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Burnout e os aspectos laborais na equipe de enfermagem de dois hospitais de médio porte

Resumos

OBJETIVO: identificar a incidência da Síndrome de Burnout (SB) e avaliar sua relação com os aspectos laborais, em profissionais de enfermagem de dois hospitais de médio porte de Cáceres, MT. MÉTODO: trata-se de estudo descritivo, transversal, com amostra de 141 sujeitos. Como instrumento de pesquisa utilizou-se um questionário para o delineamento dos aspectos laborais, acrescido do Maslach Burnout Inventory (MBI). RESULTADOS: dos 141 profissionais, 13 apresentaram SB, segundo o MBI. Em relação aos aspectos laborais, os profissionais mais acometidos foram aqueles com regime de trabalho diarista, 30 horas semanais de serviço, contratado, duplo emprego, menor tempo de formação, pouco tempo na unidade e atuantes no setor administrativo. CONCLUSÕES: logo, demonstrou-se a presença da SB na amostra, revelando necessidade de se propor mudanças organizacionais no ambiente de trabalho, a fim de diminuir a interferência desses fatores na saúde do trabalhador.

Estresse Ocupacional; Equipe de Enfermagem; Saúde do Trabalhador


PURPOSE: The aim of this study is to identify the occurrence of Burnout Syndrome (BS) and assess its relationship with different labour-related aspects, among nursing professionals at two medium-sizes hospitals in the city of Cáceres. METHOD: This is a transversal and descriptive study, with a sample totalling 141 subjects. As an instrument of research, we used a questionnaire for the limitation of labour-related aspects, with the addition of the Maslach Burnout Inventory (MBI). RESULTS: Out of the 141 professional people considered, 13 had BS, according to the MBI. In relation to the different labour aspects, the professional people most affected were those with: work regime based on pay by the day, a working week of 30 hours, regularly hired, with double employment, lower graduation period, less time spent at the unit, and active in the administrative segment. CONCLUSIONS: Hence, there was the demonstration of the presence of BS within the sample, showing the need for the proposal of organisational changes within the working environment so as to reduce these factors and their interference on the health of the worker.

Burnout, Professional; Nursing, Team; Occupational Health


OBJETIVO: Identificar la incidencia de síndrome de Burnout (BS) y evaluar su relación con los aspectos laborales, personal de enfermería de dos hospitales de medio portea de Cáceres. MÉTODO: Se trata de un estudio descriptivo, de corte transversal de la muestra de 141 sujetos. Como instrumento de investigación se utilizó un cuestionario para el delineamiento de los aspectos laborales, aumentando del Maslach Burnout Inventory (MBI). RESULTADOS: De los 141 profesionales, 13 presentaron SB según MBI. Con relación con los aspectos laborales los profesionales más acometidos son aquéllos con: régimen de trabajo diarista, 30 horas semanales de servicio, contratado, doble empleo, menor tiempo formación, poco tiempo en la unidad y actuación en el sector administrativo. CONCLUSIONES:Luego, se demostró la presencia de SB en la muestra, revelando necesidad de proponerse cambios organizacionales en el ambiente de trabajo a fin de apocar estos factores interfieren en la salud del trabajador.

Agotamiento Profesional; Grupo de Enfermería; Salud Laboral


ARTIGO ORIGINAL

Burnout e os aspectos laborais na equipe de enfermagem de dois hospitais de médio porte

IEnfermeira, MSc, Hospital Regional de Cáceres, Brasil. Professor, Departamento de Enfermagem, Universidade do Estado de Mato Grosso, Brasil

IIAluno do curso de graduação em medicina, Universidade Estácio de Sá, Campus Centro V – Arcos da Lapa, Rio de Janeiro, Brasil

IIIEnfermeira

IVPhD, Professor Titular, Departamento de Enfermagem, Faculdade de Ciências da Saúde, Universidade de Brasília, Brasil

Endereço para correspondência

RESUMO

OBJETIVO: identificar a incidência da Síndrome de Burnout (SB) e avaliar sua relação com os aspectos laborais, em profissionais de enfermagem de dois hospitais de médio porte de Cáceres, MT.

