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O equívoco da ontologia social antagonista e a crise de alienação da modernidade tardia: sobre a atualidade política da Teoria Crítica

Against antagonism in social ontology: alienation and the pertinence of Critical Theory for late modern political analysis

El equívoco de la ontología social antagónica y la crisis de alienación en la modernidad tardía: sobre la teoría política de la Teoría Crítica

Resumo:

Na teoria social e política contemporânea, tanto os pensadores da esquerda como os da direita frequentemente partem da base de uma ontologia social antagonista. Eles assumem como dado que existem conflitos e divergências de interesses irreconciliáveis entre os grupos sociais de modo que, como Laclau, Rancière e outros supõem, conflito eterno não apenas é inevitável, mas desejável, pois sua ausência não significa outra coisa que uma hegemonia incontestada de uma facção social particular. Isso corresponde a uma realidade social na qual atores políticos simplesmente percebem uns aos outros como aliados ou como inimigos e obstáculos que necessitam ser combatidos ou silenciados. Uma realidade assim inevitavelmente produz um crescente senso de alienação política. Esta contribuição, em contraste, defende que deveríamos partir de uma ontologia social relacional, o que implica que relações sociais não estão dadas a priori, mas são elas próprias produto de instituições e práticas sociais e políticas. Consequentemente, as relações entre grupos sociais não necessitam ser antagonistas, mas podem assumir uma ampla variedade de formas. A Teoria Crítica, por consequência, deveria enfocar a natureza e a qualidade de relações sociais, físicas, temporais e espaciais nas instituições sociais. O texto segue, então, com o desenvolvimento do arcabouço conceitual para esse tipo de análise baseada na teoria da ressonância.

Palavras-chave:
Alienação; Aceleração; Estabilização; dinâmica; Ressonância; Pós-estruturalismo

Abstract:

In contemporary social and political theory, thinkers from the left as well as those from the right very often start from the basis of an antogistic social ontology. They take it for granted that there are irreconcilable conflicts and divergencies of interest between social groups such that, as Laclau, Rancière and others would have it, eternal struggle is not just unavoidable, but desirable, since its absence signifies nothing but the unchecked hegemony of a particular social faction. This view corresponds to a social reality in which political actors simply perceive of each other as allies or as enemies and obstacles that need to be fought or silenced. Such a reality inevitably produces a growing sense of political alienation. By contrast, this contribution claims that we should start from a relational social ontology which implies that social relations are not a priori given, but are themselves a product of social and political institutions and practices. Hence, relationships between social groups need not be antagonistic, but can take on a wide variety of forms. Critical Theory therefore should focus on the nature and quality of social, physical, temporal and spatial relationships established in social institutions. The paper then goes on to delevop the conceptual framework for such an analysis based on the theory of resonance.

Keywords:
Alienation; Acceleration; Dynamic stabilization; Resonance; Poststructuralism

Resumen:

En la teoría social y política contemporánea, tanto los pensadores de izquierda como los de derecha parten muy a menudo de la base de una ontología social antagonista. Dan por sentado que existen conflictos y divergencias de interés irreconciliables entre los grupos sociales, de modo que, como dirían Laclau, Rancière y otros, la lucha eterna no solo es inevitable, sino deseable, ya que su ausencia no significa más que la hegemonía incontrolada de una facción social particular. Esta visión corresponde a una realidad social en la que los actores políticos simplemente se perciben entre sí como aliados o enemigos y obstáculos que hay que combatir o silenciar. Tal realidad produce inevitablemente una creciente sensación de alienación política. Por el contrario, esta contribución afirma que debemos partir de una ontología social relacional que implica que las relaciones sociales no son dadas a priori, sino que son ellas mismas producto de instituciones y prácticas sociales y políticas. Por tanto, las relaciones entre grupos sociales no tienen que ser antagonistas, sino que pueden adoptar una amplia variedad de formas. Por lo tanto, la Teoría Crítica debe enfocarse en la naturaleza y calidad de las relaciones sociales, físicas, temporales y espaciales establecidas en las instituciones sociales. A continuación, el artículo prosigue con el desarrollo del marco conceptual para un análisis de este tipo basado en la teoría de la resonancia.

Palabras clave:
Alienación; Aceleración; Estabilización dinámica; Resonancia; Postestructuralismo

Introdução: a disputa sobre o cerne da política2 2 Traduzido por Emil A. Sobottka (Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (Pucrs), Porto Alegre, RS, Brasil).

Qual é o cerne da política, o que está no centro do agir político: a disputa, o conflito e a contradição em que é necessário fazer valer os próprios interesses – ou a formatação/modelagem (conjunta) das estruturas de um mundo compartilhado? Teorias atuais da política e do político, especialmente aquelas que reivindicam para si um ponto de vista crítico, são baseadas na grande maioria em uma “ontologia social antagonista”, como Oliver Marchart (2013Marchart, Oliver. 2013. Das unmögliche Objekt: eine postfundamentalistishe Theorie der Gesellschaft. Suhrkamp. Berlin: Suhrkamp., 447) apropriadamente a designa. Uma ontologia assim, para a qual os antagonismos e conflitos constituem a base de tudo o que é social e para a qual as lutas sociais são o lugar paradigmático e a base constitutiva por excelência do político, extrai sua plausibilidade, por um lado, da longa e em muitos aspectos convincente tradição intelectual do (proto, pós e neo) marxismo com sua própria ênfase no caráter constitutivo das lutas de classes e conflitos de interesse. Essa tradição de pensamento também serve de orientação para muitos representantes da Escola de Frankfurt, para a qual a Teoria Crítica está primariamente preocupada em descobrir os mecanismos de poder com os quais os interesses das classes dominantes são impostos.

Por outro lado, também as abordagens teóricas diferenciais do pós-estruturalismo e do pós-fundamentalismo, especialmente de proveniência francesa, como as representadas por Alain Badiou (2018)Badiou, Alain. 2018. Was verstehe ich unter Marxismus? Vortrag vom 18, April 2016 an der École Normale Supérieure. Traduzido por Richard Steurer-Boulard. Wien: Passagen Verlag. e Jacques Rancière (2018Rancière, Jacques. 2018. Das Unvernehmen: Politik und Philosophie. Traduzido por Richard Steurer-Boulard. 7. ed. Frankfurt am Main: Suhrkamp., 2008Rancière, Jacques. 2008. Zehn Thesen zur Politik. Traduzido por Marc Blankenburg. Zürich: Diaphanes.), mas também por Ernesto Laclau e Chantal Mouffe (cf. Nonhoff 2015Nonhoff, Martin. 2015. Diskurs - radikale Demokratie - Hegemonie Zum politischen Denken von Ernesto Laclau und Chantal Mouffe. Bielefeld: Transcript. https://nbn-resolving.org/urn:nbn:de:101:1-201512026555.
https://nbn-resolving.org/urn:nbn:de:101...
; Bedorf e Röttgers 2010Bedorf, Thomas, e Kurt Röttgers. 2010. Das Politische und die Politik. Berlin: Suhrkamp.) e muitos outros (cf. Marchart 2010Marchart, Oliver. 2010. Die politische Differenz: zum Denken des Politischen bei Nancy, Lefort, Badiou, Laclau und Agamben. Berlin: Suhrkamp.; Reitz 2016Reitz, Tilman. 2016. Das zerstreute Gemeinwesen: politische Semantik im Zeitalter der Gesellschaft. Wiesbaden: Springer VS.), enfatizam o caráter antagonista de tudo que é político. De acordo com essa visão, mesmo lá onde as condições aparecem pacificadas e o consenso social temporário se desenvolve nas instituições, organizações e modos de ação, no fundo esse consenso é baseado somente em um esquecimento temporário ou na supressão da contingência fundamental do social, e esse esquecimento, por sua vez, se baseia no sucesso da dominação (injustificada) de um “projeto hegemônico” que conseguiu fazer com que os interesses particulares de um grupo, ou de uma coalizão de grupos, parecessem como bem comum ou como um dado natural, em detrimento dos excluídos ou desfavorecidos, a pondo de sugerir que a resistência parecesse inútil.

As condições amplamente pacificadas que geralmente encontramos não são diretamente antagonistas. No entanto, elas se baseiam na instância do antagonismo que, mesmo na sua ausência – como causa ausente – as faz “tremer”. E embora a instância fundadora possa ressurgir a qualquer momento, a guerra civil permanente não nos assola à nossa porta. (Marchart 2013Marchart, Oliver. 2013. Das unmögliche Objekt: eine postfundamentalistishe Theorie der Gesellschaft. Suhrkamp. Berlin: Suhrkamp., 448).

Nesse sentido, na medida em que as teorias críticas da política que se adscrevem a tal ontologia social assumem como sua tarefa orientar suas categorias e instrumentos com vistas a “registrar os conflitos e contingências que permeiam todas as instituições, organizações e ações” (Marchart 2013Marchart, Oliver. 2013. Das unmögliche Objekt: eine postfundamentalistishe Theorie der Gesellschaft. Suhrkamp. Berlin: Suhrkamp., 447), elas visam diretamente a uma politização despacificadora do social.

