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Adaptação transcultural e validação da European Heart Failure Self-care Behavior Scale para o português do Brasil

Resumos

OBJETIVO: adaptar e validar a European Heart Failure Self-Care Behavior Scale para uso na língua portuguesa do Brasil. MÉTODOS: o processo de adaptação cultural (tradução, síntese, retrotradução, revisão por comitê de especialistas e pré-teste) e validação (validade de face, de conteúdo e fidedignidade) foi realizado de acordo com a literatura. A European Heart Failure Self-Care Behavior Scale avalia os componentes-chave para o autocuidado: reconhecimento dos sinais e sintomas de descompensação da insuficiência cardíaca (IC) e a tomada de decisão na ocorrência desses sintomas. É composta por 12 questões (variando de 12-60, baixos escores indicam melhor autocuidado). RESULTADOS: foram incluídos 124 pacientes com IC com idade de 62,3±12 anos. A consistência interna das questões apresentou um alfa de Cronbach de 0,70 e a reprodutibilidade avaliada pelo coeficiente de correlação intraclasse foi de 0,87. CONCLUSÃO: a validade de face, de conteúdo, a consistência interna e a reprodutibilidade conferiram validade e fidedignidade ao instrumento para uso no Brasil.

Insuficiência Cardíaca; Autocuidado; Educação em Enfermagem; Estudos de Validação


OBJECTIVE: To adapt and validate a Brazilian Portuguese version of the European Heart Failure Self-Care Behavior Scale. METHODS: The cross-cultural adaptation (translation, synthesis, back-translation, expert committee review, and pretesting) and validation (assessment of face validity, content validity, and internal consistency reliability) were carried out in accordance with the literature. The European Heart Failure Self-Care Behavior Scale assesses key components of self-care: recognition of the signs and symptoms of decompensated heart failure (HF) and decision-making when these signs and symptoms arise. It comprises 12 items (range 12-60, where lower scores indicate better self-care). RESULTS: The sample comprised 124 HF patients with a mean age of 62.3 ± 12 years. The Cronbach's Alpha internal consistency was 0.70 and the intraclass correlation coefficient for reproducibility was 0.87. CONCLUSION: Face and content validity, internal consistency and reproducibility have lended validity and reliability for the use of the instrument in Brazil.

Heart Failure; Self-care; Nursing Education; Validation Studies


OBJETIVO: Adaptar y validar European Heart Failure Self-Care Behavior Scale para uso en lengua portuguesa de Brasil. MÉTODOS: El proceso de adaptación cultural (traducción, síntesis, retro traducción, revisión por comité de expertos y pré test), validación (validez de facie, de contenido y confiabilidad) fue realizado según la literatura. La European Heart Failure Self-Care Behavior Scale evalúa los componentes-clave para el auto cuidado: reconocimiento de señales y síntomas de descompensación de insuficiencia cardiaca (IC) y la decisión cuando ocurren dichos síntomas. Se compone de 12 cuestiones (que van desde 12-60, en donde las puntuaciones bajas indican peor autocuidado). RESULTADOS: Fueron inclusos 124 pacientes con IC, con edad entre 62,3 ±12 años. La consistencia interna de las cuestiones presentó un Alfa de Cronbach de 0,70 y la reproducibilidad evaluada por el coeficiente de correlación. CONCLUSIÓN: La validad de fase, de contenido, la consistencia interna y la reproducibilidad concedieron validad y confiabilidad al instrumento para uso en Brasil.

