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Educação ambiental na UFMG - 1998-2011: pesquisas acadêmicas

Environmental education at UFMG - 1998-2011: academic research

Resumo

Neste artigo analisamos os trabalhos dissertativos de Educação Ambiental (EA) defendidos entre 1998 e 2011 na Universidade Federal de Minas Gerais, sob a perspectiva das políticas educacionais e ambientais. O objetivo principal foi compreender as tendências, as implicações e os interesses de pesquisas que tratam do tema, considerando que eles foram desenvolvidos em diferentes áreas do conhecimento. São 17 textos que trouxeram no título o termo “Educação Ambiental”. Entendemos que a interdisciplinaridade perpassa os trabalhos transversalmente, e que os instrumentos legais ainda são argumentos pulsantes do conjunto de pesquisas que visam desenvolver novos valores e práticas educacionais. Os resultados apresentaram diferentes enfoques para a abordagem do tema – educativo, participativo, desenvolvimento pessoal, responsabilidade individual – uma distribuição dos estudos restrita ao escopo de certas disciplinas, destacando-se a forte relação entre o curso de formação do autor e as escolhas teórico-metodológicas de análise.

Palavras-chave
Educação ambiental; Universidade Federal de Minas Gerais; Dissertações e teses

Abstract

In this article we examine the dissertations and thesis on Environmental Education (EE) finished between 1998 and 2011 at Minas Gerais Federal University, from the perspective of educational and environmental policies. The main objective was to understand the trends, the implications and research interests that deal with the subject, considering that they were developed in different knowledge areas. There are 17 texts that brought in the title the term "environmental education". We understand that interdisciplinarity is common to all of them, and that the legal instruments are still pulsating arguments of the research aimed at the development of new values and educational practices. The results showed different approaches to addressing the theme - educational, participatory, personal development, individual responsibility - a distribution of studies restricted to the scope of certain disciplines, highlighting the strong relationship between the author’s universities program and the theoretical and methodological choices.

Keywords
Environmental education; Universidade Federal de Minas Gerais; Thesis and dissertations

Introdução


Para René Barbier, professor da Universidade de Paris VIII, a educação é o resultado da articulação dialógica feita pelos docentes entre a esfera que representa os saberes e conhecimentos generalistas – científicos, filosóficos, artísticos, religiosos - produzidos pela humanidade, e a esfera de conhecimento de si mesmo. Ele compreende que os saberes da história, da arte, da psicanálise evoluem de forma continuada. Logo, o docente consciente de si, no seu percurso formativo vai adquirindo especialidades, de acordo com sua singularidade, sua personalidade e suas experiências. “Não se tem um conhecimento de si mesmo pelo conhecimento exterior. É porque algo em nós se transformou, mudou por meio de uma prova de realidade, que avançamos em direção do conhecimento de nós mesmos” (BARBIER, 2012)BARBIER, René. Vers une éducation transversale. Bulletin Interactif du Centre International de Recherches et Études Transdisciplinaires n° 18 - Mars 2005. Disponível em: <http://basarab.nicolescu.perso.sfr.fr/ciret/bulletin/b18/b18c3.htm>. Acesso em: 2 ago. 2012.


http://basarab.nicolescu.perso.sfr.fr/ci...
. Percorrendo este caminho, compreendemos a realidade em que vivemos. 


Corroboramos com Barbier quando ele afirma que o conhecimento de si mesmo pela experiência e pela descoberta é indispensável para que o processo educativo e a compreensão de mundo ocorram do modo interdisciplinar e sistêmico. São muitas as formas de dar sentido ao mundo e nisto reside a possibilidade da transversalidade de EA nas disciplinas. Meio ambiente, educação e política são enfoques que estão juntos no processo de produção do conhecimento, pois tratam da cidadania e dos modos de organização das instituições que formam as cidades mundiais. Logo, “um educador não pode estar por fora da política, da ecologia política”. 


Esta forma de pensar pode ser o caminho para o educador ambiental adquirir uma formação fundamentada nas posturas ética e social de construção da cidadania. Porém, ele não pode ficar atado às certezas ligadas essencialmente aos saberes científicos. Ele precisa questioná-las constantemente, por meio do aprofundamento das questões. Então, tornam-se importantes as ações sobre o mundo, de tal modo que ele possa conhecer seu interior, que sempre se modifica e está em processo de construção. 


Barbier explica como isto pode se refletir nas práticas didático-pedagógicas: múltiplos olhares, trabalhos em grupo, interculturalidade, interdisciplinaridade e abertura teórica. A sensibilização e o questionamento, em diálogo com as experiências individuais, se transformam em rotina de trabalho, desmoronando as verdades de campos de saberes relativamente estruturados. Os confrontos com as diversidades e a heterogeneidade das formas de mundo e dos grupos de pessoas são os responsáveis pelas mudanças. Mas, precisamos ter a liberdade de expor nossas ideias e interpretações, de modo que as decisões sejam uma criação coletiva.


Isto é possível praticar com aqueles docentes que trabalham as questões ambientais na transversalidade, dentro ou fora de suas disciplinas de origem. A Educação Ambiental – EA não é uma disciplina autônoma, e não pertence ao escopo de uma disciplina científica classificada nas áreas, subáreas e especialidades do conhecimento(1 1 A classificação das Áreas do Conhecimento idealizada pela CAPES se dá em quatro níveis e abrange 8 grandes áreas, 76 áreas e 340 subáreas do conhecimento. Em janeiro de 2008, foi criada a Grande área Multidisciplinar que contém as seguintes áreas: Interdisciplinar, Ensino de Ciências e Matemática, Materiais e Biotecnologia, Meio Ambiente e Ciências Agrárias, Engenharia, Tecnologia, Gestão; Saúde e Biológicas e Sociais e Humanidades (CAPES, 2012). ). Todavia, se desmembramos as palavras educação e meio ambiente, é possível classificá-las em áreas segundo a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - CAPES. Por isso, muitos estudos de EA têm sido desenvolvidos em diferentes áreas, porém com relações muito próximas entre a formação dos autores e as dimensões reflexivas da ciência em questão (ver quadro 1). 