Neste artigo, não pretendo sugerir que tal concepção do político seria uma ameaça ao estado ou que ela minaria a paz social. Como gostaria de mostrar ainda, existem boas razões para ser cético com relação a essa paz. Em vez disso, o que pretendo aqui é caracterizar como repulsiva a forma da atitude perante o mundo, ou da relação com o mundo (cf. Rosa 2016bRosa, Hartmut. 2016b. Resonanz: eine Soziologie der Weltbeziehung. Berlin: Suhrkamp.) associada a essa concepção: se a disputa irreconciliável se torna a epítome do político, como sugere Jacques Rancière (2018Rancière, Jacques. 2018. Das Unvernehmen: Politik und Philosophie. Traduzido por Richard Steurer-Boulard. 7. ed. Frankfurt am Main: Suhrkamp.; cf. Laclau e Mouffe 2020Laclau, Ernesto, e Chantal Mouffe. 2020. Hegemonie und radikale Demokratie: zur Dekonstruktion des Marxismus. Traduzido por Michael Hintz e Gerd Vorwallner. 6. ed. Wien: Passagen Verlag.), então agir politicamente significa lutar com ardor, se impor, até mesmo tentar manipular os outros estrategicamente para alcançar a hegemonia e obter o domínio – um domínio que, por sua vez, irrevogavelmente excluirá os outros e se baseia em interesses particulares.

Mesmo quando isso não é formulado de forma tão clara, as concepções antagonistas baseiam o político constitutivamente na luta, mesmo quando apostam em uma forma “agonística”, ou seja, mais controlada de resolução de conflito, porque elas só conseguem conceber como única alternativa uma ontologia social harmonística, ou seja, um “modelo de consenso” do político, que teria que ser necessariamente antipluralista e “identitário” e que, portanto, só poderia conceber a diferença existencial última como um desvio. A pacificação da luta, segundo o pressuposto, só é possível se posições, formas de sujeito ou interesses divergentes forem estigmatizados como “doentios”, “irracionais”, “antinaturais”, e/ou se forem tornadas inconcebíveis através de naturalizações e de homogeneizações compulsivas.

Essa concepção do político, esse é o argumento que gostaria de desenvolver neste artigo, não tem somente um elevado preço teórico e social, mas também revela claramente consequências fatais quando ela priva os sujeitos da modernidade tardia da possibilidade de alcançarem uma relação ressonante com o mundo no modo do agir político e, com isso, de criar as condições básicas de uma vida bem-sucedida por meio da assimilação transformadora (Anverwandlung) responsiva das estruturas do mundo da vida compartilhado, e quando ela, em última análise, destrói as precondições para uma democracia real e viva e, no lugar dessa, proclama uma imagem distorcida de democracia como a forma ideal do político. O predomínio de concepções antagonistas do social é claramente corresponsável por uma realidade política em que se confrontam irreconciliavelmente e ao mesmo tempo ante “abismos intransponíveis” de um lado populistas autoritários e seus seguidores e, de outro, correntes liberais de esquerda. Por isto, eu gostaria de contrapor à abordagem antagonista uma ontologia social relacional, que pressupõe que os sujeitos políticos e os grupos sociais per se não se confrontam como antagonistas nem como harmonistas, mas que a natureza de suas relações é ela própria o resultado de um processo político.

Os sujeitos e aquilo que os confronta como mundo só se formam em um processo dinâmico de relação mútua, de forma que a própria forma da ontologia social, da realidade política, pertence àquilo que pode ser moldado politicamente – eles não precedem o processo sociopolítico. É a relação que produz os sujeitos e as instituições, ou ela é pelo menos co-original com eles. Isso obviamente inclui a possibilidade e mesmo a necessidade de questionar no debate político as assimetrias de poder e distorções (pós-coloniais, por exemplo) na constituição dos sujeitos e instituições empiricamente dados.

O ponto de partida de minhas considerações é a constatação de que as instituições, práticas e as estruturas que nutrem e moldam o modo de conduzir a vida, tais como os contextos de ação econômicos, jurídicos, técnicos, estéticos etc., sempre são o resultado da ação humana e, portanto, são sempre contingentes: elas realmente poderiam ser diferentes, e elas também estão mudando continuamente como resultado do processamento social. Em seu conjunto e em suas interações elas determinam as estruturas e contornos da forma de vida coletiva dentro da qual cada vida individual se realiza. De importância decisiva é, portanto, a questão de como essas estruturas e instituições coletivas se desenvolvem, se reproduzem e se modificam: elas se consolidam como consequências e efeitos colaterais não intencionais agregados de inúmeras ações individuais ou das estratégias econômicas, religiosas ou estéticas perseguidas por diferentes atores ou grupos de atores, ou elas são (também) o resultado de uma formatação consciente e coletiva? Esta última hipótese – a formatação consciente das estruturas e instituições da forma de vida compartilhada – é aquilo que pode ser definido como a differentia specifica do agir político: a política é, nessa concepção, o processo da influência intencional e formatadora de uma forma de vida sobre si mesma. Desse modo, é a modelagem e não o embate que se torna a forma elementar do agir político. Embates e conflitos serão certamente inevitáveis, mas, para a concepção daquilo que entendemos por política, faz uma brutal diferença constatar como um fato que a questão de como as estruturas do mundo da vida compartilhado devem ser constituídas e como deve ser a formatação da comunidade será sempre (também) controvertida, ou se for pressuposto que o embate pela imposição de seus interesses particulares seja o cerne do político.

No agir político, escreve Hannah Arendt (2020bArendt, Hannah. 2020b. Zwischen Vergangenheit und Zukunft. Übungen im politischen Denken / Hannah Arendt 1. 5. ed. München: Piper., 300), está em questão “como o mundo enquanto mundo […] deverá parecer e soar, como ele deverá poder ser apreciado e ouvido”. Essa é uma concepção bem distinta do político do que aquela que coloca no centro a luta contra os outros e pelo interesse próprio. A diferença está na forma como os cidadãos se relacionam, em primeiro lugar, uns com os outros e, em segundo lugar, com a comunidade que vai sendo criada e moldada no agir político. Nisso é totalmente plausível a convicção (dificilmente contestada hoje) de que também as formas e conteúdos do conhecimento e as formas da subjetividade em grande medida são produzidos por aquelas estruturas ou estão em uma relação constitutiva recíproca com elas. Sujeito e razão não podem, portanto, ser tomados simplesmente como instâncias corretivas ou como padrões normativos para a crítica e a formatação das estruturas do mundo da vida, porquanto, como as abordagens pós-estruturalistas e, sobretudo, as abordagens pós-coloniais mostraram, as concepções prevalecentes de razão e sujeito ainda parecem eurocentricamente distorcidas. Em um nível mais profundo, entretanto, pode-se certamente perguntar sobre o tipo, a forma e a qualidade da relação entre os indivíduos e as instituições do mundo compartilhado. A política, como gostaria de mostrar a seguir, torna-se assim um modo de relação com o mundo, e a tarefa de uma Teoria Crítica da Política consiste em encontrar padrões e critérios para testar essa qualidade.

Uma concepção do bem comum na perspectiva da teoria da ressonância

Basicamente e em todos os lugares as pessoas vivem em contextos institucionais que não criaram ou escolheram e que são o resultado de desenvolvimentos históricos anteriores. Elas nascem em uma forma de vida que as precede e, da qual elas nunca serão capazes de se desapegar completamente – se bem que podem manter uma distância crítica em relação a alguns de seus aspectos – precisamente porque sua linguagem, seu conhecimento e sua relação consigo mesmas, seu próprio ser e sentir emergem dessa forma de vida.3 3 Esse é o cerne do que Charles Taylor elaborou em seus escritos teóricos quando ele descreve o ser humano como “animal autointerpretante” (Taylor 1985; Dreyfus e Taylor 2015; Taylor 2005; Rosa 1998). Na perspectiva da sociologia das relações com o mundo, a relação interna do sujeito para com o mundo que ele assim encontra pode assumir três modos diferentes. Em primeiro lugar, suas estruturas podem ser experimentadas e aceitas absolutamente como sendo (naturalmente) dadas. Essa forma de relacionamento é o resultado da naturalização das relações sociais; ela ocorre, por exemplo, ali onde o “mercado” é postulado e entendido como a matriz básica da vida social, sem qualquer alternativa. O modo de relacionamento predominante é, então, o de indiferença. Em segundo lugar, as instituições coletivas também podem ser entendidas como o resultado imposto de uma dominação (externa) que restringe as próprias possibilidades de ação. Nesse caso, é possível, ou mesmo mandatório, combatê-las (e quem exerce a dominação). O modo dominante de relação com o mundo é, então, o de repulsão, de combate. O propósito das abordagens daquele tipo de teoria crítica da política abordada na introdução, que é baseada no antagonismo sócio-ontológico, geralmente, é o de mudar o modo social dominante de relacionamento da primeira para a segunda variante: as instituições e as estruturas deverão ser compreendidas como o resultado contingente de lutas passadas e de relações de dominação atuais e, portanto, se tornar objeto de uma nova luta. A indiferença deve ser convertida em repulsão. Minha objeção a essa abordagem é, em suma, que essa estratégia por si só não mudará o mundo para melhor, mas que ao invés disso ela é mais propensa a favorecer a alienação gerada pelas naturalizações neoliberais e a burguesia regressiva e raivosa que dela emerge. Ela gera raiva e indignação, mas por si só ela não libera energias criativas e esperanças produtivas. Porque a promessa básica da democracia moderna, da qual os cidadãos da modernidade tardia manifestamente se sentem cada vez mais ludibriados, não é a perspectiva de disputa, conflito e luta sem fim, senão que ela está baseada na ideia de que as estruturas do mundo da vida compartilhado podem ser formatadas e “assimiladas transformadamente” em coletivo (ainda que em um infindável e dinâmico processo). “Assimilação transformadora” representa simbolicamente um processo no qual a “voz própria”, o desejo subjetivo de modelagem, é incluída na formatação da comunidade, de modo que se desenvolva uma “relação de responsividade” qualificada entre os sujeitos e essas estruturas.

