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Alberta infant motor scale em pesquisas brasileiras: estudo bibliométrico

RESUMO

A Alberta infant motor scale (AIMS) é um instrumento de avaliação do desenvolvimento motor grosso dos recém-nascidos entre 0 e 18 meses de idade. Este estudo buscou sumarizar as pesquisas brasileiras que utilizaram a AIMS e identificar seus objetivos, a fim de fornecer um quadro das principais utilizações da escala aos profissionais interessados no desenvolvimento motor infantil. Trata-se de um estudo bibliométrico realizado por meio de buscas nas bases de dados SciELO, PubMed, Scopus, e Web of Science. Os descritores foram “escala motora infantil de Alberta” e “Brasil”, com seus equivalentes em inglês, unidos pelo termo booleano “AND”. O critério de inclusão foi a utilização da AIMS no Brasil, com crianças de 0 a 18 meses. As variáveis base de dados, revista, ano de publicação, idioma, região da instituição vinculada aos autores e tipo de estudo foram analisadas de forma quantitativa descritiva. Foi realizada análise de conteúdo dos objetivos descritos nas pesquisas, e foram incluídos 79 estudos, a maioria dos quais apresentou delineamento transversal e estava vinculada a instituições das regiões Sul e Sudeste. Boa parte das publicações era dos últimos 10 anos, em inglês, e a revista Fisioterapia e Pesquisa foi o periódico nacional que mais publicou estudos referentes à amostra. Os objetivos analisados foram distribuídos em seis classes de palavras, contidas em dois grandes grupos: validades psicométricas (19,1%) e estudos avaliativos (80,9%). Este último considerou as várias populações infantis analisadas. O estudo apresentou as pesquisas que utilizaram a AIMS para avaliar o desenvolvimento motor de crianças brasileiras. Isso reforça a importância deste instrumento no contexto nacional, além de estimular sua utilização.

Descritores:
Deficiências do Desenvolvimento; Desenvolvimento Infantil; Pesquisa Científica e Desenvolvimento Tecnológico; Revisão

ABSTRACT

The Alberta infant motor scale (AIMS) is an instrument for assessing the gross motor development of newborns, aged 0-18 months. This study aimed to summarize the Brazilian studies that used the AIMS and identify their objectives to know the main uses of the scale for professionals interested in child motor development. This is a bibliometric study on SciELO, PubMed, Scopus, and Web of Science databases. The searched keywords were “Alberta infant motor scale” and “Brazil,” with their equivalents in Portuguese and united by “AND.” Inclusion criteria were: use of AIMS with children aged 0-18 months carried out in Brazil. The variables database, journal, year of publication, language, region of the institution linked to the authors, and type of study were analyzed in a descriptive quantitative manner. Content analysis was performed on the objectives described in the articles. In total, 79 articles were included and most of them had a cross-sectional design and were linked to institutions in the South and Southeast regions. Furthermore, most studies were from the last 10 years and in English. The journal Fisioterapia e Pesquisa was the Brazilian journal that most published studies of the sample. The analyzed objectives were distributed into six word classes, with two large groups: psychometric validity (19.1%) and evaluative studies (80.9%). The latter considered the various child populations analyzed. We presented studies that used the AIMS to evaluate the motor development of Brazilian children, reinforcing the importance of this instrument in the national context and also encouraging its use.

Keywords:
Developmental Disabilities; Child Development; Scientific Research and Technological Development; Review

