Mapeamento dos Serviços Ecossistêmicos providos pela Área de Proteção Ambiental do Rio Paraíba do Sul

Resumo

Serviços ecossistêmicos (SE) são todos os benefícios fornecidos pelos ecossistemas essenciais à subsistência, bem-estar humano e desenvolvimento econômico e, por consequência, seu reconhecimento é fundamental para o planejamento territorial sustentável. Com objetivo de identificar os SE prioritários fornecidos pela APA das Planícies Aluvionares do Rio Paraíba do Sul e Jaguari, região totalmente integrada à malha urbana de São José dos Campos (SP), realizou-se um estudo colaborativo visando obter a percepção ambiental de atores-chave locais - agentes públicos, pesquisadores e moradores da APA. A análise foi desenvolvida a partir da interpretação de mapas de uso e ocupação do território e adaptação da metodologia Diagnóstico Rápido Participativo (DRP) preconizada no contexto TEEB Regional/Local. Os resultados reiteraram a importância da região, já protegida legalmente, para assegurar a qualidade ambiental local e identificou que os SE prioritários são: água doce, fotossíntese, ciclo de nutrientes, microclima local e regulação dos fluxos d’água.

Palavras-chave:
Serviços ecossistêmicos; estudo colaborativo; Área de Proteção Ambiental; políticas públicas e meio ambiente; planejamento territorial

Abstract

Ecosystem services (ES) are all the benefits provided by ecosystems essential to subsistence, human well-being, and economic development, and, consequently, their recognition is fundamental for sustainable territorial planning. To identify the priority ES provided by the APA of the Alluvial Plains of the Paraíba do Sul and Jaguari Rivers, a region fully integrated into the urban fabric of São José dos Campos (SP), a collaborative study was developed to obtain the environmental perception of location key-actors - public agents, researchers, and APA residents. The analysis was developed from interpreting maps of use and occupation of the territory and adaptation of the Rapid Participatory Diagnosis (RPD) methodology recommended in the TEEB Regional/Local context. The results reiterated the importance of the region, already legally protected, to ensure the local environmental quality and identified the priority ES: freshwater, photosynthesis, nutrient cycle, local microclimate, and regulation of water flows.

Keywords:
Ecosystem Services; Collaborative Study; Environmental Protection Area; Public Policies and Environment; Territorial Planning

Resumen

Los servicios ecosistémicos (SE) son todos los beneficios que arreglan los ecosistemas esenciales para los medios de vida, el bienestar humano y el desarrollo económico. En consecuencia, su reconocimiento es fundamental para la planificación territorial sostenible. Con el fin de identificar los SE prioritarios proporcionados por la APA de las Llanuras Aluviales del Paraíba do Sul y Jaguari Río, que son totalmente integrada con el tejido urbano de São José dos Campos (SP), se realizó un estudio colaborativo para obtener la percepción ambiental de las partes interesadas: agentes públicos, investigadores y vecinos de la APA. El análisis se desarrolló a partir de la interpretación de mapas de uso y ocupación del territorio y la adaptación de la metodología de Diagnóstico Rápido Participativo promovida en el contexto TEEB regional/local. Los resultados reiteraron la importancia de la región para asegurar la calidad ambiental local y identificaron que los tres SE prioritarios eran: agua dulce, fotosíntesis y ciclo de nutrientes.

Palabras-clave:
Servicios Ecosistémicos; Estudio Colaborativo; Área de Protección Ambiental; Políticas Públicas y Medio Ambiente; Participación Pública; Planificación Territorial

Introdução

Atualmente 55% da população mundial reside em áreas urbanas, principalmente em megacidades, e, à medida que a urbanização se intensifica torna-se mais evidente a inter-relação entre o desenvolvimento sustentável e a necessidade de se considerar os benefícios dos ambientes naturais, ou serviços ecossistêmicos (SE), no planejamento do território (ONU, 2018).

Manter o fluxo dos serviços prestados pela natureza de forma equilibrada para as áreas urbanas assegura a regulação do clima, a proteção contra desastres naturais, o atendimento à demanda alimentar e energética, previne a erosão do solo e oferece experiências de recreação, inspiração cultural e espiritual. Para que isso seja sempre possível, os SE devem ser considerados para a formulação de políticas, pois, podem propiciar a redução dos custos futuros das cidades, alavancar as economias locais, melhorar a qualidade de vida e garantir a subsistência. Nesse sentido, a governança ambiental apresenta-se como peça-chave para atingir a Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU) (GIZ; MMA, 2018; SEIXAS et al., 2020).

No desenvolvimento das cidades há uma constante apropriação das paisagens com intervenções que tentam controlar os processos e fluxos naturais. Porém, é preciso adotar uma visão sistêmica integrada de longo prazo, de modo que o planejamento urbano seja baseado nas paisagens que serão seus suportes biofísicos, assim como no contexto histórico e social (Herzog, 2013). Por esta razão, reconhecer os ambientes e os fluxos naturais que eles propiciam, ou seja, seus serviços ecossistêmicos, são tão fundamentais para esta reconexão entre cidade e natureza.