Essa relação responsiva, no entanto, deve ser pensada como transformadora em três lados: no processo do agir político não mudam apenas as instituições e as estruturas do mundo da vida, mas com e por meio delas, por sua vez, mudam também os próprios agentes – e nesse processo dinâmico eles não só ouvem e respondem as instâncias coletivas, mas também ouvem e respondem aos coformatadores políticos, que, como mostrarei em breve, entram em uma relação de ressonância entre si. Trata-se de uma relação responsiva que não só aceita a diferença fundamental, mas inclusive a pressupõe; não a compreende simplesmente como um campo de batalha, mas a assume como uma razão permanente para a transformação.

Parece-me óbvio que a tremenda atratividade que a ideia de democracia exerce na era modernidade – isto é, em uma época que não pode assumir que a ordem do mundo social é desejada por Deus e influenciada pelo espírito e, já por isso, estaria em uma ressonância “interna” para com as pessoas – esteja baseada justamente nesta mesma promessa: que deverá ser possível assimilar transformativamente o mundo em que vivemos (em toda a sua heterogeneidade) por meio da cooperação política de tal forma que a relação com ele não pareça simplesmente contingente e indiferente, nem simplesmente como repulsivo ou ameaçador, mas que ele pode ser experimentado como responsivo. Claro, como já indiquei, isso pressupõe não apenas uma certa qualidade da relação entre cidadãs e cidadãos, mas também a conceitualização do mundo compartilhado como uma comunidade. E é aí que começam os problemas conceituais que levaram a que concepções antagonistas da política pareçam hoje como sendo quase sem nenhuma alternativa na teoria social. Porque se o agir político for entendido como aquele agir (em conjunto) que toma como referência a questão da formatação “correta”, convincente ou legitimável da comunidade, então este agir não subsiste sem uma referência operacionalmente efetiva à ideia (reguladora) de um bem comum. Sem ela, uma cultura democrática e uma formatação democrática do mundo compartilhado não podem ser pensadas de forma consistente nem podem ser realizadas duradouramente. Ainda mais, sem ela, o agir político não pode ser distinguido conceitualmente de modo estrito da pura perseguição de interesses. Quem se engaja na política deve afirmar, pelo menos implicitamente, uma referência ao bem comum em seu agir; aquele que persegue (apenas) seus interesses justamente não precisa fazer isso.4 4 Sobre isso ver as reflexões nuançadas de Peter Graf Kielmansegg (2013). No fundo as teorias antagonistas do político também aceitam isso – provavelmente de modo mais claro nas concepções de teoria hegemônica de Laclau e Mouffe – quando apresentam a luta política como uma luta pela hegemonia na concepção de bem comum, embora para eles esse bem comum se torne um “significante vazio” e, com isso, em um instrumento puramente estratégico para a busca de interesses particulares.

A indispensabilidade da ideia do bem comum tem validade plena, independentemente da tripla imprecisão do que seria esse bem, de quem ele seria e de como se deveria compreender o respectivo comum, que faz parte constitutivamente deste conceito. Em vez disso, parece que o bem comum só pode servir como uma ideia reguladora do político precisamente porque permanece notoriamente vago, talvez também se possa dizer que permanece “essencialmente contestado” (Gallie 1956Gallie, W. B. 1956. Essentially contested concepts. Proceedings of the Aristotelian Society 56 (1): 167–98. https://doi.org/10.1093/aristotelian/56.1.167.
https://doi.org/10.1093/aristotelian/56....
). A função da ideia do bem comum para o processo da formatação política consiste em reivindicar e justificar a legitimidade: a dominação pode então reivindicar legitimidade se e somente se puder fornecer justificações boas e convincentes para servir ao bem comum – mesmo que a resposta a essa questão do que seriam boas razões permanecer historicamente variável. Mas a função da ideia do bem comum não se limita a providenciar legitimidade, mas consiste também em servir de ideia reguladora da forma de relação dos indivíduos com o mundo coletivamente compartilhado – com a comunidade – e com as concidadãs e os concidadãos. Com base nela, portanto, a questão básica do político não é: como podemos nos afirmar? Em vez disso a pergunta é: como deve ser constituída a comunidade em que vivemos?

Para quase todas as concepções atuais de teoria política, o princípio da democracia é absolutamente inevitável neste ponto: sem legitimidade democrática, a reivindicação de servir ao bem comum parece irrealizável, o que, no entanto, implica que em sua substância esse bem sempre só pode ser determinado processualmente, ou seja, politicamente.5 5 Por isso Ernst Fraenkel (1999) acertadamente cunhou o conceito de bem comum a posteriori, que só poderia ser reconhecido como resultado de disputas políticas e não como seu pressuposto (bem comum a priori). O que o bem comum poderia ser em cada caso só se revela momentânea e contextualmente e está no foco de disputas políticas contínuas. Minha tese, no entanto, é que o bem comum como forma de relação, ou seja, como forma de referência ao mundo compartilhado, talvez possa sim ser determinado aprioristicamente com os recursos da teoria da ressonância, ou seja, que ele possa ser determinado de uma forma que preceda conceitualmente o processo de disputa democrática. Embora eu esteja ciente de que este empreendimento deva parecer altamente questionável, levando-se em conta o transcurso da história das ideias políticas ao longo dos últimos cem anos e, acima de tudo, as desastrosas experiências de políticas concretas com determinações apriorísticas do bem comum, eu agora gostaria de tentar detalhar essa forma de relacionamento para, em seguida, verificar se ela será capaz de superar os ceticismos.

Portanto, minha tese é que a ideia do bem comum pode ser resgatada e defendida se ela for compreendida como uma forma determinada de relação social, temporal e espacial-material de uma comunidade política “para com o mundo”. De acordo com esta ideia, o bem comum é então perseguido e realizado ali onde uma forma de vida consegue estabelecer relações de ressonância, ou mais precisamente: eixos de ressonância,6 6 Para uma distinção entre relações de ressonância, esferas de ressonância e eixos de ressonância, ver Rosa (2016b, 331-40). primeiro entre seus membros, depois para com as instituições e práticas compartilhadas do mundo da vida coletivo e, finalmente, para com o passado e o futuro. Lá (e somente lá) a promessa da democracia é concretizada – na prática, como um processo. A dimensão social do bem comum nesse caso deve ser constituída de tal maneira que o bem-estar das minorias, daqueles que foram derrotados no debate democrático, sim, até mesmo daqueles que não “foram ouvidos” (Rancière), fique assegurado. Em termos temporais, o bem comum abarca necessariamente um horizonte histórico que vai além do presente situacional de uma decisão política tomada “no calor do embate”: implica levar em conta não apenas os interesses das gerações seguintes, futuras, mas, também, as obrigações e, além disso, as experiências que resultam da história, do passado de uma comunidade. Isso inclui especialmente a obrigação de ouvir e responder com sensibilidade às experiências de injustiça, injúrias e exclusões do passado. Por fim, a dimensão espacial não diz respeito apenas ao bem-estar de uma comunidade política abstrata, mas também à formatação de um território comum, à “transformação assimiladora” de um mundo material e institucionalmente compartilhado. O bem comum, portanto, sempre significa uma relação bem-sucedida com uma materialidade espacial politicamente formatada e historicamente desenvolvida – o que não exclui que este mundo a ser formatado também possa ser estendido até a esfera global. Nós nos defrontamos com esta última ideia, por exemplo, lá onde a proteção dos ursos polares, da floresta tropical ou da flora do fundo do mar é concebida como tarefa do bem comum.

A sugestão é, pois, que o bem comum seja compreendido como uma relação de ressonância tridimensional que só pode ser realizada no e por meio do processo democrático. O que isso pode significar em termos concretos?7 7 As reflexõs que seguem eu desenvolvi, em outra versão, em Rosa (2019). A questão em que poderia consistir ou através do que poderia ser estabelecido o “vínculo político” entre os membros de um mundo vivido institucionalmente compartilhado recentemente é colocada não apenas por pensadores de orientação comunitarista, republicana ou neo-durkheimiana. mas também e, especialmente, por autores de inspiração “pós-estruturalista” (cf. Caillé 2019Caillé, Alain. 2019. Extensions du domaine du don: demander, donner, recevoir, rendre: essai. Questions de société. Arles: Actes Sud.; Bedorf e Herrmann 2016). A resposta da teoria da ressonância a eles é que esse vínculo não é formado a partir de uma determinada substância – como valores compartilhados, costumes, tradições ou histórias – mas é formado por uma determinada relação das pessoas umas com as outras, e essa relação, em sua forma mais simples, pode ser descrita como uma relação de escuta e resposta. Ouvir e responder formam os polos alternados de uma relação de ressonância. Tal relacionamento é caracterizado por quatro atributos constitutivos. Primeiro, a vontade e a capacidade de ser afetado e tocado pelas vozes dos outros (ou por outras vozes). Eu chamo isso de característica da afecção. Ela significa: a primeira condição de uma relação de ressonância democrática é que os cidadãos e cidadãs se encontrem com o pressuposto básico e a atitude básica de que os outros (potencialmente) têm algo a dizer a eles e elas. Essa condição é minada, por exemplo, quando atores políticos se percebem reciprocamente como racistas e fascistas ou como traidores e ameaçadores da moral, dos quais julgam que eles não têm nada a dizer; e onde, em vez disso, procuram destruí-los aos berros ou tentam silenciá-los.

