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Mortalidade infantil na Região Metropolitana de São Paulo: estudo ecológico

RESUMO

Objetivo

Identificar a influência dos fatores de risco na mortalidade infantil da Região Metropolitana de São Paulo, segundo as características da mãe e do neonato e o tipo de parto.

Métodos

Trata-se de estudo ecológico com abordagem quantitativa utilizando dados secundários dos sistemas de mortalidade infantil e nascidos vivos nos 39 municípios da Região Metropolitana de São Paulo. Variáveis do recém-nascido e maternas foram extraídas do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde, tendo sido apresentadas as frequências absoluta e relativa, bem como a regressão linear e o coeficiente de correlação de Pearson.

Resultados

No decênio, registraram-se perfil materno com escolaridade entre 8 e 11 anos (β=73,58; p=0,023) e idade materna entre 30 e 34 anos (β=١٩,٠٤; p=0,015). O parto mais evidenciado foi o cesáreo (β=39,59; p=0,009) e a duração da gestação mais apontada foi a termo (β=-14,20; p=0,324). O período pós-neonatal apresentou regressão nos óbitos comparado com as demais faixas etárias (β=-25,30; p<0,001). Ainda, mulheres no período gestacional consideradas pré-termo (r=0,86; p<0,001) e pós-termo (r=0,95; p<0,001) tiveram chances aumentadas na taxa de mortalidade infantil.

Conclusão

A faixa etária materna e o grau de escolaridade estão aumentando nas mulheres que tiveram filhos na Região Metropolitana de São Paulo, no período de 2006 a 2016. Isso também demonstra relevância na redução da taxa de mortalidade infantil.

Mortalidade infantil; Gravidez; Fatores de risco; Escolaridade; Idade materna

ABSTRACT

Objective

To determine the impact of risk factors on infant mortality in the Metropolitan Region of São Paulo according to maternal and neonate characteristics, as well as mode of delivery.

Methods

An ecological, quantitative study based on secondary data retrieved from infant mortality and live birth data systems. Data from 39 municipalities located in the Metropolitan Region of São Paulo were analyzed. Newborn and maternal variables were extracted from the Information Technology Department of the Unified Health System. Absolute and relative frequencies were presented, as well as linear regression and Pearson´s correlation coefficient.

Results

The following maternal profile prevailed from 2006 to 2016: 8 to 11 years of education (β=73.58; p=0.023), age between 30 and 34 years (β=19.04; p=0.015) and delivery by cesarean section (β=39.59; p=0.009) after full-term pregnancy (β=-14.20; p=0.324). Mortality rates decreased in neonates compared to other age groups (β=-25.30; p<0.001). Infant mortality rates tended to be higher among women experiencing pre-term (r=0.86; p<0.001) or post-term (r=0.95; p<0.001) gestation.

Conclusion

Maternal age and level of education increased among women giving birth in the Metropolitan Region of São Paulo from 2006 to 2016. These were relevant factors for infant mortality rate reduction.

Infant mortality; Pregnancy; Risk factors; Educational status; Maternal age

INTRODUÇÃO

A análise da taxa de mortalidade infantil (TMI) e de seus elementos coopera para o entendimento das condições de vida ao longo do primeiro ano, pois os motivos e as condições de risco para o óbito infantil variam ao longo do período pré-natal, do parto e do puerpério. A TMI é segmentada em períodos: a taxa de mortalidade neonatal, que pode ser subdividida em neonatal precoce e tardia, e a taxa de mortalidade pós-neonatal.(11. Matos LN, Alves EB, Teixeira EM, Harbache LM, Griep RH. Mortalidade de infantil no município do Rio de Janeiro. Esc Anna Nery. 2007;11(2):283-8.)

