatinamente seu lugar para a racionalização dos eventos ocorridos no curso ordinário da natureza e dos fenômenos que cabalmente escapam, de alguma forma, ao conhecimento e explicação humanos. Uma terceira tentativa de resposta, por fim, parafraseando Marie-Thérèse D’Alverny, é considerar que a magia é uma manifestação de sentimento religioso que pode parecer de ordem inferior aos historiadores - adiciono no caso de Vitoria, aos teólogos e filósofos - mas a sua difusão foi tal que não se tem o direito de negligenciá-la enquanto fenômeno social (D’Alverny, 1994 2 “Officium ac munus theologi tam late patet, ut nullum argumentum, nulla disputatio, nullus locus alienus videatur a theologica professione et instituto” (...) “Tanta sit, ne plus exigam, theologorum bonorum inopia et solidorum. Est autem theologia omnium disciplinarum, studiorumque orbis prima, quam graeci ϑεολίαν vocant”. Cf., igualmente, Langella (2013, p. 138): Francisco de Vitoria, RB, ms. II/1735, Prólogo a la IIa pars de la Summa (1542), Apêndice, II. 7: “Nota ex doctore sancto prima parte, q. 2, quod intentio theologi et sacrae theologiae est tradere cognitionem de Deo, qui est subiectum circa quod tota versatur. Deus autem ut habetur Apocalypsi primo: est ‘rerum omnium principium et finis’, non solum secundum se, sed etiam in quantum est principium et finis creaturarum, et maxime creaturae rationalis; et ideo theologia est de Deo et de creaturis prout ordinantur in Deum”. (Adverte o que afirma o santo Doutor na Primeira Parte, questão 2, que a intenção do teólogo e da sagrada teologia é oferecer conhecimento sobre Deus, que é o sujeito sobre o que versa toda a teologia. Deus, como foi dito no Apocalipse, 1[8]: É o princípio e fim de todas as coisas, não somente por si, mas enquanto é princípio e fim das criaturas, e muito especialmente da criatura racional; e, por isso, a teologia trata de Deus e das criaturas enquanto se ordenam a Deus). (Vitoria, 1960d, p. 150). , p.154). No caso de Vitoria, não se trata apenas de um fenômeno social, mas de uma forte cultura religiosa e filosófica de seu tempo.

Neste artigo, assumimos o pressuposto de que Francisco de Vitoria, ao realizar sua busca pela natureza e fundamentação da magia, concede a possibilidade do poder tanto da magia quanto dos magos, guiado por relatos e investigações históricas, exegéticas e ideias filosófico-teológicas como ponto de apoio.

Ademais, o século XVI, marcadamente conhecido como o século da caça às Bruxas (King, 2002KING, L. M. 2002. La femme de la Renaissance. In: E. GARIN (ed.), L’homme de la Renaissance, Paris, Éditions du Seuil, p. 289-341.), estabelece - conforme demonstra Lynn Thorndike - uma distinção entre ciência4 4 Sobre a definição de ciência: “Science is systematized and ordered knowledge, a consistent body of truth, attained through sense perception, introspection, and reflection, aided by mechanical and mathematical instruments, independently of faith, emotion, prejudice, appetite, pleasure, and the like. Mind and senses must be free from phantasy and unwarranted association of ideas. Errors of senses and mind must be corrected by repeated experience and measurement, by an equal consideration of all possibly pertinent factors and logical exclusion of all extraneous matter. Hypotheses, like dogmas, should be viewed with great suspicion and disproved rather than proved, since even those which contain a large amount of truth, like the Ptolemaic or atomic, will eventually be shown to involve also too great a proportion of error. Regularities, such as the sun’s daily rising, are important for science to observe and discover. But irregularities such as its rising at different times in different latitudes or in the same latitude on different days are equally noteworthy.” (Thorndike, 1941, p. 12). e magia5 5 Sobre a definição de magia: “Magic was a systematized and ordered marvel-believing and marvel-working, a consistent body of error, attained through sense perception, introspection, reflection, and dreaming, influenced by faith, emotion, appetite, and pleasure, marked by unwarranted associations of ideas, without adequate means of correcting error and without proper standards of measurement. The last deficiency was due to the fact that mechanical invention had not yet proceeded far enough. Imagination, irresponsible conjecture and loose logic therefore filled the gap of mystery. Before such inventions sculpture and painting were more exact and interesting pursuits than physics and chemistry. In magic the desire to attain ends and satisfy human cravings not primarily intellectual was dominant; in science the urge is to measure and know.” (Thorndike, 1941, p. 13). , além de mostrar-se mais tolerante com os magos e menos tolerante, indubitavelmente, com as Bruxas.6 6 Sobre a caça às bruxas no século XVI: “It is a surprising and paradoxical fact that, although in the sixteenth century the persecution of witches reached greater proportions than before, and the literature against witchcraft became much more vehement and voluminous, there was less objection to the word magic and more approving use of it than in the preceding centuries. Wier could complain that, while witches were ruthlessly punished, magicians were allowed to go scot free. It is true that a line between natural and diabolical magic had been drawn all along, but it was now more generally recognized, and the name magic was more often applied to the natural variety-with perhaps also the cabala and other occultism-while the diabolical stigma was largely transferred to witchcraft. In the thirteenth century Roger Bacon had felt it still necessary to distinguish mathematics from divination and to differentiate two varieties of mathesis. In the sixteenth century the word, mathematics, no longer had such a double meaning although it still included astronomy and astrology, so that a royal mathematicus might include the drawing up of horoscopes and annual predictions among his functions. In the case of the word magic, there seems to have been a similar shifting, partly perhaps because in Protestant countries the old unfavorable definitions of magic in the canon law and scholastic theology went by the board, partly because of an increasing tendency towards occultism in the later fifteenth and the sixteenth centuries. As the later century wore on, the turning away from Aristotle’s natural philosophy and the rise of Paracelsanism encouraged the development of occult philosophy and a favoring attitude toward natural magic.” (Thorndike, 1941, p. 13-14). O pensamento de Vitoria, grosso modo, sobre a magia, os magos e as ciências ocultas, se enquadraria nesse contexto, não totalmente intolerante com relação às Bruxas, por ele mesmo citadas no De arte magica, mas numa postura característica do humanismo escolástico que o distingue de outros autores mais combativos e intolerantes de sua época. Configurando-se, assim, como um “defensor” do direito de livre manifestação de opiniões religiosas, culturais e filosóficas, portanto, ideias construtoras do universalismo.