Em segundo lugar, o vínculo assim entendido não se esgota em pura receptividade, mas ele se constitui inteiramente na/pela experiência de que cada um e cada uma também é capaz de tornar sua própria voz audível e de contribuir com ela. Eu chamo essa característica de autoeficácia. Nela reside a promessa básica da democracia: que cada um recebe uma voz/um voto8 8 N.T. Stimme, no original, é ao mesmo tempo voz e voto. No que segue, o autor joga com essa polissemia. que ele ou ela não entrega simplesmente (no dia da eleição), mas que a inclui no processo de formatação democrática de uma maneira responsiva, ativa e reativa. Parece-me um absurdo, em termos de teoria da democracia, contabilizar esta inclusão da voz na forma de voto como um custo que recai sobre o indivíduo na tentativa de perseguir seus interesses e maximizar seus benefícios, como fazem aquelas teorias de escolha racional (ou da escolha pública – public choice), que depois se surpreendem que as pessoas ainda assim vão votar.9 9 Referência para essa perspectiva segue sendo Downs (1957; cf. Love 2006). A inclusão da voz dá aos cidadãos e às cidadãs uma experiência de autoeficácia política que não pode ser substituída por nada: por meio do seu voto e sua voz, eles e elas se conectam com os outros e com a comunidade, e participam da formatação coletiva do mundo. A voz/o voto não é simplesmente um meio (muito limitado) pelo qual podemos alcançar algo no sentido de afirmar nossos próprios interesses, mas um instrumento (inclusive em um sentido musical (cf. Love 2006Love, Nancy Sue. 2006. Musical democracy. Albany: State University of New York Press.)) com o qual podemos alcançar os outros e estabelecer uma relação com eles. A segunda condição de uma relação democrática de ressonância (e, portanto, para a realização formal do bem comum na dimensão social) é que o processo político deve estar organizado de tal modo que ele permita e possibilite para todos os membros da comunidade essa experiência qualificada de autoeficácia.

Além disso, como uma terceira característica – e este ponto me parece de importância crucial –, a consequência de tal entrar-em-relação ressonante é a inevitável transformação das vozes participantes. Ressonância significa permitir que uma ou mais outras “chamem” ou toquem de tal forma que ao responder e reagir a gente transforme a si própria. Desse modo, a ressonância torna-se um processo dialógico de “assimilação transformadora” recíproca no qual os participantes não permanecem quem e como eram. Essa sempre foi uma visão básica e central do pensamento político republicano: (cf. Sullivan 1986Sullivan, William M. 1986. Reconstructing public philosophy. Berkeley: Univ. of Calif. Press.; Sunstein 1995Sunstein, Cass R. 1995. Democracy and shifting preferences. In The idea of democracy, organizado por David Copp, Jean Hampton e John E. Roemer, 196–230. Cambridge: Cambridge University Press.; Pocock 2016Pocock, J. G. A. 2016. The Machiavellian moment: Florentine political thought and the Atlantic Republican tradition. Princeton: Princeton University Press.; Laborde e Maynor 2008). O bem comum não pressupõe que os cidadãos compartilhem certos valores ou objetivos já desde sempre, mas baseia-se no fato de que eles se envolvem uns com os outros de tal modo que eles sejam capazes de se transformar em direção a algo comum (ou de um projeto formatador compartilhado). Que esse comum também inclua disputa e conflito, que até seja baseado neles e possa surgir deles, é inquestionável e inevitável. Portanto, é uma compreensão completamente equivocada do conceito de ressonância compreender ele simplesmente como consonância ou harmonia. Na verdade, ressonância pressupõe conceitualmente a diferença e, portanto, também a dissonância, pois somente por meio dela se torna possível o encontro com um genuinamente Outro, se torna possível o movimento político e a transformação do Si-próprio. Inversamente, porém, é um mal-entendido igualmente grande (que ocorre aos partidários do antagonismo sócio-ontológico) ver já na disputa, na dissonância e no conflito a essência e o cerne do político.

A ressonância, portanto, move-se constitutivamente entre a identidade e a diferença, entre a consonância e a dissonância; a ressonância supera os abismos entre elas em um processo de transformação, que não resulta em fusão e unidade, mas apenas em um contato temporário. O fato que ninguém precisa ficar do jeito que é e que somente na transformação reside a experiência da vitalidade formam a base para a transição de uma ontologia social antagonista para uma centrada na ressonância. Por isso, o terceiro pressuposto do bem comum assim concebido é a capacidade substancial e a vontade da comunidade e de seus membros para se transformarem. Por meio dela, segundo a formulação de Karl Marx, é possível levar “as relações petrificadas a dançar” (2006, 381). Ela é subvertida quando as estruturas dessa comunidade congelam ou são petrificadas por meio de definições substanciais apriorísticas alienadas do processo político ou por meio de “restrições objetivas” socialmente geradas e naturalizadas.

A quarta característica central de uma relação de ressonância é sua indisponibilidade por definição. Isso significa que as relações de ressonância não podem ser forçadas nem garantidas institucional ou instrumentalmente. Mais que isso: que o resultado dos processos de ressonância nunca pode ser previsto, controlado ou calculado com antecedência. As relações de ressonância são o lugar da “natalidade” no sentido de Hannah Arendt, o local de nascimento do novo, que permite a uma comunidade política e a seus membros que interrompam cadeias desastrosas de interação para continuá-las de uma maneira diferente (Arendt 2019Arendt, Hannah. 2019. Vita activa oder Vom tätigen Leben. 20. ed. München: Piper.). Para o presente contexto, isso também significa que não há possibilidade de assegurar institucionalmente a ressonância democrática, que, portanto, é impossível criar garantias constitucionais, procedimentais ou de outra natureza de que o processo político ocorrerá em modo de ressonância. Rigidez, alienação, instrumentalização e reificação, de um lado, e pura luta e repulsa antagônica, do outro, como modos alternativos de relações políticas, sempre permanecem como uma possibilidade e um perigo. Porém, para desgosto dos governantes autoritários e totalitários, indisponibilidade também significa, inversamente, que não há como suprimir ou evitar com segurança a ocorrência de ressonâncias políticas no sentido democrático-transformador delineado acima. De pequenas e intersubjetivas ressonâncias a qualquer momento pode surgir um novo movimento político.

No entanto, a indisponibilidade não significa que não seja possível criar por meios políticos, jurídicos e organizacionais os pré-requisitos disposicionais e institucionais para a possibilidade de relações de ressonância. A tarefa das instituições constitucional-jurídicas e constitucional-políticas e da organização da participação e representação democráticas consiste então em, ao mesmo tempo, criar e proteger os canais de relacionamento ou os eixos de ressonância ao longo dos quais podem desenvolver-se relações de ressonância vivas mesmo entre grupos que (ainda) se defrontam de forma antagonista. A indisponibilidade como característica central da ressonância também implica que a qualidade da democracia e a qualidade do bem comum jamais podem ser medidas ou determinadas através de critérios de resultado (output) predefinidos. O resultado dos processos de ressonância é, em sua essência, necessariamente aberto.

Se for plausível conceber o conceito de bem comum através da ideia da ressonância inicialmente como uma forma determinada de relação entre os cidadãos e as cidadãs, então esse ensaio ganha em atratividade justamente porque essa forma de relação e suas quatro características agora também podem ser aplicadas à relação com o passado e com o futuro da comunidade. Em perspectiva temporal, o bem comum realiza-se então ali e onde surgir uma relação de ressonância tanto com a história como com o futuro. No que diz respeito à história, isto significa: o bem comum implica – e o sucesso do processo democrático em que ele é realizado pressupõe – que a história da comunidade “diga respeito” e “tenha algo a dizer” aos cidadãos e às cidadãs, que eles e elas estejam para com ela em em uma relação responsiva (possivelmente complexa e contraditória em si mesma). Todos os quatro princípios de uma relação de ressonância estão envolvidos nisso: o acontecer histórico toca ou afeta aqueles que vivem hoje; eles não podem simplesmente ser indiferentes a ele. Isso não é necessariamente uma afecção agradável ou positiva. Se, por exemplo, no local de um massacre colonial, as pessoas experimentam uma obrigação existencial decorrente da reemergente memória do passado, elas reagem à circunstância com uma atitude de resposta transformadora que afeta também o seu ser presente e suas ações futuras, mesmo que elas (como consequência da indisponibilidade fundamental de ressonâncias) não sejam capazes de declarar exatamente qual obrigação surgirá disso para elas. Tal ressonância cria uma conexão, ou melhor: um eixo de ressonância entre o passado e o futuro. Contradição e disputa são formas importantes e indispensáveis de tal ato de responder – sem contradição, e isso se aplica também aqui, transformação e encontro não são possíveis; sem resistência de um outro não há experiências de ressonância.

Quem se sente conectado de forma viva e responsiva não só com gerações do passado, mas também com as gerações futuras, percebe a relevância de suas ações para aquelas e aqueles que o seguirão por assim dizer imediatamente, ou seja: afetiva e fisicamente. Ao fazer isso, levar em consideração necessidades e interesses futuros perde o caráter de uma tarefa árdua ou de custos redutores de utilidade. Em vez disso, essa atitude produz a experiência de autoeficácia viável e transformadora. Portanto, em minha opinião, é perfeitamente possível “mensurar” a qualidade de uma democracia pela constituição da conexão trans-histórica: o bem comum tende a ser realizado ali onde um eixo de ressonância pulsante conecta o passado e o futuro, uma conexão que não determina o agir atual, mas o inspira e motiva de forma aberta à transformação.