O reconhecimento e a valoração dos serviços ecossistêmicos, em ascensão mundial a partir de 2005 (AGUDELO et al., 2020), ainda são incipientes no Brasil. Entretanto, considerada as diretrizes de política urbana no país que abordam a integração e complementaridade entre as atividades urbanas e rurais além da adoção de limitadores de expansão urbana associados à sustentabilidade ambiental, é possível inferir que a incorporação da temática se faz necessária para que o ordenamento garanta o pleno desenvolvimento das funções sociais das cidades (BRASIL, 2001; CALZOLARI et al., 2020; GÓMEZ-BAGGETHUN; BARTON, 2013). Principalmente quando relacionadas às áreas protegidas, que são instrumentos eficazes de proteção de recursos naturais e seus SE produzem benefícios maiores do que os investimentos de conservação por elas demandados (BUSTAMANTE et al., 2019).

A Área de Proteção Ambiental das Planícies Aluvionares dos Rios Paraíba do Sul e Jaguari (APA/PA-PSJ) foi selecionada para esse estudo devido à importância histórica, ambiental, social e econômica para o município de São José dos Campos (SP). Regionalmente, a área é conhecida como o “mar de São José dos Campos”, nome associado às constantes enchentes do Rio Paraíba anteriores as construções das barragens de Paraibuna/Santa Branca que conferiam a sensação de mar ao banhado. Augusto Emílio-Zaluar, um viajante europeu em peregrinação pela Província de São Paulo em meados de 1860, relatou em sua passagem por São José dos Campos sobre o banhado:

Uma das cousas mais dignas de observar-se nesta localidade são os imensos brejos, a que dão aqui o nome de banhados, e que se estendem em grande distância aos pés da montanha em que está assentada a vila (...) parece que estamos em presença de um mar em constante calmaria (ZALUAR, 1953).

A APA é reconhecida como de elevada importância em todos os níveis de governança, haja vista a sua tripla proteção legal (federal, estadual e municipal). Corresponde a uma vasta planície aluvial que compõe cenário integrado à paisagem urbana do município de São José dos Campos, localizado na Região Metropolitana do Vale do Paraíba e Litoral Norte onde ocupa lugar de destaque - detendo o maior PIB e população da região (PMSJC, 2018). No final do ano de 2018, o Plano Diretor aprovado no município indicou que o local demanda normas específicas de uso e ocupação a serem estabelecidas através da implementação de plano de manejo, com o objetivo precípuo da proteção ambiental e da paisagem natural, de promoção de uso sustentável, em especial para produção agrícola orgânica, incluindo também a lente climática, isto é, reconhecendo seu papel na adaptação às mudanças climáticas.

Devido à importância regional e estratégica da região para a Macrometrópole Paulista, a região demanda uma governança que agregue, de modo participativo e inclusivo, a sociedade civil nas resoluções pertinentes ao debate socioambiental e que abranja um nível de articulação multi-escalar (MARQUES et al., 2020). Principalmente nas decisões que envolvam o gerenciamento da bacia hidrográfica do Rio Paraíba do Sul cujas águas servem para abastecimento público de milhões de pessoas, geração de energia elétrica e supre demandas dos setores industrial e agrícola (PMSJC, 2016).

Segundo Gomes e Andrade, 2020, dentre as problemáticas gerais da bacia hidrográfica do Rio Paraíba do Sul pode-se citar, particularmente, os conflitos socioambientais resultantes do uso e ocupação exploratórios e especulativos da várzea, como aqueles provenientes da extração da areia e expansão urbana e as limitações da gestão de áreas protegidas como estímulo para o desenvolvimento socioeconômico e a preservação de comunidades e culturas.

Em função desse contexto, o presente estudo foi conduzido, com o objetivo de avaliar se a percepção ambiental de diferentes atores sociais é uma técnica adequada para mapear os serviços ecossistêmicos prestados por uma unidade de conservação com múltiplos desafios para a governança, e, como consequência, subsidiar políticas públicas locais de integração e complementaridade com a área urbana do município de São José dos Campos.

Revisão Bibliográfica

Os serviços ecossistêmicos são todos os benefícios oriundos dos processos e sistemas naturais do planeta. A consciência coletiva de que um ambiente natural gera benefícios essenciais ao bem-estar humano remete aos primórdios da humanidade, já o conceito de serviços ecossistêmicos é relativamente novo sendo principalmente utilizado a partir da década de 90 (AGUILAR-GÓMEZ et al., 2020; COSTANZA et al., 1997). Por todo o mundo, comunidades e indivíduos dependem de serviços ecossistêmicos para seus meios de subsistência, bem-estar e desenvolvimento, enquanto empresas utilizam de matérias-primas e recursos fornecidos pelos ecossistemas para produção e crescimento econômico (FILHO et al., 2020; M.A. et al., 2005; RUSCHEL et al., 2020).

As regiões urbanas são demandantes de SE (XIE, ZHANG, et al., 2020) e, ao mesmo tempo, uma das principais fontes de impactos ambientais globais. As cidades dependem de ambientes naturais para a provisão de SE de abastecimento, como por exemplo o fornecimento de água, energia e alimentos, o que acarreta na exportação da degradação ecológica para regiões exteriores ao perímetro urbano (WACKERNAGEL et al., 2006). A demanda de SE das regiões urbanas, em muitos casos é suprida pela disponibilidade desses em zonas rurais ou periféricas de seu entorno e determina inter-relações territoriais que carecem de políticas públicas mais abrangentes que assegurem a sustentabilidade desses usos da terra (KROLL et al., 2012).

No cenário mundial e nacional, o mapeamento de SE para subsidiar as tomadas de decisões vem sendo paulatinamente adotado, trazendo importantes subsídios à governança ambiental, conforme síntese mostrada no quadro 1.