A natureza e o fundamento do poder da magia

As páginas de Francisco de Vitoria sobre a magia se distinguem por uma grande riqueza de autores, de doutrinas e obras, constituindo sua história erudita da magia e sua análise sobre sua própria existência e valor. A despeito de poder apresentar e analisar todo esse “estado da arte” da magia elaborado por Vitoria, convém apenas destacar sumariamente tal história e procedimento, bem como apresentar a natureza e o fundamento da magia.

História erudita da magia

Ao assumir que a magia é, em certa medida, uma manifestação do sentimento religioso e, portanto, de ordem dos instintos mais primitivos de desejo e medo que são inerentes à humanidade, cabe o seguinte pressuposto analítico tal qual formulado por D’Alverny, ao enumerar um conjunto de aspirações humanas que lhes são, mutatis mutandis, amplamente inerentes:

Desejo de adquirir riquezas, ou de encontrar os bens roubados, de pegar a caça necessária à subsistência da tribo, de provocar a fecundidade das colheitas, de assegurar-se do poder terrestre ou de poderes sobrenaturais, de satisfazer as paixões do amor, ou de saciar uma vingança, de conhecer o futuro; medo da esterilidade, das intempéries, da doença, da morte. Por gestos determinados e palavras ritualísticas, o homem acredita ser possível, em virtude da simpatia que une os seres do universo, de inclinar em seu favor os Poderes que o regem.

Nas civilizações mediterrâneas das quais somos os herdeiros, certos tipos de magia estavam integradas à religião oficial; outras simplesmente toleradas; outras, enfim, reprovadas pela moral corrente e interditadas pelas leis.

O cristianismo marca de uma mesma reprovação todas as práticas mágicas, e não cessa de as proibir, tanto nos cânones dos concílios e os artigos dos penitentes que nos escritos dos teólogos. Esses anátemas, contudo, e essas exortações reiteradas permitem suspeitar que o exercício das cerimônias defendidas, unidas à lembrança de costumes pagãos, subsistia para o bem dos lugares ( D’Alverny, 1994 D’ALVERNY, M-Th. 1994. Survivance de la magie antique (I). Antike und Orient im Mittelalter, Miscellanea Medievalia, 1. Berlim, Walter de Gruyter, 1962. In: Marie-Thérèse - (ed.), La transmission des textes philosophiques et scientifiques au Moyen Age. Great Britain, Variorum, 350 p. , p. 154).

A referência para o combate, proibição e inferiorização da magia por parte de teólogos ao longo dos séculos XVI e XVII, pode ter como referência, entre outros escritos, a própria prevalência dos debates sobre uma concepção filosófica da verdade, da razão e de suas atribuições nas relações e definições do bem e do intelecto. De modo geral, Tomás de Aquino, e.g., chega a afirmar que a magia é ilusória e imoral, posto que “as operações dos mágicos, em grande medida são realizadas para iludir e enganar os homens, sendo, portanto, o intelecto recorrido pelos magos para tal operação, considerado como imoral e ausente de bondade” (Aquino, 1996AQUINO, T. 1996. Suma contra os gentios. Vol. II. Tradução D. Odilão Moura, O.S.B. Porto Alegre, EDIPUCRS, 318 p.).7 7 “Item. Bonum proprium intellectus est veritas. Cum igitur boni sit bonum adducere, cuislibet intellectus bene disposti esse videtur alios perducere ad veritatem. In operationibus autem magorum pleraque fiunt quibus ludificentur homines et decipiantur. Intellectus igitur cuius auxilio utuntur, non est bene dispositus secundum morem.” [Para os excertos da ScG, reproduzimos aqui a tradução com texto latino de Odilão Moura]. (ScG., III, c. 106).

Afirma, ainda, que a prática da arte mágica não é virtuosa, portanto inferior; que por intermédio das artes mágicas, os homens não auferem nenhum progresso por ignorarem o uso da razão, sendo tais progressos: as ciências e as virtudes: “Por se fixarem em coisas inferiores: como na descoberta de furtos, prisão de ladrões e coisas parecidas; os magos ou a eficácia da magia, padecem de um intelecto sem virtude” (Aquino, 1996AQUINO, T. 1996. Suma contra os gentios. Vol. II. Tradução D. Odilão Moura, O.S.B. Porto Alegre, EDIPUCRS, 318 p.).8 8 “[...] Per huiusmodi autem artes non adipiscuntur homines aliquem profectum in bonis rationis, quae sunt scientiae et virtutes: sed in quibusdam minimis, sicut in inventione furtorum et deprehensione latronum, et his similibus. Non igitur substantiae intellectivae quarum auxilio hac artes utuntur, sunt bene dispositae secundum virtutem.” (ScG., III, c. 106). Porém, como tudo naturalmente tende ao bem (Aquino, 1996AQUINO, T. 1996. Suma contra os gentios. Vol. II. Tradução D. Odilão Moura, O.S.B. Porto Alegre, EDIPUCRS, 318 p.)9 9 “Adhuc. Bonum est quod omnia appetunt: ut Philosophus optime dictum introducit, I Ethicorum. Omnia autem appetunt esse actu secundum suum modum: quod patet ex hoc quod unumquodque secundum naturam suam repugnat corruptioni. Esse igitur actu boni rationem constituit: unde et per privationem actus a potentia consequitur malum, quod est bono oppositum, ut per Philospphum patet, in IX Metaphysicae. Deus autem est ens actu non in potentia, ut supra (cap. 15) ostensum est. Est igitur vere bonus”. (ScG. I, c. 37). - na visão de Tomás - incluindo as substâncias intelectuais, não é possível que essas mesmas substâncias as quais os magos recorrem nas artes mágicas sejam elas, naturalmente más.10 9 “Adhuc. Bonum est quod omnia appetunt: ut Philosophus optime dictum introducit, I Ethicorum. Omnia autem appetunt esse actu secundum suum modum: quod patet ex hoc quod unumquodque secundum naturam suam repugnat corruptioni. Esse igitur actu boni rationem constituit: unde et per privationem actus a potentia consequitur malum, quod est bono oppositum, ut per Philospphum patet, in IX Metaphysicae. Deus autem est ens actu non in potentia, ut supra (cap. 15) ostensum est. Est igitur vere bonus”. (ScG. I, c. 37).