Se o par conceitual de bem comum e democracia for reconstruído desta maneira como uma relação multidimensional de ressonância, um dos problemas básicos daquela ideia, no entanto, permanece: por onde transcorrem os limites da comunidade, cujo bem-estar está em questão, como ela se relaciona com seu exterior social ou material? Minha tese aqui é que uma comunidade não pode ser injusta, violenta, repressiva ou destrutiva externamente se ela internamente quiser permanecer capaz de ressonância. Se o bem comum for determinado pelo conceito de ressonância, então ressonância denota uma relação com o mundo como um todo, uma forma de estar-no-mundo. Repressão, violência e opressão, ao contrário, forçam não apenas as vítimas, mas também e especialmente os perpetradores a um modo reificante e repulsivo de relação com o mundo, em que é necessário suprimir disposicionalmente as relações de ressonância em si mesmo, além de si e com os outros, e erradicar “impiedosamente” impulsos empáticos correspondentes; elas impõem uma relação com o mundo em que a escuta transformadora do diferente e do Outro é sistematicamente dificultada ou tornada impossível, ao passo que promovem ou forçam sistematicamente a amplificação em forma de eco daquilo que é sempre o mesmo.

Curiosamente, isso também se aplica à relação com a natureza: quem trata o meio ambiente material (e ainda mais o ambiente vivo) unicamente como um recurso a ser extraído e processado, a ser usado e modelado instrumentalmente, não consegue experimentá-lo como uma esfera de ressonância, como um outro vivo que está em um inter-relacionamento constante e responsivo conosco, os seres humanos. O inverso também é verdadeiro: quem vive em uma relação de ressonância estável com a natureza (independentemente de como se queira entendê-la e conceitualizá-la) não precisa se forçar a conservá-la ou cultivá-la de forma sustentável; ele fará isso por si só, por assim dizer, para não tornar inaudível a voz daquele outro e precisamente dessa maneira perder sua própria voz. Nesse sentido, uma relação de ressonância sempre contém um elemento ético-protetivo: ela é essencialmente dependente e orientada para proteger e preservar a voz e a singularidade do outro.

Se o bem comum democrático for concebido desta forma, como o estabelecimento de eixos de ressonância em termos sociais (como forma de relação entre as pessoas), em termos materiais (como forma de relação com o mundo da vida compartilhado) e em termos verticais ou existenciais (como forma de relação com o mundo, a história, a natureza ou a vida como totalidades abrangentes), então o bem comum e o senso comum se revelam efetivamente como pré-requisitos complementares e responsivos, e como os elementos centrais de uma democracia bem-sucedida: senso comum denota então a capacidade e a vontade dos cidadãos e cidadãs de estabelecer relações ressoantes. O bem comum, por sua vez, se realiza ali onde as relações sociais e materiais, temporais e espaciais permitem o estabelecimento e a manutenção de eixos sociais, materiais e verticais de ressonância.

Uma Teoria Crítica das relações políticas da modernidade tardia com o mundo

Se seguirmos a concepção aqui desenvolvida de política como a formatação coletiva da comunidade e como um modo institucionalizado e disposicional das relações mundiais, então resultam três consequências decisivas para a determinação de quais são as tarefas e os limites de uma Teoria Crítica da Política. Em primeiro lugar, é óbvio que não se trata de criticar instituições, processos ou fenômenos políticos individuais, e também não de conceber a política como um (sub) sistema especial da ordem social, mas – inteiramente no sentido da Teoria Crítica mais antiga, tal como formulada e defendida por Horkheimer e Adorno – a relação de uma sociedade como um todo com o mundo, como a totalidade de todas as instituições e práticas, deve se constituir no objeto de tal teoria. Ela está preocupada com a questão de como a relação de uma formação social dada – e por enquanto isso significa: a formação social da modernidade – está constituída para com os humanos, o ambiente natural, o tempo e o espaço, e de que espécie são as relações das pessoas que nela vivem umas com as outras, ou seja, sinteticamente: quais relações com o mundo essa formação social estabelece. Na verdade, a Teoria Crítica sempre tratou da crítica das relações e, embora tenha se concentrado principalmente na dimensão social, na forma de relações de produção, de troca, de comunicação ou de reconhecimento, para autores como Adorno, Marcuse, Benjamin ou Fromm sempre estava em questão a relação com o mundo como uma forma de existência em sua totalidade.10 10 Mais detalhes a esse respeito se encontra em meu livro Ressonância (Rosa 2016b, cap. X.3). Além disso eu tento mostrar ali que no pensamento desses autores (assim como também no de representantes mais recentes da Teoria Crítica, como Axel Honneth e Jürgen Habermas) e, com isso, na linhagem da tradição da Teoria Crítica como um todo, havia elementos embrionários de uma teoria da ressonância, mas que eles não foram desenvolvidos. Nesse sentido, toda Teoria Crítica abrangente é sempre (também) uma Teoria Crítica da Política; e minha sugestão é que seu objetivo principal deveria consistir em uma crítica das relações de ressonância.

O político, esta é a tese central deste artigo, descreve um modo de relacionamento com o mundo porque descreve a forma como uma comunidade se relaciona com o mundo em todas as suas dimensões. Mas este modo é digno de crítica quando e onde uma sociedade ou comunidade política não consegue estabelecer e estabilizar eixos sociais de ressonância (entre os cidadãos), eixos materiais de ressonância (para com o mundo natural e material) e eixos existenciais de ressonância (para com o todo da vida, da natureza, do mundo ou da história), de modo que as instituições e estruturas do mundo da vida compartilhado possam ser experimentadas e formatadas em conjunto como passíveis de “assimilação transformadora”. As relações com o mundo empiricamente observáveis se revelam então como indiferentes ou repulsivas: em seu agir, os atores encontram as coisas meramente como resistentes, como passíveis de utilização ou de acumulação, mas ao mesmo tempo também como “mudas”. Percebem a história como um fardo, o futuro como fechado, a natureza como ameaça ou resistência, os concidadãos como competidores ou antagonistas e o mundo político como distante e subtraído de sua influência modeladora. Do meu ponto de vista, é possível diagnosticar atualmente de forma empírica uma dessas crises de alienação generalizada e em rápido agravamento: o declínio dos partidos estabelecidos e a perda de legitimidade do establishment político, que pode ser observado em todos os países do assim chamado Ocidente democrático e, mais além, nas novas democracias, vem acompanhada da queixa em voz alta de que a política e os políticos se tornaram “irresponsivos”. Na verdade, existem aqui ao mesmo tempo duas formas de percepção de perda de autoeficácia e, com isso, de perda de ressonância. Por um lado, muitas cidadãs e cidadãos têm a impressão de que as elites e as instituições por elas controladas se desvincularam há tempos e radicalmente delas, elas não são mais percebidas, não mais são vistas nem ouvidas; elites e instituições só se preocupam consigo mesmas. Por isso essas pessoas não querem mais ouvir nada dos atores políticos. Nessa percepção, a conexão de ressonância estabelecidas entre os cidadãos e as elites foi por assim dizer rompida, os dois lados não conseguem mais se conectar e há carência de experiência de autoeficácia democrática. Por outro lado, essa carência é reforçada pela percepção complementar de que o problema não são (apenas) as políticas e os políticos, mas que a política como um todo não consegue mais modelar as relações com o mundo, não consegue mais mover nada, que o modo de formatação política ao mesmo tempo se esgotou porque – essa é a percepção – na verdade “a economia”, “Wall Street”, “a mídia” ou os burocratas em Bruxelas, Washington, São Paulo ou em qualquer outro lugar são os que têm a palavra final ou porque os incontroláveis avanços no desenvolvimento técnico determinam cada vez mais as estruturas e os constrangimentos de nossa vida, que estão, por assim dizer, no piloto automático. Ambas as percepções embocam na convicção, ou talvez até: na experiência, de que o mundo compartilhado, as estruturas da comunidade não podem mais ser alcançadas democraticamente. Populistas de direita de todos os tipos respondem a isso: de Trump nos EUA a Bolsonaro no Brasil e a Lega Nord na Itália até a Aliança pela Alemanha (AfD) na Alemanha. Esses movimentos políticos se alimentam do protesto contra aquela experiência de alienação e do anseio por ressonância no sentido da reivindicação de ser ouvido e de se sentir politicamente eficaz. Não por acaso os discursos da campanha eleitoral de Trump culminaram na promessa (muito efetivamente encenada): “I am your voice!”,11 11 Assim por exemplo na sua famosa: Acceptance Speech at the 2016 Republican National Convention. acessado em 5 jul. 2018. https://www.youtube.com/watch?v=pWcez2OwT9s. e que, segundo a convicção do cientista político Tim Haughton, da Universidade de Birmingham, a campanha do Brexit foi exitosa, principalmente, devido a seu slogan “Take back control”.12 12 “The reason why the United Kingdom voted to leave the European Union can be expressed in three words: “Take back control”. É assim que se inicia a contribuição de Haughtons (It's the slogan, stupid: the Brexit referendum, acessado em 5 jul. 2018. http://www.birmingham.ac.uk/research/perspective/eu-ref-haughton.aspx. O povo britânico, segundo a promessa, deveria tornar-se novamente o sujeito do agir e da formatação políticos em relação à abstrata e inacessível burocracia de Bruxelas. Nós os ouvimos, nós os vemos, nós devolveremos a vocês uma voz e, com isso, a autoeficácia, esse é o cerne da mensagem do populismo de direita, que dificilmente pode ser entendida como outra coisa senão uma promessa de ressonância.

