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EXPLORANDO A MATEMÁTICA E O PENSAMENTO COMPUTACIONAL COM ATIVIDADES (DES)PLUGADAS COM CRIANÇAS DE 6 A 9 ANOS DE IDADE

EXPLORING MATHEMATICS AND COMPUTATIONAL THINKING WITH (UN)PLUGGED ACTIVITIES WITH CHILDREN FROM 6 TO 9 YEARS OLD

RESUMO

Este artigo apresenta uma pesquisa exploratória, com abordagem qualitativa, de uso de atividades (des)plugadas para o ensino de conceitos da computação e da matemática durante o isolamento social por causa da pandemia de Covid-19. O objetivo desta pesquisa foi analisar o uso de tais atividades como recursos didáticos complementares em contexto de ensino remoto para o desenvolvimento de habilidades do pensamento computacional e de matemáticas com crianças de 6 a 9 anos. Os resultados indicaram grande participação das crianças e aceitação das atividades desplugadas tanto pelas crianças quanto pela família.

Palavras-chave
Pensamento computacional; Computer Science Unplugged; Ensino remoto; Pandemia de Covid-19

ABSTRACT

This article presents an exploratory research, with a qualitative approach, on the use of (un)plugged activities to teach computing and mathematic concepts during the social isolation period imposed by the Covid-19 pandemic. The objective of this research was to analyze the use of such activities as extra resources in the context of remote education to teach computational thinking and mathematics skills to 6-to-9-year-old children. The results showed children’s great engagement in the activities, and the acceptance of unplugged activities by both the children and their families.

Keywords
Computational thinking; Computer Science Unplugged; Remote education; Covid-19 pandemic

Introdução

No primeiro trimestre de 2020, a Organização Mundial da Saúde (OMS) decretou o estado de pandemia da Covid-19 no mundo. Entre as medidas orientadas por órgãos nacionais e internacionais para o combate à sua disseminação, destacou-se a necessidade de isolamento social (OMS, 2020ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE. Coronavirus disease (COVID-19) weekly epidemiological updates and monthly operational updates. Organização Mundial da Saúde, 2020. Disponível em: https://www.who.int/emergencies/diseases/novel-coronavirus-2019/situation-reports. Acesso: 4 mar. 2021.
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). Desse modo, as aulas presenciais de instituições de ensino públicas e privadas tiveram seu planejamento pedagógico reconsiderado, buscando-se, conforme cada realidade, uma solução para garantir a continuidade dos estudos, o acolhimento e o atendimento para que todos lidassem da melhor forma possível com a situação vivenciada. Aulas remotas ou atividades assíncronas estão entre algumas das alternativas pedagógicas utilizadas pelas instituições de ensino da educação infantil ao ensino superior nesse contexto.

Além disso, uma reorganização na vida familiar precisou ser realizada, pois as casas passaram a ser espaços compartilhados de estudo, trabalho, lazer e descanso, por dias, semanas e meses ininterruptos. Atividades extracurriculares desenvolvidas pelas crianças, tais como esportes, aulas de música, dança, pintura etc., foram interrompidas, o que aumentou o tempo ocioso em casa, dedicado boa parte a games, tablets e celulares no caso de crianças cuja realidade socioeconômica o permitia.

Ao analisar o cenário de um grupo de crianças em idade escolar de 6 a 9 anos de classe média, em uma cidade no interior de Mato Grosso, quanto ao acesso a tecnologias, à disponibilidade dessas tecnologias e à familiaridade com elas, identificamos a possibilidade de desenvolver atividades pedagógicas atrativas que trabalhassem habilidades do pensamento computacional e atitudes exigidas no século XXI relacionadas à resolução de problemas, conforme postulado na Base Nacional Curricular Comum (BNCC): “A área de Matemática, no Ensino Fundamental, centra-se na compreensão de conceitos e procedimentos em seus diferentes campos e no desenvolvimento do pensamento computacional, visando à resolução e formulação de problemas em contextos diversos” (BRASIL, 2018BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular (BNCC). Brasil: Ministério da Educação, 2018. Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/abase/. Acesso em: 30 mar. 2022.
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, p. 471). Tais atividades poderiam ainda ser aplicadas transversalmente ao conteúdo de disciplinas do ensino fundamental, ajudando as crianças imersas na cultura digital.

O pensamento computacional (PC) é definido como “uma distinta capacidade criativa, crítica e estratégica humana de saber utilizar os fundamentos da Computação, nas mais diversas áreas do conhecimento, com a finalidade de identificar e resolver problemas” (BRACKMANN, 2017BRACKMANN, C. Desenvolvimento do pensamento computacional através de atividades desplugadas na educação básica. 2017. Tese (Doutorado) – Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2017., p. 29). Pode ocorrer de maneira individual ou colaborativa, com passos claros, de modo que uma pessoa ou um computador possa executá-los eficazmente.

