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O consumo de álcool entre mulheres que vivem em contextos rurais

RESUMO

Objetivo:

identificar os motivos associados ao consumo de álcool em mulheres que vivem em contextos rurais.

Método:

pesquisa descritiva de abordagem qualitativa, cujos dados foram obtidos a partir de entrevistas semiestruturadas, realizadas entre março e agosto de 2018, com 23 mulheres em consumo de álcool que residem em áreas rurais na região Centro Ocidental do Rio Grande do Sul. Foi utilizada análise textual discursiva, balizada pela Teoria bioecológica do desenvolvimento humano.

Resultados:

Os motivos associados ao consumo de álcool são: lazer, transporte, características territoriais e culturais, porém esses diferem entre as mulheres que vivem em zonas rurais e as que vivem em assentamentos.

Considerações finais:

O contexto onde as mulheres rurais vivem influencia no consumo de álcool. Portanto, faz-se necessário a inclusão de diretrizes nas políticas públicas que contemple a problemática das mulheres rurais.

Descritores:
Consumo de Bebidas Alcoólicas; População Rural; Saúde da Mulher; Saúde Pública; Serviços de Saúde

ABSTRACT

Objective:

to identify the reasons associated with alcohol consumption in women living in rural contexts.

Method:

a descriptive study with a qualitative approach, whose data were obtained from semi-structured interviews, conducted between March and August 2018, with a total of 23 women in alcohol consumption who live in rural areas in Central Western Rio Grande do Sul. We used a discursive textual analysis, marked by the Bioecological Theory of human development.

Results:

The reasons associated with alcohol consumption are: leisure time, transportation, territorial and cultural characteristics, but they differ between women living in rural areas and those living in settlements.

Final considerations:

The context in which rural women live influences alcohol consumption. Therefore, it is necessary to include guidelines in public policies that address the problematic of rural women.

Descriptors:
Consumption of Alcoholic Beverages; Rural Population; Women’s Health; Public Health; Health Services

RESUMEN

Objetivo:

Identificar los motivos asociados al consumo de alcohol en mujeres que viven en contextos rurales.

Método:

Se trata de una investigación descriptiva de enfoque cualitativo, con datos obtenidos mediante entrevistas semiestructuradas realizadas entre marzo y agosto de 2018, entre 23 mujeres consumidoras de alcohol que residen en contextos rurales de la región Centro-Occidental de Río Grande del Sur. Se utilizó el análisis textual discursivo, basado en la teoría ecológica del desarrollo humano.

Resultados:

Las razones asociadas al consumo de alcohol son: ocio, transporte, características territoriales y culturales; sin embargo, estas difieren de las mujeres que viven en zonas rurales y de las que viven en asentamientos.

Consideraciones finales:

El contexto en el que viven las mujeres rurales influye en el consumo de alcohol. Por lo tanto, es necesario incluir directrices que aborden el problema de la mujer rural en las políticas públicas.

Descriptores:
Consumo de Bebidas Alcohólicas; Población Rural; Salud de la Mujer; Salud Pública; Servicios de Salud

INTRODUÇÃO

O consumo de álcool por mulheres se constitui em sério problema devido à maior vulnerabilidade dos tecidos, essas mulheres são mais propensas a desenvolver cirrose hepática, miocardiopatias precoces, hipertensão arterial e acidente vascular cerebral. Além disso, se comparadas às mulheres abstinentes, também têm maiores chances de desenvolver câncer de mama e distúrbios como dismenorreia, hipermenorréia, desconforto pré-menstrual e variações do ciclo menstrual(11 Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia para Políticas Públicas de Álcool e Outras Drogas (INPAD) . II Levantamento Nacional de Álcool e Drogas (LENAD). [Internet]. São Paulo; 2014 [cited 2019 Mar 6]. Available from: https://inpad.org.br/wp-content/uploads/2014/03/Lenad-II-Relat%C3%B3rio.pdf
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).

Do ponto de vista social, a mulher em uso de álcool é alvo de estigma social mais intenso, uma vez que seu papel social está fortemente baseado na responsabilidade pelo cuidado da família, sobretudo dos filhos e do lar(22 Costa MC, Silva EB, Soares JSF, Borth LC, Honnef F. Rural women and violence situation: access and accessibility limits to the healthcare network. Rev Gaúcha Enferm. 2017;38(2):e59553. doi: 10.1590/1983-1447.2017.02.59553
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). Nesse sentido, quando a mulher se torna dependente de álcool, a família também se fragiliza. No caso das mulheres que vivem em contextos rurais, as censuras e as críticas por parte de sua comunidade são ainda mais fortes, devido às normas culturais desse contexto específico.