RESUMEN

La Escala Motora Infantil de Alberta (AIMS) es un instrumento que evalúa el desarrollo motor grueso de los recién nacidos de entre 0 y 18 meses de edad. Este estudio pretendió hacer una síntesis de estudios brasileños que utilizaron la AIMS, así como identificar sus objetivos, con el fin de proporcionar una tabla de los principales usos de la escala a los profesionales interesados en el desarrollo motor infantil. Se trata de un estudio bibliométrico, en el que se realizaron búsquedas en las bases de datos SciELO, PubMed, Scopus y Web of Science. Los descriptores utilizados fueron “escala motora infantil de Alberta” y “Brasil”, con sus equivalentes en inglés, unidos por el término booleano “AND”. El criterio de inclusión fue la aplicación de la AIMS en Brasil, con niños de entre 0 y 18 meses. Las variables base de datos, revista, año de publicación, idioma, región de la institución vinculada a los autores y tipo de estudio se analizaron de manera cuantitativa y descriptiva. Se realizó un análisis de contenido de los objetivos descritos en los estudios, y se incluyeron 79 estudios, de los cuales la mayoría presentó un diseño transversal y estaba vinculado a instituciones de las regiones Sur y Sudeste de Brasil. La mayoría de las publicaciones son de los últimos 10 años, en inglés, y la revista Fisioterapia e Pesquisa fue la revista nacional que más publicó estudios. Los objetivos analizados se dividieron en seis clases de palabras, que contienen dos grupos principales: validez psicométrica (19,1%) y estudios evaluativos (80,9%). Este último tuvo en cuenta las diversas poblaciones infantiles analizadas. Este estudio presentó las investigaciones que evaluaron la AIMS respecto al desarrollo motor de los niños brasileños. Esto destaca la importancia del citado instrumento en el contexto nacional, además estimula su uso.

Palabras clave:
Discapacidades del Desarrollo; Desarrollo Infantil; Investigación Científica y Desarrollo Tecnológico; Revisión

INTRODUÇÃO

Os primeiros meses de vida da criança são caracterizados pelo processo de desenvolvimento sensório-motor, logo, a falta de estímulos nessa fase poderá implicar defasagens na aquisição de habilidades motoras fundamentais e, consequentemente, no desenvolvimento infantil11. Spittle AJ, Doyle LW, Boyd RN. A systematic review of the clinimetric properties of neuromotor assessments for preterm infants during the first year of life. Dev Med Child Neurol. 2008;50(4):254-66. doi: 10.1111/j.1469-8749.2008.02025.x.
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. Portanto, ferramentas padronizadas e validadas para a avaliação dessas habilidades são amplamente utilizadas por profissionais da saúde para a vigilância do desenvolvimento infantil, pois fornecem a quantificação do desempenho motor das crianças, que é comparado com normas preestabelecidas referentes aos seus pares22. Mendonça B, Sargent B, Fetters L. Cross-cultural validity of standardized motor development screening and assessment tools: a systematic review. Dev Med Child Neurol. 2016;58(12):1213-22. doi: 10.1111/dmcn.13263.
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A Alberta infant motor scale (AIMS) é um instrumento de avaliação do desenvolvimento motor grosso de recém-nascidos a termo e pré-termo, de 0 a 18 meses de idade (38 semanas de idade gestacional até 18 meses de idade corrigida ou marcha independente). Por meio da observação do profissional, ela fornece informações sobre o repertório espontâneo das habilidades motoras das crianças33. Piper MC, Darrah J. Motor assessment of the developing infant. Philadelphia: Saunders; 1994.. A AIMS é composta por 58 itens, divididos nas seguintes subescalas: prono (21 itens), supino (9 itens), sentado (12 itens) e em pé (16 itens). Cada item contido nas subescalas deve ser registrado a partir da observação da descrição espontânea dos movimentos da criança. A escala apresenta escores brutos, percentis e categorização do desempenho motor em: normal (>25%), suspeito (25-5%), e atípico (<5%)44. Rodrigues OMPR. Escalas de desenvolvimento infantil e o uso com bebês. Educ Rev. 2012;(43):81-100. doi: 10.1590/S0104-40602012000100007.
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Mesmo após 25 anos de sua publicação, esse instrumento ainda é amplamente testado55. Darrah J, Bartlett D, Maguire TO, Avison WR, Lacaze-Masmonteil T. Have infant gross motor abilities changed in 20 years? A re-evaluation of the Alberta Infant Motor Scale normative values. Dev Med Child Neurol. 2014;56(9):877-81. doi: 10.1111/dmcn.12452.
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. No Brasil, a AIMS se mostrou uma ferramenta eficiente, confiável e consistente para avaliar o desenvolvimento motor infantil, com poder preditivo e discriminante de atrasos significativos66. Silva LP, Maia PC, Lopes MMCO, Cardoso MVLML. Intraclass reliability of the Alberta Infant Motor Scale in the Brazilian version. Rev Esc Enferm USP. 2013;47(5):1046-51. doi: 10.1590/S0080-623420130000500006.
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. Dentre as muitas facilidades de acesso e emprego, as razões que justificam sua ampla utilização são: precisa de pouco tempo para a aplicação (10-30 minutos), dispensa o uso de materiais específicos, reduz gastos financeiros e exige pouco manuseio da criança11. Spittle AJ, Doyle LW, Boyd RN. A systematic review of the clinimetric properties of neuromotor assessments for preterm infants during the first year of life. Dev Med Child Neurol. 2008;50(4):254-66. doi: 10.1111/j.1469-8749.2008.02025.x.
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), (77. Albuquerque PL, Guerra MQF, Lima MC, Eickmann SH. Concurrent validity of the Alberta Infant Motor Scale to detect delayed gross motor development in preterm infants: a comparative study with the Bayley III. Dev Neurorehabil. 2018;21(6):408-14. doi: 10.1080/17518423.2017.1323974.
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A avaliação motora a partir da AIMS tem guiado vários tipos de pesquisas, em especial no Brasil, sejam elas para formular diagnósticos situacionais ou para avaliar estratégias de intervenção66. Silva LP, Maia PC, Lopes MMCO, Cardoso MVLML. Intraclass reliability of the Alberta Infant Motor Scale in the Brazilian version. Rev Esc Enferm USP. 2013;47(5):1046-51. doi: 10.1590/S0080-623420130000500006.
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), (88. Mello EQ, Motta-Gallo S, Goulart FC, Herrero D, Gallo PR. Motor development of Brazilian breastfeeding infants in socially unfavorable condition of life. J Hum Growth Dev. 2014;24(2):163-7.. Porém, embora destacada entre os protocolos mais utilizados para a avaliação de crianças brasileiras, não há na literatura um levantamento quantitativo dos estudos que a utilizaram. Tal análise poderá fornecer dados importantes sobre a aplicabilidade e confiabilidade da AIMS em diversos polos de pesquisa e em diferentes regiões brasileiras. Assim, este estudo bibliométrico buscou sumarizar as pesquisas brasileiras que utilizaram a AIMS e seus achados em importantes bases de dados, contribuindo para as futuras pesquisas relacionadas ao desenvolvimento motor e para a atuação do profissional, que poderão utilizar essa escala para intervir no desenvolvimento infantil.