Por exemplo, nos campos de estudo da educação (Grande Área - Ciências Humanas) e do meio ambiente (Grande Área - Multidisciplinar), a EA, na Universidade Federal de Minas Gerais, apresenta pesquisas nas áreas de engenharia, arquitetura, economia, direito, educação física, geografia, ciências, direito, enfermagem, ciência da computação e ciências biológicas. Partindo-se do princípio que o meio ambiente é uma especialidade da área interdisciplinar, e que nele acontecem relações dinâmicas entre ser humano e natureza, tem-se que o exercício da discussão e do entendimento circula entre os seguintes temas: direitos humanos, turismo, cidadania, museu, desenvolvimento, sustentabilidade, riscos, degradação, patrimônio, conservação, preservação, ecologia, uso do solo, resíduos sólidos e saúde.


Analisando as palavras-chave do quadro 1, e os respectivos resumos dos trabalhos, verifica-se que os estudos sobre os riscos (Direito, Arquitetura) concentram-se nas ameaças de ruptura causadas pela atuação do ser humano sobre a natureza. O patrimônio é estudado na área de Direito (crime, penas, dinheiro, direitos humanos), e de arquitetura (patrimônio cultural e arquitetônico, conservação e revitalização de imóveis). Os estudos sobre as unidades de conservação e resíduos sólidos (engenharias e biologia) são de natureza técnica e giram em torno das formas de gestão que venham a controlar as agressões humanas sobre o ambiente. Não houve interesse pelo tema dos parques (um único trabalho foi encontrado). 


Quadro 1
Pesquisa realizada no site da Universidade Federal de Minas Gerais em 2011: buscas por palavras-chave


Fonte: Elaborado pelas autoras(2 2 http://catalogobiblioteca.ufmg.br/pergamum/biblioteca/index.php?resolution2=1024_1&tipo_pesquisa=&filtro_bibliotecas=&filtro_obras=#posicao_ dados_acervo. Obs: Há trabalhos que aparecem em mais de uma chamada. Abreviaturas: EA - Educação Ambiental; EP – Educação Patrimonial; ICB – Instituto de Ciências Biológicas; IGC – Instituto de Geociências; EEFFTO - Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional; ECI - Escola de Ciência da Informação; COLTEC – Colégio Técnico da UFMG; - FACE – Faculdade de Ciências Econômicas; FAE - Faculdade de Educação; FAFICH - Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas; CEDEPLAR - Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional de Minas Gerais; CP – Centro Pedagógico. ).


Os aspectos educacionais e do desenvolvimento sustentável são abordados de maneira prescritiva e argumentativa, com grandes narrativas feitas em muitas áreas de conhecimento. Supõe-se que estes recursos linguísticos podem interferir nos modos de agir e de pensar do ser humano e induzi-los a reagir e interagir com as propostas apresentadas. O suporte mais frequente é o livro (46). Também foram encontrados 12 trabalhos de natureza acadêmica, os quais se atêm aos estudos mais especializados sobre as ações sociais no meio ambiente. 


A EA pode ser interpretada de maneira polivalente pelo embate de ideias. Para o termo “práticas de Educação Ambiental” é essencial mencionar a incidência de chamadas para as práticas escolares de leitura e escrita, e não para as práticas lúdicas de EA. Pode-se entender que nestes estudos a EA é vista como um fazer didático-pedagógico para apresentar conteúdos, fixar e avaliar desempenhos. A dimensão ambiental deixa de ser a base para as discussões emergentes que articulam as comunidades locais com o processo de socialização e construção da cidadania planetária. 


Embora fossem feitas tentativas de busca com variação de palavras-chave, ocorreu constantemente a repetição de Universidade Federal de Minas Gerais certo grupo de trabalhos. A busca feita eletronicamente procurou os trabalhos de educação e suas especialidades, porque ela não encontra aqueles trabalhos que aderem posições interdisciplinares. O ambiente e o patrimônio aparecem em separado, por vezes apresentando soluções técnicas para problemas que são de natureza sociocultural. Não se compreende o ambiente físico contextualizado em uma rede complexa de inter-relações entre natureza, tecnologia, objetos e seres vivos. 


Neste universo de pesquisa estão inseridos os dezessete trabalhos que tratam especificamente da EA e que foram analisados neste artigo sob o enfoque político e educativo. Considerando que neles foi criado um espaço de reflexão das ações humanas sobre o ambiente físico, e que o papel da EA foi de inserir mudanças no cotidiano, os autores procuraram criar metodologias e materiais didáticos promotores de novos valores, hábitos e atitudes. Três aspectos se destacaram neste processo analítico: compreensão de mundo; políticas públicas; e a formação de educadores.


Educação ambiental e a legalidade


As políticas públicas, aqui compreendidas como espaço de diálogos, de responsabilidade e de abertura a fim de se estabelecer pactos entre os agentes participantes, quando voltadas para o meio ambiente e educação, precisam coexistir com outras e com o modelo de desenvolvimento dominante.


Celeste (1995)CELESTE, Maria de Fátima. Fragmentos de educação ambiental e cidadania. In: SORRENTINO, Marcos et al. (Orgs.). São Paulo: Gaia, 1995. Cadernos do III Fórum de Educação Ambiental. p. 49-58.

, ao colocar conceitos de EA de diferentes autores, mostra que a educação ambiental foi concebida dentro dos princípios universais da democracia: comprometimento com o futuro e com um novo ideário comportamental, recriação de valores perdidos, e cidadania enquanto conjunto de direitos e obrigações contextualizados na realidade das diferenças e dos diferentes. 


