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Significados do cuidar na promoção da saúde

Resumos

O estudo objetivou compreender os significados construídos pelos alunos e docentes sobre a promoção da saúde no processo de ensinar/aprender o cuidado de enfermagem. Trata-se de estudo qualitativo, tendo como referencial metodológico a Teoria Fundamentada nos Dados. Os dados foram obtidos por meio de entrevista, em três grupos amostrais, treze alunos e quatro docentes, e por meio da observação em sala de aula e nas reuniões dos docentes do Curso de Enfermagem. Do resultado dessa análise emergiu como tema central: construindo o ensinar e aprender na ordem, desordem e auto-organização para nova forma de cuidar, promovendo a saúde. O processo ensino/aprendizagem, encaminhado para promoção da saúde, desenvolve-se numa etapa de crise, indo de estado de ordem ao estado de desordem, que é incerto e contraditório quanto ao que a sociedade entende por saúde.

promoção da saúde; educação em enfermagem; saúde pública


The objective of the study is to understand the meaning built by students and professors on health promotion in the teaching and learning process of health care in Nursing. It is a qualitative study using ground theory as a methodological reference. Data was collected through interviews, with three samples groups, 13 students and four professors, by classroom observation, and through meetings with nursing professors. The central subject resulting from this analysis was: constructing teaching and learning in order, disorder and self organization for a new way of caring promoting health. The teaching/learning process directed at health promotion develops in a stage of crisis, going from a state of order to a state of disorder that is uncertain and contradictory regarding what society understands about health.

health promotion; education, nursing; public health


El estudio tuvo por objetivo comprender los significados construidos por los alumnos y docentes sobre la promoción de la salud en el proceso de enseñar/aprender el cuidado en Enfermería. Se trata de un estudio cualitativo teniendo como referencial metodológico la Teoría Fundamentada en los Datos. Los datos fueron obtenidos por medio de una entrevista en grupos de tres muestras, con trece alumnos y cuatro docentes de enfermería, a través de la observación en la sala de clases y durante las reuniones de los docentes. Del análisis surgió como tema central: construyendo el enseñar y aprender en orden, desorden y durante la auto-organización para promover la salud a través de una nueva forma de cuidar. El proceso de enseñanza/aprendizaje dirigido a la promoción de la salud se desarrolla durante una etapa de crisis, yendo de un estado de orden a un estado de desorden, que es incierto y contradictorio con relación a lo que la sociedad entiende por salud.

promoción de la salud; educación en enfermería; salud pública


ARTIGO ORIGINAL

Significados do cuidar na promoção da saúde

Gladys Carmela Santos FalcónI; Alacoque Lorenzini ErdmannII; Dirce Stein BackesIII

IDoutor em Enfermagem, Docente da Universidad Nacional Mayor de San Marcos, Peru, e-mail: gladys50@yahoo.com.br

IIEnfermeira, Doutor em Filosofia da Enfermagem, Professor Titular, e-mail: alacoque@newsite.com.br

IIIEnfermeira, Doutoranda, e-mail: backesdirce@ig.com.br. Universidade Federal de Santa Catarina, Brasil

RESUMO

O estudo objetivou compreender os significados construídos pelos alunos e docentes sobre a promoção da saúde no processo de ensinar/aprender o cuidado de enfermagem. Trata-se de estudo qualitativo, tendo como referencial metodológico a Teoria Fundamentada nos Dados. Os dados foram obtidos por meio de entrevista, em três grupos amostrais, treze alunos e quatro docentes, e por meio da observação em sala de aula e nas reuniões dos docentes do Curso de Enfermagem. Do resultado dessa análise emergiu como tema central: construindo o ensinar e aprender na ordem, desordem e auto-organização para nova forma de cuidar, promovendo a saúde. O processo ensino/aprendizagem, encaminhado para promoção da saúde, desenvolve-se numa etapa de crise, indo de estado de ordem ao estado de desordem, que é incerto e contraditório quanto ao que a sociedade entende por saúde.

Descritores: promoção da saúde; educação em enfermagem; saúde pública

INTRODUÇÃO

Este estudo emergiu dos questionamentos que fazíamos a formação dos profissionais de saúde em geral e da enfermagem em particular. Dentre os tópicos que foram motivo de reflexões com os colegas de trabalho, tanto na assistência quanto na docência estavam aqueles relacionados com as mudanças da sociedade nos últimos anos e que se refletiam na saúde, tendo-se, portanto, uma realidade complexa possibilitada por múltiplos fatores.