METODOLOGIA

Trata-se de um estudo bibliométrico, com levantamento quantitativo (descritivo) e qualitativo (análise de conteúdo), sobre o escopo das pesquisas brasileiras que utilizaram a AIMS. As buscas foram realizadas por dois revisores, em momentos distintos e independentes, em março e abril de 2022, nas bases de dados SciELO, PubMed, Scopus e Web of Science. Os descritores exatos foram: “Alberta infant motor scale”, “Brazil”, “escala motora infantil de Alberta” e “Brasil”. O termo booleano “AND” foi utilizado em todas as buscas, em inglês e em português.

A investigação teve como foco estudos originais com desenho transversal, longitudinal e metodológico, que utilizaram a AIMS e foram publicados a partir de 1994 (ano de publicação da escala), em qualquer idioma. Os critérios de inclusão foram: utilização da AIMS como instrumento de avaliação do desenvolvimento motor; de crianças de 0 a 18 meses como público-alvo; e estudos realizados no Brasil. A escolha deste último critério se deve à necessidade de conhecer a avaliação do desenvolvimento motor das crianças brasileiras para que sejam traçados planos de enfrentamento dos atrasos motores que atinjam especificamente essa população. Foram excluídas do estudo revisões sistemáticas.

Realizou-se pesquisa e triagem inicial a partir da leitura de título e resumo dos estudos que foram encontrados pelos descritores nas diferentes bases de dados, excluindo os duplicados e aplicando os critérios de inclusão e exclusão propostos. Em seguida, foram obtidos os textos completos para serem lidos integralmente. Trabalhos cujos critérios de inclusão não estavam explícitos também foram examinados inteiramente.