Cidadania faz parte do contexto de ação política, e na EA, os docentes e discentes trabalham com suas implicações em espaços físicos e simbólicos. Ela “como qualquer outra prática social, pode se articular aos atores da democratização, na construção de novas bases éticas, políticas e ambientalmente sustentáveis para as interações entre a sociedade e natureza” (CARVALHO, 1995, p. 60)CARVALHO, Isabel. Movimentos sociais e políticas de meio ambiente: a educação ambiental aonde fica?. In: SORRENTINO, Marcos et al. (Orgs.). São Paulo: Gaia, 1995. Cadernos do III Fórum de Educação Ambiental. p. 58-62.

.

Foram as iniciativas internacionais do final do século XX que promoveram a oficialização da EA. No Brasil, a criação da Secretaria Especial de Meio Ambiente em 1973, a Política Nacional do Meio Ambiente – PNEA - em 1981 e a Política Nacional de Educação Ambiental de 1999 impulsionaram a entrada das questões ambientais no campo educacional. Essas ações, contínuas, permanentes e identificadas como um processo vão se modificando na medida em que incorporam sentidos e significados relevantes para o envolvimento das pessoas na valorização da vida e do ambiente. 


Nesse contexto, tanto em âmbito internacional quanto nacional, a EA foi “institucionalizada por meio de leis, decretos, regulamentos, programas de governo, diretrizes curriculares, projetos político-pedagógicos e práticas educativas orientadas por várias concepções teórico-metodológicas” (LASMAR; MAGALHÃES, 2007, p. 20)LASMAR, Idárci Esteves; MAGALHÃES. Márcia Andréa Nogueira. Comissão Interinstitucional de Educação Ambiental de Minas Gerais: uma proposta de participação cidadã. Minas Gerais: Multicromo, 2007.. O parecer do Ministério da Educação – MEC - de 1991 determinou a transversalidade da EA na educação escolar e em 1996 no ensino não-formal, com a assinatura de um protocolo de intenções entre os ministérios do Meio Ambiente e da Educação. 


Um destaque especial para a questão da institucionalização da EA no ensino foi a aprovação, pelo Conselho Nacional de Educação do MEC, das Diretrizes Nacionais Curriculares para a EA e para a educação indígena. Elas são necessárias para a efetivação dos princípios e objetivos instituídos na PNEA. O documento nasceu dos diálogos entre a sociedade civil e instâncias governamentais. “Essas diretrizes orientarão as políticas pedagógicas da educação infantil à universidade, porque o que vale mesmo é quando as práticas chegam à sala de aula”, afirmou o ministro” (ASSINADAS..., 2012)ASSINADAS diretrizes curriculares para educação ambiental e indígena no País. Disponível em: <http://www.brasil.gov.br/noticias/arquivos/2012/06/14/assinadas-diretrizes-curriculares-para-educacao-ambiental-e-indigena-no-pais>. Acesso em: 2 jul. 2012.

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. 


No Estado de Minas Gerais, os projetos e programas de EA tomaram novos rumos a partir dos anos 1990 com as parcerias feitas entre setor público, setor privado e o terceiro setor. No ensino formal ela é desenvolvida como prática educativa interdisciplinar, diferenciada do ensino propedêutico, porque trabalha com o desenvolvimento da sensibilização, da percepção, interiorização de valores e a criação de significados. 


Os problemas ambientais existentes, percebidos e priorizados pela comunidade escolar devem ser discutidos, avaliados, criticados dentro da escola com a participação de todos, professores, alunos, e comunidade externa de tal forma que a escola se abra, extrapole seus muros, rompa suas paredes e vá de encontro às reivindicações da rua, do bairro, da cidade, etc. (GONÇALVES, 1990, p. 128)GONÇALVES, Dalva, R. P. A educação ambiental e o ensino básico. In: SEMINÁRIO NACIONAL SOBRE UNIVERSIDADE E MEIO AMBIENTE, 4., 1990, Florianópolis. Textos básicos. Florianópolis: UFSC, 1990, p. 125-146.


Depois de lançadas as diretrizes da Eco-1992 (Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (CNUMAD)), as atividades educacionais receberam novas orientações. Nos órgãos do governo de Minas Gerais “destaca-se a produção de publicações específicas para professores e alunos” (LASMAR; MAGALHÃES, 2007, p. 36)LASMAR, Idárci Esteves; MAGALHÃES. Márcia Andréa Nogueira. Comissão Interinstitucional de Educação Ambiental de Minas Gerais: uma proposta de participação cidadã. Minas Gerais: Multicromo, 2007.(LASMAR; MAGALHÃES, 2007, p. 36), a promoção de evento pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, o Programa Ambientação – Educação Ambiental em prédios do governo, o Programa de Educação Ambiental do Estado de Minas Gerais, e a criação do Grupo Técnico de Educação Ambiental no Instituto Estadual de Florestas (ambos em 2005). 


Entretanto, o marco que propiciou a legitimação da Educação Ambiental como política pública, agregando as várias abordagens, princípios e objetivos dados à Educação Ambiental foi a promulgação da Lei n. 9.795, de 27 de abril de 1999, que dispõe sobre a Política Nacional de Educação Ambiental - PNEA e determina a inclusão da Educação Ambiental, de modo organizado e oficial, no sistema escolar brasileiro e nos outros segmentos da sociedade (LASMAR; MAGALHÃES, 2007, p. 44)LASMAR, Idárci Esteves; MAGALHÃES. Márcia Andréa Nogueira. Comissão Interinstitucional de Educação Ambiental de Minas Gerais: uma proposta de participação cidadã. Minas Gerais: Multicromo, 2007..


No meio acadêmico, se observarmos as poucas publicações na área, retratadas no quadro 1, podemos afirmar que a contribuição científica da Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG - para as discussões ambientais é pequena. A organização universitária ainda carece de estrutura interdisciplinar para tratar a complexidade das questões ambientais. Na pós-graduação, a introdução do tema aconteceu por meio de projetos de pesquisa e criação de cursos. Dentre os quase 90 cursos de especialização e os 70 cursos de mestrado e doutorado, destacam-se poucos que aprofundam a questão ambiental na UFMG. Citamos os principais: “Ecologia, Conservação e Manejo da Vida Silvestre (níveis de Mestrado e Doutorado)”; “Engenharia Sanitária e Tecnologia Ambiental”; e “Curso de Especialização em Saneamento e Meio Ambiente”.