Estudos mostram que em regiões rurais, onde predomina uma cultura mais conservadora, as relações são fortemente influenciadas por uma organização patriarcal que coloca a mulher em posição inferior à do homem(33 Cruz AB, Araújo LA, Costa TMM. Cultura rural: resistências e modificações observadas no campo a partir da inserção da tecnologia. Anais do 2º workshop de geografia cultural: da cultura material ao simbolismo cultural 24 e 25 de junho de 2015, Alfenas-MG. [Internet]. 2015 [cited 2019 Mar 6];99-109. Available from: https://www.unifal-mg.edu.br/geografia/sites/default/files/rural99-109.pdf
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-44 Dworkin ER, Vazquez LZ, Cunningham SR, Pittenger SL, Schumacher JA, Stasiewicz PR. et-al. Treating PTSD in Pregnant and Postpartum Rural Women with Substance Use Disorders. Rural Ment Health [Internet] 2017 [cited 2019 Mar 6]; 41 (2):136-51. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/28983389
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/2898...
). Nesses contextos, o trabalho da mulher ainda inclui, predominantemente, cuidar da casa, dos filhos, da alimentação, da higiene e, além disso, ajudar o companheiro no campo. Assim, o homem detém o domínio do trabalho e administra a produção familiar e financeira(22 Costa MC, Silva EB, Soares JSF, Borth LC, Honnef F. Rural women and violence situation: access and accessibility limits to the healthcare network. Rev Gaúcha Enferm. 2017;38(2):e59553. doi: 10.1590/1983-1447.2017.02.59553
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3 Cruz AB, Araújo LA, Costa TMM. Cultura rural: resistências e modificações observadas no campo a partir da inserção da tecnologia. Anais do 2º workshop de geografia cultural: da cultura material ao simbolismo cultural 24 e 25 de junho de 2015, Alfenas-MG. [Internet]. 2015 [cited 2019 Mar 6];99-109. Available from: https://www.unifal-mg.edu.br/geografia/sites/default/files/rural99-109.pdf
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-44 Dworkin ER, Vazquez LZ, Cunningham SR, Pittenger SL, Schumacher JA, Stasiewicz PR. et-al. Treating PTSD in Pregnant and Postpartum Rural Women with Substance Use Disorders. Rural Ment Health [Internet] 2017 [cited 2019 Mar 6]; 41 (2):136-51. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/28983389
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/2898...
). No Brasil, quando se trata de mulheres que vivem em contextos rurais, as associações entre consumo de álcool e violência se potencializam, uma vez que, em geral, a vida se desenrola em territórios afastados dos grandes centros e, por conseguinte, dos recursos de saúde, sociais, políticos e comunitários. Tais fatores dificulta o acesso às estruturas que podem promover maior proteção a essas mulheres(22 Costa MC, Silva EB, Soares JSF, Borth LC, Honnef F. Rural women and violence situation: access and accessibility limits to the healthcare network. Rev Gaúcha Enferm. 2017;38(2):e59553. doi: 10.1590/1983-1447.2017.02.59553
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).

Estudos que associam as condições de vida ao consumo de álcool, particularmente às condições sociais singulares dessas mulheres, são escassos em nível nacional e internacional. A maior parte do conhecimento produzido sobre essa temática específica advém de pesquisas que abordam o alcoolismo em homens e em mulheres urbanas, o que não contempla as particularidades das mulheres em consumo de álcool que residem em contextos rurais(44 Dworkin ER, Vazquez LZ, Cunningham SR, Pittenger SL, Schumacher JA, Stasiewicz PR. et-al. Treating PTSD in Pregnant and Postpartum Rural Women with Substance Use Disorders. Rural Ment Health [Internet] 2017 [cited 2019 Mar 6]; 41 (2):136-51. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/28983389
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5 Dimenstein M, Leite J, Macedo JP, Dantas C. Condições de vida e saúde mental em contextos rurais. São Paulo: Intermeios; 2016. 428p.
-66 Barik A, Rai RK, Chowdhury A. Alcohol Use-Related Problems among a rural indian population of west bengal: an applicationof the alcohol use disorders identification test (AUDIT). Alcohol Alcoholism [Internet] 2016 [cited 2019 Mar 6]; 51 (2):215-23. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/26294678
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/2629...
).