Diversos contextos são descritos no relatório do National Research Council em 2011 para trabalhar o PC por meio de atividades que não usam tecnologias (USA NATIONAL RESEARCH COUNCIL, 2011USA NATIONAL RESEARCH COUNCIL. Report of a Workshop of Pedagogical Aspects of Computational Thinking. Washington, D.C.: The National Academies Press, 2011. Disponível em: https://nap.nationalacademies.org/catalog/13170/report-of-a-workshop-on-the-pedagogical-aspects-of-computational-thinking. Acesso em: 30 ago. 2021.
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). Tais atividades, conhecidas como desplugadas, são praticadas em diferentes formatos e espaços, a exemplo das atividades descritas no projeto Computer Science Unplugged (CS Unplugged). Este, que tradicionalmente elabora atividades a serem utilizadas em salas de aula presenciais, disponibilizou nesse momento de isolamento social um conjunto de atividades desplugadas possíveis de serem realizadas em casa, de modo a permitir às crianças explorar fora da escola conceitos fundamentais da ciência da computação. Nessa esteira, este trabalho buscou uma reflexão em torno do seguinte questionamento: como as crianças percebem as atividades extras desenvolvidas de forma (des)plugada no que tange ao PC e às habilidades matemáticas em contexto de ensino remoto?

Dada a característica do objeto de estudo, utilizamos como estratégia metodológica o estudo exploratório (MARCONI; LAKATOS, 2017MARCONI, M. de A.; LAKATOS, E. M. Técnicas de pesquisa. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2017.), com abordagem qualitativa, desenhado com base nas referências da BNCC para a área de matemática no ensino fundamental e anos iniciais quanto ao desenvolvimento do PC. Desse modo, o objetivo desta pesquisa foi analisar o uso de atividades desplugadas complementares ao ensino remoto para o desenvolvimento do PC e de habilidades matemáticas com crianças de idades entre 6 e 10 anos. Destacamos que, por causa da pandemia, precisamos, mesmo para atividades ditas desplugadas, empregar uma ferramenta de webconferência para interação com as crianças, muito embora as tarefas relacionadas ao PC por elas realizadas não dependessem de nenhum dispositivo digital. Dessa forma, neste texto adotamos em alguns momentos o prefixo des entre parênteses para indicar que as atividades realizadas são impressas, mas projetadas na tela do dispositivo digital para mediação pedagógica.

O trabalho está estruturado em seções. Na seção seguinte é descrita a metodologia desta pesquisa; na próxima seção se apresenta o Projeto Computer Science Unplugged em Casa; adiante, é descrita e analisada a experiência com atividades (des)plugadas; depois, são elencados os resultados e faz-se a discussão; e, na sequência, tem-se as considerações finais.

Metodologia do Estudo

O estudo exploratório, com abordagem qualitativa (GIL, 2008GIL, A. C. Métodos e técnicas de pesquisa social. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2008.), adotou a prática de computação (des)plugada relacionando-a ao uso de tecnologias para o desenvolvimento de aulas remotas vivenciadas pelas crianças em razão do isolamento social causado pela pandemia de Covid-19, com vistas a trabalhar conceitos computacionais e matemáticos mediante as atividades selecionadas e disponibilizadas pelo Projeto CS Unplugged a serem desenvolvidas em casa. A pesquisa teve aprovação no Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos das Áreas de Ciências Humanas e Sociais da Universidade Federal de Mato Grosso, com recolha dos termos de Consentimento Livre e Esclarecido (CLE) e de Assentimento Livre e Esclarecido (ALE).

Ao analisar o cenário de um grupo de crianças em idade escolar de 6 a 9 anos quanto ao acesso a tecnologias, à disponibilidade dessas tecnologias e à familiaridade com elas, identificamos a possibilidade de desenvolver atividades atrativas e que trabalhassem habilidades do PC e atitudes que são exigidas no século XXI e estão relacionadas à resolução de problemas, podendo ser aplicadas transversalmente ao conteúdo de disciplinas do ensino fundamental a fim de ajudar as crianças imersas na cultura digital.

O convite para participar da pesquisa foi feito a cinco crianças, com o consentimento dos pais, no rol de colegas de escola dos filhos da primeira autora deste estudo. Essas crianças participam de um grupo de jogos online nos horários livres e estudam na mesma escola. O número de participantes deu-se pela necessidade de maior monitoramento em função da pouca idade. Uma das crianças estuda no 1º ano, e quatro crianças frequentam o 4º ano do ensino fundamental de uma escola privada de Mato Grosso. Esse grupo de crianças participantes é formado por duas meninas (4º ano) e três meninos (um do 1º ano e dois do 4º ano).

A proposta didática foi planejada em uma semana e desenvolvida de forma síncrona com as crianças ao longo de quatro semanas consecutivas, com horário definido pelas mães (sábados à tarde) e duração média de duas horas por encontro. A situação didática foi desenvolvida de forma remota, com a utilização do Google Meet para a videoconferência, sendo disponibilizado e enviado aos responsáveis o link por meio do aplicativo WhatsApp.

Neste trabalho, foram desenvolvidas quatro atividades (des)plugadas das oito disponibilizadas pelo Projeto CS Unplugged em Casa. Optamos por: “Desafio binário”, “Encontre meu cartão”, “Destravando o segredo nos códigos de produtos” e “Apertando imagens em códigos” (BELL; WITTEN; FELLOWS, 2011BELL, T.; WITTEN, I. H.; FELLOWS, M. Computer science unplugged. 2011. Disponível em: https://classic.csunplugged.org/wp-content/uploads/2014/12/CSUnpluggedTeachers-portuguese-brazil-feb-2011.pdf. Acesso em: 4 nov. 2019.
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).