Diversos aspectos estão relacionados aos óbitos infantis, sendo estes riscos socioeconômicos, comportamentais e biológicos.(22. Garcia LP, Fernandes CM, Traebert J. Risk factors for neonatal death in the capital city with the lowest infant mortality rate in Brazil. J Pediatr (Rio J). 2019;95(2):194-200.) A mortalidade neonatal é vulnerável às condições intrínsecas ou biológicas pertinentes à gestação e ao parto e relacionadas a problemas genéticos, malformação fetal e complicações no parto e no pós-parto, sendo as ações na prevenção mais complexas.(33. Ramalho AA, Andrade AM, Martins FA, Koifman RJ. Infant mortality trend in the city of Rio Branco, AC, 1999 to 2015. Rev Saude Publica. 2018;52:33.)

Além disso, é um indicador sugestionável aos fatores externos que influenciam na ocorrência de óbitos nessa faixa etária. Corresponde às características maternas e às condições de vida, como meio ambiente, nutricionais, socioeconômicas, educação, acesso aos serviços de saúde e de bem-estar, em que essa população está inserida.(44. Ferrari RA, Bertolozzi MR. Postnatal mortality in Brazilian territory: a literature review. Rev Esc Enferm USP. 2012;46(5):1204-11. Review.)

Por conseguinte, as causas de mortalidade infantil podem indicar que ações preventivas conhecidas não estão sendo viabilizadas de maneira adequada.(55. Lisboa L, Abreu DM, Lana ÂM, França EB. Mortalidade infantil: principais causas evitáveis na região Centro de Minas Gerais, Brasil, 1999-2011. Epidemiol Serv Saude. 2015;24(4):711-20.)

No Brasil, nas últimas décadas, ocorreu importante redução na mortalidade infantil tardia, além de atenuação da mortalidade neonatal e acréscimo dos nascimentos pré-termo.(66. Teixeira JA, Araujo WR, Maranhão AG, Cortez-Escalante JJ, Rezende LF, Matijasevich A. Mortality on the first day of life: trends, causes of death and avoidability in eight Brazilian Federative Units, between 2010 and 2015. Epidemiol Serv Saude. 2019;28(1):e2018132.)

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), por meio do censo 2010, aponta que, no período de 2000 a 2010, os óbitos de crianças menores de 1 ano tiveram declínio de 47,6% na TMI no Brasil.(77. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Censo 2010: escolaridade e rendimento aumentam e cai mortalidade infantil. Rio de Janeiro: IBGE; 2012 [citado 2020 Jan 27]. Disponível em: https://censo2010.ibge.gov.br/noticias-censo?view=noticia&id=1&idnoticia=2125
https://censo2010.ibge.gov.br/noticias-c...
)

A pactuação diante dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) leva em consideração a redução da mortalidade infantil. O Brasil, por sua vez, vem obtendo evoluções positivas na redução da mortalidade infantil, mas, considerando tal pactuação, precisa reduzir ainda mais os óbitos antes de 2030.(88. Araujo Filho AC, Araujo AK, Almeida PD, Rocha SS. Mortalidade infantil em uma capital do nordeste brasileiro. Enferm Foco. 2017;8(1):32-6.)

A Região Metropolitana de São Paulo (RMSP) é considerada uma importante região brasileira por ter alta concentração populacional, desigualdade social e complexidades urbanas. Assim, políticas públicas vêm sendo implantadas nas últimas décadas, especialmente de saúde, que necessitam de informações e indicadores para orientar os programas e as ações de melhoria da qualidade de vida. Caracterizar o perfil da mortalidade infantil pode oferecer importante subsídio para acompanhamento e avaliação de tais políticas governamentais.

No Brasil, o aperfeiçoamento dos sistemas de informações em saúde do país, especialmente do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) e do Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (SINASC), tem contribuído para uma melhor qualidade das informações e a disseminação delas abordando a mortalidade infantil e seus determinantes.(99. Maia LT, Souza WV, Mendes AC. Diferenciais nos fatores de risco para a mortalidade infantil em cinco cidades brasileiras: um estudo de caso-controle com base no SIM e no SINASC. Cad Saude Publica. 2012;28(11):2163-76.)

OBJETIVO

Identificar a influência dos fatores de risco na mortalidade infantil da Região Metropolitana de São Paulo, segundo as características da mãe e do neonato e o tipo de parto.