Uma planilha eletrônica foi elaborada para catalogação dos dados dos estudos, com as seguintes informações: base de dados; título; revista; ano de publicação; idioma; região brasileira; autores; instituição; objetivo; delineamento; resultados e conclusões. O delineamento dos estudos foi subdividido em: longitudinal (longitudinais, ensaios clínicos, experimentais e/ou quase-experimentais); e transversal (transversais, metodológicos, relatos, estudos de caso e exploratórios) (99. Hulley SB, Cummings SR, Brower WS, Grady DG, Newman TB. Delineando a pesquisa clínica. 4th ed. Porto Alegre: Artmed; 2015.. Estudos sobre desenvolvimento, validação e avaliação de ferramentas e métodos de pesquisa foram tratados como pesquisa metodológica1010. Polit DF, Beck CT. Fundamentos de pesquisa em enfermagem: avaliação de evidências para a prática da enfermagem. 7th ed. Porto Alegre: Artmed; 2011.. O idioma identificado na planilha refere-se àquele encontrado nas bases, o que não significa que o estudo não esteja publicado também em outra língua. Em relação às instituições vinculadas e suas respectivas regiões brasileiras, consideramos a primeira instituição brasileira ligada aos autores, na sequência da autoria.

Foi utilizada análise descritiva para apresentar frequências absolutas e relativas das variáveis “delineamento”, “base de dados”, “revista”, “ano de publicação”, “idioma” e “região”. Dados referentes aos objetivos foram examinados através da análise de conteúdo1111. Bardin L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70; 1977.. Na construção do corpus textual, os termos “desenvolvimento motor” e “recém-nascidos” foram agrupados em um único termo, respectivamente nas seguintes formas: desenvolvimento_motor e recém_nascidos. Para isso, foi utilizado o software Interface de R pour les Analyses Multidimensionnelles de Textes et de Questionnaires (IRaMuTeQ) (1212. Camargo BV, Justo AM. IRAMUTEQ: um software gratuito para análise de dados textuais. Temas Psicol. 2013;21(2):513-8. doi: 10.9788/TP2013.2-16.
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A partir disso, foram realizados dois tipos específicos de análises: análise de especificidades, com o objetivo de verificar as diferenças nas evocações (considerando a frequência de incidência de palavras e seus índices hipergeométricos) entre os objetivos dos estudos em função variável região do Brasil; e classificação hierárquica descendente (CHD), para o reconhecimento do dendrograma com classes emergentes, em que, quanto maior o χ², mais associada está a palavra à classe, desconsiderando-se as palavras com χ²<3,80 (p<0,05).

RESULTADOS

Foram encontrados 181 estudos, mas, após a finalização da etapa de leitura, apenas 79 estudos constituíram a amostra final. A Figura 1 apresenta o fluxograma de triagem e seleção dos artigos.

Figura 1
Fluxograma de identificação e seleção de estudos da revisão bibliográfica

Quarenta e cinco (57%) estudos foram publicados em inglês e 34 (43%) em português, os quais foram publicados em 37 revistas. Destas, 18 (48,6%) são brasileiras, nas quais foram publicados 50 (63,3%) estudos, e 19 (36,7%) internacionais, nas quais foram publicados 29 (36,7%) estudos. As revistas brasileiras com maior número de publicações foram Fisioterapia e Pesquisa (n=14) e Fisioterapia em Movimento (n=7), e as internacionais foram Pediatrics International (n=4) e Research in Developmental Disabilities (n=3). Os estudos selecionados foram publicados a partir de 2006 (Figura 2).

Figura 2
Quantidade de estudos publicados por ano

A Figura 3 apresenta as frequências de estudos vinculados às regiões onde se localizam as instituições dos autores. Ainda foi possível comparar e descrever as evocações nos objetivos dos estudos através da análise de especificidades, considerando a frequência de incidência de palavras e seus índices hipergeométricos, entre as regiões do Brasil.