Para a coleta de dados, ocorreram: observação no decorrer de todo o processo; grupo focal com as crianças, após a finalização das quatro atividades (des)plugadas; e entrevista com as mães das crianças participantes da pesquisa, com o objetivo de analisar o processo de vivência e as percepções das crianças, da pesquisadora e das mães quanto ao desenvolvimento das atividades desplugadas de forma remota, bem como a recepção e a participação das crianças nas atividades.

Para a análise dos dados coletados, utilizamos a análise interpretativa, com base nas respostas obtidas por meio do grupo focal online feito com as crianças e nos comentários feitos pelas mães sobre as observações realizadas durante as atividades.

Projeto Computer Science Unplugged em Casa

O CS Unplugged em Casa tem como objetivo promover a ciência da computação não só para crianças, mas para estudantes de todas as faixas etárias, do ensino fundamental até o ensino superior, como uma disciplina interessante, envolvente e intelectualmente instigante. O foco está em difundir fundamentos da ciência da computação por meio de atividades que não dependem de software, sistemas específicos ou computadores e que podem ser utilizadas por muitos anos (CS Unplugged, 2021CS UNPLUGGED. Computer science unplugged. Disponível em: https://csunplugged.org/. Acesso em: 7 jul. 2021.
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).

Originalmente, o Projeto CS Unplugged em Casa foi desenvolvido para lidar com situações como a redução do número de estudantes na área da computação, mais graves para mulheres, e com a consequente criação de estereótipos sobre carreiras na computação. O projeto difundiu-se em salas de aula ao redor do mundo e, agora, vem sendo amplamente utilizado no ensino de conceitos da ciência da computação e no desenvolvimento do PC (BELL; WITTEN; FELLOWS, 2011BELL, T.; WITTEN, I. H.; FELLOWS, M. Computer science unplugged. 2011. Disponível em: https://classic.csunplugged.org/wp-content/uploads/2014/12/CSUnpluggedTeachers-portuguese-brazil-feb-2011.pdf. Acesso em: 4 nov. 2019.
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). O material das atividades desplugadas é disponibilizado no site CS Unplugged, compreendendo uma variedade de recursos e materiais gratuitos, incluindo o livro Computer Science Unplugged, em diversos idiomas, para serem utilizados com turmas escolares.

Com o advento da pandemia de Covid-19, o CS Unplugged selecionou um conjunto de atividades possíveis de serem realizadas em casa com a orientação de um responsável para o ensino de habilidades do PC. A seleção conta com oito atividades desplugadas que exigem alguns materiais para sua execução e conhecimentos prévios. Tais atividades vêm acompanhadas de orientações e exemplificações. Seus títulos incluem: “Mágica de leitura de mente”, “Desafio binário”, “Adivinhe meu número”, “Encontre meu cartão”, “Adivinhe a frase”, “Destravando o segredo nos códigos de produtos”, “Crianças-robô” e “Apertando imagens em códigos”.

Destacamos, com base em uma revisão sistemática (SASSI; MACIEL; PEREIRA, 2021SASSI, S. B.; MACIEL, C.; PEREIRA, V. C. Revisão sistemática de estudos sobre computação desplugada na educação básica e superior de 2014 a 2020: tendências no campo. Revista Contexto & Educação, v. 36, n. 114, p. 10-30, 2021. https://doi.org/10.21527/2179-1309.2021.114.10-30
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), que não foram encontrados trabalhos da literatura que registrassem experiências com essas atividades desplugadas realizadas de forma remota. Foi apenas identificada a experiência de Figueiredo et al. (2020)FIGUEIREDO, L. A.; DIAS, A. B. A.; FAGUNDES, L. A. P.; SILVA, V. P.; ALMEIDA, S. G. M.; MAGALHÃES, M. L. C.; REZENDE, P. M.; LIMA, M. O.; FORTES, L. S.; RESENDE, O. S.; GOMES, P. S. B.; XAVIER, J. S. Código X em Casa: um relato de experiência sobre o ensino remoto de computação desplugada para meninas em situação de vulnerabilidade socioeconômica, em tempos de distanciamento social. In: WORKSHOP DE INFORMÁTICA NA ESCOLA, 26., 2020. Anais [...]. Porto Alegre: Sociedade Brasileira de Computação, 2020. p. 279-288. https://doi.org/10.5753/cbie.wie.2020.279
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, que trabalhou atividades desplugadas com estratégias de projetos como o Code.org e o Bloc-kly.games, adaptadas para serem realizadas em casa.

No Quadro 1 descrevemos os materiais necessários para a execução das atividades propostas pelo CS Unplugged, os pré-requisitos requeridos aos participantes e conceitos da área da computação e das disciplinas da BNCC.

Quadro 1
Computer Science Unplugged em Casa.