MÉTODOS

Delineamento do estudo

Estudo observacional, de caráter ecológico, com abordagem quantitativa, utilizando dados secundários sobre mortalidade infantil.(1010. Sousa LV, Paiva LD, Figueiredo FW, Almeida TC, Oliveira FR, Adami F. Trends in stroke-related mortality in the ABC region, São Paulo, Brazil: an ecological study between 1997 and 2012. Open Cardiovasc Med J. 2017;11:111-9.)

O período escolhido para análise das informações obtidas da mortalidade infantil foi de 2006 a 2016.

Local de estudo

Os 39 municípios da RMSP estão localizados em torno da cidade de São Paulo (SP), na Região Sudeste brasileira. Possuem a maior concentração urbana do Brasil.(1111. Holcman MM, Latorre MR, Santos JL. Infant mortality evolution in the metropolitan region of São Paulo (Brazil), 1980-2000. Rev Saude Publica. 2004;38(2):180-6.)

Essa região foi criada em 1973 e reestruturada em 2011, pela lei complementar 1.13916, de junho de 2011, que a organizou em sub-regiões, conforme dados fornecidos pelo site (https://www.pdui.sp.gov.br/rmsp/?page_id=56).(1212. Plano de Desenvolvimento Urbano e Integrado Região Metropolitana de São Paulo (PDUI). Região Metropolitana de São Paulo. São Paulo: EMPLASA; 2019 [citado 2019 Jul 5]. Disponível em: https://www.pdui.sp.gov.br/rmsp/?page_id=56
https://www.pdui.sp.gov.br/rmsp/?page_id...
)Além do município de São Paulo, as sub-regiões são: Norte (Caieiras, Cajamar, Francisco Morato, Franco da Rocha e Mairiporã), Leste (Arujá, Biritiba-Mirim, Ferraz de Vasconcelos, Guararema, Guarulhos, Itaquaquecetuba, Mogi das Cruzes, Poá, Salesópolis, Santa Isabel e Suzano), Sudeste (Diadema, Mauá, Ribeirão Pires, Rio Grande da Serra, Santo André, São Bernardo do Campo e São Caetano do Sul), Sudoeste (Cotia, Embu das Artes, Embu-Guaçu, Itapecerica da Serra, Juquitiba, São Lourenço da Serra, Taboão da Serra e Vargem Grande Paulista) e Oeste (Barueri, Carapicuíba, Itapevi, Jandira, Osasco, Pirapora do Bom Jesus e Santana do Parnaíba).

Existem, nessa região, aproximadamente 21,6 milhões de habitantes, segundo estimativa do IBGE para 2018.

Coleta de dados

O levantamento dos dados foi realizado por intermédio do site do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DATASUS), utilizando a ferramenta denominada TABNET, que disponibiliza informações sobre a saúde brasileira.

Os sistemas do DATASUS que foram usados para a coleta foram o SINASC e o SIM.(1313. Brasil. Ministério da Saúde. Portal saúde. Informações de Saúde (TABNET). Estatísticas Vitais. Brasília (DF): 2013 [citado 2019 Ago 20]. Disponível em: http://www2.datasus.gov.br/DATASUS/index.php?area=0205
http://www2.datasus.gov.br/DATASUS/index...
)O SINASC foi instituído em 1990 pelo Ministério da Saúde, a fim de fornecer um registro sistemático de todos os nascidos vivos do país, a partir de informações oriundas da Declaração de Nascido Vivo, que abrange dados sobre a mãe, o pré-natal, o parto e o recém-nascido.(1414. Paiva NS, Coeli CM, Moreno AB, Guimarães RM, Camargo Júnior KR. Sistema de informações sobre nascidos vivos: um estudo de revisão. Cien Saude Colet. 2011;16(Suppl 1):1211-20.) O SIM foi instituído em 1975 e tem como base a captação dos dados de óbitos de todo o país, provenientes da declaração de óbito, que é padronizada.(1515. Brasil. Ministério da Saúde. Fundação Nacional de Saúde (FUNASA). Manual de procedimentos do sistema de informação sobre mortalidade. Brasília (DF): MS; 2001 [citado 2019 Ago 20]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/sis_mortalidade.pdf
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe...
)