Essa promessa é então quebrada em todos os quatro momentos de ressonância pela estratégia de resposta proposta (cf. Rosa 2016aRosa, Hartmut. 2016a. Der Versuch einer sklerotischen Gesellschaft, sich die Welt vom Leibe zu halten – und ein Vorschlag zum Neuanfang. In Pegida - Rechtspopulismus zwischen Fremdenangst und “Wende”-Enttäuschung? Analysen im Überblick, organizado por Karl-Siegbert Rehberg, Franziska Kunz e Tino Schlinzig, 289–96. Bielefeld: Transcript.): a política associada tenta, em primeiro lugar, excluir tudo o que é não idêntico e, em segundo lugar, justamente com isso torna inaudível a respectiva voz própria dos sujeitos; em terceiro lugar, ela tenta evitar a transformação social “congelando” a situação dada e, em quarto lugar, impedir a indisponibilidade social através de políticas radicais de ordem. Em particular, os partidos com identidade nacionalista e seus líderes preocupam-se em silenciar todas as outras vozes. Quem não é assim como o imaginário sentimento popular espera não pertence ao grupo e deve calar-se ou desaparecer. Os judeus ou indígenas, os negros, os muçulmanos, os transexuais, os migrantes, os comunistas ou marxistas etc., todos eles, segundo essa visão, não têm direito a “estar aqui”, não pertencem “ao nosso povo” e, justamente por isso, não devem ser ouvidos. Ali onde o Outro é percebido fundamentalmente como perturbador ou hostil, ali vigora repulsão disposicional, que é diametralmente o oposto de uma orientação para a ressonância.

O que se expressa nessa atitude é uma relação petrificada para com o mundo, que se fecha sistematicamente ante a possibilidade de um contato transformador. Ali onde as pessoas percebem o mundo que as rodeia e que vem a seu encontro como uma zona de batalha, que na melhor das hipóteses é indiferente a elas, mas geralmente as confronta como hostil, e no qual elas sempre já e somente ocuparam posições precárias, aquilo que é vivo, estranho, desconhecido, aquilo que pode enfrentá-las parece a elas como perigo e ameaça. Efetivamente, nas condições de uma sociedade globalizada e “neoliberal”, essas pessoas já tiveram muitas vezes a experiência muito real de que ser tocado significa ser lesado e que a mudança está ligada ao declínio e descenso social (cf. Nachtwey 2016Nachtwey, Oliver. 2016. Die Abstiegsgesellschaft: über das Aufbegehren in der regressiven Moderne. Berlin: Suhrkamp.). Uma relação com o mundo caracterizada desta maneira pode realmente ser definida com o conceito de alienação. Ela se caracteriza pelo medo do encontro tocante com o outro (e, com isso, em última análise: com “o mundo”) e ao mesmo tempo está baseada em uma grave carência de experiências de autoeficácia que permitiria se envolver com um estranho (seja um ser humano, uma ideia, uma prática ou uma manifestação arquitetônica, como por exemplo na forma de um templo distinto) para se envolver em uma discussão aberta e ativa ou até mesmo para assimilar transformadoramente este estranho de uma forma autotransformadora.

Uma relação deste tipo com o mundo é precária e repulsiva; onde ela domina, os sujeitos se sentem colocados como não ouvidos, invisíveis, isolados e sem voz em um ambiente indiferente ou mesmo ameaçador, situação na qual é importante manter este mundo o máximo possível e literalmente longe do corpo (cf. Thadden 2018Thadden, Elisabeth von. 2018. Die berührungslose Gesellschaft. München: C. H. Beck.). Quanto mais decepcionadas e deprimidas, mais alienadas as pessoas forem, pode-se observar, tanto mais radical se torna a necessidade de uma estratégia de blindagem, do recuar-se e de cercar-se atrás de muros. O mundo percebido como ameaçador deve ser mantido a distância, as relações com ele que sejam indisponíveis, ou seja, que não podem ser controladas e governadas a priori, devem ser rompidas.

É precisamente essa relação com o mundo que encontra sua superfície de projeção ideal na atual crise de refugiados na Europa e na América do Norte. A figura do refugiado surge como a razão da própria alienação do mundo. Os estranhos e suas peculiaridades devem ser mantidos afastados com muros e cercas e, se necessário, com minas e rifles, e assim as imagens que atualmente dominam a reportagem política são as dos muros de fronteira reforçados com arame farpado, cercas e forças de segurança ou da ameaça de guerra literal ou comercial. Nelas surge a necessidade de excluir o mundo que se aproxima, o Outro vivo e incontrolável, manter longe de seu corpo, mesmo que seja pela força das armas.

Uma comunidade política na qual tal atitude em relação ao mundo se torna dominante está ameaçada por uma incapacidade constitutiva de ressoar. Quem quer silenciar tudo o que é não idêntico não ouve nenhuma outra voz à qual possa responder e pela qual possa deixar-se ser afetado e transformado. Ela torna a si própria incapaz de ressonância. A consequência lógica disso é que, paradoxalmente, a própria voz não pode mais ser percebida e articulada. Porque a própria voz só pode ser ouvida, desenvolvida e desdobrada se e na medida em que entra em diálogo com outras pessoas e com outros objetos. O populismo de direita, no entanto, promete (ou almeja) que o indivíduo se funda em uma “totalidade povo” homogênea, na qual a voz do povo aparece como uma voz identitária, indiferenciada, que se expressa nas declarações do movimento ou do líder como uma voz. No lugar de uma relação de ressonância entre duas ou mais vozes individuais, cada uma com seu próprio timbre, há uma relação oca de eco: de todos os lugares a voz deve soar igual, o mesmo deve retornar ecoante, muitas vezes amplificado. É significativo que Trump não tenha dito: farei sua voz ser ouvida, mas eu sou sua voz – no singular. Os movimentos populistas do século 21 vivem dessa visão de uma fusão ruidosa em harmonia, que se propõe a substituir a petrificação silenciosa. O preço para tanto é alto: ele não consiste apenas em excluir todo o outro e o desviante, silenciar ou mesmo destruí-lo, e justamente por isso não permitir experimentar nenhuma autoeficácia, mas, em terceiro lugar, consiste também em excluir toda mudança e desenvolvimento, toda dinâmica e, ao fim e ao cabo: excluir todo encontro vivo e, com isso, a própria vida. A resposta populista de direita ao problema de alienação da modernidade capitalista tardia é expressão não de uma relação ressonante, mas profundamente repulsiva com o mundo; ela não é capaz de promover o bem comum democrático em qualquer sentido.

Meu diagnóstico crítico de época é, em primeiro lugar, que a modernidade tardia é caracterizada por um enorme défice de ressonância política e, em segundo lugar, que o caminho do populismo de direita é completamente inadequado para superá-lo. Essa inadequação se deve, não por último, ao fato de que a causa da crise de ressonância é determinada de modo completamente errôneo se simplesmente os estranhos e “outros” (marxistas, povos indígenas, membros LGTBQ+) forem responsabilizados pela alienação. Mas onde está enraizado o crescente sentimento desesperador e paralisante de muitos cidadãos e cidadãs de que seu mundo não pode ser formatado politicamente, de que eles não têm voz efetiva, de que o futuro está fechado para eles, de que as instituições da vida cotidiana são uma zona hostil de batalha e que o mundo emergente é um ameaça, contra a qual se devem proteger com tarifas aduaneiras e cercas, quando não com muros e armas? Em suma, essa impressão mobiliza pelo fato de que parece estar correta. Nas condições prevalecentes, o mundo e o futuro dificilmente podem ser formatados politicamente; eles estão petrificados e não são responsivos, porque os imperativos que mudam o mundo da vida em grande e pequena escala, isto é, institucional e individualmente – as compulsões de expansão que resultam do modo formativo de reprodução capitalista de estabilização dinâmica – são de natureza estrutural e sistêmica. É a compulsão de constantemente aumentar, otimizar e racionalizar nas cadeias de meios fins, que se manifesta igualmente na apropriação econômica de matérias-primas e de funções corporais, de grupos populacionais e de áreas de vida, bem como na coação política de aposentados e crianças, de desempregados e pessoas engajadas solidariamente, assim como na incansável aceleração de tecnologias, de mudanças sociais e da velocidade da vida (cf. Rosa, Dörre e Lessenich 2017). A realidade política e cultural da modernidade tardia se caracteriza pela compulsão na escalada de expansão, por um lado, e pela estagnação institucional e estrutural, por outro, porque todas as energias mobilizadas não servem à mudança, mas apenas para manter o status quo institucional. Esta circunstância de “paralisação frenética” se reflete na realidade de vida dos indivíduos no fato de que eles têm que correr mais rápido a cada ano para manter seu lugar na sociedade e, portanto, em seu mundo. Porque a lógica desse imperativo de expansão, em última análise, domina todas as áreas da sociedade e grupos populacionais (embora de maneiras diferentes: as elites culturais e econômicas geralmente a internalizaram e habitualizaram, enquanto os trabalhadores dependentes e precarizados muitas vezes são confrontados com ela na forma pressão institucional externa de otimização e de ameaças de exclusão, ao passo que nas pessoas completamente excluídas ela se reflete na luta pela sobrevivência) e porque nem partidos democráticos de esquerda, nem populistas de direita ou de orientação ecológica têm uma proposta plausível para neutralizá-la, o mundo da vida compartilhado da comunidade política realmente se revela como não responsiva e a ação política como autoineficaz. Os atos de aparente autoempoderamento, que se refletem, por exemplo, em ações de guerra, na dura repressão policial, em aumentos de impostos ou multas, afetam essa lógica no máximo perifericamente, mesmo que possam ter consequências de vida ou morte para os afetados. Se, portanto, o agir político significa a assimilação transformadora modeladora do mundo em um modo de relação ressonante com o mundo, então a política genuína atualmente não está mais acontecendo, então a presente crise de alienação repousa sobre uma dramática perda do mundo no sentido de Hannah Arendt,13 13 Ver a esse respeito o texto detalhado e instrutivo de Paul Sörensen (2016). porque a lógica estrutural da comunidade está, por assim dizer, “surda” para toda invocação política.