Igualmente, essa lacuna identificada na literatura se reproduz no campo das políticas públicas. No que se refere à Política Nacional de Saúde Mental(77 Ministério da Saúde (BR) Nota Técnica nº 11/2019. Esclarecimentos sobre as mudanças na Política Nacional de Saúde Mental e nas Diretrizes da Política Nacional sobre Drogas [Internet]. 2019[cited 2019 Mar 6]. Available from: http://pbpd.org.br/wp-content/uploads/2019/02/0656ad6e.pdf
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), não há uma diretriz estabelecida de atenção à população rural. Mesmo na mais recente Política Nacional à Saúde Integral das Populações do Campo e da Floresta de 2013, não há nenhuma referência quanto as particularidades territoriais, sociais e culturais que demarcam os modos de vida dessas populações e, consequentemente, as necessidades de saúde, os modos de adoecer e de cuidado, os modos de consumo de álcool, para nortear o planejamento e ordenamento das redes de atenção, assim como a oferta de ações e serviços de cunho psicossocial(88 Dantas CMB, Dimenstein M, Leite JF, Torquato JL, Macedo JP. A pesquisa em contextos rurais: desafios éticos e metodológicos para a psicologia. Psicol Soc [Internet]. 2018 [cited 2019 Mar 6];30:e165477. Available from: http://www.scielo.br/pdf/psoc/v30/1807-0310-psoc-30-e165477.pdf
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).

Da mesma forma, a política do Ministério da Saúde para a Atenção Integral a Usuários de Álcool e outras drogas, implantada em 2003, aborda a problemática do alcoolismo de modo geral, no entanto, não contempla o alcoolismo em mulheres. Já a Política Nacional de Atenção Integral a Saúde da Mulher, de 2004, inseriu em suas diretrizes a atenção à saúde da mulher rural(99 Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Gestão Estratégica e Participativa. Departamento de Apoio à Gestão Participativa Tecendo a saúde das mulheres do campo, da floresta e das águas: direitos e participação social [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde ; 2015 [cited 2019 Mar 6]. 60p. Available from: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/tecendo_saude_mulheres_campo_floresta.pdf
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), todavia tem-se mais de uma década de PNAISM e as ações de saúde a essa população específica são limitadas(22 Costa MC, Silva EB, Soares JSF, Borth LC, Honnef F. Rural women and violence situation: access and accessibility limits to the healthcare network. Rev Gaúcha Enferm. 2017;38(2):e59553. doi: 10.1590/1983-1447.2017.02.59553
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). Em síntese, as Políticas Públicas de saúde não contemplam atendimento especializado à mulher em consumo de álcool e que vive em contextos rurais(1010 Santos AM, Silva MRS. A experiência de cuidar da mulher alcoolista na família. Rev Esc Enferm USP. 2012 [cited 2019 Mar 6];46(2):364-71. doi: 10.1590/S0080-62342012000200014
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), ou seja, não consideram que essas mulheres têm especificidades e enfrentam adversidades que precisam ser tratadas.

Essas lacunas identificadas na literatura e nas políticas pública justificam a necessidade de aprofundar o estudo sobre o uso de álcool em mulheres que vivem em contextos rurais, mais especificamente acerca dos motivos associados, uma vez que têm forte impacto sobre a vida familiar. A questão norteadora do estudo foi: Quais os motivos associados ao consumo de álcool em mulheres que vivem em contextos rurais?

OBJETIVO

Identificar os motivos associados ao consumo de álcool em mulheres que vivem em contextos rurais.

MÉTODO

Aspectos éticos

O estudo respeitou os preceitos relativos a pesquisas com seres humanos, estabelecidos pela Resolução nº 466, de 12 de dezembro de 2012, do Conselho Nacional de Saúde(1111 Ministério da Saúde (BR). Conselho Nacional de Saúde Resolução nº 466, de 12 de dezembro de 2012. Dispõe sobre a pesquisa com seres humanos [Internet]. Brasília, 2012[cited 2019 Mar 6]. Available from: https://conselho.saude.gov.br/resolucoes/2012/Reso466.pdf
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). O anonimato das mulheres participantes foi garantido por meio da utilização do sistema alfanumérico, utilizando a letra M (Mulher), seguida de números arábicos, 1, 2, até 23. A proposta de investigação foi submetida aos Comitês de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Rio Grande - FURG em 28 de fevereiro de 2018, com número no Certificado de Apresentação para Apreciação Ética.