A análise dos nascidos vivos seguiu agrupamentos do SINASC relativos a características da mãe, do neonato e da gestação. Da mãe, as características foram idade (agrupada nas seguintes faixas: 20 a 24; 25 a 29; 30 a 34; 35 a 39; 40 a 44; 45 a 49 e 50 a 54), tipo de parto (cesáreo ou vaginal), escolaridade (dividida em 1 a 3 anos de estudo; 4 a 7 anos de estudo; 8 a 11 anos estudo e 12 anos ou mais anos de estudo) e idade gestacional (menos de 22; 22 a 27; 28 a 31; 33 a 36; 37 a 41 e 42 semanas ou mais). Dos neonatos, foi pesquisado o sexo (masculino e feminino), e foram incluídos todos os óbitos estimados para a RMSP ocorridos em crianças menores de 1 ano, no período de 2006 a 2016.

Já no SIM, foram observadas Características relacionadas à mãe, como idade da mãe (20 a 24; 25 a 29; 30 a 34; 35 a 39; 40 a 44; 45 a 49 e 50 a 54); tipo de parto (cesáreo e vaginal); escolaridade da mãe (1 a 3 anos; 4 a 7 anos; 8 a 11 anos e 12 anos e mais) e idade gestacional (menos de 22; 22 a 27; 28 a 31; 33 a 36; 37 a 41, e 42 semanas ou mais). As características dos óbitos registradas foram faixa etária (zero a 6 dias; 7 a 27 dias e 28 a 364 dias) e sexo (masculino e feminino).

As taxas de mortalidade neonatal precoce (óbitos de zero a 6 dias de vida), neonatal (óbitos de 7 a 27 dias de vida), pós-natal (óbitos de 28 a 364 dias de vida) e infantil (óbitos menores de 1 ano de vida) foram calculadas por 1.000 nascidos vivos.

Análise estatística

A tendência da mortalidade infantil foi verificada por meio de modelos de regressão linear, apresentando a TMI (variável dependente) e o tempo (variável independente), expressos nos anos que compõem o período de estudo (2006 a 2016).

Considerou-se nível de confiança de 95% e utilizou-se o programa estatístico Stata, versão 11.0®.

Comitê de ética

Este estudo é baseado em dados secundários, não sendo capaz de identificar o indivíduo. Os dados estão disponíveis na Internet de forma livre e irrestrita, não havendo necessidade do envio deste projeto ao Comitê de Ética em Pesquisa para apreciação, segundo expresso na resolução 466/2012.

RESULTADOS

Ao analisar as características maternas de todos os nascimentos ocorridos na RMSP, no período de 2006 a 2016, a tabela 1 mostrou que a escolaridade da mãe apresentou aumento significante de anos estudados, com ênfase para o aumento dos estratos de 8 e 11 anos de estudos (β=73,58; p=0,023) e mais de 12 anos de estudo (β=15,33, p=0,024).

Tabela 1
Análise das características maternas (relacionadas às parturientes) da Região Metropolitana de São Paulo

Os dados revelam que as faixas etárias de mães entre 30 e 34 (β=19,04; p=0,015) e 35 e 39 (β=16,26; p≤0,001) foram as mais predominantes ao longo dos anos. Sobre o tipo de parto, o cesáreo (β=39,59; p=0,009) teve aumento com relação ao vaginal (β=-12,27; p=0,437), e, em relação à duração da gestação, partos considerados a termo (37 a 41) tiveram acréscimo na comparação com os demais (β=14,20; p=0,324).