Para investigar, estabelecer e demonstrar a natureza e os fundamentos da magia, Francisco de Vitoria estabelece, aparentemente, no De arte magica uma investigação geral do tema da magia, na qual a mencionada Relectio possui uma estrutura composta de uma análise erudita da história da magia. Esse trabalho por ele elaborado caracteriza-se como que mostrando o “estado da arte” referente ao tema da magia. Trata-se de um inventário das principais correntes e autores ao longo da história, que abordaram ou que estiveram intrinsicamente ligados ao tema da magia. Esse tipo de retomada de tradições precedentes é fundamental para a compreensão do contexto da história das ideias no Renascimento espanhol e a projeção das ideias universalistas de Vitoria. Por outro lado, uma Relectio proferida por um teólogo membro da Ordem dos Pregadores (dominicanos) - encarregada, sobretudo, da manutenção do conhecimento teológico, jurídico e da ortodoxia católica -, versado em autores tão diversos: antigos, medievais, dos magos e filósofos por ele citados é impressionante por dois motivos: primeiro, por adotar uma opinião bastante moderada para sua época com relação à magia e todo conhecimento dito oculto; segundo, porque para chegar a tal opinião, tudo foi muito bem fundamentado e o conhecimento de uma tradição de autores imiscuídos com a tradição das ciências ocultas fica patente no mestre salmanticense, chamando a atenção para sua erudição e abertura intelectual para com a matéria.

Há que se destacar que o que se sabe da magia no contexto de Francisco de Vitoria, por intermédio de sua Relectio dá-se por meio de um escrito extrínseco ao próprio oficio da operação da magia. Em outras palavras, o contexto, muitas vezes, do tema apresenta-se por escritos eclesiásticos (cânones, manuais, tratados e outros) elaborados por teólogos, sedentos, ora por entender e ora por combater e proibir tais práticas e especulações de conhecimentos ocultos. Na sua maioria, por não serem verdadeiros e possíveis; por desafiarem as leis sejam divinas, sejam naturais, estabelecendo uma relação pactual com entidades teológicas denominadas como demônios.

Tendo em vista o suposto posicionamento tolerante e “universalista” de Vitoria com relação à magia, ele mesmo chega a afirmar que toda obra e eficácia dos magos está baseada e se funda num certo pacto estabelecido e formado com os demônios. Pressupondo e aceitando a ideia de uma convenção. i.e., um acordo, pacto entre os magos e os demônios - tota opera et efficacia magorum fundatur et nititur in condicto et pacto inito et firmato cum daemonibus (Vitoria, 1960cVITORIA, F. 1960c. De arte magica. De la Magia. Obras de Francisco de Vitoria: Relecciones Teológicas, Edición crítica del texto latino, versión española, introducción general e introducciones de su doctrina teológico-jurídica por Teófilo Urdanoz, O.P. Madrid, Ed. Católica B.A.C., 1386 p., p. 1274).

A estrutura, i.e., a matéria a ser exposta e disputada do De arte magica divide-se em duas partes. Na primeira parte, trata do poder e da faculdade mágicas; na segunda parte, inconclusa, abordaria a liceidade ou moralidade da arte mágica. Cumpre observar - conforme Urdañoz - que esta divisão era bastante obrigatória: de um lado, analisar as causas de tais poderes ocultos de adivinhação ou encantamentos mágicos; o outro, a determinação da moralidade de tais práticas, i.e., o grau de malícia ou reconhecendo a possível licitude que se pode haver em se comprovando algo de natural e “científico” nos questionamentos ou ditas indagações.11 11 Consulte-se a Introdução de Urdañoz. A interpretação de Urdañoz, apesar de ser importante e, de certo modo, pioneira, ainda que concisa, deve ser vista cum grano salis, pois além de um tanto quanto “ultrapassada”, demonstra preconceitos demasiados infundados com relação às manifestações que ele as desqualifica por não serem científicas, o que nem mesmo o próprio Vitoria o fez no século XVI. Ver Vitoria, 1960c, p. 1224. O ponto de partida para a discussão do tema da magia é um texto de Levítico, 19, 31: Não vos virareis para os adivinhadores e encantadores; não os busqueis, contaminando-vos com eles. Eu sou o Senhor vosso Deus.12 12 “Locus relegendus est: Non declinetis ad magos, nec ab ariolis aliquid sciscittemini (Lev. 19, 31).” (Vitoria, 1960c, p. 1228).