Se a relação de ressonância entre as pessoas e a comunidade estiver perturbada de forma tão fundamental, então também o eixo de ressonância para o futuro e o passado se revela como “surdo”: o futuro aparece como o retorno desolado do sempre mesmo, sob presságios, cada vez mais sombrios. O fato de que continuará indefinidamente assim, ao mesmo tempo em que cada vez maiores energias materiais, culturais, políticas e psicológicas necessitam ser investidas na manutenção do jogo da expansão e da competitividade, se parece ao cenário apocalíptico, porque o espaço para a formatação construtiva (ou ressonante) em todas essas dimensões parece se tornar cada vez menor. A percepção existencial resultante daí tornou-se entrementes tão claustrofóbica que o apocalipse do colapso disruptivo parece ser o mal menor. Talvez isso explique por que as pessoas aparentemente estão cada vez mais dispostas a embarcar em experimentos políticos que parecem insanos e descaminhos irracionais à la Trump, Bolsonaro ou Brexit.

O estreitamento dos espaços no jogo político também determina a forma dominante da relação social com a natureza. Este é também um grande problema (de alienação) para a formação social da modernidade, porque ela própria fez da natureza uma de suas esferas centrais de ressonância (cf. Rosa 2016bRosa, Hartmut. 2016b. Resonanz: eine Soziologie der Weltbeziehung. Berlin: Suhrkamp., 453–71). Precisamente porque seres humanos modernos podem transformar a noite em dia, regulando a temperatura e a luminosidade do ambiente, subtraindo gradativamente a oferta de comida das influências diárias, sazonais e climáticas e regulando também em grande parte a vida social independentemente dos ciclos naturais locais específicos, eles podem conceber a natureza como uma contraparte ressonante que deve ser ouvida. Para a formação social moderna, a “natureza” tornou-se uma contraparte que nunca está inteiramente disponível, que fala com sua própria voz e “tem algo a nos dizer”, e que se tornou talvez a esfera de ressonância mais importante. Os imperativos de expansão da estabilização dinâmica, entretanto, institucionalizaram nas esferas centrais de adaptação técnica, econômica e científica da natureza o modo “mudo” da reificação constitutiva de relação com o mundo. A natureza aparece aqui de duas maneiras como aquilo que deve ser disponibilizado: como explorável e para sustentar os imperativos de crescimento e aceleração, mas também como um recurso a ser apropriado para a recuperação psicofísica e como um objeto de formatação. A tentativa cultural hegemônica de solucionar o dilema resultante consiste em aceitar o modo de reificação dominante para as esferas sociais centrais – nas indústrias extrativistas, nos lixões, na criação industrializada de animais, na pesca, na experimentação com animal etc. – e compensá-la com a permanência transitória em “oásis puros de ressonância”, que é como a floresta, o local de férias nas montanhas ou à beira-mar, a viagem pelo deserto, o planetário ou o pequeno jardim são concebidos. A consequência disso, no entanto, é que a relação com o mundo natural como um todo ameaça se tornar “muda”, porque em ambos os modos de relacionamento as condições de ressonância são minadas: no modo de reificação dominante, a afeição está sistematicamente ausente, enquanto no “oásis de ressonância”, que transforma a natureza apenas em um pano de fundo, há carência de autoeficácia genuína. A praia e o local de férias são caracterizados justamente pelo fato de que neles o mundo não pode ser modelado, a menos que se seja pescador ou hoteleiro e, em sendo assim, opere por sua vez no modo da reificação.

Essa experiência de uma perda fundamental e ao mesmo tempo existencial de ressonância em relação ao “mundo” ou à comunidade como um todo se transfere então fatidicamente também para a atitude disposicional na dimensão social ou horizontal da relação com o mundo e, com isso, para os eventos políticos em um sentido mais estrito. As vozes tidas como outras na sociedade – independentemente de se tratar de oponentes de classe, grupos religiosos, partidos políticos ou de diferenças étnicas – aparecem como os oponentes contra os quais é preciso se impor, para defender seus interesses, direitos e reivindicações normativas. O agir democrático é entendido como um evento de luta, não no sentido de se aproximar do outro e encontrar algo comum através de uma transformação recíproca, mas no sentido de uma diferenciação antagonista amigo/inimigo, de modo que não se quer dar ouvidos a nada quando os inimigos do povo, os corruptores dos jovens e os traidores da pátria, ou os fascistas, racistas e sexistas, disserem “qualquer coisa”, e que se trata de se afirmar e conquistar a hegemonia. Essa realidade corresponde, de fato, às ontologias sociais antagonistas discutidas no início, de modo que essas teorias e essas práticas se reforçam e se confirmam mutuamente em uma espécie de loop de feedback,14 14 Sobre a figura de um círculo normativo entre teoria política e práxis política ver meu texto Identität und kulturelle Praxis (Rosa 1998, 258). mas ela é uma realidade gerada politicamente e não uma necessidade ontológica; ela surge de um determinado modo de relacionamento político com o mundo, a saber, o modo repulsivo. Nesse modo, luta política significa fazer com que o seu próprio lado seja ouvido tanto quanto possível, que seja disponibilizado o máximo possível do que estiver em disputa ao deslegitimar as reivindicações de outros ou ao torná-las inaudíveis. A autoeficácia almejada aqui é a do modo de (máxima) disposição e não a da realização (recíproca). Este modo repulsivo básico de disputa política é treinado e demonstrado em talk shows, nas redes sociais e em debates parlamentares, nos quais o objetivo é justamente não se deixar tocar pelos argumentos, preocupações e convicções dos outros, e em nenhuma circunstância se “mover” (ou na melhor das hipóteses, fazê-lo estrategicamente), mas antes expor e deslegitimar o outro lado tanto quanto possível. Essa lógica de disputa então tem continuidade na rua, por exemplo, quando cidadãos de direita irados se defrontam com manifestantes de esquerda.

Uma crítica das relações de ressonância concebida dessa forma fornece um resultado claro: as relações de ressonância revelam-se danificadas em todas as três dimensões, e a sociedade moderna tardia parece permanentemente desafinada. Mas como e a partir do que uma Teoria Crítica da Política poderia desenvolver energias e sugestões para uma superação construtiva da crise? Quais orientações subjetivas e quais mudanças institucionais são concebíveis para tornar novamente possível o agir político no modo ressonância como formatação e criação de mundo? Em que direção elas poderiam ser encontradas?

Como tentei mostrar, a própria política pode ser entendida como um modo de relação com o mundo. Um modo de relação com o mundo, por sua vez, descreve uma totalidade: ele cria um determinado mundo e uma determinada forma de sujeito, e oferece uma relação igualmente determinada entre eles. Essa relação pode ser repulsiva, e então criará sujeitos “mudos” e um mundo “petrificado”, que são confirmados por uma ontologia social antagonista e uma teoria política que vê a luta como o centro do político. Mas ela não precisa ser antagonista. A maior dificuldade aqui é que, com base em tal relação com o mundo, outros modos são praticamente impensáveis – eles parecem sempre como sendo apenas fantasias irrealistas, como rebentos de um pensamento desejante que claramente ignora a realidade e não a perpassa teoricamente. É precisamente essa preocupação que assombrava Adorno em sua concepção de um “contexto de ilusão total” ou Marcuse em seu diagnóstico sombrio da dominação do “homem unidimensional” (Marcuse 1987Marcuse, Herbert. 1987. Der eindimensionale Mensch: Studien zur Ideologie der fortgeschrittenen Industrieges. 21. ed. Darmstadt: Luchterhand.): ambos temiam que a possibilidade de outro-ser-no-mundo poderia se tornar impossível de ser pensado e experimentado.