Referencial teórico-metodológico

Para a interpretação utilizou-se a teoria Bioecológica de desenvolvimento humano, de Bronfenbrenner(1212 Bronfenbrenner U. Bioecologia do desenvolvimento humano: tornando os seres humanos mais humanos. Porto Alegre: Artmed; 2011. 310p.), a qual permitiu compreender as questões culturais, sociais e demais interações que perpassam a vida da mulher em consumo de álcool. Justifica-se tal teoria pela possibilidade de compreender os fenômenos a partir das características pessoais, do processo, do contexto e do tempo. A teoria aplicada a esse estudo permite compreender o consumo de álcool entre mulheres rurais em diferentes perspectivas. A pessoa que vive nesse contexto tem sua vida fortemente marcada pelas características desse lugar, o qual também possui aspectos sociais, os quais atribui às interações entre a mulher em consumo de álcool e que vive no contexto rural com a família, com o trabalho na agricultura, com os serviços de saúde e com o contexto onde vive e como essas interações influenciam diretamente no processo de viver dessa mulher. Portanto, o contexto no qual a pessoa vive é envolvido de interações que progridem por meio do tempo e determina o que lá ocorre(1212 Bronfenbrenner U. Bioecologia do desenvolvimento humano: tornando os seres humanos mais humanos. Porto Alegre: Artmed; 2011. 310p.).

A teoria permitiu o conhecimento de como as participantes vivenciam certa experiência (uso do álcool), posta em contextos distintos. Esses contextos possuem aspectos físicos e sociais, que os individualizam e desempenham influência no sujeito e na família.

Tipo de estudo

Trata-se de uma pesquisa descritiva(1313 Flick U. Introdução à pesquisa qualitativa. 3.ed. Porto Alegre: Artmed; 2009. 405p.) de abordagem qualitativa(1414 Gil AC. Métodos e técnicas de pesquisa social. 6. ed. São Paulo: Atlas; 2008. 220p.) norteado pela ferramenta SRQR - Standards for Reporting Qualitative Research) .

Cenário do estudo

Este estudo foi realizado em áreas rurais de um município da região Centro Ocidental do Rio Grande do Sul, o qual foi escolhido por ser de pequeno porte e a maioria da população residir em áreas rurais. Nessas áreas encontram-se também assentamentos de Reforma Agrária do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Ressalta-se que a pesquisadora possui vínculo com as mulheres, pois atuou na supervisão de aulas práticas de discentes do curso de graduação em Enfermagem, o que facilitou a condução das entrevistas sem intercorrências.

Fonte de dados

Para elegibilidade das participantes do estudo, utilizou-se como critério de inclusão: ser mulher, ter mais de 18 anos e residir em áreas rurais do município de estudo há pelo menos um ano, ou seja, pessoas que realmente vivenciam o contexto rural. Além desses, considerou-se o histórico de consumo de bebida alcoólica, identificado pelos Agentes Comunitários de Saúde (ACS) da Unidade de Saúde (ESF) de referência da região. Bem como o fato de não pertencer à área de abrangência da ESF de referência foi o critério de exclusão considerado. A coleta de dados ocorreu entre março e agosto de 2018, nos domicílios das participantes. O primeiro contato com as mulheres rurais ocorreu durante as Visitas Domiciliares realizadas pelos ACS.

Coleta e organização dos dados

Realizou-se entrevistas com vinte e três (23) mulheres em consumo de álcool, todas foram indicadas pelos ACS e nenhuma das mulheres recusou-se a participar. No momento da entrevista face a face o ACS não participou, o diálogo ocorreu somente entre uma das pesquisadoras e as participantes, em um espaço reservado do domicílio escolhido por elas, e teve duração média de 50 minutos. Foi utilizado um roteiro organizado por cinco etapas: (1) Caracterização das participantes; (2) Interação da mulher com o álcool; (3) Interação da mulher alcoolista com a família; (4) Interações sociais com ênfase na relação da mulher com o trabalho; e, (5) Interações com os serviços de saúde. Neste artigo são apresentados os resultados da análise dos dados relativos às etapas um e dois. O material foi devidamente gravado e transcrito.