Insuficiencia Cardíaca; Autocuidado; Educación en Enfermería; Estudios de Validación


ARTIGO ORIGINAL

Adaptação transcultural e validação da European Heart Failure Self-care Behavior Scale para o português do Brasil

Maria Karolina FeijóI; Christiane Wahast ÁvilaI; Emiliane Nogueira de SouzaII; Tiny JaarsmaIII; Eneida Rejane RabeloIV

IEstudantes de mestrado, Escola de Enfermagem, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil

IIEstudante de doutorado, Professor Assistente, Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre, Brasil

IIIPhD, Professor, Department of Social and Welfare Studies, Faculty of Health Sciences, Linköpings Universitet, Suécia

IVPhD, Professor Adjunto, Escola de Enfermagem, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil

Endereço para correspondência

RESUMO

OBJETIVO: adaptar e validar a European Heart Failure Self-Care Behavior Scale para uso na língua portuguesa do Brasil.

MÉTODOS: o processo de adaptação cultural (tradução, síntese, retrotradução, revisão por comitê de especialistas e pré-teste) e validação (validade de face, de conteúdo e fidedignidade) foi realizado de acordo com a literatura. A European Heart Failure Self-Care Behavior Scale avalia os componentes-chave para o autocuidado: reconhecimento dos sinais e sintomas de descompensação da insuficiência cardíaca (IC) e a tomada de decisão na ocorrência desses sintomas. É composta por 12 questões (variando de 12-60, baixos escores indicam melhor autocuidado).

RESULTADOS: foram incluídos 124 pacientes com IC com idade de 62,3±12 anos. A consistência interna das questões apresentou um alfa de Cronbach de 0,70 e a reprodutibilidade avaliada pelo coeficiente de correlação intraclasse foi de 0,87.

CONCLUSÃO: a validade de face, de conteúdo, a consistência interna e a reprodutibilidade conferiram validade e fidedignidade ao instrumento para uso no Brasil.

Descritores: Insuficiência Cardíaca; Autocuidado; Educação em Enfermagem; Estudos de Validação.

Introdução

Estudos recentes têm enfatizado a importância da educação sistemática sobre a doença e autocuidado para pacientes com insuficiência cardíaca(1-2). Os objetivos desse processo são ensinar, reforçar, melhorar e avaliar constantemente as habilidades dos pacientes para o autocuidado(1). A educação sistemática contribui para a prevenção dos fatores precipitantes de descompensação da doença e, consequentemente, redução do número de reinternações(2). No entanto, as informações e orientações que são dispensadas aos pacientes em ambientes como hospital, clínicas de insuficiência cardíaca e domicílio nem sempre são avaliadas em relação à efetividade da sua implementação(3).

No contexto da insuficiência cardíaca, o autocuidado pode ser definido como adesão à medicação, às recomendações sobre estilo de vida (dieta e exercícios físicos) e manejo da doença aos mínimos sinais de descompensação(3). Enquanto vários questionários estão disponíveis para avaliação de autocuidado e conhecimento da doença, há poucos estudos que sugerem ferramentas breves e práticas, voltadas para pacientes com insuficiência cardíaca(3-5).

No contexto da insuficiência cardíaca, o autocuidado também foi foco de interesse para a elaboração de instrumentos que pudessem avaliar esse comportamento entre os pacientes. O primeiro instrumento, originalmente denominado Self-management of Heart Failure Instrument, foi desenvolvido por enfermeiras pesquisadoras americanas e projetado para avaliar a capacidade dos pacientes de lidar com a doença. Desde a sua primeira publicação, o instrumento tem sido amplamente adaptado(6).

Na Europa, um grupo de pesquisadores desenvolveu e validou o instrumento denominado European Heart Failure Self-care Behavior Scale (EHFScBS), que consiste de 12 questões referentes ao autocuidado, incluindo a verificação diária do peso, a restrição de sal e líquidos, a prática de atividade física e a busca por ajuda pela equipe de saúde, quando surgem os sinais de descompensação. O desenvolvimento desse instrumento foi baseado nos pressupostos teóricos da Teoria do Autocuidado de Orem(7). A primeira versão da escala foi desenvolvida em holandês e traduzida para o inglês e o sueco. Dos 20 itens do instrumento original, todos foram reavaliados, e aqueles com pontuações inferiores foram retirados. A versão final do instrumento com doze itens, desenvolvido em inglês, foi traduzido e retrotraduzido para o sueco e, após, para o holandês. A mesma metodologia foi adotada para a utilização em outras línguas(3). A validade de face e concorrente foi estabelecida e a consistência interna da escala foi testada. Essa escala foi validada através de uma variedade de populações e culturas e foi utilizada na avaliação de mais de 2.590 pacientes(8-10).