O estado de pandemia da Covid-19 no mundo afetou diretamente as aulas presenciais das escolas brasileiras, públicas e privadas, que foram suspensas, e todo o planejamento pedagógico foi revisado e adaptado conforme cada realidade escolar e familiar. Como estratégia para continuidade dos estudos, algumas escolas utilizaram aulas remotas e/ou atividades assíncronas como alternativa pedagógica, firmada pelo ato normativo Decreto nº 510, de 3 de junho de 2020 (MATO GROSSO, 2020MATO GROSSO. Decreto nº 510, de 3 de junho de 2020. Mato Grosso, 2020. Disponível em: http://www.transparencia.mt.gov.br/documents/363605/14442674/DECRETO±N%C2%BA±510%2C±DE±03±DE±JUNHO±DE±2020.pdf/99397c4e-9368-0146-cd32-dc997ef49b48. Acesso em: 31 mar. 2021.
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), que manteve a suspensão das aulas presenciais e determinou para a Secretaria de Estado de Educação de Mato Grosso a elaboração de um plano estratégico com diretrizes para o retorno às aulas. Nesse sentido, tecnologias e atividades diferenciadas no campo educacional foram de suma importância para o bem-estar da população.

Atividades (des)Plugadas em Casa

A situação didática foi proposta a crianças em situação de isolamento social por causa da pandemia de Covid-19 e que tinham acesso à tecnologia digital necessária para a interação entre os pares.

Planejou-se para cada semana desenvolver uma atividade do Projeto CS Unplugged em Casa, com duração de duas horas. A pesquisadora atuou da seguinte maneira: inicialmente, fez perguntas para identificar se as crianças já conheciam ou teriam ouvido algo sobre o tema a ser trabalhado a cada dia. Com base nas respostas, os conceitos de cada aula eram trabalhados, e as atividades desplugadas, executadas com as crianças. Para a exposição dos conceitos e exemplificações, foram utilizados slides feitos no Microsoft PowerPoint. A interação das crianças com a pesquisadora ocorreu por meio da oralidade mediante o microfone e a câmera. Em alguns momentos, houve complementação da interação por escrito no recurso de bate-papo do Google Meet.

Foram selecionadas as atividades “Desafio binário”, “Encontre meu cartão”, “Destravando o segredo nos códigos de produtos” e “Apertando imagens em códigos” (BELL; WITTEN; FELLOWS, 2011BELL, T.; WITTEN, I. H.; FELLOWS, M. Computer science unplugged. 2011. Disponível em: https://classic.csunplugged.org/wp-content/uploads/2014/12/CSUnpluggedTeachers-portuguese-brazil-feb-2011.pdf. Acesso em: 4 nov. 2019.
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), porque abordam diferentes conceitos da área da computação e da matemática possíveis de serem trabalhados com todas as crianças participantes. Por intermédio dessas atividades, foram trabalhadas as habilidades de contar, correlacionar, ordenar, comparar, adicionar, multiplicar e colorir e também os conceitos de sequência e padrão sequencial e de descrição de uma regra para um padrão.

Na atividade “Desafio binário”, utilizaram-se cinco cartões, confeccionados com rascunhos de folha A4 pelas crianças seguindo a orientação da pesquisadora: um lado sem escrita ou marcações, e o outro lado com pontos desenhados, segundo instrução do material e demonstrado via Microsoft PowerPoint, conforme Fig. 1.

Figura 1
Confecção do material para atividade “Desafio binário”.

Para essa atividade, as habilidades exigidas eram contar até 31 e conhecer o conceito de adição, porém trabalhamos também os conceitos de números pares e ímpares, ordenação crescente e decrescente e multiplicação por 2. Foram desenvolvidos exemplos com as crianças, utilizando-se imagens para a representação dos conceitos. O trabalho consistiu na sequência de números decimais e números binários (Fig. 2), bem como na construção de sua representação por meio de cartões e representações por meio de lâmpadas acesas (1) e apagadas (0).

Figura 2
Exemplo de conversão de número decimal em número binário.

Após a exposição, a primeira atividade atribuída às crianças foi converter um número decimal em um número binário. Assim, cada criança apresentou o seu número, identificando lâmpadas acesas ou apagadas e o número binário correspondente. No segundo momento, foi desenvolvida a atividade “Enviando mensagem secreta”, conforme a Fig. 3, como complemento da atividade anterior. Nessa outra atividade, a criança precisava decifrar a mensagem enviada por meio de lâmpadas acesas ou apagadas, as quais representavam, respectivamente, o número 1 e o número 0, formando uma sequência binária que tinha como correspondente uma letra do alfabeto. Essa atividade foi encaminhada aos responsáveis, que fizeram a impressão dela para cada criança.

Figura 3
Exemplo de conversão de número decimal em número binário.

A atividade “Encontre meu cartão” deu-se mediante oito cartões, que deveriam ser numerados de 0 a 7, confeccionados com material reciclado. Cada criança confeccionou manualmente os seus cartões. A habilidade exigida da criança na atividade correspondeu à capacidade de comparar os números de 0 a 7, no entanto novamente trabalhamos os conceitos de números pares e ímpares, de ordenação crescente e decrescente, de maior ou igual e de menor ou igual. Utilizaram-se para exemplificar esses conteúdos às crianças cartões via recurso Microsoft PowerPoint e formas (linhas e estrela) para eliminar e marcar os números usados, conforme pode ser observado na Fig. 4.