Ao recorrer aos sites de busca, encontram-se cursos avulsos de Educação Ambiental promovidos pela Universidade Federal de Minas Gerais. Por exemplo, no ano 2000, a instituição promoveu cursos de capacitação do trabalhador em que foram abordadas questões de EA. O Núcleo de Estudos e Pesquisas em Educação Ambiental promove cursos de extensão e o programa multidisciplinar de Educação Ambiental da Pró-Reitoria de Extensão trabalha com as questões de gestão de resíduos sólidos. Dentre suas metas, as propostas de Educação Ambiental para a UFMG devem ultrapassar o caráter técnico e operacional da gestão dos resíduos sólidos. “O processo de sensibilizar passa por vários sentidos, estimulando o ser como um todo. Nesse aspecto, a proposta de Lixo e Criatividade procura valorizar o emocional, as sensações, ao transformar o lixo em algo belo, mas, nem por isso, menos preocupante” (EDUCAÇÃO..., 2012)EDUCAÇÃO ambiental voltada para o lixo. Disponível em: <https://www.ufmg.br/proex/geresol/educambiental.html>. Acesso em: 6 ago. 2012.
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. 


Destacam-se os programas educativos de visitação e de pesquisas feitos em uma unidade de conservação urbana. No campus Pampulha da Universidade Federal de Minas Gerais situa-se a Estação Ecológica que oferece atividades de EA, dentre outras, para a comunidade interna e externa durante o ano todo. Existem programas de capacitação para monitores, os quais, juntamente com e as equipes da coordenação e dos funcionários enfatizam que o rompimento das fronteiras entre as disciplinas pode acontecer fora do ambiente escolar. Conforme a observação de Telésforo (2009, p. 8)TELÉSFORO, Gizelle Barbosa. Estação Ecológica da UFMG: espaço de conhecimento, prática da educação ambiental e conservação da natureza. ENCONTRO NACIONAL DE PRÁTICA DE ENSINO DE GEOGRAFIA, 10., 2009, Porto Alegre. Anais.... Porto Alegre: UFRGS, 2009. p. 1-17., “a formação de uma equipe de monitores tão diversa segundo os campos do conhecimento proporciona grande aprendizado, pois torna possível o diálogo multidisciplinar frente à temática ambiental”. 


Um entendimento das funções legais no processo de Educação Ambiental, e a sua força no discurso dos trabalhos analisados foram fundamentais para compreender as relações entre políticas de ensino, interdisciplinaridade e medidas de proteção ambiental. Passamos a seguir ao estudo pormenorizado do conjunto de trabalhos de conclusão de curso de graduação (2), monografias (2), dissertações (12) e teses (1) defendidas em três instâncias da Universidade Federal de Minas Gerais: nas faculdades (7), nos institutos (6) e nas escolas (4). 


Sintonia das propostas de ações ambientais com os princípios da política nacional de EA

As propostas da EA idealizadas pela Política Nacional e executadas pelo Ministério da Educação - MEC- são bastante normativas e prescritivas, com foco na responsabilidade individual diante das questões ambientais e dos discursos de “conscientização” que se interpõem entre os conflitos e os interesses diversos. Este contexto pode ser visto nos textos que compõem os artigos da Lei Federal n. 9.795/99 (BRASIL, 1999)BRASIL. Lei n. 9.795 de 27 abr. 1999 (Dispõe sobre a educação ambiental, institui a Política Nacional de Educação Ambiental e dá outras providências). Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9795.htm>. Acesso em: 2 maio 2011.

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. Ali estão implícitos os conceitos de homem/mulher-ambiente, de sociedade e de educação que configuram uma multiplicidade de ações e trocas possíveis. Palharini (2007)PALHARIN I, Luciana. Conhecimento disciplinar: (im)possibilidades do discurso sobre a problemática ambiental. Pesquisa em Educação Ambiental, São Carlos, v. 2, n. 2, p. 29-48, jul./dez. 2007.

 diz que eles ao mesmo tempo em que garantem a legitimidade, fazem proliferar as diversidades. 


A EA da forma como é proposta pelo MEC, é, ainda, normativa e centralizada na conduta da responsabilidade e éticas individuais. [...] Territorializa um posicionamento diante do tema ao prescrever uma série de condutas lógicas e politicamente corretas, mesmo que suas intenções sejam as de enfatizar a responsabilidade de todos os cidadãos perante tais questões (p. 42).


Na proposta das Diretrizes Nacionais Curriculares, o procedimento é semelhante. Considerada pela sociedade como parte do percurso histórico da EA pela sua inclusão nas diferentes modalidades e níveis de ensino, elas ainda são normativas e carecem de diretrizes operacionais e pedagógicas para trabalhar suas características de interdisciplinaridade e transversalidade inseridas em um complexo contexto de desafios políticos, econômicos, sociais e culturais.

Por estes motivos, é essencial que as Diretrizes Curriculares Nacionais do CNE auxiliem no dever atribuído constitucionalmente ao Estado de promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente (C.F., art. 225 § 1º inciso VI) e na implementação das Políticas Nacionais de Educação Ambiental e de Meio Ambiente (estabelecidas pela Lei nº 9.795, de 27.04.99, regulamentadas pelo Decreto nº 4.281, de 25.06.2002, e pela Lei nº 6.938/81) que exigem também do ensino formal o dever de capacitar as pessoas, em todos os níveis e modalidades de ensino, para a participação ativa na defesa do meio ambiente (BRASIL, 2012)BRASIL. Lei n. 9.795 de 27 abr. 1999 (Dispõe sobre a educação ambiental, institui a Política Nacional de Educação Ambiental e dá outras providências). Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9795.htm>. Acesso em: 2 maio 2011.