Quadro 1:
Subsídios à gestão pública dos casos de mapeamento de SE

Estudo	Local	Metodologia	Subsidiários à Gestão Pública	Referência
Mapping Ecosystem Services Potential in Lithuania	Lituânia	Abordagem expert-based-ranking combinado com método matriz e análise espacial, para determinar o potencial SE por meio de padrões espaciais e relações entre SE múltiplos.	O estudo concluiu que as áreas de floresta tinham o maior potencial para entrega de SE, enquanto o potencial mais baixo era o de áreas urbanas. Reforçou ainda que a abordagem tem grande capacidade de cobrir grandes áreas geográficas e é eficaz para casos onde há escassez de dados ambientais e sociais.	1
A Performance-Based Planning Approach Integrating Supply and Demand of Urban Ecosystem Services	Trento, Itália	Seleção dos SE baseada em documento público junto a funcionários municipais, sistema de pontuação para desenvolvimento de indicadores nos mapas de oferta e demanda, e avaliação do equilíbrio entre os impactos positivos e negativos nos SE.	As avaliações dos serviços ecossistêmicos podem apoiar a concepção de instrumentos de política pública, contribuindo para iluminar o desconhecimento sobre o papel dos SE nos processos de tomada de decisão. A abordagem é aplicável e transferível para outros contextos, em função de sua flexibilidade.	2
Quantifying and Mapping Ecosystem Service Use Across Stakeholder Groups: Implications for Conservation with Priorities for Cultural Values	British Columbia, Canada	Divulgação previa da pesquisa para estimular participação da comunidade. Realização de entrevistas com desenho de polígonos representando o uso de SE pelos participantes. Análise de sobreposição dos mapas para determinar a provisão de SE: cultural, provisão e grupos combinados.	O mapeamento colaborativo mostrou ser ferramenta adequada para a localização espacial de SE culturais e de provisão em grupos variados de stakeholders. A frequência de reconhecimento dos SE pode determinar as prioridades regionais de conservação.	3
Towards A National Set of Ecosystem Service Indicators: Insights from Germany	Alemanha	Apresentou e discutiu os resultados preliminares da abordagem adotada para a definição de indicadores para a implementação do Mapeamento e Avaliação de Ecossistemas e seus Serviços (MAES) - Objetivo 2 da Estratégia de Biodiversidade - EU.	O adequado planejamento de uso da terra pode aprimorar os SE de provisão. Dados específicos sobre SE ainda são necessários para subsidiar as políticas públicas.	4
Focusing Conservation Efforts on Ecosystem Service Supply May Increase Vulnerability of Socio-Ecological Systems	Argentina e Chile	Estudos de caso realizado na Argentina e Chile, a fim de comparar prioridades de conservação de acordo com os mapas de abastecimento de SE versus mapas de vulnerabilidade socioecológica, através de uma versão melhorada do protocolo ECOSER - ferramenta de mapeamento GIS.	A priorização de conservação deve considerar não apenas os SE atuais, mas suas interações e mudanças temporais. Notou-se forte desacoplamento espacial entre a oferta de SE, vulnerabilidade socioecológica e a perda de serviços ecossistêmicos.	5
Integrating Deliberative Monetary Valuation, Systems Modelling and Participatory Mapping to Assess Shared Values of Ecosystem Services	Estuário do Rio Forth, Escócia	Integração entre modelagem de sistemas conceituais, mapeamento participativo e avaliação monetária deliberativa para avaliar valores compartilhados de SE.	Apenas a avaliação monetária acarretaria um reconhecimento insuficiente dos SE, diferente dos valores expressos por meio do mapeamento participativo, logo, o mapeamento participativo traz aprimoramento para a avaliação monetária dos SE.	6
Percepção dos Serviços Ecossistêmicos de Áreas Verdes Urbanas de Curitiba/PR	Curitiba, Paraná	Pesquisa qualitativa com especialistas em meio ambiente, através da ferramenta Ecosystem Services Review - ESR, com o objetivo de identificar os SE mais importantes no contexto da geração de bem-estar socioeconômico.	A regulação do clima local e a manutenção da qualidade do ar foram apontados como sendo os SE mais importantes prestado pelas áreas verdes em Curitiba. Concluiu-se que os SE analisados, especialmente os mais relevantes, devem ser criteriosamente observados e incorporados na gestão das áreas verdes urbanas, além de apontar quais são considerados como não sendo passíveis de substituição, no caso de supressão das áreas verdes.	7
Mapeamento e Valoração de Bens e Serviços Ecossistêmicos no Semiárido Brasileiro	Bacia Hidrográfica do Rio Taperoá, Paraíba	Mapeamento participativo junto à comunidade, gestores e especialistas, para identificar bens e serviços ecossistêmicos atribuindo um nível de importância (valoração social) para cada bem ou serviço. O mapeamento foi interpolado no software ArcGis para elaboração de mapas digitais.	Apesar do processo de degradação que o trecho da bacia hidrográfica do Rio Taperoá enfrenta, foi possível identificar um número elevado de bens e serviços ecossistêmicos, exceto na zona urbana e ao norte do açude, onde há o predomínio da agricultura e pecuária que estão entre os mais citados e valorados pelos grupos de interesse, apesar da relação com a degradação ambiental da região devido a prática da agricultura e pecuária tradicional.	8

• Fonte: 1. DEPELLEGRIN et al., 2016; 2.CORTINOVIS; GENELETTI, 2020; 3. DARVILL; LINDO, 2015; 4. ALBERT et al., 2016; 5. LATERRA et al., 2016; 6. KENTER, 2016; 7. PANASOLO et al., 2019; 8. GOMES, 2019). Quanto ao gráfico, tem-se: azul corresponde aos moradores, cinza aos agentes públicos, e verde pesquisadores.