Figura 4
Atividade “Encontre meu cartão”.

Nessa atividade, para exemplificar, a pesquisadora pensou em um dos números e pediu para uma das crianças indicar o possível número escolhido. Com base no número escolhido pela criança, a pesquisadora afirmaria se o palpite era maior ou igual ao número pensado. Após o exemplo, foram formadas duplas para a realização da atividade, que se deu cada vez com uma dupla. Embora tenham sido divididas em duplas, as demais crianças interferiam ajudando no palpite e/ou na resolução da questão pelos outros colegas.

A terceira atividade (des)plugada foi “Destravando o segredo nos códigos de produtos”. Para tal, as crianças utilizaram um rascunho para realizar os cálculos e dois rótulos de embalagem com códigos de barra de produtos com 13 dígitos cada um. As habilidades exigidas nessa atividade eram somar números até 150 e multiplicá-los por 3, porém também trabalhamos os conceitos de ordenação, organização em linhas e colunas e subtração. A pesquisadora exemplificou a atividade mediante embalagens e slides no Microsoft PowerPoint, conforme Fig. 5.

Figura 5
Exemplo da atividade “Destravando o segredo nos códigos de produtos”.

Baseadas na exemplificação, as crianças escreviam os códigos de seus produtos no chat do Google Meet e atribuíam a um/a amigo/a desvendar o último dígito do produto. Na Fig. 5, observamos que há um número escondido, denominado de dígito de verificação, que está atrás do retângulo azul. Após a realização dos cálculos, a criança conseguia identificar o código de verificação desse rótulo. Para a correção da atividade, a pesquisadora utilizou o recurso Microsoft PowerPoint, seguindo as informações/instruções descritas pelas crianças.

A última atividade (des)plugada desenvolvida foi “Apertando imagens em códigos”. Para tanto, foram utilizados lápis, papel com grade 20 × 20 e uma instrução encaminhada para as mães realizarem a impressão. As habilidades necessárias para essa atividade consistiam em ler números, contar até 20 e colorir os quadrados da grade seguindo a instrução. Também trabalhamos os conceitos de eixo das abscissas e eixo das ordenadas e a localização de pontos. Para a exemplificação e correção da atividade, foi utilizado o recurso Microsoft PowerPoint, conforme Fig. 6.

Figura 6
Atividade “Apertando imagens em códigos”.

Posteriormente à exemplificação, foram atribuídas às crianças duas instruções, que foram seguidas por todas, utilizando lápis colorido e o material impresso. As crianças, durante a realização da atividade (des)plugada, fizeram referência ao conteúdo que estava sendo trabalhado nas aulas regulares de Matemática no 4º ano do ensino fundamental, identificando semelhança quanto ao cálculo de área desenvolvido com imagens quadriculadas.

Resultados e Discussão

Nesta seção apresentamos o processo de vivência e as percepções das crianças, da pesquisadora e das mães quanto ao desenvolvimento das atividades desplugadas de forma remota, bem como a recepção e a participação das crianças nas atividades. Para a produção de dados, utilizamos o grupo focal com as crianças e a entrevista com as mães. O grupo focal online com as crianças teve como base um questionário preestabelecido e foi conduzido após a aplicação da última atividade (des)plugada, por meio do Google Meet, com a participação das cinco crianças. Todas são aqui identificadas pela letra C acrescida de numeração sequencial.

O grupo focal online teve início com a pesquisadora explicando que, naquele momento, seria gravado o áudio para arquivo dos dados e posterior análise, conforme descrito nos termos ALE e CLE. Foi questionado às crianças, de forma aberta, se elas perceberam a matemática presente nessas atividades desenvolvidas nas quatro semanas. A criança C1 afirmou: “Sim. Por exemplo, a última atividade que você ensinou [“Encontre meu cartão”] para a gente, nós tínhamos que eliminar números maiores ou menores, até encontrar o número que você escolheu”.

Para mais informações sobre essa pergunta, a pesquisadora acrescentou as seguintes perguntas: “e nas outras atividades? Números binários, código de barras e Apertando imagens em códigos, aparece a matemática?”. C2 declarou:

Sim, nas outras atividades também. Na atividade “Números binários” tem multiplicação e soma. Na atividade de código de barras, também tem multiplicação e soma. Já na atividade de pintar [“Apertando imagens em códigos”], nós seguimos a regra [instrução] dada e pintamos no quadrado quadriculado, igual utilizamos nas aulas de Matemática, quando a professora ensina calcular área de quadrado e retângulo.

Observa-se na fala das crianças que, além de terem identificado conceitos matemáticos presentes nas atividades, elas fizeram relações com conceitos trabalhados nas aulas regulares de Matemática.