A figura 1 apresenta redução da mortalidade infantil segundo as faixas etárias na RMSP nos anos de 2006 a 2016. Na tabela 2, a mortalidade pós-neonatal de 28 a 364 dias apresenta significante redução na incidência de óbitos (β=-25,30; p<0,001), seguida do período neonatal precoce (zero a 6 dias), que também expressou declínio (β=-17,60; p=0,004) no total dos óbitos. Em relação ao sexo dos óbitos, os dados não revelaram significância.

Figura 1
Tendência temporal da taxa de mortalidade infantil

Tabela 2
Análise das características relacionadas aos óbitos infantis de neonatos da Região Metropolitana de São Paulo

A figura 2 apresenta a tendência dos óbitos infantis segundo a idade materna. No decênio, houve tendência de queda em sua totalidade, porém a maior queda ocorreu no ano de 2007 em todas as idades. O ano de 2008 teve aumento considerável na tendência de óbitos na faixa de etária de 20 a 24 anos, e, no ano de 2013, na faixa etária de 30 a 34 anos, vê-se tendência a novo aumento.

Figura 2
Tendência dos óbitos infantis segundo a idade materna

Na tabela 3, observa-se que mulheres com mais anos de estudo – entre 8 a 11 anos (r=0,97; p<0,001) ou 12 anos ou mais (r=0,91; p<0,001) – apresentaram elevada taxa de parto cesáreo, assim como mulheres com idade entre 30 a 34 anos e 35 a 39 anos (r=0,95; p<0,001 e r=0,92; p<0,001, respectivamente). Parto vaginal prevaleceu naquelas mulheres com poucos anos de estudo (4 a 7 anos; r=0,85; p<0,001) e idade entre 20 a 24 anos (r=0,98; p<0,001).

Tabela 3
Correlação entre a escolaridade e idade da mãe com o tipo de parto na Região Metropolitana de São Paulo

A figura 3 apresenta a tendência dos óbitos infantis segundo os anos de escolaridade materna na RMSP entre os anos de 2006 e 2016.

Figura 3
Tendência dos óbitos infantis segundo os anos de escolaridade materna

Na tabela 4, destaca-se que mulheres no período gestacional considerado pré-termo, entre ٢٨ e ٣١ semanas (r=٠,٨٦; p<٠,٠٠١), e pós-termo, de 42 ou mais semanas (r=0,95; p<0,001), tiveram incidência aumentada de mortalidade infantil. Em relação à idade materna, os dados de maior significância demonstram que na faixa etária entre 35 e 39 anos (r=-0,81; p<0,002) teve redução da TMI no período estudado. A escolaridade da mãe apresentou incidência aumentada de mortalidade infantil dos estratos de 1 a 3 anos de estudos (r=0,89; p<0,001).

Tabela 4
Duração da gestação, idade materna e escolaridade materna, segundo taxa de mortalidade infantil na Região Metropolitana de São Paulo

DISCUSSÃO

Neste estudo, considerando os partos ocorridos na RMSP, o perfil e as características maternas revelaram que as mulheres dessa região possuíam nível de escolaridade elevado (acima de 8 anos de estudo) e eram predominantemente da faixa etária entre 30 a 39 anos, com destaque para a elevação dos partos considerados a termo e o tipo de parto cesáreo como dominante. Entretanto, as condições de baixa escolaridade materna (1 a 3 anos de estudo) têm chamado atenção negativamente para óbitos infantis, pois essa variável tem sido utilizada como indicador da condição socioeconômica da mãe e de sua família, relacionando-se à qualidade dos cuidados com a saúde da criança.(1717. Borges TS, Vayego S. Fatores de risco para mortalidade neonatal em um município na região Sul. Ciênc Saúde (Porto Alegre). 2015;8(1):7-14.,1818. Jobim R, Aerts D. Mortalidade infantil evitável e fatores associados em Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil, 2000-2003. Cad Saude Publica. 2008;24(1):179-87.) A escolaridade materna influencia na mortalidade infantil, há relação direta entre mães sem nenhum grau de instrução e aumento no risco da mortalidade infantil.(1717. Borges TS, Vayego S. Fatores de risco para mortalidade neonatal em um município na região Sul. Ciênc Saúde (Porto Alegre). 2015;8(1):7-14.,1818. Jobim R, Aerts D. Mortalidade infantil evitável e fatores associados em Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil, 2000-2003. Cad Saude Publica. 2008;24(1):179-87.) Ainda, há registros de que, nos anos de 2001 a 2011 (risco relativo de 4,89 e 5,06, respectivamente) e em 2000 a 2003, mulheres com 3 anos de estudo ou menos tiveram 1,56 mais chance de serem mães.