Figura 3
Distribuição dos estudos de acordo com a região do Brasil e as principais evocações presentes nos objetivos dos estudos, classificadas por região

Quanto ao delineamento dos estudos, foram registrados: 27 (34,2%) longitudinais, 25 (31,7%) transversais, 16 (20,2%) metodológicos, 4 (5%) ensaios clínicos, 3 (3,8%) experimentais e/ou quase-experimentais, 2 (2,5%) relatos, 1 (1,3%) estudo de caso e 1 (1,3%) estudo exploratório. Os estudos longitudinais possuem a maior frequência na amostra, destes 15 (55,6%) são de instituições da região Sudeste, 8 (29,6%) da região Sul, 2 (7,4%) da Centro-oeste e 2 (7,4%) da Nordeste. Dos ensaios clínicos (n=4), 3 (75%) são de instituições da região Sul e 1 (25%) da Sudeste. Dos estudos experimentais e quase-experimentais (n=3), 2 (66,6%) são da região Sul e 1 (33,3%) da Sudeste (ver Quadro 1 do material suplementar Material suplementar O material suplementar pode ser consultado em: https://osf.io/xdcjn. ).

Do total de 25 estudos com delineamento transversal, 15 são de instituições da região Sul (60%), 8 (32%) Sudeste, 1 (4%) Nordeste e 1 (4%) Centro-Oeste. Já entre os estudos metodológicos encontrados (n=16), todos investigaram a confiabilidade da escala e suas respectivas validações no público brasileiro, sendo 7 (43,7%) de instituições da região Sul, 7 (43,7%) da Sudeste e 2 (12,5%) da Nordeste. Dois relatos foram encontrados, 1 (50%) vinculado a uma instituição da região Sul e 1 (50%) da Sudeste. Também foi encontrado um estudo de caso, de uma instituição da região Sudeste, e um estudo exploratório, de uma instituição da região Nordeste (ver Quadro 2 do material suplementar Material suplementar O material suplementar pode ser consultado em: https://osf.io/xdcjn. ).

O corpus teve aproveitamento de 68 segmentos textuais (86,0%). Emergiram 1.932 ocorrências (palavras, formas ou vocábulos), sendo 462 palavras distintas e 284 com uma única ocorrência. O conteúdo analisado foi categorizado em seis classes (Figura 4).

Figura 4
Dendrograma das classes da classificação hierárquica descendente dos objetivos dos estudos da amostra e sua porcentagem e as palavras mais prevalentes em cada classe, com o valor do χ²

Os segmentos da classe 1 se referem à avaliação do desenvolvimento motor de bebês participantes de intervenções, a saber: intervenção aquática, intervenção cognitivo-motora, orientações para práticas maternas, intervenção parental e telecuidado. Essa classe de palavras foi prevalente na região Sul (χ²=4,85).

A classe 2 se refere a termos ligados à avaliação do desenvolvimento motor de crianças prematuras com baixo peso, verificando a influência do sono adequado, do tempo de internação e da qualidade do ambiente. Essa classe de palavras foi prevalente na região Centro-Oeste (χ²=16,26).

A classe 3 está relacionada a termos referentes à avaliação do desenvolvimento motor de crianças expostas ao vírus Zika e ao vírus da imunodeficiência humana (HIV) e suas possíveis consequências, como a paralisia cerebral em crianças com a síndrome congênita do Zika vírus.

A classe 4 é composta por termos referentes à comparação entre o desenvolvimento de bebês pré-termo e a termo com relação a: controle segmentar do tronco, controle postural e marcha. Essa classe de palavras foi prevalente na região Sudeste (χ²=3,9).

A classe 5 engloba termos relacionados à caracterização do desenvolvimento de crianças com síndrome de Down e à verificação de suas dificuldades na aquisição das habilidades motoras.

Por fim, a classe 6 apresenta termos referentes à validade e à confiabilidade da AIMS. Os instrumentos utilizados para comparação foram a terceira edição da escala Bayley de desenvolvimento do bebê e da criança pequena (Bayley III) e a escala de medida da função motora grossa (gross motor function measure - GMFM). Foram utilizados, também, grupos de crianças expostos ao HIV e prematuros. Esses estudos contribuíram para os aspectos da versão brasileira da escala, a qual também serviu como comparador em relação ao test of infant motor performance (TIMP). Essa classe foi prevalente na região Nordeste (χ²=5,83).