Além da matemática, conceitos da área da computação foram trabalhados nas quatro atividades (des)plugadas, buscando atender às Diretrizes para ensino de computação na educação básica (SBC, 2019SOCIEDADE BRASILEIRA DE COMPUTAÇÃO (SBC). Diretrizes para ensino de computação na educação básica. SBC, 2019. Disponível em: https://www.sbc.org.br/documentos-da-sbc/summary/203-educacao-basica/1220-bncc-em-itinerario-informativo-computacao-2. Acesso em: 10 fev. 2022.
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), que estabelece um conjunto de habilidades computacionais a serem desenvolvidas na educação básica e que estão organizadas em três eixos: PC, mundo digital e cultura digital. Foi questionado às crianças, de forma aberta, se elas perceberam a computação presente nas quatro atividades desenvolvidas. A criança C3 relatou:

Eu já sabia que na computação tem muita matemática, mas achei que não conseguiria aprender alguma coisa ainda sendo criança”. Já C1 disse: “Não sabia que o computador tinha uma linguagem binária. Achei muito interessante e entendi como transformar um número [decimal] em número binário”.

Ao trabalhar as atividades de decodificação e conversão de números binários, trabalhamos os quatro eixos do PC:

  • Decomposição, ao quebrar a conversão dos números binários sequencialmente bit a bit;

  • Reconhecimento de padrões, ao identificar que os números se duplicam a cada bit inserido;

  • Abstração, ou seja, capacidades de filtrar e classificar os dados, separando os elementos mais importantes para determinado problema;

  • Algoritmo, isto é, conjunto de instruções para converter um número binário em um decimal.

Outro ponto abordado com as crianças foi a eventual dificuldade para realizar alguma atividade (des)plugada. Das cinco crianças, duas relataram dificuldades. C5 contou ter tido dúvidas e ter recebido auxílio da pesquisadora: “Tive dúvidas, mas você ajudou”. Já C4 relatou ter tido dificuldade, pois o conceito abordado não correspondia ao ano de escola: “Eu tive dificuldade quando teve multiplicação, pois eu não aprendi a fazer multiplicação ainda”. Nesse caso, adaptamos a atividade e trabalhamos a adição no lugar da multiplicação.

As atividades disponibilizadas pelo Projeto CS Unplugged são recomendadas a crianças de 6 anos ou mais, com indicações quanto aos conceitos a serem trabalhados e habilidades necessárias. Barcelos e Silveira (2012)BARCELOS, T. S.; SILVEIRA, I. F. Pensamento computacional e educação matemática: relações para o ensino de computação na educação básica. In: WORKSHOP SOBRE EDUCAÇÃO EM COMPUTAÇÃO, 20., 2012, Curitiba. Anais [...]. Curitiba: UFPR, 2012. fazem um paralelo entre PC e as competências para o ensino de matemática presentes nos Parâmetros Curriculares Complementares e afirmam que há relações inerentes entre o conhecimento, habilidades e atitudes advindas da ciência da computação e aquelas comumente relacionadas à matemática.

Para a realização das atividades (des)plugadas, por causa do isolamento social, foi utilizado para contato, interação e mediação com as crianças o mesmo serviço de comunicação usado pela escola das crianças nas aulas regulares: o Google Meet. Perguntamos se as crianças sentiram dificuldades na utilização do Google Meet e o que elas achavam de ter aulas online. As cinco crianças relataram não ter dificuldade com o Google Meet e disseram também não ter dificuldade ou vergonha em utilizar a câmera, microfone e chat. Sobre as aulas online, as cinco contaram preferir a aula presencial, como podemos observar nas respostas obtidas: “Não tenho dificuldade, mas acho chato. Prefiro presencial, para ver as pessoas e conversar” (C3); “Eu não gosto muito, porque ficar em frente a tela o tempo todo é ruim. Mas se precisar eu faço” (C5); “Eu não gosto de aula online. Prefiro ir para a escola, pois cansa menos” (C4). As expressões das crianças quanto à aula online nos fazem refletir sobre a necessidade de interação mesmo em ambiente online e o tempo despendido em frente a uma tela para o desenvolvimento de atividades.

As atividades (des)plugadas foram realizadas aos sábados por um mês. Questionadas se, caso houvesse mais atividades, as crianças gostariam de participar, todas responderam que sim, mas revelaram que preferiam fazê-las durante a semana, para no fim de semana descansar. As crianças participantes desta pesquisa realizam atividades extras no contraturno da escola, o que dificultou um mesmo horário disponível para os encontros da pesquisa durante a semana.

Diante disso, a pesquisadora questionou o que mudou na realização das atividades extras em função da pandemia. Das cinco crianças, três afirmaram ter parado de fazer atividades extras por causa da pandemia, como pode ser verificado nas falas: “Eu parei de fazer as atividades extras quando começou a pandemia” (C5); “Também parei de fazer atividades extras” (C3); e “Eu parei de fazer atividade extra e ainda não voltei” (C4). Muitas atividades/serviços/empresas, porém, adaptaram-se à situação vivenciada, como percebemos na afirmação de C1, quando evidenciou: “Algumas atividades extras pararam, outras continuaram de forma online”.