Especificamente os estudos e projetos nacionais que versam sobre a temática de serviços ecossistêmicos aplicados ao desenvolvimento urbano vêm aumentando e explicitam a importância da abordagem ecossistêmica para a formulação de políticas públicas (SCHERER, 2019).

Dentre eles destaca-se a aplicação da metodologia de mapeamento dos serviços ecossistêmicos no território em Duque de Caxias - RJ, em 2018, desenvolvida por meio dos projetos da cooperação Brasil-Alemanha e “TEEB Regional-Local”, que resultou em uma cartilha metodológica replicável em diferentes esferas, voltada para atores locais e tomadores de decisão (GIZ; MMA, 2018). Esse trabalho, adotou o Diagnóstico Rápido Participativo (DRP) e evidenciou a importância da participação da sociedade civil no processo de reconhecimento dos serviços ecossistêmicos.

O DRP, técnica que contém o mapeamento colaborativo, é uma metodologia que permite o levantamento de informações locais a partir do ponto de vista da comunidade. Usualmente é uma ferramenta utilizada no processo de diagnóstico e planejamento rural, porém vem sendo democratizada em diversas outras áreas. É uma metodologia fundamentada na coleta de informações que captam a percepção e conhecimento que os indivíduos e grupos têm do território em que vivem, gerando um resultado rico em detalhes e experiências locais (ANTUNES et al., 2018 e MENDONÇA; SOUZA, 2009). Desta forma, os diagnósticos realizados junto a atores locais podem fornecer informações relevantes para o embasamento do planejamento urbano e a tomada de decisões para políticas públicas (JOHNSON; SIEBER, 2013).

Material e Métodos

O estudo compreendeu cinco etapas sequenciais e complementares. A sequência lógica da pesquisa está apresentada na Figura 1.

Figura 1:
Etapas de condução da pesquisa

Caracterização do uso e ocupação do solo da APA/PA-PSJ

Para a caracterização da APA/PA-PSJ realizou-se inicialmente uma pesquisa bibliográfica, por meio da coleta de informações geoespaciais e documental de arquivos da Prefeitura de São José dos Campos, portal de Infraestrutura de Dados Espaciais Ambientais -SP e do banco de dados na Universidade Estadual Paulista - UNESP, no ano de 2019. Partes das informações foram sistematizadas por meio de um Webmap e disponibilizadas online na plataforma Arcgis, onde é possível uma visualização interativa das informações, através do link < https://arcg.is/1C9aja >.

O uso do solo foi identificado através da análise da região de interesse por meio do software QGIS 3.6.0, aplicando classificação supervisionada - método de máxima verossimilhança, e utilizando como base imagem de satélite ‘Copernicus Sentinel [2019]’. Na etapa de classificação foram identificadas as seguintes classes: água, agricultura, vegetação, pressão urbana, solo exposto e pasto.

Identificação dos serviços ecossistêmicos

No mapa resultante foram avaliados os serviços ecossistêmicos potencialmente existentes na APA, fundamentados pela The Economics of Ecosystems and Biodiversity, 2010, isto é, para cada tipo de uso e cobertura do solo identificado, foram levantados todos os possíveis SE existentes naquele ecossistema.

A caracterização buscou evidenciar cada tipo de uso e cobertura da terra, além de identificar quais as pressões mais significativas sobre eles (e, portanto, sobre os serviços ecossistêmicos associados). Para nortear o trabalho, utilizou-se a abordagem de Integração de Serviços Ecossistêmicos - ISE, voltada a projetos e planejadores, a fim de reconhecerem as relações entre natureza e desenvolvimento urbano, considerando os trade-offs ambientais e econômicos associados e assim auxiliar na integração de oportunidades e riscos ligados aos serviços ecossistêmicos no planejamento e desenvolvimento de estratégias (KOSMUS et al., 2012).

Percepção ambiental e priorização dos SE por atores-chave locais

A percepção ambiental dos SE existentes na APA/PA-PSJ pelos atores sociais foi identificada e ponderada por meio de uma Survey realizada com o uso de questionário estruturado, aplicado em plataforma online - Forms (Microsoft), no primeiro semestre de 2019. O questionário teve como objetivo capturar a percepção ambiental dos stakeholders sobre a APA, através de perguntas elaboradas com este propósito. Nele, foram listados todos os serviços ecossistêmicos, definidos pela TEEB (2010), associados a cada uso do solo identificado (primeiro e segundo passos), separado nas classes provisão, regulação, suporte e culturais. O principal objetivo foi a priorizar os SE conforme especificado pelo passo 2 da Abordagem ISE explicitado por Kosmus et al. (2012).

Com base nos princípios do Diagnóstico Rápido Participativo - DRP, e, tendo em vista a abordagem qualitativa, o questionário foi enviado para os atores-chave selecionados por possuírem algum grau de interação e conhecimento sobre o local, tais como: agentes públicos da prefeitura, pesquisadores e especialistas técnicos, membros do Conselho Gestor e moradores da APA Estadual do Banhado, considerados os requisitos necessários ao adequado levantamento de informações qualitativas conforme sugerido por Yin (2016).