Estão disponíveis, atualmente, dois instrumentos validados e específicos para a avaliação do autocuidado em pacientes com insuficiência cardíaca: Self-care Heart Failure Index(6) e a European Heart Failure Self-care Behavior Scale(3). Ambos foram submetidos a testes psicométricos rigorosos, entretanto, foram elaborados para avaliar diferentes aspectos do comportamento de autocuidado. As variações das informações obtidas sobre o comportamento de autocuidado das duas escalas permitem que os profissionais de saúde possam optar pelo instrumento que melhor atende as necessidades dos pacientes, da equipe e do cenário de cuidados de saúde(11).

A decisão em validar a EHFScBS para o uso na população brasileira deveu-se aos aspectos avaliados pelo instrumento original, o pequeno número de questões e a grande miscigenação da população brasileira, o que poderia replicar a variedade de países em que o instrumento já foi validado (a EHFScBS está disponível atualmente em 14 línguas). Além disso, a escala avalia os dois comportamentos-chave para o autocuidado na insuficiência cardíaca: o reconhecimento dos sinais e sintomas de descompensação e a tomada de decisão na ocorrência desses sintomas, guiando a equipe nas suas estratégias com consequente alcance da estabilidade clínica(3). Recentemente, a EHFScBS foi usada em um estudo com pacientes com insuficiência cardíaca, em acompanhamento ambulatorial, com o objetivo de identificar os fatores determinantes para o autocuidado. Através da análise dos escores da EHFScBS foi possível identificar que os recursos individuais utilizados, para a manutenção do autocuidado, podem ser alvo de constante melhoria(12). Assim, através da abordagem educativa para o autocuidado, aliada a ferramentas de avaliação desse comportamento, é possível identificar quais determinantes demonstram-se frágeis, necessitando de abordagem intensiva ou diferenciada.

Uma vez que a melhora ou a estabilidade do estado de saúde dos pacientes com insuficiência cardíaca está relacionado ao autocuidado, é imprescindível que as intervenções realizadas sejam avaliadas constantemente através de instrumentos validados, fidedignos e, sobretudo, factíveis de serem replicados na prática clínica(13).

Considerando que a avaliação do conhecimento sobre a prática do autocuidado é ferramenta importante para guiar a equipe no seguimento e evolução dos pacientes, somada à inexistência de escalas validadas no Brasil, que sejam de fácil aplicação, é que se conduziu a realização deste estudo. Os resultados desta pesquisa poderão auxiliar a equipe de saúde no reforço das orientações e estratégias para melhorar as habilidades dos pacientes e seus cuidadores para a prática diária do autocuidado.

Objetivo

O objetivo deste estudo foi adaptar e validar a EHFScBS em uma amostra de pacientes brasileiros com insuficiência cardíaca em acompanhamento ambulatorial em um hospital universitário.

Métodos

Desenho do estudo

Estudo metodológico, que se caracteriza como uma investigação de métodos para organização e análise de dados, projetados para a avaliação e validação de instrumentos e técnicas de pesquisa(14). Este estudo foi desenvolvido em um ambulatório especializado de insuficiência cardíaca de um hospital universitário, do Sul do Brasil. Os dados foram coletados de março a julho de 2009.