A atenção, no entanto, de Vitoria, voltar-se-á sobretudo para a passagem na qual interpretará os “adivinhadores” e os “encantadores”, deixando, de certo modo, a segunda parte do conteúdo em segundo plano. Não se interessa se os homens irão ou não buscar os magos: eles já os buscam; não se interessa, prima facie, com a dita contaminação e nem por isso, considera que esses buscadores das ciências ocultas não reconhecem o senhorio de Deus no contexto cristão de suas vidas. A preocupação de Vitoria, ao contrário, não é combativa e, sim, investigativa e respeitosa, diríamos, tolerante e universalista. Para isso, organiza - dentro da primeira parte - o De arte magica em oito questões: sendo a primeira parte dedicada à natureza do poder da magia. 1ª. - Se existe a magia (§§ 1-3); 2ª. - Se o poder mágico produz efeitos ilusórios ou também reais (§§ 4-5); 3ª. - Se as obras maravilhosas dos magos são naturais, ou seja, se procedem de causas naturais (§§ 6-9); 4ª. - Se o autor das obras de magia é o demônio ou atribui-se a Deus e seus anjos (§§ 10-17); 5ª. - Se os magos podem fazer milagres (§ 18); 6ª. - Se os magos podem submeter os demônios à sua vontade (§§ 19-31); 7ª. - Se os magos podem mudar os corpos de lugar (§§ 32-33); 8ª. - Se os magos podem, imutando os corpos naturais, produzir enfermidades e curas (§§ 34-35).

Postas as questões que, além de resolverem assuntos específicos sobre a natureza e fundamento da magia de caráter geral, perpassam e constituem a história erudita da magia na mitologia, na antiguidade, na patrística, na tradição do direito civil e dos canonistas e decretistas do direito divino e civil, na Idade Média e em seus contemporâneos e predecessores: Circe, Medeia e outros magos evocados por poetas e por Varrão, Jasão (Vitoria, 1960cVITORIA, F. 1960d. Relecciones teológicas. De potestate civili. Edición crítica del texto latino, versión española, introducción general e introducciones de su doctrina teológico-jurídica por Teófilo Urdanoz, O.P. Madrid, B.A.C , 1386 p., p. 1230-1231); Zoroastro, Hermes Trismegisto, São Jerônimo, Santo Agostinho, os alquimistas, as narrativas de Heródoto e Plínio, Diodoro, Pompeu, Plutarco, Valério; Tito Lívio; Porfírio; Jâmblico, Proclo, Amônio, Filopono, Avicena, Al-Ghâzâlî, Aristóteles, Tomás de Aquino, Marsílio Ficino; permanecendo, contudo, como referências onipresentes, Agostinho e Tomás, ao longo das discussões. Vitoria chega a afirmar - no decorrer de sua narrativa que se constitui como uma história erudita da magia que abarca o De arte magica - que grandes filósofos cultivaram a magia: como Demócrito, Pitágoras, Empédocles, Platão e, entre os próprios frades dominicanos, Alberto Magno. Afirmando, ainda, que não se pode apressar-se em protestar e condenar como supersticioso um fato que nos pareça obscuro e admirável.13 13 “Item, summi philosophi fuerunt magiae studiosi, ut Democritus, Pythagoras, Empedocles, Plato et inter nostros Albertus. [...]. Non ergo, ut statim aliquid ignotum et stupendum videmus, continuo pro superstitioso damnandum est.” (Vitoria, 1960c, p. 1243-1244).

Ao buscar o significado da palavra milagre, Vitoria a define na sua relação com o admirável, i.e., a admiração no sentido filosófico do termo. Derivando o milagre da ideia daquilo que é admirável, apresenta o conteúdo sob dois aspectos, retomando o livro I da Metafísica de Aristóteles, da noção de admiração: sendo um primeiro aspecto, focado na hipótese de que a causa daquilo que admiramos seja oculta; o segundo aspecto, indicando um certo grau de crença, i.e., uma aproximação epistemológica que sustente certas crenças que são contrarias à realidade tal qual se apresenta; em outras palavras, a ideia de que haja ou apareça algo que nos faça acreditar que deveria realizar-se justamente o contrário do que admiramos.

O melhor exemplo oferecido por Vitoria é da ignorância da própria virtude ou força contida na natureza e nas suas operações: quando alguém se admira ao ver que o ferro sobe em direção ao imã. Isso, para Vitoria, é fruto não de magia ou coisa do gênero, mas por ignorar, i.e., desconhecer a virtude ou força a esse intrínseca.14 14 “Pro solutione notandum quod miraculi nomen a mirando est assumptum. Ad admirationem autem duo concurrunt, ut potest accipi ex verbis Philosophi in principio Metaphysicorum, quorum unum est quod causa illius, quod admiramur, sit occula. Secundum est quod in eo quod miramur sit vel appareat aliquid per quod videatur contrarium debere contingere eius, quod miramur. Sicut aliquis posset mirari si videret ferrum ascendere ad magnetem, ignorans eius virtutem.” (Vitoria, 1960c, p. 1265)

A existência da magia

Vitoria trata da existência da magia nos seguintes termos no De arte magica:

Para proceder, como de costume, com método escolástico, a primeira questão será se existe a magia. Quer dizer, se há entre os homens alguma arte ou poder para realizar aquelas obras prodigiosas que se escreve e se conta dos magos, ou se são todas vãs e coisa de impostores e malvados, falsamente cridas pela baixeza e vaidade do vulgo, como pensam alguns ( Vitoria, 1960c VITORIA, F. 1960d. Relecciones teológicas. De potestate civili. Edición crítica del texto latino, versión española, introducción general e introducciones de su doctrina teológico-jurídica por Teófilo Urdanoz, O.P. Madrid, B.A.C , 1386 p. , p. 1230). 15 15 “Et ut scholastico ordine ex more procedamus, prima quaestio sit: An omnino sit magia, hoc est, an sit inter mortales ars, vel facultas aliqua ad edendum et faciendum opera illa mirabilia quae de magis scribuntur et circumferuntur. An prorsus omnia illa sint vana et conficta ab impostoribus et maleficis, et falso credita a vulgi levitate et vanitate, ut quidam putant.” (De arte magica).