Nesse sentido, achávamos que os futuros profissionais, dentre os quais, os alunos de enfermagem, deveriam estar conscientes de tais mudanças e do contexto em geral e que os profissionais da saúde, mormente os docentes, deveríamos fazer propostas epidemiológicas e/ou metodológicas, que fornecessem respostas às necessidades da sociedade em termos de saúde. Dada a complexa da formação, acreditamos que os problemas devam ser estudados com diferentes abordagens e diferentes teorias, considerando as múltiplas inter-relações dos aspectos ligados à saúde.

É possível compreender que existem inadequações cada vez mais amplas, profundas e graves, entre, de um lado, os saberes desunidos, divididos, compartimentados e, de outro, as realidades ou problemas cada vez mais multidisciplinares, transversais, multidimensionais, transnacionais, globais e planetários (1). Pode-se dizer também que, nessa inadequação, torna-se invisível o contexto, o global, o multidimensional, o complexo.

Nessa direção, já é possível constatar que existem mudanças nos currículos de enfermagem com vistas a formar alunos com uma visão ampliada da saúde, considerando não só os aspectos curativos da doença. Acreditamos que seja necessário estudar esses novos currículos para saber de que maneira os alunos estão interiorizando tais conhecimentos e que significados estão construindo à promoção da saúde. Com base nessas e outras indagações, o estudo teve por objetivo compreender os significados construídos pelos alunos e docentes sobre a promoção da saúde no processo de ensinar/aprender o cuidado nas disciplinas Processo de Viver Humano I e II.

PERCURSO METODOLÓGICO

Procuramos um marco referencial que permitisse entender a problematica do objeto que se desenvolve numa realidade complexa, com problemas multidimensionais e múltiplas interações entre os atores sociais que vivenciam o processo de ensino/aprendizagem (professores e alunos) identificando, assim, a Teoria da Complexidade, desenvolvida por Morin e seguidores em todos os campos do saber.

A Teoria Fundamentada nos Dados (TFD) foi o referencial metodológico utilizado para atingir o objetivo de elaborar uma teoria substantiva com base nas vivências/experiências dos professores e alunos das disciplinas anteriormente mencionadas. A teoria deriva de dados recopilados de maneira sistemática e analisados por meio de um processo de investigação. Na TFD a coleta de dados, a análise e a teoria que surge deles guardam uma estreita relação entre si(2).

O estudo foi realizado no Curso de Enfermagem de uma universidade federal do sul do Brasil, instituição eleita por estar desenvolvendo um currículo novo, tendo como eixo central à promoção da saúde. A coleta de dados ocorreu no segundo semestre de 2005 e primeiro de 2006.

Os dados foram colhidos por meio do processo de amostragem teórica para gerar a teoria, no qual o investigador coleta codifica e analisa seus dados, decidindo quais dados coletar a seguir e onde encontrá-los, para desenvolver a teoria que está emergindo. A saturação teórica foi alcançada com 17 sujeitos entre alunos da primeira fase (quatro) e segunda fase (nove) e docentes (quatro) das disciplinas Processo de Viver Humano I (primeira fase) e Processo de Viver Humano II (segunda fase) do Curso de Enfermagem. Os entrevistados foram divididos em três grupos amostrais; seguindo os procedimentos recomendados pela TFD.

Para a análise dos dados se utilizou à codificação proposta em seus três momentos: Codificaçäo aberta, axial e seletiva(2). Nesta, considerou-se os dados obtidos pela observação participante em sala de aula com os alunos e nas salas de reunião com os docentes, as entrevistas e aqueles obtidos pela pesquisadora, como notas de observação, notas teóricas e notas metodológicas.

Os dados foram organizados segundo o modelo paradigmático, estabelecendo-se as categorias causais, o contexto, as condições intervenientes, as ações estratégicas e as conseqüências do fenômeno, atentando-se para as várias conexões entre categorias e categorias, entre categorias e subcategorias até a estruturação do fenômeno(3).