Instrumento

O instrumento EHFScBS, validado neste estudo, consiste de 12 questões com um único domínio relacionado ao comportamento de autocuidado. As respostas para cada item variam de 1, " eu concordo plenamente" a 5, "eu discordo plenamente", seguindo uma escala tipo Likert, de cinco pontos. A pontuação total é obtida pela soma de todas as respostas, que podem variar de 12 a 60. Os valores baixos indicam melhor autocuidado. Os itens dizem respeito aos diversos comportamentos de autocuidado de pacientes com insuficiência cardíaca, como verificação de peso diário (item 1), repouso (itens 2 e 7), busca de ajuda pela equipe de saúde (itens 3, 4, 5 e 8), restrição de líquidos (item 6), dieta (item 9), adesão às medicações (item 10), vacinação anual contra a gripe (item 11) e prática de exercícios (item 12)(3).

Adaptação transcultural

No presente estudo, utilizou-se como referencial teórico uma das propostas mais descritas na literatura para a adaptação de instrumentos, preconizadas por pesquisadores da França, no início dos anos 90(15). Essa proposta foi revisada e sua última atualização foi publicada em 2007. Foram seguidas as seguintes etapas: tradução, síntese, retrotradução, revisão pelo comitê de especialistas, pré-teste e validação das propriedades psicométricas(16). Antes do processo de adaptação, foi obtida a autorização dos autores do instrumento original para traduzir e adaptá-lo para o português do Brasil.

Por se tratar de instrumento originalmente desenvolvido em idioma diferente (inglês), foi necessária a tradução por dois especialistas no idioma de origem. O tradutor 1 deveria conhecer os conceitos que estavam sendo analisados no instrumento a ser traduzido. Suas adaptações são destinadas a fornecer a equivalência, a partir de uma perspectiva mais clínica, produzindo tradução que proporciona equivalência mais confiável do ponto de vista da medição. O tradutor 2 não deveria conhecer os conceitos a serem abordados e, de preferência, não ter nenhum conhecimento de ciências da saúde. A atuação desse tradutor permite, portanto, detectar diferenças de significado entre o texto original e a tradução inicial, sendo menos influenciada pelos objetivos acadêmicos, fornecendo tradução que reflete a linguagem utilizada pela população alvo, muitas vezes, destacando significados ambíguos no instrumento original. As duas versões foram comparadas e discutidas até que se chegasse a um consenso entre os tradutores. Após a versão preliminar do instrumento, foi elaborada a síntese da tradução com a participação conjunta de ambos os tradutores e o pesquisador, auxiliados pelo documento original. O resultado obtido foi o instrumento final. A etapa de retrotradução envolveu a tradução do instrumento para o idioma de origem. Foram produzidas duas retrotraduções por dois tradutores diferentes, tendo a língua de origem do instrumento como sua língua materna. Os dois tradutores não deveriam conhecer nem serem informados sobre os conceitos explorados e, de preferência, não terem formação na área de saúde. As principais razões são para evitar o viés de informação e suscitar significados inesperados dos itens do instrumento traduzido, aumentando, assim, a probabilidade de ter as "imperfeições destacadas". O objetivo dessa etapa foi melhorar a tradução final, identificando possíveis falhas na interpretação, de adaptação cultural e contextual e ambiguidades na versão de origem. Essa versão foi enviada para o autor do instrumento que aprovou a sua versão final(16).

Um comitê de especialistas, composto por 12 profissionais (três médicos, dois nutricionistas, seis enfermeiros pós-graduados com experiência na área de insuficiência cardíaca e um profissional de linguística), avaliou a versão do instrumento em português, visando um acordo por consenso e a melhoria do instrumento. A equivalência semântica, idiomática, experimental e conceitual do instrumento foi aperfeiçoada. A versão final foi definida e submetida ao pré-teste. Após a aprovação da versão final, o pré-teste foi realizado em uma amostra de 30 indivíduos da população alvo do instrumento. As questões que apresentaram índice de incompreensão de 20%, ou mais, foram revistos(16). Foram necessários aproximadamente 10 minutos para aplicar o instrumento aos pacientes.