Para a ponderação dos indicadores, assim como o mapeamento de Duque de Caxias, adotou-se o critério de determinação de pesos, numa escala de 0 a 5, sendo que “0” corresponde a não existência do serviço ecossistêmico e “5” a sua máxima significância. Após a coleta, os valores atribuídos pelos respondentes foram somados para cada um dos SE e os primeiros dez com as maiores pontuações foram considerados prioritários.

Este tipo de análise, embora represente uma avaliação de característica qualitativa, é um método científico e, por isso, usado em estudos de entidades de renome como, por exemplo, o IPCC (“expert elicitation”). A elicitação de especialistas é baseada na suposição de que, por meio de experiência, indivíduos têm conhecimento suficiente sobre o assunto da pesquisa para que se possa oficialmente confiar em sua opinião (JACOBS et al., 2015).

Avaliação da oferta dos SE por peritos para criação dos mapas temáticos

A estimativa da oferta ocorreu considerando o potencial de diferentes tipos de cobertura da terra em prover serviços ecossistêmicos específicos, seguido da análise espacial. A abordagem utilizada foi adaptada a aplicada no mapeamento de Duque de Caxias, o Método Matriz (GIZ; MMA, 2018) e também baseada no estudo “Capacidades das paisagens para fornecer serviços ecossistêmicos - Um conceito para avaliações baseadas na cobertura da terra” (BURKHARD et al., 2009), no qual ampara-se no conhecimento específico de peritos para avaliar os SE fornecidos por determinadas áreas. A abordagem é uma das mais recomendadas para avaliações em níveis local e regional e utilizada em situações nas quais existem incertezas ou poucos dados disponíveis.

Este passo teve como objetivo principal representar os serviços ecossistêmicos no espaço geográfico da APA, através do mapeamento colaborativo junto a um perito com conhecimento excepcional sobre a várzea do Rio Paraíba do Sul. A partir do mapa de uso do solo e da identificação dos serviços ecossistêmicos prioritários, é possível avaliar o fornecimento dos SE, considerando a oferta (atual e potencial). A avaliação é baseada em unidades de paisagem, portanto, o valor (importância relativa) para cada unidade de paisagem pode ser transportado para os Sistemas de Informações Geográficas (SIG) (GIZ; MMA, 2018).

A classificação de uso do solo forneceu uma referência espacial para iniciar a avaliação dos serviços ecossistêmicos. Como se originam de imagens de satélite, a representação da situação real da superfície permite analisar com maior fidelidade a situação da oferta do serviço ecossistêmico e isso acarreta numa base adequada para avaliações consistentes. Esta abordagem permite que o mapeamento dos serviços ecossistêmicos retrate coerentemente a realidade (GIZ; MMA, 2018; JACOBS et al., 2015).

Para este trabalho, a estimativa de oferta dos SE foi realizada por um perito externo, em conjunto com os pesquisadores responsáveis pelo projeto. Atribuiu-se pontuação variando de 0 (oferta não é relevante), 1 (oferta é baixa), 2 (oferta tem média relevância), 3 (oferta é alta) e 4 (oferta é muito alta), para cada serviço ecossistêmico prioritário, em relação as classes de uso do solo identificadas na APA/PA-PSJ. O método consiste em uma matriz onde as linhas são os usos do solo e as colunas os serviços ecossistêmicos e no cruzamento entre elas insere-se a pontuação. Posteriormente, essa pontuação foi espacializada através de geoprocessamento, utilizando o software QGIS 3.6.0., para confecção dos mapas temáticos de todos os serviços prioritários.

Resultados

Usos e ocupação do solo da APA/PA-PSJ

A área em estudo, denominada APA Municipal das Planícies Aluvionares dos Rios Paraíba do Sul e Jaguari, se sobrepõe a APA Estadual do Banhado, a APA Federal dos Mananciais do Rio Paraíba do Sul e ao Parque Natural Municipal do Banhado. A Figura 2 apresenta a caracterização do uso do solo para a APA do Rio Paraíba do Sul e Jaguari e o resultado reflete o retrato da área em março de 2019, data da imagem de satélite utilizada.

Figura 2:
Uso do solo na APA das Planícies Aluvionares do Rio Paraíba do Sul e Jaguari. Percentualmente tem-se que a área é composta de 46% de pastagem/campos antrópicos, 36% de campos agricultáveis, 12% de vegetação, 3% de corpos d’água, 2% de pressão urbana e 0,4% de solo exposto. Contorno em vermelho indica o limite da APA das Planícies Aluvionares dos Rios Paraíba do Sul e Jaguari, definida pela LC nº 612/2018

O uso principal do solo na área é caracterizado por pastagens destinadas à pecuária extensiva, seguida por culturas temporárias e fragmentos de vegetação nativa. Por ser um cenário integrado à paisagem urbana de São José dos Campos, nota-se significativa pressão antrópica, principalmente decorrente da implantação de condomínios fechados de alto padrão, construções clandestinas, especulação imobiliária e projetos de infraestrutura urbana. Portanto, pode-se inferir que, no contexto de uso e ocupação do solo, a região sofre com conflitos de usos, que paulatinamente acarretam a deterioração do ambiente natural exposto ao intenso uso urbano (MENDES et al., 2018; MORELLI et al., 2002).

A vegetação característica da região, segundo Morelli et al. (2002), era originalmente ocupada por Florestas Estacional Semidecidual Aluvial, bioma Mata Atlântica, nas várzeas do Rio Paraíba do Sul. Atualmente, existem pequenas manchas de vegetação remanescente ao longo da várzea do Rio Paraíba, a maioria delas sendo de vegetação secundária, ou seja, aquela que se regenerou após os processos de sucessão.