Para mostrar e discutir a existência da magia, Vitoria na sequência do excerto apresentado, empreende já nas páginas iniciais o que chamamos de história erudita da magia, para, além de buscar respaldo na história e nas experiências passadas, mostrar que, embora controversa, a magia existe. Mas qual o estatuto de existência dessa? Em princípio, Vitoria busca esclarecer e definir se há algum tipo de arte ou poder entre os homens que de fato possa estar, de certo modo, fora do curso normal da natureza, além da reconhecida força divina que age segundo seus ditames e vontade próprias. A intenção do mestre salmanticense é buscar a partir da teologia, as razões de tais poderes ou arte tradicionalmente conhecido como magia ou ciências ocultas. Em um primeiro momento, Vitoria parece desqualificar a magia, afirmando em três argumentos que tais prodígios e coisas são apenas fábulas (Vitoria, 1960cVITORIA, F. 1960c. De arte magica. De la Magia. Obras de Francisco de Vitoria: Relecciones Teológicas, Edición crítica del texto latino, versión española, introducción general e introducciones de su doctrina teológico-jurídica por Teófilo Urdanoz, O.P. Madrid, Ed. Católica B.A.C., 1386 p., p. 1230).16 16 “Et videtur quod omnia illa sint vana et fabulosa.” (De arte magica, §1). No terceiro argumento, contudo, afirma que:

Os magos oferecem adivinhar o futuro; mas esse conhecimento, é claro, logo o discutiremos, nem o podem tê-lo, nem o podem comunicá-lo; ao contrário, seriam deuses, conforme o que disse Isaías 41, 23: Diga-nos o que acontecerá no futuro e diremos que sois deuses. Logo, por uma semelhante razão, há que se acreditar que os magos prometem o que não podem cumprir ( Vitoria, 1960 VITORIA, F. 1960d. Relecciones teológicas. De potestate civili. Edición crítica del texto latino, versión española, introducción general e introducciones de su doctrina teológico-jurídica por Teófilo Urdanoz, O.P. Madrid, B.A.C , 1386 p. c, p. 131-132). 17 17 “Tertio. Magi promittunt divinationem futurorum, quam tamem neque habere praestare possunt, ut certum est et statim disputatibur. Alias essent dii, Is. 41, 23: Annuntiate quae ventura sunt in futurum et dicemus quia dii estis vos. Ergo pari ratione credendum est magos alia polliceri quae impelere non possunt.” (De arte magica, §1).

Vitoria identifica os magos com os videntes, “profetas” que dizem poder, além de prever o futuro, prometer coisas que não podem ocorrer. A essa visão crítica dos magos, relaciona-se com uma postura enganadora dos magos, mas e a natureza da magia? Vitoria afirma o seguinte:

(...) é de se notar que o nome magia não significa por si uma arte ou faculdade que esteja fora de toda virtude (força) e eficácia das causas naturais. Esta questão foi muito discutida e por um longo tempo entre os filósofos, e ainda não foi resolvida. Porém, ao que parece, o nome de magia foi tomado, a princípio, como uma arte ou faculdade de fazer obras ocultas e maravilhosas, não só fora do curso ordinário das coisas, senão, outrossim, sobre o conhecimento e o alcance dos homens ( Vitoria, 1960c VITORIA, F. 1960c. De arte magica. De la Magia. Obras de Francisco de Vitoria: Relecciones Teológicas, Edición crítica del texto latino, versión española, introducción general e introducciones de su doctrina teológico-jurídica por Teófilo Urdanoz, O.P. Madrid, Ed. Católica B.A.C., 1386 p. , p. 1241-1242). 18 18 “Pro probatione conclusionis et eius declaratione est notandum quod nomem magiae de se non importat artem aut facultatem extra vel supra omnem virtutem, et efficaciam causarum naturalium. Hoc patet, quia si hoc esset de ratione vel significatione magiae, non relinqueretur locus dubio, aut disputationi, an effectus et opera magorum possint esse a solis causis naturalibus. Quae tamem quaestio fuit multum ac diu iactata inter philosophos, et adhuc sub iudice lis est. Sed videtur nomen magiae a principio receptum pro arte et facultate ad efficiendum et patrandum opera occulta et mirabilia, non solum extra solitum rerum cursusm, sed supra hominum opinionem et captum.” (De arte magica, §7).

O excerto mostra a necessidade que Vitoria tem em definir o que será objeto de seu estudo. Procedimento bastante frequente no pensamento do mestre salmanticense que tem origem no contexto da escolástica: definir com precisão os termos, os conceitos e os problemas.

Há que se destacar que Vitoria insere a magia em um patamar, i.e., na ordem dos acontecimentos naturais, grosso modo, e não apenas, conforme uma longa discussão filosófica, de restringir à magia apenas ao universo do impossível.

Vitoria reconhece, de certo modo, alguma virtude, i.e., força na própria magia, pois não se restringe às definições de arte ou faculdade.

Neste sentido, ele trata dos possíveis efeitos que dessa arte ou faculdade possa assim advir. No escopo da busca sobre a natureza da magia, encontra-se, além da história erudita da magia e da possível existência desta arte, força ou faculdade, os efeitos que dessa provêm. Vitoria os divide em ilusórios e reais.

Trata-se de uma concessão, ou tolerância ao assunto, uma vez que, mesmo considerando, grosso modo, por um lado, a magia como produzindo efeitos fantasiosos e ilusórios e, por outro, como efeitos que correspondem à realidade, tal posicionamento teológico pode revelar a natureza da magia no contexto interno de sua obra e extrínseco aos círculos em que tais conhecimentos mágicos são praticados (Vitoria, 1960cVITORIA, F. 1960c. De arte magica. De la Magia. Obras de Francisco de Vitoria: Relecciones Teológicas, Edición crítica del texto latino, versión española, introducción general e introducciones de su doctrina teológico-jurídica por Teófilo Urdanoz, O.P. Madrid, Ed. Católica B.A.C., 1386 p., p. 1237).

Considerações finais

Por fim, apesar de todo o caráter valorativo empregado por Vitoria e o seu não distanciamento ao tratar do objeto, i.e., da natureza da magia, sua atividade pode ser considerada, mutatis mutandis, como um estudo sobre a “filosofia das religiões”, na perspectiva da relação do homem com o sagrado, o religioso, o oculto e misterioso, não apenas no âmbito da religião cristã, mas como um aporte às diversas manifestações religiosas presentes na história humana, em outros termos, de seu universalismo. Essa interpretação só é possível se considerarmos a relevância da formação humanista a qual Vitoria obteve e ensinou: o lugar da história dos mitos, da literatura latina e grega, da patrística, da filosofia escolástica, dos sistemas jurídicos (civil e divino) e toda uma experiência literária do cultivo do refinamento humanístico voltado para a resolução de problemas levados ao debate no ambiente universitário de sua época.