Análise dos dados

A análise dos dados fundamentou-se na Análise Textual Discursiva, adotando as etapas preconizadas por seus autores Moraes e Galiazzi(1515 Moraes R, Galiazzi MC. Análise textual discursiva. 2. ed. Ijuí: Unijuí; 2016. 224p.), ou seja, aos dados coletados aplicou-se o processo que se inicia com a desmontagem dos textos, etapa em que os textos foram separados em unidades de significado. Depois passou a se fazer a articulação de significados semelhantes, isto é, estabelecimento de relações. Posteriormente, captou-se o que de novo surgia nas falas e, por fim, reúnem-se os textos interpretativos em um processo denominado de categorização(1313 Flick U. Introdução à pesquisa qualitativa. 3.ed. Porto Alegre: Artmed; 2009. 405p.).

RESULTADOS

Caracterização das participantes do estudo

Dentre as 23 mulheres que participaram do estudo 11 residem em áreas rurais e 12 residem em assentamentos rurais, sendo que todas relatam consumir álcool no dia a dia. A faixa etária variou entre 21 e 66 anos, sendo que dez mulheres têm entre 21 e 30 anos; seis tem entre 31 e 39 anos; cinco tem entre 41 e 56 anos; e, duas tem entre 57 e 66 anos. São mulheres procedentes de diferentes regiões do Estado do Rio Grande do Sul, mas que no momento da coleta de dados estavam residindo em áreas rurais do município do Capão do Cipó - RS. Têm em média três filhos, com exceção de uma mulher que não teve filhos. A maioria (18) é católica.

Quanto à escolaridade: onze mulheres possuíam ensino fundamental incompleto e três mulheres possuíam o ensino médio incompleto. Da mesma maneira três possuíam o ensino médio completo, uma possuía ensino superior, uma possuía ensino técnico e quatro não frequentaram a escola. Em relação ao número de filhos: sete possuíam três filhos oito tiveram um filho, três mulheres tiveram dois filhos, outras três possuíam quatro filhos, uma tiveram oito filhos e uma não tem filhos.

A renda das participantes variou entre um e dois salários mínimos (R$ 937,00 - salário mínimo) e 12 recebem adicionalmente o benefício Bolsa Família, do Governo Federal. No que se refere à ocupação, 13 mulheres trabalham em suas próprias lavouras, três são assalariadas em granjas, duas em leiteiras, uma vive com o dinheiro do arrendamento de suas terras, uma mulher viúva vive da pensão deixada pelo marido, uma faz um curso técnico e duas se declaram donas de casa. Todas dependem exclusivamente do Sistema Único de Saúde.

Motivos associados ao consumo de álcool entre mulheres que vivem em contextos rurais

A análise dos dados apontou diferentes motivos associados ao consumo de álcool - segundo a percepção das mulheres rurais que participaram deste estudo - que estão relacionados com o contexto em que vivem. As mulheres que vivem em Assentamentos de Reforma Agrária, do (MST), referem um sentimento de não pertencimento ao lugar onde vivem, sentem-se tristes e angustiadas. Esse território é reconhecido por elas como um lugar isolado e sem perspectivas, e os motivos associados referem-se às difíceis condições sociais como: a) dificuldades de acesso ao transporte; b) falta de lazer; c) isolamento e solidão pelas características territoriais; d) forte presença de bares nos assentamentos.

Quanto às mulheres que vivem em zonas rurais, elas possuem um sentimento de pertencimento ao contexto rural e os motivos associados ao consumo de álcool podem ser categorizados como práticas sociais, incluindo lazer e entretenimento com a família/amigos. Contudo, destaca-se o costume cultural de beber em família. Portanto, as motivações para o uso do álcool entre as mulheres rurais vinculam-se aos núcleos de convivências, bem como os costumes locais e familiares.

O contexto do assentamento e o consumo de álcool entre as mulheres

Entre as mulheres que vivem em assentamentos parece não existir o sentimento de pertencimento ao lugar onde vivem. São mulheres que se reconhecem tristes, isoladas e sem perspectivas para o futuro.