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Com o intuito de compreender este processo, no nosso estudo, de natureza qualitativa e interpretativa, foram selecionados alguns artigos do capítulo I e II – da Política Nacional de EA, considerados relevantes e abrangentes. Foram confrontados os conteúdos dissertativos de aprofundamento sobre as contradições provocadas pelo modelo de desenvolvimento com os esforços do governo para programar suas metas de sustentabilidade e de qualidade de vida. Comentamos a seguir como os princípios e objetivos podem construir representações capazes de serem reproduzidas em pesquisas-ação e em pesquisas de natureza bibliográfica. 


No quadro 2, que associa os títulos dos trabalhos com os textos do capítulo I e II, verificamos as incidências de casos que se travam entre os interesses políticos presentes na legislação (artigos) e os diferentes enfoques sobre as relações sociedade e ambiente (trabalhos). Destacamos em especial aqueles referentes à formação profissional e ao papel da escola para trabalhar com as questões educacionais e ambientais. 


Dada a amostra dos 17 trabalhos, podemos verificar que os sete primeiros trabalhos associam a educação formal aos programas institucionais. Eles tratam do processo educativo e dos Parâmetros Curriculares Nacionais. As análises de casos e ações foram de natureza qualitativa documental (4) e análise qualitativa com pesquisa de campo (3). Três trabalhos (8, 9 e 10) tratam das relações com a comunidade, com pesquisas feitas in loco. Um deles faz interações do processo de EA com comunidades rurais e dois com comunidades urbanas. Há três estudos que abordam vivências agro-ecológicas com hortaliças em escolas de ensino fundamental e em comunidades. Tal como observado por Marcos Reigota em suas pesquisas, tratam-se de projetos específicos e por vezes sem continuidade. O autor (citado por CARVALHO, 2008) também identificou que há predomínio de estudos no ensino fundamental. A maior parte das pesquisas visa avaliar projetos específicos que são desenvolvidos nas escolas, enfocando a interdisciplinaridade presente na estrutura curricular.


Há dois trabalhos de natureza técnica (11 e 12). Eles estão inseridos adequadamente nos requisitos da PNEA dos capítulos I e II. Ambos desenvolvem estudos e experimentações que estimulam a participação individual e coletiva na preservação do equilíbrio do meio ambiente. Um deles avaliou o emprego da Educação Ambiental para usuários (residentes e alunos) de equipamentos sanitários economizadores na redução do consumo de água (11). A autora utilizou o conceito da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, UNCED 1992 para justificar sua pesquisa-ação: capacitar uma população consciente e preocupada com o meio ambiente e com os problemas a ele associados (VIMEIRO, 2005)VIMIEIRO, Gisele Vidal. Educação ambiental e emprego de equipamentos economizadores na redução do consumo de água em residências de famílias de baixa renda e em uma escola de ensino fundamental. Dissertação (Mestrado) - Escola de Engenharia da Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2005.


Quadro 2
Política Nacional de Educação Ambiental: normas e prescrições presentes nos títulos dos trabalhos da UFMG - 1998-2011



Fonte: Elaborado pelas autoras.


O outro (12) optou por uma abordagem geomorfológica e ambientalista para encontrar soluções para problemas encontrados nas atividades agrícolas. O autor acredita que esta mesma metodologia poderia ser aplicada também para as atividades mineradoras, de alto impacto negativo no ambiente físico (MELGAÇO, 1999)MELGAÇO, Jairo. Geomorfologia, Educação Ambiental e produção agrícola em municípios do alto Jequitinhonha - Serra do Espinhaço Meridional – MG. Dissertação (Mestrado) - Instituto de Geociências, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 1999.

. Seria o caso do trabalho número 13, que trata da EA em empresa mineira. Apesar de ela fazer parte das atividades cotidianas empresariais, há carência de metodologias capazes de mudar as ações negativas encontradas nos processos produtivos. A empresa adota posições estratégicas para atender as reivindicações dos órgãos governamentais, porém elas continuam sendo conservadoras. 


Braga (1995)BRAGA, Tânia. Educação ambiental, economia internacional e gestão empresarial. In: SORRENTINO, Marcos et al. (Orgs.). São Paulo: Gaia, 1995. Cadernos do III Fórum de Educação Ambiental. p. 215-227.

, ao estudar as relações entre EA, economia internacional e gestão empresarial diz que existem três posturas empresariais diferenciadas quanto à visão do meio ambiente. A denominada “conservadora” associa o marketing, a moda e o meio ambiente, sem avaliar as implicações que existem nos seus modos de produzir. A “legalista” considera que o Estado coloca empecilhos – controle, fiscalização - no seu agir, mas que na realidade são os reais motivadores da adoção e o uso de equipamentos fabricados com tecnologias limpas. A terceira e última é a “estratégica”, na qual existem interesses por parte da empresa em participar das vendas internacionais e adquirir certificações de qualidade ambiental. Por isso ela implanta a Educação Ambiental. Conforme a autora, a EA deveria possuir como principais objetivos trabalhar com os empregados e com as comunidades externas os seguintes temas: 


[...] as relações entre poluição e tecnologias utilizadas; a responsabilidade socioambiental da empresa e de cada um de seus empregados; a responsabilidade socioambiental de cada cidadão; a divulgação sistemática dos índices de monitoramento da qualidade ambiental na região; a dimensão social e política da problemática ambiental regional (BRAGA, 1995, p. 223)BRAGA, Tânia. Educação ambiental, economia internacional e gestão empresarial. In: SORRENTINO, Marcos et al. (Orgs.). São Paulo: Gaia, 1995. Cadernos do III Fórum de Educação Ambiental. p. 215-227.