No estudo da Região Metropolitana de Porto Alegre realizado nos de 1998 a 2006, a escolaridade materna teve bons impactos sobre as taxas de mortalidade infantil, pois a influência das mulheres com 8 ou mais anos de instrução aumentou de 46,09%, em 1996, para 60,98%, em 2008.(1919. Hernandez AR, Silva CH, Agranonik M, Quadros FM, Goldani MZ. Análise de tendências das taxas de mortalidade infantil e de seus fatores de risco na cidade de Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil, no período de 1996 a 2008. Cad Saude Publica. 2011;27(11):2188-96.)

No entanto, outros estudos comprovam que 43,2% das mães com grau de escolaridade elevado (superior a 8 anos de estudo) tiveram mais associação com o óbito infantil.(2020. Feitosa AC, Santos EF, Ramos JL, Bezerra IM, Nascimento VG, Macedo CC, et al. Factors associated with infant mortality in the metropolitan region of Cariri, Ceará, Brazil. Rev Bras Crescimento Desenvolv Hum. 2015;25(2):224-9.)

Os dados da pesquisa demonstraram que a idade da mãe entre 35 e 39 anos sobressaiu como fator protetor da ocorrência da mortalidade infantil. Os achados de Alberto et al.,(2121. Alberto SA, Lima LC, Rodrigues RN, Machado CJ. Fatores associados aos óbitos neonatais e pós-neonatais em Moçambique. Rev Bras Estud Popul. 2011;28(1):203-16.) identificaram que, em Moçambique, a idade materna mais elevada também é um fator protetor, e as mães adolescentes foram indicativo para mortalidade infantil. No Brasil e em Moçambique, os resultados indicam que mães consideradas maduras conduzem melhor a gestação, pois aderem ao pré-natal, e desempenham melhor os cuidados com a criança.

Estudo realizado em Londrina (PR) nos anos de 2000 a 2009 evidenciou que, em quase todos os biênios, os óbitos infantis foram mais frequentes entre mulheres na faixa etária dos 10 aos 19 anos. Ainda, a TMI entre adolescentes foi maior se comparada à de mães com idade reprodutiva avançada.(2222. Ribeiro FD, Ferrari RA, Sant’Anna FL, Dalmas JC, Girotto E. Extremes of maternal age and child mortality: analysis between 2000 and 2009. Rev Paul Pediatr. 2014;32(4):381-8.)

A prematuridade é o fator de risco de mortalidade infantil mais evidenciado na literatura. Neste estudo, a maioria dos óbitos infantis aconteceu no período gestacional de 28 a 31 semanas, em consonância com o encontrado por Sanders et al.,(2323. Sanders LS, Pinto FJ, Medeiros CR, Sampaio RM, Viana RA, Lima KJ. Mortalidade infantil: análise de fatores associados em uma capital do Nordeste brasileiro. Cad Saude Colet. 2017;25(1):83-9.) que demonstraram que a maioria das mães que concebeu seus filhos com menos de 37 semanas teve mais chances de óbitos infantis (intervalo de confiança de 6,3-66,8; p<0,001).

Em relação às características relacionadas aos óbitos infantis, este estudo destaca que houve significante diminuição nos óbitos de neonatos acima de 28 dias. Sabe-se que o principal componente da mortalidade infantil é o neonatal precoce (57,1%), com ênfase nas primeiras 24 horas de vida.(88. Araujo Filho AC, Araujo AK, Almeida PD, Rocha SS. Mortalidade infantil em uma capital do nordeste brasileiro. Enferm Foco. 2017;8(1):32-6.)