DISCUSSÃO

Através da investigação bibliométrica, este estudo buscou responder à seguinte questão: qual o escopo das pesquisas que utilizaram a AIMS para avaliar o desenvolvimento motor de crianças de 0 a 18 meses no Brasil? Observou-se que a maioria das pesquisas encontradas teve delineamento transversal, objetivando a delimitação de valores e características do desenvolvimento motor e de curvas de referência da AIMS para crianças brasileiras prematuras e a termo.

Os estudos de delineamento longitudinal reforçam a robustez da AIMS e sua consolidação na prática clínica, enquanto os estudos metodológicos contribuem principalmente para a segurança na escolha da AIMS, já que é imperativo que os instrumentos de triagem e avaliação do desenvolvimento possuam validação psicométrica. Esforços nesse sentido são muito necessários no Brasil1414. Albuquerque KA, Cunha ACB. Novas tendências em instrumentos para triagem do desenvolvimento infantil no Brasil: uma revisão sistemática. J Hum Growth Dev. 2020;30(2):188-96. doi: 10.7322/jhgd.v30.10366.
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Os estudos metodológicos mostraram a eficácia, a validade e a confiabilidade da AIMS, através do estabelecimento de curvas e normas para crianças brasileiras. Na prática clínica, os profissionais devem escolher as avaliações do desenvolvimento motor baseadas nas propriedades psicométricas voltadas para o contexto da criança que está sendo avaliada. Assim, são de suma importância pesquisas sobre validade preditiva, confiabilidade e capacidade de resposta das ferramentas de avaliação motora grossa. A AIMS se mostrou um instrumento válido, confiável e eficaz para a avaliação do desenvolvimento motor de crianças brasileiras, inclusive em amostras contemporâneas55. Darrah J, Bartlett D, Maguire TO, Avison WR, Lacaze-Masmonteil T. Have infant gross motor abilities changed in 20 years? A re-evaluation of the Alberta Infant Motor Scale normative values. Dev Med Child Neurol. 2014;56(9):877-81. doi: 10.1111/dmcn.12452.
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As regiões Sul e Sudeste tiveram a maior quantidade de instituições vinculadas aos estudos selecionados. O levantamento dos artigos por região é importante para traçar a trajetória de desenvolvimento de cada uma, pois diferenças regionais, considerando a cultura e o contexto social, podem influenciar o desenvolvimento motor1515. Adolph KE, Hoch JE. Motor development: embodied, embedded, enculturated, and enabling. Annu Rev Psychol. 2019;70:141-64. doi: 10.1146/annurev-psych-010418-102836.
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. Além disso, não foram encontrados estudos referentes a este tema na região Norte, e poucos foram as pesquisas vinculadas às regiões Centro-Oeste e Nordeste do país, sinalizando assimetrias regionais na produção científica nacional sobre a temática. A maior concentração de programas de pós-graduação (PPGs, mestrado e doutorado, acadêmico e profissional), considerando a área 21 (Educação Física, Fisioterapia, Terapia Ocupacional e Fonoaudiologia) da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), em determinadas regiões brasileiras pode elevar a incidência de pesquisas publicadas sobre a temática. Em 2021, as regiões Sudeste e Sul abrangeram cerca de 71% dos PPGs dessa área, enquanto apenas 8,2% destes se encontravam na região Norte. É possível que existam, na amostra final, estudos com autores vinculados a instituições de todas as regiões do Brasil, mas, por estas regiões não serem as dos primeiros autores ou das instituições destacadas como local onde o estudo foi desenvolvido, não foram consideradas.

Merece ser destacada a grande concentração de estudos nos anos recentes, o que pode significar que se trata de um assunto que despertou maior interesse há pouco tempo, com grande potencial para ampliação e inovação. Outro ponto importante observado é que a maioria dos artigos da amostra foram publicados em inglês, mesmo que, em sua maioria, estejam em revistas brasileiras.