É importante destacar que mesmo sendo classificada como unidade de conservação de uso sustentável, sua existência e conservação está associada ao movimento ambientalista pela proteção do Banhado, pois esse coibiu alguns usos incompatíveis com as características de seu ambiente, como a urbanização exacerbada e a extração de areia, comuns nas áreas de várzea de outros municípios permeados pelo Rio Paraíba do Sul (SANTOS et al., 2015).

Percepção ambiental e priorização dos SE por atores-chave locais

O questionário enviado aos atores-chave mostrou-se uma ferramenta ágil e consistente de comunicação. No total, foram coletadas 22 respostas, das quais 54% foram de pesquisadores (12 respostas), 36% de agentes públicos (8 respostas) e 9% de moradores do local (2 respostas). Ressalta-se que este último grupo teve menor representatividade devido à pequena presença de pessoas dentro da APA/PA-PSJ, cerca de 300 famílias, em situação de extrema vulnerabilidade, o que resultou em baixa adesão à pesquisa. Outro ponto importante a ser destacado é que o conjunto de atores-chave com interação ou conhecimento aprofundado sobre a área é pequeno. A Figura 3 mostra a pontuação global dos serviços ecossistêmicos e a média obtida por grupo.

Figura 3:
Pontuação dos serviços ecossistêmicos globais e média por grupo de atores-chave

A partir dos dados e informações obtidos no questionário, identificaram-se dez serviços ecossistêmicos considerados prioritários, a saber:

• 1st. Água doce;

• 2nd. Fotossíntese;

• 3rd. Ciclo de nutrientes;

• 4th. Microclima local;

• 5th. Regulação dos fluxos de água;

• 6th. Prevenção de erosão e manutenção da fertilidade do solo;

• 7th. Habitats para espécies;

• 8th. Experiência espiritual e senso de lugar;

• 9th. Moderação de eventos climáticos extremos;

• 10th. Sequestro e armazenamento de carbono.

Mapa temático de estimativa de oferta dos SE por uso do solo

Os mapas com os dez SE priorizados estão representados na Figura 4. Quanto mais escuro o tom de verde na legenda, mais a classe de uso do solo possui potencial de oferecer o serviço ecossistêmico prioritário.

Figura 4:
Resultado do mapeamento de serviços ecossistêmicos para APA das Planícies Aluvionares dos Rios Paraíba do Sul e Jaguari

A partir dos mapas é possível identificar onde a oferta e provisão dos SE são mais expressivas. Para o serviço ecossistêmico de fotossíntese e ciclo de nutrientes, a oferta mais alta ocorre nos fragmentos de vegetação nativa, seguido por agricultura e pastagem. No ciclo de nutrientes, a água doce também apresenta pontuação alta também devido à dinâmica aquática de ciclagem de nutrientes.

A ‘experiência espiritual e senso de lugar’ apresentou uma pontuação heterogênea de acordo com a classe do uso do solo. A vegetação, a água e a agricultura apresentam as maiores ofertas deste SE (maiores pontuações associadas), pois são os três tipos de paisagem que melhor caracterizam a APA/PA-PSJ como paisagem, conferindo ao local o senso de lugar.

Observa-se que no mapeamento geral, a pressão urbana e solo exposto obtiveram pontuação nula na oferta dos serviços ecossistêmicos. Os SE de Moderação de Eventos Climáticos Extremos e Sequestro/Armazenamento de carbono merecem atenção especial devido ao papel desempenhado para resiliência da cidade em vista da nova realidade climática global (JOLY et al., 2019). A partir do mapa, pode-se verificar que as áreas verdes são aquelas que possuem uma oferta alta ou muito alta no fornecimento desses serviços.

Discussão

A caracterização da área demonstrou que a APA enfrenta pressão antrópica em grande parte de sua extensão, porém ainda possui alguns fragmentos de vegetação ciliar. Com a regularização da vazão, em 1971, após as construções das barragens Paraibuna, Paraitinga, Santa Branca, Jaguari e Funil (BITTENCOURT; BATISTA, 2009) as margens do Rio Paraíba do Sul não foram mais alagadas, o que facilitou a fixação humana e corroborou para o desenvolvimento de atividades de subsistência no local (ex.: agricultura e pecuária). Porém, o ambiente natural de planícies aluvionares foi modificado, e, portanto, também os SE específicos providos por esse ecossistema.

Tal resultado se assemelha àquele obtido por Gomes (2019) que realizou o mapeamento participativo junto à comunidade e, devido a este fator, identificou como SE agricultura e pecuária. Porém, apesar de serem os SE com maior reconhecimento, esses também possuem relação direta com a degradação ambiental da região, pois suas práticas ocorrem de modo tradicional, sem cuidados específicos com o meio ambiente.

A pressão urbana na área em estudo pode afetar a oferta dos serviços ecossistêmicos. Portanto, para continuidade do potencial de oferta destes, é necessário que se tenha um olhar crítico e de controle para este tipo de uso do solo na APA/PA-PSJ. Todavia, é necessário ressaltar que nem sempre a presença de pessoas no interior de área de preservação ambiental é prejudicial, visto que populações tradicionais residentes por longos períodos no ambiente podem ser aptas a promover a preservação do ecossistema local, devido ao conhecimento adquirido ao longo do tempo sobre a dinâmica dos serviços ecossistêmicos e da biodiversidade no local (HILL et al., 2019).