Propriedades psicométricas

A validade de conteúdo foi avaliada pelo comitê de especialistas com análise da relevância de cada item do instrumento. A validade de face foi avaliada pela compreensão e aceitação dos itens pelos pesquisadores e pela amostra de pacientes do pré-teste(14-16).

A fidedignidade do instrumento foi avaliada pela consistência interna (alfa de Cronbach) e reprodutibilidade (pré e pós-teste). Os pacientes que fizeram parte do pré e pós- teste foram convidados a retornar ao hospital de sete a 14 dias para reaplicação do instrumento. A reprodutibilidade foi avaliada em 24 pacientes, do total de 124 incluídos no estudo(14-16).

A versão adaptada do instrumento foi denominada Versão Brasileira da European HeartFailure Self-care Behavior Scale.

Cálculo do tamanho de amostra

O tamanho da amostra foi calculado em 124 pacientes. De acordo com a literatura, o tamanho da amostra deve ser, pelo menos, cinco vezes maior do que o número de variáveis em análise, ao passo que o tamanho mais aceitável teria uma razão de 10:1(17). De acordo com o referencial teórico adotado(16), os 30 pacientes do pré-teste não compuseram a amostra total para validade do instrumento. Para a reprodutibilidade (pré e pós-teste) foram necessários 24 pacientes (de um total de 124), para detectar uma diferença de 4 pontos no escore total, considerando um coeficiente de correlação de r=0,8, desvio-padrão=9 e um α=0,05 com poder estatístico de 90%.

Logística do estudo

O instrumento foi aplicado a pacientes de ambos os sexos, com idade igual ou maior que 18 anos, com diagnóstico prévio de insuficiência cardíaca (critérios de seleção semelhantes aos dos pacientes incluídos para o desenvolvimento da escala original)(3). O presente estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética da Instituição de origem, sob número 08-622. Os pacientes com déficits cognitivos, que pudessem comprometer a conclusão do instrumento, foram excluídos da amostra. Todos os pacientes acompanhados no ambulatório de insuficiência cardíaca passam, previamente, por avaliação de seu estado cognitivo, através do Mini-Mental Status Exam. Pacientes com pontuação menor ou igual a 23 foram classificados como tendo déficit cognitivo e excluídos do estudo(18).

O instrumento foi aplicado pelo enfermeiro pesquisador em uma sala reservada. Um questionário destinado à coleta de dados clínicos e demográficos também foi aplicado.

Análises estatísticas

As análises estatísticas foram realizadas utilizando o Statistical Package for the Social Sciences, versão 17.0. As variáveis contínuas foram expressas como média±desvio-padrão ou mediana e intervalo interquartílico. As variáveis categóricas foram expressas em frequências absolutas ou relativas (n e %). O alfa de Cronbach foi utilizado para a análise da consistência interna. O coeficiente de correlação intraclasse foi utilizado para verificar a reprodutibilidade do instrumento no pré-teste e pós-teste(19).

Resultados

Sujeitos

A escala foi aplicada em uma amostra de 124 pacientes com idade média de 62,3±12 anos. A maioria dos pacientes era do sexo masculino, 50% tinha mais de 5 anos de estudo. Outras características são demonstradas na Tabela 1.

Adaptação Transcultural

Durante o pré-teste alguns pacientes apresentaram dificuldade de compreensão da escala Likert, relacionada às alternativas "eu concordo plenamente" e "eu não concordo", portanto, foi estabelecido que essas alternativas poderiam ser adaptadas, como nos exemplos: "concordo plenamente", "quase sempre", "às vezes concordo", "quase nunca concordo", "discordo plenamente". As adaptações consistiram em mudança no instrumento a fim de melhorar a compreensão dos pacientes e reduzir a subjetividade, durante a aplicação do mesmo.