Em relação à distribuição das classes de palavras no dendrograma, observou-se que há uma primeira divisão entre estudos de validade psicométricos e estudos avaliativos. Esta segunda categoria engloba a maior parte dos artigos, considerando as várias populações infantis analisadas. Esses estudos são muito importantes, pois vêm ao encontro de uma grande necessidade do nosso país: o acompanhamento do desenvolvimento das nossas crianças1616. Caminha MFC, Silva SL, Lima MC, Azevedo PTACC, Figueira MCS, et al. Vigilância do desenvolvimento infantil: análise da situação brasileira. Rev Paul Pediatr. 2017;35(1):102-9. doi: 10.1590/1984-0462/;2017;35;1;00009.
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Desta forma, estes apontamentos podem contribuir para obtermos uma visão mais ampla da avaliação dos desfechos motores em crianças e para colocarmos em pauta sua importância para a promoção de boas estratégias de intervenção motora precoce em crianças brasileiras. Entre as limitações do estudo está a desproporção dos estudos quanto aos tipos de delineamento e aos temas estudados, o que promove quantidade significante de pesquisas para alguns temas e escassez de outros.

CONCLUSÃO

A maioria das pesquisas que utilizam a AIMS com crianças brasileiras são do tipo transversal, seguidas das longitudinais e metodológicas. As pesquisas, majoritariamente, forneceram valores, trajetórias de desenvolvimento e curvas de referência da escala para crianças prematuras e a termo, bem como disponibilizaram critérios de qualidade para a escala.

As categorias temáticas dos objetivos dos estudos apresentam classes relacionadas a estudos de validação e de avaliação do desenvolvimento de crianças prematuras, com baixo peso ao nascer, expostas a vírus e com síndrome de Down. Isso revela a crescente utilização da AIMS para suprir a grande necessidade de acompanhamento do desenvolvimento das crianças brasileiras através de instrumentos amplos e confiáveis.

Considerando esses achados, a realização de futuros estudos sobre estes temas, abrangendo crianças brasileiras, merece ser considerada. Para isso, o grande desafio seria o treinamento e aperfeiçoamento de profissionais da saúde (fisioterapeutas, profissionais de educação física, pediatras, entre outros) para uma avaliação pormenorizada de aspectos suspeitos de causarem o atraso no desenvolvimento motor de crianças brasileiras.

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    Albuquerque KA, Cunha ACB. Novas tendências em instrumentos para triagem do desenvolvimento infantil no Brasil: uma revisão sistemática. J Hum Growth Dev. 2020;30(2):188-96. doi: 10.7322/jhgd.v30.10366.
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  • 15
    Adolph KE, Hoch JE. Motor development: embodied, embedded, enculturated, and enabling. Annu Rev Psychol. 2019;70:141-64. doi: 10.1146/annurev-psych-010418-102836.
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  • 16
    Caminha MFC, Silva SL, Lima MC, Azevedo PTACC, Figueira MCS, et al. Vigilância do desenvolvimento infantil: análise da situação brasileira. Rev Paul Pediatr. 2017;35(1):102-9. doi: 10.1590/1984-0462/;2017;35;1;00009.
    » https://doi.org/10.1590/1984-0462/;2017;35;1;00009
  • 5
    Estudo desenvolvido pelo Laboratório de Avaliação e Intervenção Motora (LAVIM) do Instituto de Educação Física e Esportes, Universidade Federal do Ceará (UFC) - Fortaleza (CE), Brasil.
  • 6
    Este artigo foi extraído do Trabalho de Conclusão de Curso intitulado Alberta Infant Motor Scale em pesquisas brasileiras: estudo bibliométrico, de autoria de Carla Thais de Sousa, apresentado para fins de conclusão do curso de Educação Física da UFC no ano de 2022.
  • 7
    Fonte de financiamento: nada a declarar

Material suplementar

O material suplementar pode ser consultado em: https://osf.io/xdcjn.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    20 Out 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    02 Dez 2022
  • Aceito
    26 Abr 2023
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