MÉTODO: trata-se de estudo descritivo, transversal, com amostra de 141 sujeitos. Como instrumento de pesquisa utilizou-se um questionário para o delineamento dos aspectos laborais, acrescido do Maslach Burnout Inventory (MBI).

RESULTADOS: dos 141 profissionais, 13 apresentaram SB, segundo o MBI. Em relação aos aspectos laborais, os profissionais mais acometidos foram aqueles com regime de trabalho diarista, 30 horas semanais de serviço, contratado, duplo emprego, menor tempo de formação, pouco tempo na unidade e atuantes no setor administrativo.

CONCLUSÕES: logo, demonstrou-se a presença da SB na amostra, revelando necessidade de se propor mudanças organizacionais no ambiente de trabalho, a fim de diminuir a interferência desses fatores na saúde do trabalhador.

Descritores: Estresse Ocupacional; Equipe de Enfermagem; Saúde do Trabalhador.

Introdução

A vivência profissional no cuidar implica em tensão emocional constante, atenção e grandes responsabilidades, a cada gesto. Assim é a natureza do trabalho em saúde, porque resulta em lidar com a dor, com o sofrimento e com a morte de pacientes, o que pode afetar os trabalhadores de instituições hospitalares, propiciando o surgimento da Síndrome de Burnout.

Burnout refere-se a uma síndrome em que o trabalhador perde o sentido da relação com o trabalho e faz com que as coisas não tenham mais importância. É um conceito multidimensional que envolve três componentes, podendo aparecer associados, mas são independentes: exaustão emocional, despersonalização e baixa realização pessoal no trabalho(1-2).

A exaustão emocional caracteriza-se pela falta ou carência de energia, acompanhada de sentimento de esgotamento emocional. Os trabalhadores percebem que já não possuem condições de despender mais energia para o atendimento de seu cliente ou demais pessoas, como em situações passadas.

Quanto à despersonalização, essa pode ser definida como distanciamento emocional, indiferença em relação às atividades laborais, podendo o trabalhador tratar outras pessoas como objeto(2). Cada trabalhador encontra formas de conviver e dar vazão à tensão gerada pela ruptura entre envolver-se ou não no trabalho.

Por fim, a reduzida realização profissional é caracterizada pela sensação de insuficiência, baixa autoestima, insatisfação com suas atividades e desmotivação, provocando, muitas vezes, a vontade de abandonar a profissão(3). As pessoas se sentem infelizes consigo mesmas e insatisfeitas com o próprio desenvolvimento profissional(4-5).

Burnout surge como resposta a um estresse crônico, afetando diretamente o desempenho de tarefas, relacionamento interpessoal, produtividade e até mesmo a qualidade de vida no trabalho, do indivíduo e da organização, devido à exposição direta com pacientes, e à extensa jornada de trabalho em condições, muitas vezes, desfavoráveis(6).

Logo, é uma síndrome característica do meio laboral, que resulta da cronificação do estresse ocupacional e produz consequências negativas em nível individual, profissional, familiar, social e institucional. Dentre as consequências trazidas pela síndrome à instituição de saúde destacam-se os altos índices de absenteísmo, repercutindo, consequentemente, em problemas para essas organizações.

Enfermeiros, técnicos e auxiliares de enfermagem fazem parte de uma profissão caracterizada por ter, em sua essência, o cuidado e por grande parte da carga de trabalho se constituir no contato direto com pacientes e familiares. Do ponto de vista da organização do trabalho, a indefinição do papel profissional, a sobrecarga de trabalho frequentemente justificada por falta de pessoal e estimulada pelo pagamento de horas extras, a falta de autonomia e autoridade na tomada de decisões, entre outras, geram estado de estresse crônico, identificando-a como uma das profissões com maior incidência de Burnout(7-8). Esse fato justifica a escolha dessa classe profissional para a realização da presente pesquisa, visto que é tida como profissão de risco para o desenvolvimento da síndrome.