Nas questões referentes aos sinais de descompensação da insuficiência cardíaca (3 - se minha falta de ar aumenta, eu contato com meu médico ou enfermeira, 4 - se meus pés ou pernas tornam-se mais inchados, eu contato com meu médico ou enfermeira, 5 - se eu ganhar 2kg em uma semana, eu contato com meu médico ou enfermeira, 8- se eu apresentar cansaço, eu contato com meu médico ou enfermeira) foi acrescentada uma alternativa adicional, pois a maioria dos pacientes da amostra era atendida pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e os pacientes não eram atendidos por um único médico ou enfermeira. Assim, as questões foram modificadas para: se eu ganhar 2kg em uma semana, eu entro em contato com meu médico ou enfermeira (ou algum serviço de saúde).

Figura 1


A média dos escores dos instrumentos está mostrada na Tabela 2. Como no instrumento original(3), a escala foi aplicada em uma clínica de insuficiência cardíaca. No presente estudo o escore total foi 24,7±8,5.

Reprodutibilidade

Consistência Interna

A reprodutibilidade, através do alpha de Cronbach, variou de 0,61 a 0,70. Abaixo, na Tabela 3, são demonstrados os coeficientes para o total, correlação item/total e após a exclusão de cada um dos itens.

Reprodutibilidade: pré e pós-teste

Para avaliar a reprodutibilidade, foram analisados dados de 24 pacientes que completaram o pré e o pós-teste. O coeficiente de correlação intraclasse foi de 0,87.

Discussão

Este estudo teve por objetivo traduzir, adaptar e validar o instrumento EHFScBS para a população brasileira. Foi realizado um teste-piloto em uma amostra de pacientes brasileiros com diagnóstico de insuficiência cardíaca, em acompanhamento em ambulatório especializado de um hospital universitário.

Duas adaptações foram realizadas durante o pré-teste. A primeira consistia em inserir uma frase que correspondia às respostas para os itens 2, 3 e 4, de modo a reduzir a subjetividade das respostas dos pacientes. O segundo ajuste foi feito para os itens relativos ao reconhecimento de sinais de descompensação e na busca de atendimento médico. Como este estudo foi realizado em um hospital público, a alternativa de que os pacientes poderiam procurar atendimento em uma unidade de saúde, em caso de descompensação, foi adicionada a cada item.

Uma nova versão deste instrumento foi recentemente desenvolvida pelo mesmo autor da escala original. Afirmações como "se eu sinto falta de ar, eu descanso", "eu descanso durante o dia" e "eu tomo a vacina contra a gripe todos os anos" foram removidas. Os autores inferiram que os pacientes realizam essas ações como resultado da progressão da doença ou piora dos sintomas, o que não indica melhor capacidade de manejo do autocuidado. Além disso, eles decidiram que a vacinação anual contra a gripe não é uma atividade de autocuidado específica da insuficiência cardíaca(20). Na versão da escala validada para uso no Brasil, foi encontrado um escore semelhante ao do estudo original, e não foram encontradas dificuldades na administração do instrumento, embora as questões relativas ao descanso não revelem melhor capacidade de autocuidado e se considere a vacinação contra o vírus da gripe uma medida importante. Durante a aplicação da escala, identificou-se que os pacientes não tinham consciência da importância dessa medida, sendo reforçada a importância dessas orientações durante as consultas com o paciente(20).

A consistência interna da versão adaptada da escala foi determinada por meio do alfa de Cronbach. Em uma amostra de 124 pacientes, o alfa foi de 0,70. Alguns autores sugerem que a consistência interna dos itens deva ser classificada da seguinte forma: valores >0,9 são considerados excelentes, >0,8 são considerados bons, >0,7 são aceitáveis, >0,6 são questionáveis, >0,5 são pobres, e ≤0,5 são considerados inaceitáveis. No entanto, não há um limite inferior para o coeficiente(16). Em algumas áreas de pesquisa, tais como as ciências sociais, alfa de Cronbach de 0,6 é considerado aceitável, desde que os resultados sejam interpretados com cautela(21). Em uma metanálise, os valores de alfa de Cronbach variaram de 0,70-0,82, no entanto, não houve relação entre o valor do alfa e as características estudadas(22). Embora o valor de alfa de Cronbach encontrado neste estudo tenha sido inferior ao do estudo original (0,81), ele está dentro do intervalo aceitável.