Referências

  • AQUINO, T. 1996. Suma contra os gentios Vol. II. Tradução D. Odilão Moura, O.S.B. Porto Alegre, EDIPUCRS, 318 p.
  • D’ALVERNY, M-Th. 1994. Survivance de la magie antique (I) Antike und Orient im Mittelalter, Miscellanea Medievalia, 1. Berlim, Walter de Gruyter, 1962. In: Marie-Thérèse - (ed.), La transmission des textes philosophiques et scientifiques au Moyen Age Great Britain, Variorum, 350 p.
  • GETINO, A. 1933. Relecciones teológicas del Maestro Fray Francisco de Vitoria, Edición crítica, con facsimil de códices y ediciones príncipes, variantes, versión castellana, notas e introducción por el Fr. Luis G. Alonso Getino, Tomo 1. Madrid, Publicaciones de la Asociación Francisco de Vitoria - Biblioteca Internacionalista de clássicos españoles, 368 p.
  • GETINO, A. 1930. El Maestro Fr. Francisco de Vitoria - su vida, su doctrina e influencia, Publicaciones de la Asociación Francisco de Vitoria. Madrid, Imprenta Católica, 573 p.
  • GETINO, A. 1914. Fr. Francisco de Vitoria y el Renacimiento filosofico teologico del siglo XVI, Madrid, Tip. De la “Ver. De Arch., Bibl. Y Museos”, Olózaga, núm. 1., 280 p.
  • KING, L. M. 2002. La femme de la Renaissance In: E. GARIN (ed.), L’homme de la Renaissance, Paris, Éditions du Seuil, p. 289-341.
  • LANGELLA, S. 2013. La ciencia teológica de Francisco de Vitoria y la Summa Theologiae de Santo Tomás de Aquino en el siglo XVI a la luz de textos inéditos Traducción de Juan Montero Aparicio, OCD. Salamanca, Editorial San Esteban, (Biblioteca de teólogos españoles 51), 468 p.
  • THORNDIKE, L. 1941. A history of magic and experimental science Volume V and VI the sixteenth century, Vol. V.New York, Columbia University Press, 695 p.
  • TODOROV, T. 1982. La conquête de l’Amérique: La question de l’autre, Paris, Seuil, 279 p.
  • VITORIA, F. 1960c. De arte magica. De la Magia Obras de Francisco de Vitoria: Relecciones Teológicas, Edición crítica del texto latino, versión española, introducción general e introducciones de su doctrina teológico-jurídica por Teófilo Urdanoz, O.P. Madrid, Ed. Católica B.A.C., 1386 p.
  • VITORIA, F. 1557. Relectiones theologicae XII Jacob Boyer, Lyon, 1557, 936 p.
  • VITORIA, F. 1960a. Relecciones teológicas De indis, sive de iure belli hispanorum in barbaros, relectio posterior Edición crítica del texto latino, versión española, introducción general e introducciones de su doctrina teológico-jurídica por Teófilo Urdanoz, O.P. Madrid, B.A.C, 1386 p.
  • VITORIA, F. 1960b. Relecciones teológicas Relectio de indis prior. Edición crítica del texto latino, versión española, introducción general e introducciones de su doctrina teológico-jurídica por Teófilo Urdanoz, O.P. Madrid, B.A.C , 1386 p.
  • VITORIA, F. 1960d. Relecciones teológicas De potestate civili. Edición crítica del texto latino, versión española, introducción general e introducciones de su doctrina teológico-jurídica por Teófilo Urdanoz, O.P. Madrid, B.A.C , 1386 p.
  • VITORIA, Francisco. 2013. De la loi, Commentaire de la Somme théologique (Ia-IIae, q. 90-108) Traduction, introduction et notes de Gaëlle Demelemestre. Paris, Ed. du Cerf, 178 p.
  • VITORIA, Francisco. 2010. De legibus 1a ed. Estudio introductorio: Simona Langella, transcripción y notas del texto latino: José Barrientos García y Simona Langella, traducción al español: Pablo García Castillo, traducción al italiano: Simona Langella. Salamanca, Ediciones Universidad de Salamanca - Università degli studi di Genova, 291 p.
  • 1
    Veja-se, e.g., dois clássicos e indispensáveis estudos elaborados por Getino (1930GETINO, A. 1930. El Maestro Fr. Francisco de Vitoria - su vida, su doctrina e influencia, Publicaciones de la Asociación Francisco de Vitoria. Madrid, Imprenta Católica, 573 p.; 1914GETINO, A. 1914. Fr. Francisco de Vitoria y el Renacimiento filosofico teologico del siglo XVI, Madrid, Tip. De la “Ver. De Arch., Bibl. Y Museos”, Olózaga, núm. 1., 280 p.).
  • 2
    Officium ac munus theologi tam late patet, ut nullum argumentum, nulla disputatio, nullus locus alienus videatur a theologica professione et instituto” (...) “Tanta sit, ne plus exigam, theologorum bonorum inopia et solidorum. Est autem theologia omnium disciplinarum, studiorumque orbis prima, quam graeci ϑεολίαν vocant”. Cf., igualmente, Langella (2013LANGELLA, S. 2013. La ciencia teológica de Francisco de Vitoria y la Summa Theologiae de Santo Tomás de Aquino en el siglo XVI a la luz de textos inéditos. Traducción de Juan Montero Aparicio, OCD. Salamanca, Editorial San Esteban, (Biblioteca de teólogos españoles 51), 468 p., p. 138): Francisco de Vitoria, RB, ms. II/1735, Prólogo a la IIa pars de la Summa (1542), Apêndice, II. 7: “Nota ex doctore sancto prima parte, q. 2, quod intentio theologi et sacrae theologiae est tradere cognitionem de Deo, qui est subiectum circa quod tota versatur. Deus autem ut habetur Apocalypsi primo: est ‘rerum omnium principium et finis’, non solum secundum se, sed etiam in quantum est principium et finis creaturarum, et maxime creaturae rationalis; et ideo theologia est de Deo et de creaturis prout ordinantur in Deum”. (Adverte o que afirma o santo Doutor na Primeira Parte, questão 2, que a intenção do teólogo e da sagrada teologia é oferecer conhecimento sobre Deus, que é o sujeito sobre o que versa toda a teologia. Deus, como foi dito no Apocalipse, 1[8]: É o princípio e fim de todas as coisas, não somente por si, mas enquanto é princípio e fim das criaturas, e muito especialmente da criatura racional; e, por isso, a teologia trata de Deus e das criaturas enquanto se ordenam a Deus). (Vitoria, 1960dVITORIA, F. 1960d. Relecciones teológicas. De potestate civili. Edición crítica del texto latino, versión española, introducción general e introducciones de su doctrina teológico-jurídica por Teófilo Urdanoz, O.P. Madrid, B.A.C , 1386 p., p. 150).