Além das características do dia a dia da profissão de enfermagem que torna esses profissionais suscetíveis à Síndrome de Burnout, como citado anteriormente, ressalta-se, ainda, que o local de trabalho do profissional pode exercer influência no desenvolvimento da síndrome. A atividade laboral hospitalar é caracterizada por excessiva carga de trabalho, contato com situações limitantes, alto nível de tensão e de riscos para si e para outros(9).

As jornadas de trabalho dos profissionais de enfermagem são, em sua maioria, exaustivas, dado o volume de usuários, e a reposição de energia desses trabalhadores nem sempre é adequada. São submetidos a plantões que, especialmente no noturno, alteram o biorritmo de sono, alimentação e atividades sociais. Além disso, ainda se dedicam a mais de um emprego, visto que os salários são baixos no setor e o ritmo de trabalho na emergência não os deixa impunes(10).

Diante disso, destaca-se a relevância da escolha de unidade hospitalar como campo de estudo, frente à importância de se investigar os aspectos laborais associados à saúde do trabalhador de enfermagem na rede hospitalar, visto que o ambiente é fonte constante de estressores que podem comprometer a assistência prestada.

Considera-se imprescindível refletir e desenvolver estudos a respeito dessa temática, para melhor compreender os fatores que contribuem para o processo saúde/doença dos trabalhadores de enfermagem em instituições hospitalares(11).

Assim, diante do exposto, o estudo buscou avaliar a incidência da Síndrome de Burnout e sua relação com os aspectos laborais dos profissionais de enfermagem do Hospital Regional Dr.Antonio Fontes e Hospital São Luiz, no município de Cáceres, MT.

Método

Trata-se de estudo epidemiológico quantitativo descritivo, do tipo transversal, com abordagem da Síndrome de Burnout em função dos aspectos laborais em profissionais de enfermagem da rede hospitalar.

Os locais de estudo foram dois hospitais de médio porte da cidade de Cáceres, MT: Hospital Regional de Cáceres Dr.Antônio Fontes (HRCAF) e Hospital São Luiz (HSL). Ressalta-se que o município de Cáceres é importante polo regional de saúde, abrangendo 22 municípios da região, atendendo população de mais de 185 mil usuários do SUS(12). A escolha dos hospitais deu-se pelo fato de serem referência no atendimento de média e alta complexidade, além do apoio ao ensino e à pesquisa na área de saúde, possuindo convênios firmados com instituições de ensino superior e ensino técnico na área de saúde, como a Universidade do Estado de Mato Grosso (UNEMAT), a Faculdade de Quatro Marcos (FQM) e o Instituto Educacional de Cáceres (IEC). Sendo de suma importância verificar a Síndrome de Burnout dos profissionais de enfermagem que prestavam atendimento nesses dois hospitais de referência regional.

O HRCAF é público estadual, de referência regional do sudoeste de Mato Grosso, em urgência e emergência, e atende a demanda de 22 municípios da região. O HSL é privado e credenciado ao Sistema Único de Saúde, com referência para clínica médica geral, cirúrgica geral, obstetrícia clínica e cirúrgica e unidade de terapia intensiva (UTI) adulto tipo II.

A amostra do presente estudo foi obtida pelo método de amostragem de conveniência, sendo composta por 141 profissionais de enfermagem, pertencentes aos três níveis hierárquicos: auxiliar de enfermagem, técnico de enfermagem e enfermeiro.

A equipe de enfermagem do HRCAF, segundo o departamento de Recursos Humanos, era composta por 141 profissionais de enfermagem (22 enfermeiros, 73 técnicos de enfermagem e 46 auxiliares de enfermagem). Entretanto, com os critérios de exclusão, restaram 89 profissionais participantes do estudo no HRCAF (16 enfermeiros, 55 técnicos de enfermagem e 18 auxiliares de enfermagem). No HSL, a equipe de enfermagem era composta por 144 profissionais de enfermagem (21 enfermeiros, 89 técnicos e 34 auxiliares de enfermagem). Contudo, a distribuição dos profissionais participantes do estudo no HSL após os critérios de exclusão ficou constituída por 52 pessoas (14 enfermeiros, 32 técnicos de enfermagem e 6 auxiliares de enfermagem). Assim sendo, a amostra de 141 pessoas participantes do estudo, ficou constituída por 89 profissionais de enfermagem do HRCAF e 52 profissionais de enfermagem do HSL.