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O principal compromisso da EA é fomentar mudanças de conduta quanto ao modo de utilizar os recursos naturais. Se a natureza for entendida como fornecedora de matérias primas e de energia, haverá sempre aqueles que não “traduzirão” a diversidade de pensamentos, ações e culturas como determinantes no cenário global. Pode acontecer de não vermos os espaços do cotidiano que são dominados por imagens culturais e midiáticas. Então, retomando as ideias de René Barbier (2005)BARBIER, René. Vers une éducation transversale. Bulletin Interactif du Centre International de Recherches et Études Transdisciplinaires n° 18 - Mars 2005. Disponível em: <http://basarab.nicolescu.perso.sfr.fr/ciret/bulletin/b18/b18c3.htm>. Acesso em: 2 ago. 2012.


http://basarab.nicolescu.perso.sfr.fr/ci...
e de Paul Hart (2009)
>HART, Paul. Em resposta a “Isto não é bom o suficiente”: reflexões sobre a pesquisa em Educação Ambiental no Canadá em contextos de expansão. Educação em Revista, Belo Horizonte, v. 25, n. 3, p. 159-190, dez. 2009..


Adquirir mais consciência de que tais ideias estão relacionadas à cultura no sentido de uma reconceituação de conexões entre a natureza, a cultura, a educação e o meio ambiente parece significar o enfrentamento de questões de valor que formam a base da diversidade cultural e do caráter único do indivíduo [...] (HART, 2009, p. 175)
>HART, Paul. Em resposta a “Isto não é bom o suficiente”: reflexões sobre a pesquisa em Educação Ambiental no Canadá em contextos de expansão. Educação em Revista, Belo Horizonte, v. 25, n. 3, p. 159-190, dez. 2009.. 


O trabalho 14 trata deste tema, na medida em que procura focar a educação ambiental e o turismo como formas políticas de inserir novamente o adolescente autor de ato infracional na sociedade. São questões cruciais, que fazem parte do fortalecimento da cidadania, cujas dimensões são controversas e exigem mudanças sociais e culturais dos educadores, os quais precisam aprender a trabalhar com a mente aberta para diferentes relações com os outros. “A educação apresenta-se, então, como importante instrumento para a adoção de um novo universo de valores. Agindo sobre os indivíduos, a educação agiria também sobre a sociedade, uma vez entendido que indivíduos e sociedade se co-produzem, num circuito recursivo permanente” (PIVA, 2005, p. 69)PIVA, Adriana. Apropriação do pensamento de Edgar Morin na pesquisa em Educação Ambiental no Brasil. Dissertação (Mestrado em Educação) – Programa de Pós-Graduação em Educação: conhecimento e inclusão social, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2005

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A autora afirma que o ensino está impregnado de valores, que precisam ser discutidos e confrontados em situações de interdisciplinaridade, nas teorias e nas práticas, considerando toda a complexidade da construção do conhecimento. Estas ideias estão presentes no trabalho 15, que aborda as influências do pensador francês Edgar Morin no campo da EA. A PNEA considera o pluralismo de ideias e concepções pedagógicas, na perspectiva da inter, multi e transdisciplinar fundamentais para compreender mais e se equivocar menos (PIVA, 2005)PIVA, Adriana. Apropriação do pensamento de Edgar Morin na pesquisa em Educação Ambiental no Brasil. Dissertação (Mestrado em Educação) – Programa de Pós-Graduação em Educação: conhecimento e inclusão social, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2005

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Os trabalhos 16 e 17 também posicionam a EA no pensamento complexo de Morin. Segundo o autor, lutamos constantemente com as forças do erro e da ilusão, que obscurecem a lucidez. Precisamos trabalhar com as incertezas para buscarmos soluções para os problemas ambientais. Do conteúdo do capítulo I da PNEA, não foram encontrados trabalhos sobre a conservação recuperação e melhoria do meio ambiente; a articulação entre os níveis e modalidades de ensino (Diretrizes Nacionais da EA em 2012); a cooperação entre as regiões do País, com vistas à construção de uma sociedade ambientalmente equilibrada; e o fomento e integração com a ciência e a tecnologia. 


Do capítulo II foram considerados pontos fracos na argumentação dos trabalhos classificados os seguintes temas: produção e divulgação de material educativo (que demanda investimentos e gastos); incorporação da dimensão ambiental na formação, e especialização e atualização dos educadores de todos os níveis e modalidades de ensino (Diretrizes Nacionais da EA em 2012); e a preparação de profissionais orientados para as atividades de gestão ambiental.


Diferentes enfoques


A seguir, mostramos em um quadro ilustrativo n. 3 a distribuição dos trabalhos em relação às disciplinas. Verificamos uma forte relação entre os cursos de mestrado e doutorado, os temas desenvolvidos, e os diferentes enfoques da educação ambiental. Há mais trabalhos sobre a educação formal, em particular sobre a atuação dos docentes de ensino fundamental.


A maior parte das áreas do conhecimento apresenta alguma atuação na esfera da educação, sendo que algumas delas incorporam o ensino fundamental e médio. A Geografia é uma área de conhecimento que vem tendo, ao longo do tempo, um estreito relacionamento com esses níveis do ensino (MELGAÇO, 1999, p. 12)MELGAÇO, Jairo. Geomorfologia, Educação Ambiental e produção agrícola em municípios do alto Jequitinhonha - Serra do Espinhaço Meridional – MG. Dissertação (Mestrado) - Instituto de Geociências, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 1999.

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Quadro 3
Classificação da amostra por área de conhecimento - EA na UFMG



Fonte: Elaborado pelas autoras. 


O enfoque educativo foi predominante. Nos pressupostos básicos deste olhar está o comportamento do docente frente a sua profissionalização. Ainda faltam cursos de capacitação para o educador ambiental, os quais sejam estimuladores do desenvolvimento de valores, atitudes e comportamentos sustentáveis. E também do uso de técnicas para o conhecimento de si mesmo, conforme a teoria do professor René Barbier. Há trabalhos que enfocam o desenvolvimento pessoal do docente, em especial daqueles que trabalham na zona rural. Há também um enfoque baseado na legislação que trata da responsabilidade pessoal sobre as ações no meio ambiente planetário. O olhar sobre a educação popular perpassa a maioria dos trabalhos, em especial no que tange à diversidade de experiências, a cidadania, aos comportamentos e à prestação de serviços para as comunidades carentes. 