Eu queria sair desse lugar, eu não gosto daqui [assentamento]. Eu sempre quis sair, desde que nós chegamos aqui, pode perguntar para ele [esposo], vê se é mentira, eu não me sinto bem aqui, não gosto desse lugar. Quando eu vou para a cidade parece que eu me sinto mais feliz. Não é para mim aqui, eu sempre digo para ele [companheiro], aqui não é para mim, desde o dia que entremos aqui para morar, eu chorei dia inteiro, é distante de tudo. (M4)

No contexto do assentamento, os fatores sociais como falta de atividades de lazer, dificuldade de transporte e de acesso, contribuem para o consumo de álcool. Todas as mulheres que vivem em assentamentos (12) relataram que há poucas possibilidades de lazer e entretenimento, assim como forte presença de bares, denominados pelas participantes pela expressão “bolichos” e “bodegas”.

Na comunidade não tem nada, mas tem bodega [bares]. Então é uma comunidade que tem pouca coisa para ser feito. (M2)

Eu fico só em casa, não saio para lado nenhum. Não tem aonde ir aqui [no assentamento]. Daí eu tenho tomado cervejinha, mas não demais [risos, risos]. (M9)

Tem gente que toma cachaça, caipira, essas coisas, esses são mais fortes, eu sempre tomo cervejinha das mais fracas. (M9)

A gente só fica em casa, a gente conversa, toma mate, assistimos televisão, às vezes eu e a mãe saíamos, daí a gente vai ao bar eu e a mãe. (M3)

Em relação aos recursos para deslocamento nos assentamentos, as respostas das participantes dão ênfase à ausência de transportes, o que dificulta o acesso ao lazer, ao entretenimento e, também, aos serviços de saúde.

O transporte é problema aqui, porque às vezes tem exame para fazer e não tem transporte, daí tem que pagar um carro que é R$ 150,00 ou R$ 180,00. E para sair, ir a algum lugar na cidade também não tem como. (M12)

Aqui tem o transporte escolar, mas é um favor que eles fazem de dar carona algumas vezes. Se eles quiserem dar carona, dão, mas eles não têm obrigação. E nós, para pagar uma corrida, não temos condições. (M16)

A um tempo atrás estavam falando que ia ter [transporte aqui], mas não saiu. Então, tudo é a pé. É bem dificultoso para tudo, para se divertir, para ir a mercado, e no caso de doenças, então...! (M13)

Na verdade, no assentamento é difícil. Quando chega visita, aí a gente faz a janta e conversa, toma uma cervejinha, começa a dar risada, começa a brincar, vamos dizer que tomamos umas quatro ou cinco latas. (M17)

Para as mulheres que vivem em assentamentos, as características do contexto onde vivem as colocam em isolamento, “longe de tudo e de todos”. Esse é um problema que gera angústia e, consequentemente, constitui-se como um fator que contribui para o consumo de álcool entre essas mulheres.

Ah para se distrair é difícil né, não sai mais nada na comunidade só quando eles fazem alguma atividade do CRAS [Centro de Referência da Assistência Social]. No assentamento não sai atividades, é tudo muito longe de tudo. Isso angustia um pouco, não tem muitas vizinhas, daí não tem onde a gente sair. As mulheres podiam se juntar e fazer alguma coisa, algo diferente, mas não! Não fazem nada, a gente fica isolada. (M12)

Aqui que comecei [beber]. Eu morava [em outra cidade] bem maiorzinha. Lá eu morava bem em uma avenida. Para mim, a principal razão que me leva a beber é o distanciamento. Eu nunca me vi morar assim [longe]. Foi por causa disso que eu entrei numa angústia profunda, bebia um dia e no outro também. Só queria saber de cerveja, cerveja, cerveja e cerveja. (M12)

O contexto rural e o consumo de álcool entre as mulheres

Outros motivos associados ao consumo de álcool, apontado pelas mulheres rurais que participaram deste estudo, estão relacionados com o costume de beber em família e com os amigos. As mulheres que vivem em contextos rurais se referem características sociais e culturais próprias desse ambiente que podem contribuir para o consumo de álcool. Essas características se relacionam com a família, com o lazer próprio do contexto rural.