Para inclusão no estudoadotaram-se os seguintes critérios de seleção: todos os profissionais deviam estar em plena atividade e aceitarem participar da pesquisa, voluntariamente. Os critérios de exclusão abrangiam os que estavam em gozo de férias ou licença-prêmio, em licença médica para tratamento de saúde, licença-maternidade e afastados para capacitação profissional, como mestrado e doutorado.

Como instrumento da pesquisa foram aplicados dois questionários. O primeiro, elaborado para o delineamento dos aspectos sociodemográficos e laborais, composto por 14 questões fechadas, elaborado levando-se em conta as variáveis dicotômicas, de atributos e contínuas.

Variáveis dicotômicas – sexo, jornada de trabalho, duplo vínculo empregatício. Variáveis de atributos – setor de trabalho no hospital, categoria profissional, grau de escolaridade, carga horária semanal, vínculo empregatício. Variáveis contínuas – faixa etária, tempo de trabalho na unidade e tempo de formação.

O segundo questionário se refere ao Maslach Burnout Inventory (MBI), utilizado para avaliar o Burnout, composto por 22 questões, em sua versão adaptada e validada para o português por Tamayo(13). O MBI é autoinforme, para ser respondido por uma escala de frequência de cinco pontos que vai de um (nunca) até cinco (sempre). Os 22 itens do inventário avaliam as três dimensões independentes entre si, que são: exaustão emocional (9 itens), despersonalização (5 itens) e realização profissional (8 itens).

A pontuação em cada subescala foi obtida através da soma dos valores das respectivas subescalas. Para isso, utilizaram-se as notas de corte de outro estudo realizado, no qual os autores(7) consideraram que, na subescala exaustão emocional (EE), pontuação igual ou maior que 27 seria indicativa de alto nível de exaustão, o intervalo de 19 a 26 corresponderia a valores moderados, sendo que valores menores que 19 indicariam baixo nível.

Na subescala despersonalização (DE), pontuação igual ou superior a 10 seria nível alto, pontuação entre 6 e 9 nível moderado e menor que 6 baixo grau de despersonalização.

A subescala realização profissional (RP) apresenta uma medida inversa, nível alto corresponde a valores iguais ou menores que 33, nível médio de 34 a 39 e baixo nível valores acima de 40.

As informações dos instrumentos respondidos foram codificados, digitados e processados em planilha Excel®. Todas as análises foram feitas com o software Statistical Package for the Social Sciences (SPSS)®, versão 15.0, para Windows®.

Os resultados foram analisados por estatística descritiva dos dados (média, desvio-padrão, mediana, percentagem e incidência), e apresentados sob a forma de tabelas, utilizando-se os recursos do programa SPSS 15.0.

Para comparar as variáveis, foi aplicado o teste não paramétrico do qui-quadrado (χ2), adotando-se para tal o nível de significância de 5% de probabilidade (p<0,05).

O presente estudo foi desenvolvido com anuência dos hospitais em questão e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade de Brasília CEP/FS-UnB, em 8 de junho de 2010, com o Parecer nº052/10.

Resultados

Em relação às características sociodemográficas, os sujeitos da pesquisa, quanto ao sexo, a maioria era do sexo feminino (84,40%), casados (58,15%), com filhos (75,90%), renda familiar entre dois e quatro salários-mínimos (66,67%) e idade entre 20 e 40 anos (73,05%). Quanto à categoria profissional, a maioria dos pesquisados era de técnicos de enfermagem (61,70%). A Tabela 1 apresenta a frequência absoluta e relativa das características citadas, oportunizando um primeiro reconhecimento da população estudada.

O trabalhador que atua em instituições hospitalares está exposto a diferentes estressores ocupacionais que afetam diretamente o seu bem-estar. Apresentar informações pertinentes à jornada de trabalho, carga horária, duplo vínculo, dentre outras, torna-se pertinente ao se tratar da Síndrome de Burnout. A Tabela 2 traz as informações quanto às características laborais, que serão posteriormente mostradas, a fim de conhecer sua relação com a Síndrome de Burnout.