Contatos prévios foram estabelecidos com os diretores das instituições no sentido de informá-los a cerca dos procedimentos. Da mesma forma, o projeto seguiu as recomendações da Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde, que incorpora sob a ótica do indivíduo e das coletividades os quatro referenciais básicos da bioética: a autonomia, a não maleficência, a beneficência e a justiça, entre outros, além de assegurar os direitos e deveres que dizem respeito à comunidade científica, aos sujeitos da pesquisa e ao Estado(4). O projeto recebeu parecer favorável do Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Santa Catarina, sob o número 0273/05.

Para preservar o anonimato dos atores envolvidos, as contribuições significativas foram identificadas, no texto, com nomes fictícios.

ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

No início do estudo no Curso de Enfermagem que busca formar os alunos com base nas diretrizes do Ministério da Saúde e ênfase na saúde básica, na disciplina Processo de Viver Humano I foram encontradas diferentes percepções dos alunos em relação a sua formação para promover a saúde. Assim, a maioria deles considerava os temas abordados em sala de aula muito filosóficos e de pouca utilidade para sua vida profissional. Por outro lado, um pequeno grupo de alunos considerava os temas necessários para entender o ser humano que atenderiam na sua vida profissional. Essa contradição pode ser compreendida(5) quando entendemos que pessoas diferentes têm possibilidades de definir uma mesma situação de maneira diferente, porque os significados dos objetos variam de pessoa para pessoa. Eu acho que a teoria é importante, porque na primeira fase tem que ter teoria tem que ter filosofia, pelo fato de ajudar a gente pensar (Cristal).

A forma como a pessoa define a situação depende, de outro modo, de seu background, que é único em cada pessoa. O background do aluno depende de suas experiências prévias em relação à saúde, das suas leituras, das conversações com seus pais, seus amigos, familiares. Observou-se que os alunos que referiam os temas como necessários eram aqueles que tinham tido experiências prévias em saúde, como doença de algum familiar ou de si mesmos, ou experiências em cursos anteriores ou, também, como manifestaram, pela idade, tinham esse desejo de saber coisas novas, como se evidencia nos seguintes depoimentos: Eu sabia por meu pai, ele fez um enfarto, daí, eu fiquei com ele no hospital (Topázio). Uma questão de crescimento, de evolução pelo fato de ficar mais velho quer aprender coisas novas tipo sobre meio ambiente, saúde individual, saúde coletiva (Safira).

No estudo, mudanças ficaram evidentes nos alunos da segunda fase quando alguns manifestaram que consideravam importantes os temas desenvolvidos, tanto na disciplina Processo de Viver Humano I como em Processo II. Os alunos vão compreendendo a natureza do cuidado à medida que atendem o ser humano que precisa ser entendido e isso lhes exigirá certa familiaridade com os temas, chamados por eles de filosóficos. Na primeira fase já tira tudo isso de tua cabeça, esse monte de coisas que a gente traz, tira bastante (Ouro).

Para pensar a complexidade é preciso considerar que o tetragrama: ordem, desordem, interação e organização, estão presente no universo e na história humana em todas suas vertentes(6). Nessa direção, a desordem significa desvios que aparecem em qualquer processo, alterando-o de alguma forma. São os choques, os acidentes, as imprevisibilidades, as desintegrações, as agitações e o que é inesperado. No que diz respeito ao espírito, a desordem se explica pela incerteza e o autor o considera como fundamental para a evolução.

No processo de ensino/aprendizagem dirigido para a promoção da saúde, este último encontro entre dois fenômenos organizados pode ser evidenciado tanto nos alunos quanto nos docentes. Para os alunos que participaram da pesquisa, a ordem significa olhar a realidade com a visão biologista que trazem, produto do imaginário da sociedade, e dentro dessa ordem, o enfermeiro é aquele que trabalha só no hospital, realizando atividades técnicas.

Na universidade, essa ordem se desintegra quando os alunos se deparam na disciplina Processo de Viver Humano I, com temas sobre o ser humano, meio ambiente, processo saúde/doença, saneamento ambiental e outros relacionados com a promoção da saúde. Os alunos sofrem um choque, desordenam suas concepções sobre saúde, pois eles não relacionam esses temas com o trabalho do enfermeiro, não têm nada a ver com a imagem profissional do enfermeiro que trazem para a universidade. Portanto, nas aulas dessa disciplina eles se mostram contrários a esses temas, rejeitam-nos e queixam-se de que são muito abstratos e que têm muitas horas, pois aquilo não lhes diz nada: Em Processo I eu perguntava para que é essa disciplina? Se vou trabalhar com pessoas com problemas psicológicos, neurológicos, eles estão falando da vida, da filosofia, porque que estão fazendo isso, a gente questionava (Ouro).