Podemos afirmar também que nos trabalhos não foram aprofundados os temas referentes às grandes problemáticas ambientais discutidas nas reuniões internacionais: desenvolvimento sustentável, poluição, mercado de carbono, economia verde, pobreza e governança internacional. Classificamos numericamente, a seguir os trabalhos relacionando aos seus conteúdos e às problemáticas da Educação e do Meio Ambiente. Pode ocorrer que um mesmo trabalho esteja inserido em mais de uma categoria. Constatamos que o enfoque educativo é o que contém mais trabalhos e que a temática ambiental vem em seguida, ainda que nenhum trabalho tenha este enfoque como objetivo específico das pesquisas.


Quadro 4
Classificação dos trabalhos pelo conteúdo - EA na UFMG – 1998-2011

Fonte: Elaborado pelas autoras com base na classificação de Marcos Reigota (2002
REIGOTA, Marcos. O estado da arte da educação ambiental no Brasil. Tópicos em Educação Ambiental, México, v. 4, n. 11, p. 49-62, 2002.;2009)REIGOTA, Marcos. O que é educação ambiental. São Paulo: Brasiliense, 2009..

Outra classificação foi feita durante a leitura dos textos que está diretamente relacionada aos artigos da PNEA. Foi verificada a aproximação parcial, total e nula dos trabalhos com os enfoques da EA preconizados na Lei que cria a Política Nacional. Por vezes, os trabalhos tiveram mais de um enfoque.

Quadro 5
Enfoques dos trabalhos segundo a Lei Federal 9.795/1999

Fonte: Elaborado pelas autoras.


Dois enfoques que, em grande parte, não contribuíram para a produção de conhecimentos didático-pedagógicos de EA, foram o higienista, e o tecnológico e científico (17). Lima e Copello (2007)
LIMA, Cleiva Aguiar; COPELLO, Maria Inês. Educação ambiental desde o enfoque ciência, tecnologia, sociedade (CTS) – um possível caminho. Pesquisa em Educação Ambiental, São Carlos, v. 2, n. 2, p. 173-196, jul./dez. 2007. acreditam que a inserção de discussões e atividades sobre ciência e tecnologia com abordagens metodológicas que conduzam discentes e docentes a desenvolver capacidades de reflexão, argumentação crítica, participação e cooperação em situações de trabalho educativo contribui para ampliar o escopo da EA. Esta abordagem “constitui-se numa linha de trabalho de caráter interdisciplinar que discute a natureza social do conhecimento cientifico e tecnológico e suas implicações nos diferentes âmbitos econômicos, sociais, ambientais e culturais” (p. 179). 


Em média, 50% dos trabalhos apresentaram um enfoque sistêmico, humanista e participativo para abordar temas de EA. Com exceção de um trabalho, a amostra dos textos apresentou as metodologias de pesquisa-ação e estudo de caso. Tozoni-Reis (2007)TOZONI-REIS, Marília Freitas de Campos. A construção coletiva do conhecimento e a pesquisa-ação participativa: compromissos e desafios. Pesquisa em Educação Ambiental, São Carlos, v. 2, n. 2, p. 89-107, jul./dez. 2007.
 explica que as pesquisas participativas estão em processo de consolidação na EA e elas contêm as seguintes categorias de análise: 1 - mediação do educador no processo grupal (5); 2 - temas ambientais como geradores de um processo educativo (5); 3 -participação (5); 4 - possibilidades e limites da pesquisa-ação participativa em EA (0) (p. 89). 


Os números entre parênteses representam os trabalhos da amostra. No item 1, estão os trabalhos que trataram da formação docente, seja na sua atuação em sala de aula, seja em cursos específicos. No item 2, foram agrupados as pesquisas que analisaram práticas escolares de EA e discussões conceituais. No item 3 foram classificados os seguintes tipos de participação: a participação do docente nas atividades de EA; a do discente, a das Organizações Não Governamentais – ONG’s, a do setor público e a do setor privado. Vale destacar que algumas pesquisas tiveram a participação coletiva no sentido de envolverem a comunidade nas suas ações. Não houve nenhum estudo sobre a avaliação das pesquisas realizadas. 


Reigota (2009) e Tozoni-Reis (2007)TOZONI-REIS, Marília Freitas de Campos. A construção coletiva do conhecimento e a pesquisa-ação participativa: compromissos e desafios. Pesquisa em Educação Ambiental, São Carlos, v. 2, n. 2, p. 89-107, jul./dez. 2007.
explicam que na pesquisa-ação os sujeitos trabalham com a complexidade das realidades sociais, as quais exigem que as perspectivas sistêmicas e humanistas façam parte da construção dos métodos. “A metodologia, então deve abordar o conjunto das expressões humanas” (p. 151). Ao mesmo tempo em que os docentes e discentes precisam dominar os conceitos básicos necessários para a compreensão da educação para o meio ambiente, eles precisam questionar a contextualização cultural e temporal desses saberes e conhecimentos que fundamentam o raciocínio lógico, as ações, o saber-fazer e o saber-ser sistêmico. Neste conjunto, as relações e as ligações entre os elementos são fluidas. “Ou seja, é único, mas também é múltiplo, sendo que é composto por vários outros (sub) sistemas” (LIMBERGER, 2006, p. 99)
LIMBERGER, Leila. Abordagem sistêmica e complexidade na geografia. Geografia, Londrina, v. 15, n. 2, p. 95-109, jul./dez. 2006. Disponível em: <http://www.uel.br/revistas/geografia>. Acesso em: 12 ago. 2012.. 


São quatro elementos relevantes para que abordagem humanista faça parte das práticas escolares: o docente representa o papel de facilitador da aprendizagem; há abertura da organização escolar para que o discente possa desenvolver e alcançar sua autonomia; o aluno precisa ser ativo e participativo durante o processo ensino-aprendizagem; e os conteúdos disciplinares são discutidos e avaliados em interação com os discentes (SANTOS, 2005)
SANTOS, Roberto Vatan. Abordagens do processo de ensino e aprendizagem. Revista Integração Ensino-Pesquisa-Extensão, São Paulo, v. 9, n. 40, p. 19-31, jan./maio 2005..