Levando em conta o regime de trabalho, foi possível observar que 70 (49,65%) dos entrevistados eram plantonistas e 58 (41,13%) diaristas. Destaca-se que os profissionais plantonistas são aqueles que, conforme o estabelecido pela escala de trabalho para cumprir a carga horária semanal, não estão presentes necessariamente todos os dias na unidade, nem no mesmo horário, sempre. Já os diaristas não possuem essa mobilidade de dia e horário.

Resultados apontaram que 119 (84,40%) dos profissionais entrevistados realizavam carga horária de 40 horas semanais e nove (6,38%) pertenciam à escala de 30 horas semanais, o que corresponde a seis horas diárias, distribuídas em turnos.

Em relação ao vínculo empregatício dos profissionais do estudo, observou-se que 40 (28,37%) profissionais eram funcionários públicos estatutários e 89 (63,12%) com vínculo empregatício via contrato temporário, regidos pela Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) e Regime Estatutário, segundo a Secretaria Estadual de Saúde do Estado do Mato Grosso (SES/MT). Revelando, portanto, a influência do contrato temporário nas instituições de saúde.

Dentre os profissionais pesquisados 37 (26,24%) possuíam duplo vínculo empregatício, enquanto 90 profissionais (63,83%) não trabalhavam com outros vínculos. Entre aqueles com duplo vínculo de trabalho, com exceção de um profissional enfermeiro, que atuava na área da docência, todos os outros exerciam a mesma função na área da saúde. Observou-se que prevaleceram, nessa variável, os profissionais que não trabalhavam sob outro vínculo.

Em relação ao tempo de formação desses profissionais, na área de enfermagem, 48 (34,04%) estavam atuando há menos de cinco anos, 90 (63,83%) tinham mais de seis anos de atuação profissional. Em relação ao tempo de trabalho na unidade, 51 (36,17%) tinham permanência igual ou maior que cinco anos.

Quanto à distribuição dos profissionais nos setores, cabe primeiramente ressaltar que a classificação das unidades de atuação da equipe de enfermagem considerou a divisão em três setores: administrativo, setor aberto e fechado. No setor administrativo, estão inclusos os profissionais que atuam em gerência e supervisão que, no caso, é a comissão de controle de infecção hospitalar (CCIH) e coordenação de enfermagem do hospital. No setor aberto, os profissionais atuam nas unidades de internação: clínica médica geral e cirúrgica, clínica obstétrica e pediatria. Nas unidades fechadas, os profissionais exercem a profissão nas unidades de terapia intensiva (UTI), centro cirúrgico e central de material e esterilização (CME). E em relação à denominação setor administrativo por se entender que os profissionais que atuam em gerência e supervisão desempenham tais funções.

Os resultados do presente estudo mostraram que cinco (3,55%) profissionais se encontravam exercendo funções administrativas, 86 (60,99%) nos setores abertos e 46 (32,62%) em setores fechados.

Ao se observar a variável laboral, é possível caracterizar a população estudada como sendo, em sua maioria, plantonistas, atuando sob 40 horas semanais, nos diversos setores, com contrato temporário, em um único vínculo, com mais de cinco anos de formação e atuação na área.

A Síndrome de Burnout, como visto, é uma condição de sofrimento psíquico, relacionada ao trabalho. Na Tabela 3, a seguir, se encontra a incidência da Síndrome de Burnout em relação aos aspectos laborais.

Quanto ao regime de trabalho, os profissionais diaristas apresentaram maior incidência da síndrome (9-15,5%) em relação aos plantonistas (4-5,7%).

Percebe-se que a maior incidência, em relação à carga horária semanal com a Síndrome de Burnout, foi apresentada em profissionais que executavam suas atividades com 30 horas semanais (22,2%), quando comparados aos profissionais que trabalhavam 40 horas semanais (9,2%).