A pesquisa de percepção ambiental se mostrou uma alternativa válida de participação da sociedade para a criação de um consenso em torno da definição dos SE prioritários, porém o questionário online não apresentou a quantidade de respostas esperada. Para trabalhos futuros recomenda-se a comunicação social prévia e a realização de encontros presenciais com os atores-chave, tal como realizado por Darvill e Lindo (2015).

Dos dez serviços ecossistêmicos pontuados como prioritários, nota-se que, metade são de regulação, seguido por suporte - com três SE, cultural e provisão com um cada. Este resultado evidencia a importância que a APA tem para assegurar a qualidade ambiental em sua área de influência, devido aos SE priorizados gerarem benefícios que servem de base para qualidade da vida e bem-estar em múltiplos aspectos, que, segundo Zardo et al.(2017), vão desde melhora na saúde da população, passando por tornar a cidade mais resiliente, até a redução dos custos de energia, devido à amenização do calor decorrentes das áreas verdes existentes nas cidades (ZARDO, GENELETTI, et al., 2017).

Os resultados indicaram também que os SE ofertados pela APA reconhecidos como os mais relevantes, são: a manutenção da capacidade produtiva do solo (fertilidade), o controle da erosão, assim como a capacidade de autorregular o clima e os fluxos ecossistêmicos. Desse modo, percebe-se que a área potencialmente garante a proteção contra riscos climáticos, atua como amortecedor de desastres naturais e previne seus possíveis danos.

A APA/PA-PSJ também foi reconhecida por sua capacidade de suporte, isto é, como local onde se garante a manutenção dos ciclos de vida fundamentais para manter os ecossistemas, possibilitando a produção primária (fotossíntese) e o ciclo de nutrientes, além do SE de habitat para espécies, o que significa seu reconhecimento como um espaço onde a fauna e a flora podem viver e se reproduzir, e, consequentemente, resguardar e promover a biodiversidade. De acordo com Bartkowski et al.(2015), essa capacidade de suporte desempenha uma série de papéis nos ecossistemas e, consequentemente, influencia o bem-estar de diversas maneiras, reforçando sua relevância para o território.

O único serviço reconhecido de provisão - água doce, converge com a característica primordial da APA: o de proteção das planícies aluvionares do Rio Paraíba do Sul e do Rio Jaguari. Por fim, o serviço ecossistêmico cultural com maior pontuação, refletiu a importância que a APA/PA-PSJ possui para os residentes do município, principalmente no que se refere ao senso de lugar e de pertencimento que a comunidade joseense atribui à região, uma vez que esta é constantemente reconhecida como um dos principais cartões postais do município (PMSJC, 2016).

A partir da análise dos distintos grupos de atores-chave, nota-se que há uma diferença em relação à pontuação por eles atribuídos. Enquanto os pesquisadores apresentaram tendência mais homogênea na pontuação, resultando nas maiores médias para os SE provavelmente devido ao entendimento prévio de suas relevâncias, os agentes públicos transmitiram respostas mais variáveis e heterogêneas, o que pode ser reflexo de uma disparidade no entendimento do conceito e importância dos SE por parte dos servidores, além de percepções diferentes acerca da relevância da área para o município. Tal disparidade evidencia a desproporção de conhecimento daqueles que legislam e tomam decisões que afetam diretamente a APA. Destaca-se que, conforme exposto por Garcia (2019), a comunicação entre tomadores de decisão e sociedade está associada a eficácia da gestão do território.

Os moradores atribuíram as menores pontuações aos SE, de modo heterogêneo, e com os serviços de regulação apresentando as menores médias. Este resultado é extremamente relevante, pois reflete que os atores com maior contato com a região ainda não reconhecem os SE por ela oferecidos. Tal fato pode estar associado ao desconhecimento dos moradores locais sobre o conceito de SE (que lhes foi brevemente apresentado por meio do questionário) ou devido ao contato diário desses com a área ao longo dos anos, que lhes permitem perceber de forma mais acentuada a pressão antrópica, que reduz a qualidade dos ecossistemas ali presentes e a capacidade de oferecerem serviços. Essa percepção é distinta daquela verificada por Canova et al. (2019), pois, em seus resultados os autores identificaram um maior reconhecimento de SE de regulação por proprietários rurais brasileiros, com contato permanente com o ambiente.

Em suma, os pesquisadores atribuíram maior média global para os SE de suporte, os agentes públicos, para os serviços de regulação e os moradores para os serviços culturais, expressando a diferença da percepção de cada grupo de ator-chave em relação aos serviços ecossistêmicos.

Parte da APA está localizada na zona central do município, o que colabora para que a área seja um ponto importante na dinâmica de purificação do ar, devido à capacidade da cobertura vegetal absorver e filtrar grande parte dos materiais particulados e elementos tóxicos do ar. Além disso, de acordo com TEEB (2010), áreas verdes propiciam estabilidade microclimática em diversos aspectos, como a redução do calor, da velocidade dos ventos e maior umidade do ar, estes fatores trazem benefícios diretos na qualidade de vida da população no entorno.

A proximidade de áreas verdes também traz inúmeros benefícios físicos, psicológicos e mentais à saúde, funcionando como local de lazer/recreação/interação social, de prática de atividades físicas e promovendo a interação social (GÜNTHER; GIULIO, 2018). Recentemente a prefeitura de São José dos Campos revitalizou a zona central do município, com montagem de decks de contemplação da orla do Banhado, cujos limites é abrangido pela APA/PA-PSJ, o que potencializou esses benefícios (PMSJC, 2016b).