No presente estudo, a reprodutibilidade do instrumento foi verificada em 24 pacientes, por meio do pré e pós-teste. O coeficiente de correlação intraclasse foi escolhido, pois o coeficiente Kappa requer que todos os escores ocorreram pelo menos uma vez. Como a maioria das respostas variou de uma pontuação de 1, 3 ou 5, o coeficiente Kappa não poderia ser utilizado. O coeficiente de correlação intraclasse foi de 0,87 (adequado). Estudos de validação da EHFScBS, realizados na Europa, demonstraram resultados semelhantes(23-25). Em um estudo japonês, que validou a EHFScBS em cenário ambulatorial, foram encontrados valores de reprodutibilidade de 0,33 a 0,87, medidos pelo coeficiente Kappa(24). Portanto, o coeficiente de reprodutibilidade obtido em dois países não europeus indica que o instrumento é adequado.

Quando analisado, o escore da escala validada para o português foi maior do que o encontrado no estudo original para pacientes em um ambulatório especializado, que receberam orientações de enfermagem antes de autoaplicação do instrumento(3). Os escores foram mais baixos do que em um estudo realizado no Japão, com valores que evidenciaram diminuição da capacidade para a autocuidado, quando comparada com a de outras populações, ainda que os pacientes recebessem orientações em um ambiente muito semelhante ao de outros estudos(24).

O autocuidado ainda é objeto de investigação em diversos cenários, principalmente porque é reconhecido como um componente-chave para os pacientes desfrutarem dos benefícios do seu tratamento. No entanto, a aplicação prática do autocuidado por pacientes e seus cuidadores é um exercício contínuo de persistência, e seus resultados podem ser observados em médio e longo prazo(6).

O desenvolvimento de escalas que permitem que as equipes avaliem esses parâmetros torna-se essencial nesse contexto e essas escalas devem ser seguidas pela validação para diferentes idiomas. Dessa forma, revisões para a atualização e aperfeiçoamento dos instrumentos previamente validados tornaram-se necessárias para a prática clínica(3,26).

Como não há instrumentos, com o objetivo de avaliar o autocuidado em pacientes com insuficiência cardíaca, já validados para populações brasileiras, a validade de critério não pôde ser estabelecida, pois isso teria exigido o uso de um instrumento padrão-ouro. Acredita-se que essa foi a principal limitação do estudo.

Os resultados deste estudo mostram que o instrumento testado é válido e reprodutível para avaliação do comportamento de autocuidado em pacientes brasileiros com insuficiência cardíaca. O instrumento revela-se um instrumento útil, rápido e fácil de utilizar em qualquer cenário de saúde.

A validação da EHFScBS pode permitir sua aplicação em diversos cenários na prática (clínicas de insuficiência cardíaca, em domicílio, unidades básicas de saúde e monitoramento por telefone). Esse instrumento permite aos enfermeiros e médicos parâmetros objetivos de comportamento de autocuidado, principalmente no que diz respeito ao reconhecimento dos benefícios da adesão ao tratamento pelos pacientes.

Conclusões

A escala EHFScBS foi adaptada e validada para a população brasileira. Foi demonstrado que se trata de importante ferramenta para avaliar o autocuidado em pacientes com insuficiência cardíaca e, consequentemente, avaliar a efetividade das ações implementadas pela equipe multidisciplinar.

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  • Corresponding Author:

    Eneida Rejane Rabelo
    Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Escola de Enfermagem
    Rua São Manoel, 963
    Bairro: Rio Branco
    CEP: 90620-110, Porto Alegre, RS, Brasil
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      20 Nov 2012
    • Data do Fascículo
      Out 2012

    Histórico

    • Recebido
      02 Mar 2012
    • Aceito
      05 Out 2012
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