A partir da desordem e pelas interações que estabelecem com os diferentes objetos (físicos, sociais e abstratos) no desenvolvimento das primeiras disciplinas (Processo de Viver Humano I e Processo de Viver Humano II), inicia-se o processo de transformação de seus conceitos. Quer dizer, os alunos vão auto-organizando seu saber e, ao ingressarem na segunda fase, conseguem dar sentido à sua formação porque começam a enxergar que existem outras formas de cuidar em saúde e, para desenvolvê-la, precisam rever as suas concepções a respeito. Assim, precisam discutir temas filosóficos. Como reflete o depoimento de Ágata: Até o primeiro semestre eu achava que a filosofia não tinha nada a ver com a enfermagem, porque Processo de Viver I não passou isso, então não achava nada significativo porque aquilo não me disse nada. Agora, já no segundo, a gente começa a entender que enfermagem não é só o prático, tem que conhecer, tem que saber chegar ao paciente, tem que conhecer, para isso precisa da filosofia, tem que tratar a pessoa (Ágata).

Por outro lado, os docentes também vivenciam esse processo do tetragrama: ordem, desordem, interação e organização durante o desenvolvimento de ensino/aprendizagem para promoção da saúde. Eles vivenciam uma situação de ordem no ensino quando lecionam disciplinas relacionadas com o que esperam os alunos, como Enfermagem Pediátrica, por exemplo. Nesses casos, os alunos mostram interesse e desejo de aprender, por considerarem parte da formação de enfermagem e de acordo com o seu imaginário.

A situação de desordem para os docentes se apresenta no desenvolvimento da disciplina Processo de Viver Humano I, quando a maioria dos alunos, apesar dos esforços dos professores, não mostra entusiasmo e/ou até mesmo mostram resistência ou rejeição aos temas desenvolvidos nas aulas, considerando-os muito "filosóficos". E para os professores pode ser um processo difícil, até doloroso, em alguns casos: Eu estava acostumada com os alunos que estavam gostando da disciplina, se envolvendo, quando a gente estava na pediatria. E agora, pela avaliação, a maioria não entendeu muito bem o porquê da disciplina e perguntam por que tantas horas? Por que esses temas? ... o processo está sendo doloroso para mim... não desisti, não ainda e não vou desistir tão fácil, mas é um processo que não é fácil (Professor 3).

Também os docentes organizam-se ante essa situação que chamam de paradoxal. Mediante as interações entre docentes da disciplina ou com docentes das outras disciplinas, e tendo em conta as avaliações dos alunos, vão fazendo modificações nas disciplinas. Os professores utilizam estratégias, como a metodologia problematizadora, procurando diminuir a abstração dos temas, fazendo modificações nas práticas, organizando-se e conseguindo a compreensão e participação dos alunos em forma processual. Você inicia com uma perspectiva e à medida que vai caminhando no condicionamento da proposta é preciso corrigir rumos. Nós estamos tentando corrigir para diminuir esse nível de abstração da disciplina Na verdade nos vamos aos pouquinhos, continuar, claro, com as discussões abstratas necessárias (Professor 2).

O conhecimento é considerado um diálogo entre nós e o universo, e nosso mundo real é aquele cuja desordem nunca poderá ser eliminada e de onde ele não poderá jamais se eliminar a si mesmo: Quer dizer que nosso conhecimento é subjetivoobjetivo, que pode assimilar os fenômenos ao combinar os princípios do tetragrama ordem/desordem/interação/organização, mas que continua sendo uma incerteza insondável quanto à natureza última desse mundo(6).

Nessa perspectiva, o autor acima referido, nos encoraja a trabalhar com a incerteza ao afirmar que "o trabalho com a incerteza perturba muitos espíritos, mas exalta outros, incitam a pensar aventurosamente e a controlar o pensamento. Incita a criticar o saber estabelecido, que se impõe como certo. Incita ao auto-exame e à tentativa de autocrítica"(6). Nessa direção, a educação deveria ensinar princípios de estratégias que permitam enfrentar os riscos, o inesperado, o incerto é necessário aprender em um oceano de incertezas através de arquipélagos de certeza(1).