Tratando-se dos valores mais encontrados do MBI, relacionados ao vínculo empregatício, dez (11,2%) dos casos encontrados da Síndrome referiram-se aos profissionais com contratos temporários regidos pela CLT.

Os profissionais de enfermagem que conciliavam mais de um emprego – duplo vínculo - obtiveram maior frequência (13,5%) em relação aos que não possuiam (8,88%) outro vínculo (p=0,434).

No que tange à distribuição de Burnout, quanto ao tempo de formação, os profissionais mais acometidos foram aqueles com tempo de formação entre zero e cinco anos (6–12,5%). Quanto ao tempo de serviço, 15,4% dos casos de Burnout referem-se a profissionais com menos de um ano de trabalho. Em relação à classificação dos setores de trabalho, observou-se que a predominância de Burnout dos profissionais, lotados no setor administrativo, foi de 40,0%. Verificou-se diferença estatisticamente significante entre os setores administrativo x aberto (p=0,01) e setor administrativo x fechado (p=0,039).

Discussão

Como observado anteriormente, cuidou-se em delinear a Síndrome em relação aos fatores laborais, isso para que fosse possível observar o grau de significância entre uma variável e o desencadeamento da mesma.

Os resultados obtidos na pesquisa evidenciaram que, na amostra estudada, a carga horária da maioria dos profissionais (84,40%) era de 40 horas semanais. Porém, os profissionais mais acometidos pela Síndrome de Burnout foram aqueles que trabalhavam em regime de carga horária de 30 horas.

Em consonância com os resultados encontrados, outro estudo(14) também evidenciou que os enfermeiros que apresentaram maior número dos desvios nas dimensões de Burnout tinham carga horária menor, já que profissionais com carga horária menor em uma instituição possuíam duplo vínculo empregatício, provavelmente por verem nesse fato a possibilidade de melhorar a renda familiar. E essa sobrecarga laboral, como mostram alguns autores(15-16), é um dos fatores que leva a desencadear o Burnout. Considera-se imprescindível refletir e desenvolver estudos a respeito dessa variável, para melhor compreender sua relação no processo saúde/doença.

Quanto ao vínculo empregatício, observou-se que 63,12% dos profissionais de enfermagem possuíam apenas contrato temporário com a instituição. E, ainda, que os profissionais contratados eram os mais acometidos pela Síndrome. Regra geral, o fato de o trabalhador ser contratado tende a deixá-lo ansioso a cada término do contrato, buscando saber se haverá renovação ou não. O fato de ser contratado implica em preocupação por assegurar o emprego, para garantir seus compromissos financeiros e a sustentabilidade da família. A condição de estabilidade no trabalho garante ao profissional certa despreocupação com o término do contrato e com o desemprego. Esse aspecto deveria ser levado em conta como satisfação pessoal, mas sabe-se que, no Hospital Regional, hospital público estadual, ainda hoje é grande o número de contratos temporários, e no Hospital São Luiz, hospital particular/conveniado, todos são contratados.

Equivalente ao encontrado na pesquisa, outro estudo(17) mostra a diferença encontrada quando se comparam os profissionais com situações mais estáveis na carreira (efetivos no local de trabalho) e profissionais em situações contratuais mais instáveis (contratos temporários), sendo a síndrome mais prevalente no último caso. Outro autor(18) ressalta também que esses dados corroboram a hipótese da situação contratual, uma vez que aqueles que possuem vínculos de trabalho temporário, nos respectivos locais de trabalho, assumem mais estresse associado à instabilidade profissional e à carreira.

No que diz respeito ao duplo vínculo, os resultados mostraram que a maioria (63,83%) dos profissionais de enfermagem dos dois hospitais estudados não possuía outro vínculo empregatício. Quando se analisou a relação dessa variável com a Síndrome, obteve-se que não há diferença significante. O fato de o profissional possuir múltiplos empregos, realidade que persiste na enfermagem, pode intensificar o problema do absenteísmo.