Quando nós vamos numa festa ou em um baile bebemos um pouco, mas não daquele jeito, ah não posso ir embora porque eu bebi demais! É tomar uma, duas, três cervejas, uns refrigerantes, às vezes a gente toma uma Vodka, um samba, é isso. (M20)

Sempre tem alguma coisa aqui na localidade, alguma festa, porque as gurias [filhas] participam do grupo de dança do CTG [Centro de Tradições Gaúchas]. Aí todo sábado a gente vai de carro levar elas no grupo, depois tem a janta e a gente sempre toma umas cervejas, eu e meu companheiro. (M10)

Entre as manifestações de diversão, algumas mulheres rurais mencionam as tradições culturais (danças gaúchas) apreendidos por gerações familiares anteriores.

Nós fomos da [administração] no piquete CTG [Centro de Tradições Gaúchas], fomos sócios fundadores. Então, era mais fácil faltarem os músicos do que nós, nós sempre participamos, sempre trabalhamos, sempre se divertimos e bebemos. Nós íamos porque gostávamos de danças gaúchas. É de família isso [gostar do CTG], bebo de vez em quando porque eu gosto de tomar uma cerveja, gosto mesmo. (M21R)

Com relação ao transporte, várias mulheres que vivem em contextos rurais (10) têm veículos próprios. Os depoimentos mostram que ter um meio de transporte disponível facilita o acesso as práticas sociais e ao lazer, que, por consequência, também se associam ao consumo de álcool.

Temos carro próprio, a maioria que trabalha em granja. Todo mundo tem carro próprio. Aí só não vão para cidade quando chove. Sobre sair, a gente faz assim, com as mulheres daqui a gente faz curso essas coisas, tem mateada também. Nós organizamos mateada daqui de cima [localidade rural], pelo menos uma ou duas vezes por mês, nós nos vemos, todas as mulheres. (M19)

Ah a gente sai, a semana passada a gente foi para [cidade], foi eu e meus pais, saímos um pouco. A gente gosta muito de acampamento. No verão a gente foi acampar. Lá no meu pai tem um rio, gostamos de acampar. Também escuto música e assisto TV. Gosto muito de lidar na horta, com flor ou cuidar os bichos, alguma coisa assim, aprendi com minha família gostar dessas coisas. Nós [família] somos bem companheiros para beber cerveja, sempre foi assim. Às vezes eles me convidam e vamos beber uma lata ou duas. Eles não se importam de eu beber alguma coisa, porque nós bebemos mesmo para se divertir. (M11)

DISCUSSÃO

As participantes deste estudo que vivem em assentamentos da reforma agrária, do Movimento Sem Terra (MST), manifestam um sentimento de não pertencimento ao lugar onde vivem, sentem-se tristes e angustiadas. O território do assentamento para essas mulheres mostra-se não como um local de vida. Confirmado na literatura(1616 Groff A, Maheirie K, Prim L. A Experiência de Coletivização em um Assentamento de Reforma Agrária do MST. Psicol Pol [Internet] 2009 [cited 2019 Mar 6]; 9 (17):113-28. Available from: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/rpp/v9n17/v9n17a08.pdf
http://pepsic.bvsalud.org/pdf/rpp/v9n17/...
-1717 Bertoni LM, Santos RVR. Alcoolismo e meio rural. Rev Geo N [Internet] 2017 [cited 2019 Mar 6]; 1:98-113. Available from: https://seer.ufs.br/index.php/geonordeste/article/view/6122/pdf
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), esse fato pode ser explicado por questões ideológicas do movimento (entre não ter a posse da terra e ter a posse), já que a vida das mulheres que vivem em assentamentos é caracterizada por sentimentos de medo, desânimo e impotência, em virtude de que na maioria das vezes não possuem a cultura da ruralidade e são alocadas nesse espaço para o trabalho na agricultura.