Na correlação entre tipo de parto e anos de estudos da mãe, esta pesquisa mostra que aquelas com mais de 12 anos de estudo realizaram prioritariamente parto cesáreo, concordando com os achados de Riscado et al.,(2424. Riscado LC, Jannotti CB, Barbosa RH. A decisão pela via de parto no Brasil: temas e tendências na produção da saúde coletiva. Texto Contexto - Enferm. 2016;25(1):e3570014. Review.) que ressaltam que mulheres com nível socioeconômico e escolaridade elevados e usuárias do setor privado são as que mais realizam cesarianas, sendo tal conduta influenciada pela lógica do mercado na assistência ao parto.

É importante sensibilizar os profissionais de saúde para o entendimento das vias de partos, bem como dos riscos da cesariana eletiva e da prematuridade iatrogênica.(55. Lisboa L, Abreu DM, Lana ÂM, França EB. Mortalidade infantil: principais causas evitáveis na região Centro de Minas Gerais, Brasil, 1999-2011. Epidemiol Serv Saude. 2015;24(4):711-20.) O parto cesáreo pode se apresentar como fator de proteção para óbito infantil, principalmente em gestações de alto risco.(2323. Sanders LS, Pinto FJ, Medeiros CR, Sampaio RM, Viana RA, Lima KJ. Mortalidade infantil: análise de fatores associados em uma capital do Nordeste brasileiro. Cad Saude Colet. 2017;25(1):83-9.)

A relação entre via de parto e idade materna é assunto que gera bastante indagação, pois existe a preocupação de que as adolescentes não estejam preparadas para serem submetidas ao parto vaginal, pela imaturidade corporal para a parturição e por fragilidade emotiva. No entanto, o desenvolvimento obstétrico das adolescentes é similar ao das mulheres adultas quanto à via de parto. Ainda, os índices de cesariana estão aumentando com o avançar da idade materna, pois muitas mulheres mais maduras, que iniciaram a prática reprodutiva tardiamente e têm gestações planejadas, têm indicação de cesariana eletiva, por apresentarem futuro reprodutivo previsível.(2525. Silva JL, Surita FG. Idade materna: resultados perinatais e via de parto. Rev Bras Ginecol Obstet. 2009;31(7):321-5.)

Quanto à correlação entre a duração da gravidez com a TMI, esta pesquisa observou que gestações classificadas como pré-termo (28 e 31 semanas) e pós-termo (com 42 semanas ou mais) tiveram aumento da ocorrência de mortes infantis. Kropiwiec et al.,(2626. Kropiwiec MV, Franco SC, Amaral AR. Factors associated with infant Mortality in a brazilian city with high human development index. Rev Paul Pediatr. 2017;35(4):391-8.) também registraram o aumento da mortalidade infantil para gestações entre 28 a 36 semanas de gestação (razão de chance de 12,08), justificando a relação com a prematuridade (<37 semanas de gestação; razão de chance de 12,08), associação esta entendida como fator relevante para o óbito infantil – especialmente o neonatal precoce.

A análise de informações obtidas de dados secundários gera limitações no estudo, pois, apesar de melhorias nos sistemas de informações, ainda existem inconsistências, como subnotificações. No entanto, como descreve Boing et al.,(2727. Boing AF, Boing AC. Mortalidade infantil por causas evitáveis no Brasil: um estudo ecológico no período 2000-2002. Cad Saude Publica. 2008;24(2):447-55.)é necessário aprimorar a discussão dos dados para melhorar o sistema de informação.

CONCLUSÃO

A faixa etária das mães e o grau de escolaridade aumentaram nas mulheres que tiveram filhos na Região Metropolitana de São Paulo, no período de 2006 a 2016. Ainda, ambas, a faixa etária e a escolaridade aumentadas mostraram-se relevantes na redução da taxa de mortalidade infantil.

REFERENCES

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Ago 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    3 Mar 2020
  • Aceito
    2 Dez 2020
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