Em outro estudo, o autor(19) descreve que os profissionais dessa área se veem pressionados a ter, por vezes, duplo ou triplo vínculo empregatício, devido aos salários baixos e aviltantes, incompatíveis com a dignidade de suas atividades, fato esse que vêm piorando a qualidade de vida desses trabalhadores, levando-os a assumir mais de um emprego para aumentar a renda familiar, o que implica em extensas jornadas de trabalho, estresse e pouco tempo para o lazer e para a família.

Em seu estudo, outro autor(20) relata que o ritmo acelerado de trabalho, resultante do sempre insuficiente número de trabalhadores e excesso de tarefa por indivíduo, demanda aceleração na realização das atividades e redução dos tempos de pausa. E que esse ritmo se intensifica quando o trabalhador apresenta dois vínculos empregatícios, pois essa situação, provavelmente, se repete nos dois cenários de trabalho.

Ao analisar o tempo de formação, verificou-se que os profissionais com intervalo de zero a cinco anos de formação eram os mais acometidos em relação à Síndrome de Burnout. Assim sendo, o pouco tempo de serviço, de acordo com os resultados, está influenciando a saúde do trabalhador, fato que pode comprometer a qualidade de suas atividades desenvolvidas. A saída das universidades e a entrada no mercado de trabalho, na maioria dos casos, e nas mais variadas ocupações, é passível de gerar stress no indivíduo.

Outros estudos mostram que(21-22) trabalhadores com pouca experiência profissional apresentam mais chances de desenvolver a sintomatologia por se sentirem pouco preparados para as responsabilidades da profissão. Em outro estudo(2) foi reportado que profissionais de enfermagem, brasileiros, que se encontravam em início de carreira, podiam se mostrar frustrados com o trabalho e, como consequência, apresentarem sensação de alienação, basicamente porque possuíam entendimento irrealista sobre o alcance e limites de suas práticas.

Em relação ao setor de lotação, os resultados mostraram que os profissionais que trabalhavam no setor administrativo eram os mais acometidos (40%). No universo administrativo, o enfermeiro responsável responde diretamente pelas Resoluções exigidas pelo Conselho de Enfermagem e atribuições definidas por órgão superior, e, dessa forma, os níveis de exigência acarretam para o profissional um conjunto de condições que podem resultar na Síndrome de Burnout. Ambientes fechados são carregados de atribuições e responsabilidades que levam o profissional a sofrer fortes influências de estressores.

Conclusão

Com o presente estudo, fez-se uma análise do processo de desgaste entre profissionais de enfermagem de diferentes setores hospitalares, proporcionando visão do adoecimento desses trabalhadores. Verificou-se que nos dois hospitais de Cáceres, MT, os profissionais de enfermagem mais acometidos pela Síndrome de Burnout eram aqueles com regime de trabalho diarista, com carga horária semanal de 30 horas, vínculo empregatício por meio de contrato, duplo vínculo empregatício, menor tempo de formação, com menos de um ano de trabalho na unidade e aqueles que possuíam, como setor de lotação, cargo administrativo.

Foram ressaltados alguns dos aspectos laborais ligados ao ambiente de trabalho hospitalar que interferem na qualidade de vida dos profissionais de enfermagem. Assim, destaca-se a necessidade de se propor mudanças organizacionais no ambiente de trabalho, com o fim de diminuir esses fatores que podem interferir na saúde do trabalhador. O trabalho não pode se constituir num fardo pesado, ou numa fonte de infortúnio ou desprazer. Ao contrário, deve proporcionar às pessoas condições de desenvolvimento de suas potencialidades e de autorrealização.

Espera-se que este estudo oportunize inquietações quanto ao tema, e que essas inquietações gerem novas discussões e pesquisas na área. Podendo, assim, contribuir tanto para o reconhecimento de Burnout em equipe de enfermagem quanto para o aumento da preocupação consciente de todos os envolvidos com a qualidade de vida dos profissionais de enfermagem.

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  • 1
    Flávia Maria de FrançaI; Rogério FerrariII; Diana Carla FerrariIII; Elioenai Dornelles AlvesIV
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      20 Nov 2012
    • Data do Fascículo
      Out 2012

    Histórico

    • Recebido
      04 Jan 2012
    • Aceito
      20 Ago 2012
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