A Carta de Ottawa preconiza as mudanças de atitudes dos profissionais e que estes sejam alcançados por meio de processos educativos, de um maior esforço da pesquisa em saúde, de treinamentos e de novos formatos organizacionais(7).

Neste estudo, se observou que os alunos esperam aprender a interagir com as pessoas na academia e na prática. Para isso, consideram importante, além das aulas teóricas, ter maior contato com a comunidade, e que esse contato deveria ser desde o início das aulas. Os alunos valorizam o conhecimento das pessoas da comunidade sobre o processo de saúde-doença, sua maneira de conservar a saúde e de reagir ante a doença. Este conhecimento, que é transmitido de pais a filhos, deve ser respeitado quando se cuida das pessoas, porque tem muito valor para elas: Eu acho importante o conhecimento popular porque não é totalmente errado, acho que é importante, porque a gente tem que conhecer também (Ágata).

Outro aspecto que foi evidenciado nesta pesquisa é a compartimentalização das disciplinas, tanto em Processo de Viver Humano I como em Processo de Viver Humano II, com relação às outras disciplinas do curso de enfermagem. Quer dizer, as disciplinas se desenvolvem separadamente, sem interconexões entre si. Para os docentes, existe uma falta de comunicação entre as disciplinas.

Em relação à compartimentalização das disciplinas pode se afirmar que o currículo escolar é mínimo e fragmentado(8). Na maioria das vezes peca tanto quantitativa como qualitativamente, não oferecendo nessas disciplinas a visão do todo, do curso e do conhecimento, nem favorecendo a comunicação e o diálogo entre os saberes. Quer dizer, as disciplinas, cada qual com seus programas e conteúdos, não se integram ou complementam, dificultando a perspectiva de conjunto que favorece a aprendizagem.

Os alunos associam a profissão do enfermeiro com a promoção da saúde. Consideram que ele está mais ligado com a comunidade e que tem um trato mais direto com as pessoas além de desenvolver os aspectos educativos. Acreditam que a formação do enfermeiro está dirigida à prevenção de doenças e promoção da saúde, considerando a educação para a prevenção de doenças. Acham que a participação do enfermeiro é fundamental para atuar na promoção da saúde, tanto no hospital como na comunidade. Eu acho que a participação de enfermagem é fundamental pelo caso que o contato que tem com outras pessoas. Então a função de enfermagem é preventiva, educativa, para a saúde é fundamental (Cristal). Eu acho que o enfermeiro está totalmente ligado à promoção da saúde (Ouro).

Os alunos da segunda fase de enfermagem pertencentes à disciplina Processo de Viver Humano II descobrem gradualmente o papel de educador do enfermeiro. Observamos, por suas expressões em sala de aula e nas entrevistas, que os alunos gostam desse aspecto educativo e o valorizam como um aspecto pelo qual o enfermeiro é reconhecido na comunidade. Igualmente, sentem-se muito satisfeitos quando desenvolvem um projeto educativo que lhes permite passar os conhecimentos aprendidos e, também, aprender com a comunidade.

No estudo, poucos alunos manifestaram que percebem a desigualdade existente na sociedade e que há uma relação entre a saúde e outros fatores, considerados como determinantes sociais da saúde, tais como: trabalho adequado, renda adequada, moradia digna, com boa alimentação e higiene adequada. Para esses alunos é importante a conscientização das pessoas para que estes modifiquem os seus estilos de vida.

Já o enfoque da promoção da saúde é mais amplo e abrangente; procura identificar e enfrentar os macro-determinantes do processo de saúde-doença, e transformá-los favoravelmente na direção da saúde(9-11). Para a promoção da saúde, o objetivo contínuo é um nível ótimo de vida e de saúde, portanto, a ausência de doenças não é suficiente, já que perante qualquer nível de saúde registrado em um indivíduo sempre haverá algo a ser feito para promover um nível de saúde melhor e condições de vida mais satisfatórias(12).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A Teoria da Complexidade nos ajudou a compreender o quanto é complexo o processo de ensinar/aprender focando a promoção da saúde, possibilitando-nos verificar as inúmeras interconexões que apresenta. Não é um processo fácil de desenvolver, nem para os professores nem para os alunos, pois inclui as (des) construções, construções e reconstruções que os seus atores sociais precisam fazer no percurso.