  • 3
    (...). Ergo oportet ea assignare daemonibus. Et certe, ut omittamus auctoritatem religionis et Scripturam, vehementer confirmatur haec sententia ex eo quod barbari homines, nec persuasi, nec decepti a philosophis, ut peripatetici calumniatur, eadem retinent fidem et opinionem. Nec dubiant daemones esse, quales sunt isti, qui ab hispanis ante aliquot annos reperti sunt, inter quos publica fama est daemones esse, et non raro aliquibus in ea regione apparuisse.” Sobre o contexto da complexidade das culturas e povos nativos das Américas, no tocante, inclusive, à sua religiosidade, dentre outros, vale conferir as páginas do trabalho de Todorov (1982TODOROV, T. 1982. La conquête de l’Amérique: La question de l’autre, Paris, Seuil, 279 p.).
  • 4
    Sobre a definição de ciência: “Science is systematized and ordered knowledge, a consistent body of truth, attained through sense perception, introspection, and reflection, aided by mechanical and mathematical instruments, independently of faith, emotion, prejudice, appetite, pleasure, and the like. Mind and senses must be free from phantasy and unwarranted association of ideas. Errors of senses and mind must be corrected by repeated experience and measurement, by an equal consideration of all possibly pertinent factors and logical exclusion of all extraneous matter. Hypotheses, like dogmas, should be viewed with great suspicion and disproved rather than proved, since even those which contain a large amount of truth, like the Ptolemaic or atomic, will eventually be shown to involve also too great a proportion of error. Regularities, such as the sun’s daily rising, are important for science to observe and discover. But irregularities such as its rising at different times in different latitudes or in the same latitude on different days are equally noteworthy.” (Thorndike, 1941THORNDIKE, L. 1941. A history of magic and experimental science. Volume V and VI the sixteenth century, Vol. V.New York, Columbia University Press, 695 p., p. 12).
  • 5
    Sobre a definição de magia: “Magic was a systematized and ordered marvel-believing and marvel-working, a consistent body of error, attained through sense perception, introspection, reflection, and dreaming, influenced by faith, emotion, appetite, and pleasure, marked by unwarranted associations of ideas, without adequate means of correcting error and without proper standards of measurement. The last deficiency was due to the fact that mechanical invention had not yet proceeded far enough. Imagination, irresponsible conjecture and loose logic therefore filled the gap of mystery. Before such inventions sculpture and painting were more exact and interesting pursuits than physics and chemistry. In magic the desire to attain ends and satisfy human cravings not primarily intellectual was dominant; in science the urge is to measure and know.” (Thorndike, 1941THORNDIKE, L. 1941. A history of magic and experimental science. Volume V and VI the sixteenth century, Vol. V.New York, Columbia University Press, 695 p., p. 13).
  • 6
    Sobre a caça às bruxas no século XVI: “It is a surprising and paradoxical fact that, although in the sixteenth century the persecution of witches reached greater proportions than before, and the literature against witchcraft became much more vehement and voluminous, there was less objection to the word magic and more approving use of it than in the preceding centuries. Wier could complain that, while witches were ruthlessly punished, magicians were allowed to go scot free. It is true that a line between natural and diabolical magic had been drawn all along, but it was now more generally recognized, and the name magic was more often applied to the natural variety-with perhaps also the cabala and other occultism-while the diabolical stigma was largely transferred to witchcraft. In the thirteenth century Roger Bacon had felt it still necessary to distinguish mathematics from divination and to differentiate two varieties of mathesis. In the sixteenth century the word, mathematics, no longer had such a double meaning although it still included astronomy and astrology, so that a royal mathematicus might include the drawing up of horoscopes and annual predictions among his functions. In the case of the word magic, there seems to have been a similar shifting, partly perhaps because in Protestant countries the old unfavorable definitions of magic in the canon law and scholastic theology went by the board, partly because of an increasing tendency towards occultism in the later fifteenth and the sixteenth centuries. As the later century wore on, the turning away from Aristotle’s natural philosophy and the rise of Paracelsanism encouraged the development of occult philosophy and a favoring attitude toward natural magic.” (Thorndike, 1941THORNDIKE, L. 1941. A history of magic and experimental science. Volume V and VI the sixteenth century, Vol. V.New York, Columbia University Press, 695 p., p. 13-14).
  • 7
    Item. Bonum proprium intellectus est veritas. Cum igitur boni sit bonum adducere, cuislibet intellectus bene disposti esse videtur alios perducere ad veritatem. In operationibus autem magorum pleraque fiunt quibus ludificentur homines et decipiantur. Intellectus igitur cuius auxilio utuntur, non est bene dispositus secundum morem.” [Para os excertos da ScG, reproduzimos aqui a tradução com texto latino de Odilão Moura]. (ScG., III, c. 106).