Com base nas afirmações das crianças quanto à preferência por estudos e atividades extras presenciais, bem como na necessidade e nas dificuldades para se adaptar ao momento de pandemia, visto que a interação social das crianças é fator-chave na educação, Sarmento (2003, p. 4)SARMENTO, M. J. Imaginário e culturas da infância. Cadernos de Educação, v. 12, n. 21, p. 51-69, 2003. explica:

As culturas da infância, sendo socialmente produzidas, constituem-se historicamente e são alteradas pelo processo histórico de recomposição das condições sociais em que vivem as crianças e que regem as possibilidades das interações sociais das crianças, entre si e com os outros membros da sociedade. As culturas da infância transportam as marcas dos tempos, exprimem a sociedade nas suas contradições, nos seus estratos e na sua complexidade.

Observamos que a adaptação das atividades na pandemia de Covid-19 implicou dificuldades para C2: “Foi bem difícil quando começou a pandemia. Tudo parou, e a escola mandou bastante atividade, depois começou a aula online. Até se adaptar à aula online foi difícil”. Mesmo com todo o aparato tecnológico e a presença de um responsável para auxílio no desenvolvimento das atividades e acompanhamento das aulas, a criança demonstrou que passou por um momento difícil e necessário de adaptação ao novo.

Durante as atividades desplugadas, foi possível observar a facilidade que todas essas crianças têm de acessar a sala online, ligar e desligar câmera e áudio, bem como utilizar o chat para conversar entre elas e direcionar perguntas à pesquisadora, ou empregar plano de fundo e compartilhar tela. Todas essas habilidades foram impulsionadas pelo aceleramento da comunicação síncrona online durante a pandemia.

Para finalizar o grupo focal, perguntamos se elas já pensaram no que querem trabalhar quando forem adultas. Inserimos essa questão uma vez que as atividades do CS Unplugged são focadas nas áreas das exatas e também usadas em atividades para fomentar a equidade de gênero (MACIEL; BIM; BOSCARIOLI, 2013MACIEL, C.; BIM, S. A.; BOSCARIOLI, C. HCI with chocolate: introducing HCI concepts to Brazilian girls in elementary school. In: LATIN AMERICAN CONFERENCE ON HUMAN COMPUTER INTERACTION. Anais […]. Cham: Springer, 2013. p. 90-94.). Das cinco respostas obtidas, temos três crianças (meninos) que pensam em uma formação nas áreas da engenharia e computação, enquanto duas pensam em uma formação nas áreas da saúde e da arte: “Eu quero formar meu próprio time de futebol, mas, se não der certo, quero ser agrônomo” (C1); “Eu quero ser cientista, não sei em quê. Quero ser aquele cientista que descobre ou inventa um robô” (C2); “Eu quero ser artista. Não sei se quero ser pintora, desenhista ou dançarina. Não sei, só sei que gosto da arte” (C3); “Eu quero trabalhar igual meu pai na empresa dele, com tecnologia” (C4); e “Quero ser veterinária” (C5).

Com a finalização da aplicação das atividades (des)plugadas, realizamos também uma entrevista com as mães, em busca da percepção delas sobre a participação do/a filho/a nas atividades. Das quatro mães, três participaram da entrevista. A mãe de C1 fez o seguinte relato: “Meu filho demonstra bastante independência para participar e resolver as atividades. Ele se demonstrou animado, comentou e mostrou para o pai as atividades. Sempre falou de forma positiva” (M1). Verificamos na fala que a criança apresenta independência e responsabilidade em seus estudos, sendo acompanhada pela família. Além disso, temos uma resposta positiva da criança e uma reprodução da atividade desplugada com o pai.

A mãe da criança C5 retratou uma mudança de posicionamento da filha quanto ao estudo, em termos de participação e interação. Segundo a mãe:

Minha filha gostou muito das atividades. Foi diferente do que eles fazem. São atividades que não são maçantes. Percebi que ela conseguiu se concentrar nas atividades e participar, diferente de outras atividades que ela perde a concentração e não apresenta interesse na participação. Ela gostou muito!

(M4).

Nesse caso, destacamos as atividades desplugadas, disponibilizadas pelo Projeto CS Unplugged, por serem divertidas e envolventes, permitindo às crianças explorarem ideias fundamentais em ciência da computação e da matemática.

As crianças C3 e C5, segundo a mãe, não apresentam dificuldade em matemática e participaram das atividades desplugadas com atenção, além de terem exposto ao pai e à mãe essas atividades e as reproduzido, para mostrarem o que aprenderam tanto na área de computação quanto na de matemática. Conforme a mãe:

Minha filha e meu filho gostam muito de matemática. Atividades que envolvem cálculo chamam muito a atenção deles. Estas atividades também chamaram a atenção deles, não apresentaram dificuldades. Meu filho, por ter 6 anos e estar no 1º ano, apresentou dificuldade quando apareceu o conceito de multiplicação, mas, quando foi explicado utilizando a soma, ele desenvolveu facilmente. Em casa, eles falavam bastante das atividades desenvolvidas com o pai, que é da área da computação, e a mãe, da área da matemática

(M3).

Diante das falas das crianças e das mães que responderam à entrevista, percebemos que as atividades (des)plugadas foram bem aceitas tanto pelas crianças quanto pelas famílias. Foi importante termos as falas de ambos os grupos para analisar o objeto de forma mais ampla.