O processo ensino/aprendizagem encaminhado para promoção da saúde desenvolve-se, pois, numa etapa de crise, indo de um estado de ordem (pensamento biologista da saúde) a um estado de desordem (formando para promoção da saúde), que é incerto e contraditório quanto ao que a sociedade entende por saúde. Para pensar a complexidade é preciso considerar que o tetragrama: ordem, desordem, interação e organização estão presentes no universo e na história humana em todas as suas vertentes(6). O autor reconhece que na realidade se produz uma perturbação causada pelo encontro eventual entre dois fenômenos organizados, como aconteceu com o caso estudado.

A utilização da TFD como referencial metodológico nos permitiu mostrar o fenômeno com base na análise de aspectos causais, contextuais e das ações ou estratégias utilizadas pelos docentes para desenvolver o fenômeno. Também foram identificados os aspectos intervenientes que dificultam as ações/estratégias e, finalmente, permitiu-nos mostrar as conseqüências de tal processo.

Como conseqüência desse processo de (des)construção e reconstrução do fenômeno, os alunos inter-relacionam a saúde com a sociedade e o meio-ambiente e começam a vislumbrar outras formas de cuidar em saúde. Alguns alunos passaram a mostrar preferência pela área da saúde comunitária para desenvolverem ações de promoção da saúde sendo profissionais.

Verificamos que, para os alunos, um dos aspectos mais importantes de sua formação é o relacionado com o aspecto educativo. Eles valorizam muito o desenvolvimento dos projetos educativos, pelo qual demonstraram grande interesse. Valorizam estes projetos, porque aprendem a trabalhar em grupo, porque aplicam os temas anteriormente desenvolvidos em aula e pela capacidade de passar os seus conhecimentos para a comunidade.

Nesse processo, mostra-se pertinente à análise da comunidade educativa do Curso de Enfermagem, principalmente a necessidade de repensarmos a formação em enfermagem, com o enfoque da Nova Promoção da Saúde, baseado nos determinantes sociais. Neste estudo, foram poucos os alunos que mencionaram tais determinantes e/ou demonstraram ter consciência de seus efeitos na saúde da população. Pelo que foi observado, os alunos acreditam que basta ensinar a mudar estilos de vida para promover a saúde, considerando que os próprios sujeitos/membros da comunidade têm a responsabilidade por sua saúde.

REFERÊNCIAS

  • 1. Morin E. Os sete saberes necessários à educação do futuro. São Paulo: Cortez; 2004.
  • 2. Strauss A, Corbin J. Bases de la Investigación Cualitativa. Técnicas y Procedimientos para desarrollar la Teoría Fundamentada. Colombia: Editorial Universidad de Antioquia; 2002.
  • 3. Santos LHP dos, Cassiani SHB. Vivendo em constante conflito: o significado da prática docente no ensino médio de enfermagem. Rev Latino-am Enfermagem 2000 outubro; 8(5): 58-64.
  • 4
    Ministério da Saúde (BR). Resolução nº. 196. Diretrizes e normas técnicas regulamentadoras de pesquisa envolvendo seres humanos. Brasília (DF): MS; 1996.
  • 5. Morin E, Almeida MC. Educação e complexidade: Os Sete Saberes e outros Ensaios. São Paulo: Cortez; 2002.
  • 6. Morin E. Ciência com consciência. 7ş ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil; 2003.
  • 7. World Health Organization - WHO. The Ottawa Charter for Health Promotion. Ottawa, Canada, November; 1986.
  • 8. Petraglia IC, Morin E. A educação e a complexidade do ser e do saber. 8ş ed. Petrópolis: Vozes; 2003.
  • 9. Buss PM. Uma Introdução ao Conceito de Promoção da Saúde. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2003.
  • 10. Carvalho SR. Saúde coletiva e promoção da saúde. Sujeito e mudança. São Paulo: HUCITEC; 2005.
  • 11. Lefevre F, Lefevre AC. Promoção de saúde: a negação da negação. Rio de Janeiro: Vieira & Lent; 2004.
  • 12. Gutiérrez J. Controvérsias disciplinares e compromissos pendentes na pesquisa contemporânea em educação ambiental. Rev Educação Pública 2003; 12(22): 29-37.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    30 Jul 2008
  • Data do Fascículo
    Jun 2008

Histórico

  • Aceito
    20 Fev 2008
  • Recebido
    08 Out 2007
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