Conclusão


Na pesquisa realizada na UFMG, mesmo que tenha havido uma distribuição dos trabalhos restrita ao escopo de disciplinas, a EA não deixou de estar articulada com os processos educativos ocorridos de maneira formal e não-formal. Os pesquisadores recorreram a metodologias e bibliografias diversas, o que pode ser um indicativo da interdisciplinaridade. É preciso considerar que os Programas de Pós-Graduação estão organizados em áreas do conhecimento, com especialidades identificadas nas linhas de pesquisas, e com um corpo de orientadores que tem seus interesses de trabalho. Por isso, a EA se insere neste contexto com um enfoque transversal às disciplinas, às pesquisas, às práticas e às teorias, integrando o indivíduo, o meio natural, a cultura e a sociedade. 


As tendências, as implicações e os interesses pelo tema variaram por duas razões: uma pela própria característica da EA quanto a sua não-disciplinaridade e outra, pelas possibilidades de entrecruzar conteúdos disciplinares com enfoques ambientais. Neste sentido, o enfoque sobre a educação foi mais incisivo do que sobre o meio ambiente, considerando que a organização textual esteve atrelada aos objetivos dos diferentes programas de pós-graduação e interesses de pesquisa dos orientadores. 


Os 17 textos que trouxeram no título o termo “Educação Ambiental” foram classificados nas disciplinas de Geografia, Educação, Engenharia e Arquitetura. Nove trabalhos abordaram o tema sobre as perspectivas sistêmica e humanista. Este resultado aponta um progresso em direção à tão almejada não-compartimentalização do conhecimento. Apesar da incompatibilidade entre as teorias e as práticas, a quase totalidade dos trabalhos fez uso dos recursos dos métodos de pesquisa-ação e estudo de caso para trabalhar as complexidades das relações sociais. 


Entendemos que as pesquisas dos autores não tiveram enfoque crítico da legislação. Os esforços se concentraram nas citações dos documentos legais e na busca de alternativas existentes para idealizar situações educativas capazes de promover novos saberes e conhecimentos sobre cidadania e meio ambiente. Porém, há uma sintonia entre a EA e as questões de legalidade, pois sem elas, não haveria condições de inseri-la no ambiente escolar. Quase 50% das pesquisas realizaram-se em escolas, as quais procuraram integrá-la no planejamento escolar, na capacitação de pessoal para trabalhar a dimensão ambiental e no desenvolvimento de estudos e projetos de pesquisa. 


Grande parte dos trabalhos está relacionada com a formação de professores para atuarem como educadores ambientais. Muitas dificuldades foram apontadas no sentido de transformar as práticas tradicionais e conservadoras de ensino e organizar um fazer educativo em consonância com a complexidade do mundo global. Esse novo perfil didático-pedagógico contribui para a formação também de discentes com opiniões formadas, capazes de participar de discussões, debates e processos de tomada de decisões. 


Este panorama da produção acadêmica de EA na Universidade Federal de Minas Gerais é uma forma de divulgação das pesquisas sobre educação e meio ambiente que circulam nas diferentes áreas de conhecimento. Pode-se dizer que ainda não há um ambiente privilegiado para a produção do conhecimento que se ocupa desta problemática em específico. Sem dúvidas, o nosso apelo se estende para a superação destes resultados e para a mobilização que precisa existir entre os pesquisadores para se criar uma base de conhecimentos neste campo, tanto na graduação quanto na pós-graduação. 


Mudamos nossas representações sociais de educação e meio ambiente quando introduzimos temas das ciências humanas e das ciências naturais em diferentes especialidades do conhecimento. Acreditamos que a educação é o resultado da mediação dialógica entre os saberes e conhecimentos do docente com o conhecimento de si mesmo. Do mesmo modo, esta ideia é válida para os discentes e para a comunidade como um todo. Na medida em que nos transformamos, transformamos o mundo e a realidade que vivemos. 


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  • 1
    A classificação das Áreas do Conhecimento idealizada pela CAPES se dá em quatro níveis e abrange 8 grandes áreas, 76 áreas e 340 subáreas do conhecimento. Em janeiro de 2008, foi criada a Grande área Multidisciplinar que contém as seguintes áreas: Interdisciplinar, Ensino de Ciências e Matemática, Materiais e Biotecnologia, Meio Ambiente e Ciências Agrárias, Engenharia, Tecnologia, Gestão; Saúde e Biológicas e Sociais e Humanidades (CAPES, 2012).
  • 2
    http://catalogobiblioteca.ufmg.br/pergamum/biblioteca/index.php?resolution2=1024_1&tipo_pesquisa=&filtro_bibliotecas=&filtro_obras=#posicao_ dados_acervo. Obs: Há trabalhos que aparecem em mais de uma chamada. Abreviaturas: EA - Educação Ambiental; EP – Educação Patrimonial; ICB – Instituto de Ciências Biológicas; IGC – Instituto de Geociências; EEFFTO - Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional; ECI - Escola de Ciência da Informação; COLTEC – Colégio Técnico da UFMG; - FACE – Faculdade de Ciências Econômicas; FAE - Faculdade de Educação; FAFICH - Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas; CEDEPLAR - Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional de Minas Gerais; CP – Centro Pedagógico.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul 2015

Histórico

  • Recebido
    6 Jun 2012
  • Aceito
    15 Abr 2013
Publicação da Rede de Avaliação Institucional da Educação Superior (RAIES), da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) e da Universidade de Sorocaba (UNISO). Rodovia Raposo Tavares, km. 92,5, CEP 18023-000 Sorocaba - São Paulo, Fone: (55 15) 2101-7016 , Fax : (55 15) 2101-7112 - Sorocaba - SP - Brazil
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