Portanto, essa me parece ser a primeira e mais importante tarefa de uma Teoria Crítica como tal: manter aberta a possibilidade de pensar um ser-no-mundo diferente, um modo diferente de relação com o mundo. Do lado dos sujeitos ou da cultura, isso significa contribuir para que a disposição e a capacidade de deixar-se ser “chamado” e de responder de forma “espontânea”, no sentido de Erich Fromm, ou seja, de forma não disposicional-apropriadora, mas criativo-transformadora, não se percam, que uma atitude de ouvir e responder sensível à ressonância permaneça uma opção do agir. O otimismo é possível aqui porque a habilidade básica de ressoar não é algo que os sujeitos primeiro tenham que aprender culturalmente: as pessoas são desde o nascimento física e psicologicamente calibradas pela natureza para o entrar-em-ressonância com o mundo; o acesso reificante-distanciador ao mundo, por outro lado, é o resultado de um processo de aprendizagem cultural (cf. Rosa 2016bRosa, Hartmut. 2016b. Resonanz: eine Soziologie der Weltbeziehung. Berlin: Suhrkamp., pt. 1). Por isso mesmo na realidade institucional da modernidade tardia muitas, senão a maioria das situações de ação são, por assim dizer, “duplamente codificadas”: elas frequentemente sugerem um acesso instrumental-reificador (a pacientes ou alunos, usuárias e clientes, colegas e concorrentes, mas também a locais de residência, a equipamentos para e produtos do trabalho, a bens de consumo e produtos naturais etc.), mas da mesma forma, muitas vezes, também abrem espaço para e criam aspirações de um outro entrar-em-relação. Justamente da tensão disso resultante surge a sensação de alienação: se os sujeitos seguirem os impulsos de ressonância que não podem ser totalmente suprimidos, então correm o risco de ficar para trás, de serem massacrados e de perderem seu lugar no mundo, o que paradoxalmente também significa: elas ao mesmo tempo abdicam de suas (futuras) chances de um estar-no-mundo ressonante. Por isso o uso individual da “margem de ressonância” certamente não é suficiente para superar a alienação existencial da modernidade tardia, sua estrutura básica repulsivo-antagonista. Isso requer a desativação do imperativo de expansão da estabilização dinâmica, por um lado, e o estabelecimento da democracia como uma esfera genuína de ressonância no sentido delineado acima, por outro.

Enquanto os imperativos de expansão e a coação para a aceleração associados ao modo de estabilização dinâmica estiverem em vigor, o mundo mostra-se impossível de ser modelado e a política democrática, por consequência, se revela autoineficaz. Por isso, um outro modo de reprodução estrutural e de estabilização da ordem social é buscado. As estruturas básicas da comunidade, o futuro e o ambiente material e institucional só se mostrarão modeláveis e “transformativamente assimiláveis”, os eixos de ressonância entre as pessoas, com a natureza e com a história só se revelarão ativáveis quando as relações entre eles não forem mais determinadas pelos imperativos cegos da expansão, mas forem negociadas em um ambiente de ressonância democrática como espaço para a genuína formatação política. Como essa sociedade tão diferente deveria ou poderia ser, quais reformas poderiam contribuir para estabelecê-la – a introdução de uma renda básica incondicional e de um “tempo básico” democrático, a disponibilização de infraestruturas sociais, o controle político dos mercados financeiros, a limitação do abismo salarial, um corte mundial nas dívidas, a determinação econômico-democrática das metas e formas de produção e/ou algo completamente diferente –, isso não pode ser decidido na prancheta sociológica. “Projetos” para uma formação social ressonante são impossíveis por definição. Legitimidade para uma nova concepção do bem comum só pode ser conquistada de forma democrática, ela só pode ser produzida por meio de uma cooperação ressonante. A consequência disso é que a ressonância democrática, de certa forma, já é a alternativa ao modo dominante de estabilização dinâmica: sua capacidade de formatação, autoeficaz e aberta em relação ao resultado, deve determinar a forma, a estrutura e a direção da comunidade.

Esse modo alternativo de estabilização pode, provisória e improvisadamente, ser descrito como o modo de estabilização adaptativa: esse termo descreve um estado em que crescimento, aceleração e inovação são sempre possíveis para mudar o status quo institucional, mas não necessárias para mantê-lo vigente. A ordem institucional “se adapta” às concepções daquilo que for negociado como “bem comum” no espaço de ressonância democrática. O que uma Teoria Crítica da Política pode contribuir para realizar este modo alternativo de estabilização e a outra forma ressoante de relação com o mundo a ele correlata consiste em fornecer os meios teóricos e conceituais para manter acessível, como possibilidade de pensar e vivenciar, este espaço de ressonância democrático, no centro do qual não esteja a luta, mas sim a formatação da comunidade e para o qual não sirva como ideia reguladora a hegemonia, mas o bem comum. Talvez isso não seja muito, mas também não é pouco. Só assim será possível manter a esperança de que um dia o mundo possa ser novamente assimilado transformativamente, que a alienação possa ser superada, que, nas palavras impressionantes de Hannah Arendt (2020aArendt, Hannah. 2020a. Was ist Politik? Fragmente aus dem Nachlaß. Organizado por Kurt Sontheimer. Traduzido por Ursula Ludz. 7. ed. München: Piper., 181), “nós que não viemos do deserto, mas vivemos nele, sejamos capazes de transformar o deserto em um mundo humano”.

  • 2
    Traduzido por Emil A. Sobottka (Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (Pucrs), Porto Alegre, RS, Brasil).
  • 3
    Esse é o cerne do que Charles Taylor elaborou em seus escritos teóricos quando ele descreve o ser humano como “animal autointerpretante” (Taylor 1985Taylor, Charles. 1985. Philosophy and the human sciences. Cambridge: Cambridge University Press.; Dreyfus e Taylor 2015Dreyfus, Hubert L., e Charles Taylor. 2015. Retrieving realism. Cambridge: Harvard University Press.; Taylor 2005Taylor, Charles. 2005. As fontes do self: a construção da identidade moderna. São Paulo: Loyola.; Rosa 1998Rosa, Hartmut. 1998. Identität und kulturelle Praxis: politische Philosophie nach Charles Taylor. Frankfurt am Main: Campus.).
  • 4
    Sobre isso ver as reflexões nuançadas de Peter Graf Kielmansegg (2013)Kielmansegg, Peter. 2013. Die Grammatik der Freiheit: Acht Versuche über den demokratischen Verfassungsstaat. Baden-Baden: Nomos..
  • 5
    Por isso Ernst Fraenkel (1999)Fraenkel, Ernst. 1999. Deutschland und die westlichen Demokratien. In Gesammelte Schriften 5: Demokratie und Pluralismus, organizado por Alexander Von Brünneck, 37–280. Baden-Baden: Nomos Verlagsgesellschaft. acertadamente cunhou o conceito de bem comum a posteriori, que só poderia ser reconhecido como resultado de disputas políticas e não como seu pressuposto (bem comum a priori).
  • 6
    Para uma distinção entre relações de ressonância, esferas de ressonância e eixos de ressonância, ver Rosa (2016bRosa, Hartmut. 2016b. Resonanz: eine Soziologie der Weltbeziehung. Berlin: Suhrkamp., 331-40).
  • 7
    As reflexõs que seguem eu desenvolvi, em outra versão, em Rosa (2019)Rosa, Hartmut. 2019. Demokratie und Gemeinwohl: Versuch einer resonanztheoretischen Neubestimmung. In Was stimmt nicht mit der Demokratie? Eine Debatte mit Klaus Dörre, Nancy Fraser, Stephan Lessenich und Hartmut Rosa, organizado por Hanna Ketterer e Karina Becker, 160–88. Berlin: Suhrkamp..
  • 8
    N.T. Stimme, no original, é ao mesmo tempo voz e voto. No que segue, o autor joga com essa polissemia.
  • 9
    Referência para essa perspectiva segue sendo Downs (1957Downs, Anthony. 1957. An economic theory of democracy. Boston: Addison Wesley.; cf. Love 2006Love, Nancy Sue. 2006. Musical democracy. Albany: State University of New York Press.).
  • 10
    Mais detalhes a esse respeito se encontra em meu livro Ressonância (Rosa 2016bRosa, Hartmut. 2016b. Resonanz: eine Soziologie der Weltbeziehung. Berlin: Suhrkamp., cap. X.3). Além disso eu tento mostrar ali que no pensamento desses autores (assim como também no de representantes mais recentes da Teoria Crítica, como Axel Honneth e Jürgen Habermas) e, com isso, na linhagem da tradição da Teoria Crítica como um todo, havia elementos embrionários de uma teoria da ressonância, mas que eles não foram desenvolvidos.
  • 11
    Assim por exemplo na sua famosa: Acceptance Speech at the 2016 Republican National Convention. acessado em 5 jul. 2018. https://www.youtube.com/watch?v=pWcez2OwT9s.
  • 12
    “The reason why the United Kingdom voted to leave the European Union can be expressed in three words: “Take back control”. É assim que se inicia a contribuição de Haughtons (It's the slogan, stupid: the Brexit referendum, acessado em 5 jul. 2018. http://www.birmingham.ac.uk/research/perspective/eu-ref-haughton.aspx.
  • 13
    Ver a esse respeito o texto detalhado e instrutivo de Paul Sörensen (2016)Sörensen, Paul. 2016. Entfremdung als Schlüsselbegriff einer Kritischen Theorie der Politik: eine Systematisierung im Ausgang von Karl Marx, Hannah Arendt und Cornelius Castoriadis. Zeitgenössische Diskurse des Politischen 10. Baden-Baden: Nomos..
  • 14
    Sobre a figura de um círculo normativo entre teoria política e práxis política ver meu texto Identität und kulturelle Praxis (Rosa 1998Rosa, Hartmut. 1998. Identität und kulturelle Praxis: politische Philosophie nach Charles Taylor. Frankfurt am Main: Campus., 258).

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    22 Abr 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    23 Dez 2021
  • Revisado
    23 Dez 2021
  • Aceito
    22 Fev 2022
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