  • 8
    [...] Per huiusmodi autem artes non adipiscuntur homines aliquem profectum in bonis rationis, quae sunt scientiae et virtutes: sed in quibusdam minimis, sicut in inventione furtorum et deprehensione latronum, et his similibus. Non igitur substantiae intellectivae quarum auxilio hac artes utuntur, sunt bene dispositae secundum virtutem.” (ScG., III, c. 106).
  • 9
    Adhuc. Bonum est quod omnia appetunt: ut Philosophus optime dictum introducit, I Ethicorum. Omnia autem appetunt esse actu secundum suum modum: quod patet ex hoc quod unumquodque secundum naturam suam repugnat corruptioni. Esse igitur actu boni rationem constituit: unde et per privationem actus a potentia consequitur malum, quod est bono oppositum, ut per Philospphum patet, in IX Metaphysicae. Deus autem est ens actu non in potentia, ut supra (cap. 15) ostensum est. Est igitur vere bonus”. (ScG. I, c. 37).
  • 10
    [...] Naturali igitur ordine substantia intellectualis vult bonum. Impossibile est igitur quod illae substantiae intellectuales quarum auxilio magicae artes utuntur, sint naturaliter malae.” (ScG., III, c. 107).
  • 11
    Consulte-se a Introdução de Urdañoz. A interpretação de Urdañoz, apesar de ser importante e, de certo modo, pioneira, ainda que concisa, deve ser vista cum grano salis, pois além de um tanto quanto “ultrapassada”, demonstra preconceitos demasiados infundados com relação às manifestações que ele as desqualifica por não serem científicas, o que nem mesmo o próprio Vitoria o fez no século XVI. Ver Vitoria, 1960cVITORIA, Francisco. 2013. De la loi, Commentaire de la Somme théologique (Ia-IIae, q. 90-108). Traduction, introduction et notes de Gaëlle Demelemestre. Paris, Ed. du Cerf, 178 p., p. 1224.
  • 12
    Locus relegendus est: Non declinetis ad magos, nec ab ariolis aliquid sciscittemini (Lev. 19, 31).” (Vitoria, 1960cVITORIA, Francisco. 2010. De legibus. 1a ed. Estudio introductorio: Simona Langella, transcripción y notas del texto latino: José Barrientos García y Simona Langella, traducción al español: Pablo García Castillo, traducción al italiano: Simona Langella. Salamanca, Ediciones Universidad de Salamanca - Università degli studi di Genova, 291 p., p. 1228).
  • 13
    Item, summi philosophi fuerunt magiae studiosi, ut Democritus, Pythagoras, Empedocles, Plato et inter nostros Albertus. [...]. Non ergo, ut statim aliquid ignotum et stupendum videmus, continuo pro superstitioso damnandum est.” (Vitoria, 1960cVITORIA, Francisco. 2013. De la loi, Commentaire de la Somme théologique (Ia-IIae, q. 90-108). Traduction, introduction et notes de Gaëlle Demelemestre. Paris, Ed. du Cerf, 178 p., p. 1243-1244).
  • 14
    Pro solutione notandum quod miraculi nomen a mirando est assumptum. Ad admirationem autem duo concurrunt, ut potest accipi ex verbis Philosophi in principio Metaphysicorum, quorum unum est quod causa illius, quod admiramur, sit occula. Secundum est quod in eo quod miramur sit vel appareat aliquid per quod videatur contrarium debere contingere eius, quod miramur. Sicut aliquis posset mirari si videret ferrum ascendere ad magnetem, ignorans eius virtutem.” (Vitoria, 1960cVITORIA, Francisco. 2010. De legibus. 1a ed. Estudio introductorio: Simona Langella, transcripción y notas del texto latino: José Barrientos García y Simona Langella, traducción al español: Pablo García Castillo, traducción al italiano: Simona Langella. Salamanca, Ediciones Universidad de Salamanca - Università degli studi di Genova, 291 p., p. 1265)
  • 15
    Et ut scholastico ordine ex more procedamus, prima quaestio sit: An omnino sit magia, hoc est, an sit inter mortales ars, vel facultas aliqua ad edendum et faciendum opera illa mirabilia quae de magis scribuntur et circumferuntur. An prorsus omnia illa sint vana et conficta ab impostoribus et maleficis, et falso credita a vulgi levitate et vanitate, ut quidam putant.” (De arte magica).
  • 16
    Et videtur quod omnia illa sint vana et fabulosa.” (De arte magica, §1).
  • 17
    Tertio. Magi promittunt divinationem futurorum, quam tamem neque habere praestare possunt, ut certum est et statim disputatibur. Alias essent dii, Is. 41, 23: Annuntiate quae ventura sunt in futurum et dicemus quia dii estis vos. Ergo pari ratione credendum est magos alia polliceri quae impelere non possunt.” (De arte magica, §1).
  • 18
    Pro probatione conclusionis et eius declaratione est notandum quod nomem magiae de se non importat artem aut facultatem extra vel supra omnem virtutem, et efficaciam causarum naturalium. Hoc patet, quia si hoc esset de ratione vel significatione magiae, non relinqueretur locus dubio, aut disputationi, an effectus et opera magorum possint esse a solis causis naturalibus. Quae tamem quaestio fuit multum ac diu iactata inter philosophos, et adhuc sub iudice lis est. Sed videtur nomen magiae a principio receptum pro arte et facultate ad efficiendum et patrandum opera occulta et mirabilia, non solum extra solitum rerum cursusm, sed supra hominum opinionem et captum.” (De arte magica, §7).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    02 Set 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    08 Nov 2021
  • Aceito
    20 Mar 2022
Universidade do Vale do Rio dos Sinos - UNISINOS Av. Unisinos, 950 - São Leopoldo - Rio Grande do Sul / Brasil , cep: 93022-750 , +55 (51) 3591-1122 - São Leopoldo - RS - Brazil
E-mail: deniscs@unisinos.br