Considerações Finais

Este estudo focou na percepção de crianças e de suas mães quanto à participação em atividades extras desenvolvidas de forma (des)plugada no que tange ao PC e às habilidades matemáticas, com cinco crianças de idades entre 6 e 10 anos, de forma remota, com a utilização do Google Meet para contato, interação e mediação com os participantes. A proposta utilizou as atividades disponibilizadas pelo Projeto CS Unplugged, indicadas para serem aplicadas em casa durante o isolamento social causado pela pandemia de Covid-19. No decorrer das atividades, foi possível trabalhar com as crianças conceitos já vistos nas aulas de Matemática, tais como sequência, números pares e ímpares, adição, multiplicação, maior que ou menor que.

As cinco crianças participantes das atividades desplugadas perceberam tais atividades e as relacionaram com aquelas desenvolvidas na escola na disciplina de Matemática, mas elas são diferentes quanto ao modo de apresentação dos conceitos. Além disso, as atividades propostas trabalharam habilidades do PC (compreender, analisar, definir, modelar, resolver, comparar e automatizar problemas e suas soluções, por meio de algoritmos) previstas para serem abordadas no ensino fundamental, sobretudo na disciplina de Matemática. As atividades desplugadas foram consideradas atrativas, mesmo sendo desenvolvidas nos sábados à tarde, momento tradicionalmente destinado a descanso e brincadeiras.

Acerca da utilização do Google Meet, as crianças disseram não ter dificuldade, porém enfatizaram que preferem desenvolver atividades de ensino e aprendizagem presencialmente. É importante frisar que essas opiniões foram expressas após um longo período de pandemia, no qual os estudantes já permaneceram muito tempo conectados e privados da interação social, uma das funções da escola. Isso não significa, porém, que em outro momento eles não possam preferir essas atividades de forma desplugada.

Na vivência, segundo a ótica da pesquisadora, as crianças conseguiram realizar as atividades propostas, apresentando poucas dificuldades em sua execução quanto aos conceitos matemáticos, passíveis de serem sanadas. Além disso, durante as atividades, as crianças mostraram rica participação, interação e cooperação entre si. Quanto às percepções das três mães participantes da entrevista, foi possível observar o acompanhamento da família ao longo dos encontros, bem como a aceitação, participação e interação das crianças no desenvolvimento das atividades desplugadas realizadas de forma remota como atividades extras.

Essa experiência leva-nos a refletir sobre as potencialidades das atividades desplugadas, bem como algumas vantagens, tais como não ser necessário o deslocamento dos estudantes, o aproveitamento dos conhecimentos de manipulação de tecnologias síncronas e o tempo de execução das atividades desplugadas.

As percepções neste estudo estão permeadas por questões afeitas ao momento pandêmico que vivenciamos, de ensino remoto e seus desafios. Nesse sentido, espaços para atividades e debates são criados, similares aos espaços da escola, apesar dos limites impostos pela tecnologia. Nesse sentido e dado o cunho exploratório desta pesquisa, aventamos algumas hipóteses para futuras pesquisas: o uso de atividades (des)plugadas gera um ambiente de colaboração entre as crianças, estimulando o estudo da matemática e do PC; e tais atividades criam um ambiente de interação e comunicação entre professores, estudantes e pais propício para discussão de outras pautas importantes para a educação, como a carreira futura desses estudantes.

A comunidade da computação tem também discutido a necessidade de eventos científicos terem espaços infantis (MACHADO et al., 2020MACHADO, L. S.; BIM, S. A.; RIBEIRO, K. da S. F. M.; FRIGO, L. B.; MACIEL, C. Espaço infantil em eventos da Sociedade Brasileira de Computação: uma necessidade ou não? In: WOMEN IN INFORMATION TECHNOLOGY, 14., 2020, Cuiabá. Anais [...]. Porto Alegre: Sociedade Brasileira de Computação, 2020. p. 30-39. https://doi.org/10.5753/wit.2020.11273
https://doi.org/10.5753/wit.2020.11273...
) para viabilizar a participação de congressistas que sejam pais ou mães e precisem ter consigo seus filhos/as durante os eventos. Atividades desplugadas como as citadas neste artigo poderiam fazer parte desses espaços, seja em eventos remotos, seja em presenciais, apoiando ainda a divulgação de conhecimentos nesse campo.

Ademais, como trabalhos futuros, esperamos aumentar o tempo de experiência, bem como o número de participantes; e realizar uma análise qualitativa das respostas das crianças às atividades propostas, tendo como foco as habilidades envolvidas e a interdisciplinaridade. Também se planeja desenvolver experiências buscando contemplar outros conceitos computacionais e relacioná-los com a disciplina de Matemática.

Agradecimentos

Não se aplica.

Disponibilidade de Dados da Pesquisa

Todos os dados foram gerados/analisados no presente artigo.

Referências

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Editores Associados:

Ana Clara Bortoleto Nery https://orcid.org/0000-0001-6316-3243 e Eduardo Alessandro Kawamura https://orcid.org/0000-0002-0209-2282

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    22 Maio 2023
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2023

Histórico

  • Recebido
    01 Set 2022
  • Aceito
    01 Mar 2023
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