Os mapas temáticos demonstraram ser uma boa maneira de visualização espacial das áreas sensíveis e também daquelas com máximo potencial de fornecimento dos SE. Portanto, podem ser empregados em diversos escopos dentro do município como, por exemplo, em atividades de educação ambiental nas escolas e comunidades e no planejamento territorial, pois auxiliam no reconhecimento da importância da paisagem da APA, assim como pontuado em GIZ e MMA (2018).

Assim como no projeto desenvolvido em Duque de Caxias, os resultados da presente pesquisa corroboram para o melhor entendimento do uso da terra na região, pois permitem associar as percepções ambientais dos atores-chave e a oferta atual dos serviços ecossistêmicos por eles priorizados. Pode ser apropriada como uma ferramenta para gestão de conflitos ali existentes e subsidiar a implementação de medidas que maximizem a preservação do capital natural.

Os serviços ecossistêmicos identificados também reforçam a importância que políticas públicas municipais, com viés de mitigação e adaptação aos impactos das mudanças do clima, que foquem em aumentar estes serviços na cidade. Uma vez que a APA/PA-PSJ possui localização estratégica, integrada à malha urbana de São José dos Campos, a manutenção e conservação dos usos que favorecem a oferta destes serviços devem ser priorizadas, com enfoque principal no incremento da vegetação nativa, já que este uso do solo obteve maior pontuação na oferta de serviços ecossistêmicos.

Dentre as políticas públicas passíveis de aplicação neste contexto estão: o pagamento de serviços ambientais (PSA) aos produtores rurais da APA, com foco em restauração de áreas degradadas e reflorestamento de reservas legais e áreas de preservação permanente, e o Plano Nacional de Agricultura de Baixo Carbono (Plano ABC), que tem como medidas principais o incentivo a recuperação de pastagens degradadas, a Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF) e Sistemas Agroflorestais (SAFs), visando o desenvolvimento de políticas de baixo carbono (MAPA, 2020).

Quando comparados os resultados obtidos no presente estudo àqueles decorrentes do mapeamento realizado em Duque de Caxias, verifica-se que em ambos evidenciou-se que a infraestrutura urbana possui menor relevância na oferta de SE, enquanto áreas de floresta ou outro tipo de cobertura vegetal possuem uma relevância média a alta para a maioria dos serviços. Os ambientes aquáticos, refletidos aqui pelas várzeas dos rios, e lá pelo ecossistema marinho e áreas alagadas, possuem extrema importância para a regulação do clima local e o controle de inundações e enchentes natural (GIZ; MMA, 2018).

Outro resultado relevante, que converge com o obtido na Percepção dos Serviços Ecossistêmicos de Áreas Verdes Urbanas de Curitiba/PR, Panasolo et al., 2019, cuja análise indica que dos SE analisados, especialmente os de regulação do clima local e habitat, são considerados como não passíveis de substituição no caso de supressão das áreas verdes, evidenciando que devem ser focos principais de políticas de conservação.

Conclusões

A metodologia de abordagem participativa mostrou-se uma ferramenta eficaz e democrática, adequada ao uso em unidades de conservação com múltiplos desafios para a governança, pois é capaz de integrar as diferentes percepções dos atores sociais do território, tais como a população local, os peritos e os gestores públicos, inclusive expressando a diferença da percepção ambiental de cada grupo avaliado. Por meio dela também é possível identificar as políticas públicas necessárias de valorização dos territórios e daquelas destinadas à capacitação dos próprios agentes públicos.

O mapeamento das paisagens da APA/PA-PSJ relacionando com a capacidade de prover serviços ecossistêmicos apresenta um panorama atual sobre o potencial que a região tem de beneficiar e impactar, direta e indiretamente, a sua área de influência. Seus resultados podem ser apropriados como um ponto de partida para políticas públicas municipais que em grande parte dependem do fornecimento dos mesmos (ex.: turismo, qualidade do ar) ou afetam o potencial de provê-los (ex.: permitir uso de defensivos agrícolas tóxicos).

A pesquisa aqui apresentada pode ser considerada como referencial para o contínuo monitoramento das percepções dos atores sociais sobre o território estudado. Dentre os desafios vindouros destacam-se a necessidade de aprofundamento do conceito e importância dos SE junto aos atores sociais, para melhor compreensão da percepção ambiental, e ampliar o número de peritos externos para a avaliação da oferta atual.

Ademais, a metodologia detém o potencial para contribuir com a conscientização do valor da natureza na comunidade local e para o desenvolvimento de políticas públicas que fomentem o desenvolvimento sustentável. O planejamento territorial baseado nestes princípios traz benefícios extremamente positivos, uma vez que a proteção dos recursos e ambientes naturais, muitas vezes vista como impedimento do desenvolvimento local, na verdade pode potencializá-lo. Assim sendo, pode se afirmar que seus resultados subsidiam políticas públicas mais eficientes, para territórios que demandam abordagem sistêmica, não só no campo político e econômico, mas também na esfera socioambiental.

Agradecimentos

Agradeço especialmente ao Pr. Dr. Allan Yu Iwama de Mello pela colaboração e auxílio na metodologia de estimativa de oferta atual e potencial dos serviços ecossistêmicos para a APA das Planícies Aluvionares dos Rio Paraíba do Sul e Jaguari.

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Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  15 Jul 2022
• Data do Fascículo
  2022

Histórico

• Recebido
  23 Dez 2019
• Aceito
  13 Dez 2021