Essas mulheres relatam poucas possibilidades de lazer e entretenimento. A forte presença de bares, as dificuldades de transporte e as características territoriais dos assentamentos são presentes nos depoimentos, demonstrando, assim, que esses são motivos associados ao consumo de álcool. Corroborando esses resultados, outro estudo realizado no Sri Lanka mostra que o isolamento é um dos fatores mais predisponentes ao uso de álcool entre a população rural(1818 Ariyasinghe D, Abeysinghe R, Siriwardhana P, Dassanayake T. Prevalence of major depressive disorder among spouses of men who use alcohol in a rural community in central Sri Lanka. Alcohol Alcoholism [Internet] 2015 [cited 2019 Mar 6]; 50 (3):328-332. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4398988/
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/article...
). As áreas de assentamento onde foi realizado este estudo são geograficamente isoladas, fato esse que pode tornar as mulheres mais vulneráveis ao consumo de álcool. Igualmente, em estudo realizado com mulheres na Índia foi demonstrado que o padrão do uso de álcool foi superior nas mulheres que residiam em áreas de isolamento geográfico, atraso social e econômico(66 Barik A, Rai RK, Chowdhury A. Alcohol Use-Related Problems among a rural indian population of west bengal: an applicationof the alcohol use disorders identification test (AUDIT). Alcohol Alcoholism [Internet] 2016 [cited 2019 Mar 6]; 51 (2):215-23. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/26294678
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/2629...
). Estudo realizado na África, com mulheres que vivem em diferentes áreas rurais e urbanas, evidenciaram que o ambiente social e o isolamento refletem no consumo de álcool(1919 Letsela L, Weiner R, Gafos M, Fritz K. Alcohol availability, marketing, and sexual health risk amongst urban and rural youth in South Africa. AIDS Behav [Internet] 2019 [cited 2019 Mar 6]; 23 (1):175-189. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC6342855/
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/article...
).

A condição da mulher que vive em assentamentos é delineada por dificuldades de acesso ao lazer, de transporte e de solidão. Essas estão relacionadas às grandes distâncias, falta de transporte nos assentamentos e ausência de práticas culturais, o que demonstra que o uso de bebida alcoólica parece ser a única forma de entretenimento na percepção dessas mulheres. Em estudo realizado em assentamentos na Bahia, foi evidenciado que beber é “quase que a única forma de se divertir na região do assentamento”(1717 Bertoni LM, Santos RVR. Alcoolismo e meio rural. Rev Geo N [Internet] 2017 [cited 2019 Mar 6]; 1:98-113. Available from: https://seer.ufs.br/index.php/geonordeste/article/view/6122/pdf
https://seer.ufs.br/index.php/geonordest...
). Nesse sentido, a pessoa que vive nesse contexto tem sua vida fortemente marcada pelas “características desse lugar, o qual possui aspectos sociais e físicos”(1515 Moraes R, Galiazzi MC. Análise textual discursiva. 2. ed. Ijuí: Unijuí; 2016. 224p.). Do ponto de vista social, pode-se atribuir às interações entre a mulher assentada com o contexto onde vive, ou seja, como o trabalho, família e atividades sociais. Quanto aos aspectos físicos, pode-se conferir as dificuldades de acesso pelas características territoriais dos assentamentos, que também se apresentam como um limitador a essas mulheres. Estudo realizado, em um ambulatório francês, com mulheres que consomem álcool evidenciou que poucas mulheres procuram os serviços de saúde, o que demonstra a necessidade de maior conhecimento das características específicas das mulheres rurais para, assim, desenvolver programas que aumentem o acesso a serviços de tratamento especializado entre essas mulheres(2020 Bourion BS, Urmès IC, Bédès A, Baumann ABC. Factors involved in seeking care at a specialty service among alcoholic rural French women: a cross-sectional study of rural women. Presse Méd. 2019; 48(12):361-8. doi: 10.1016/j.lpm.2019.09.046
https://doi.org/10.1016/j.lpm.2019.09.04...
).

Quanto às mulheres que vivem em áreas rurais, os motivos associados ao consumo de álcool referem-se ao lazer, divertimento com a família/amigos e hábitos culturais, pois os depoimentos mencionam que o uso do álcool tem forte ligação com festividades entre as famílias. A mulher que nasce e vive no contexto rural traz consigo valores culturais próprios do viver rural, como o trabalho na horta, tradições como danças gaúchas e o uso de álcool. É interessante ressaltar que a cultura é um elemento social, impossível de se desenvolver individualmente. Pode-se então considerar que o contexto assume papel fundamental, visto que é nele que as interações acontecem(1515 Moraes R, Galiazzi MC. Análise textual discursiva. 2. ed. Ijuí: Unijuí; 2016. 224p.), mas não necessariamente as determinam.

É importante destacar que, segundo a percepção das participantes deste estudo, o consumo de álcool tem características associadas particularmente ao contexto onde vivem. Por outro lado, estudo realizado com mulheres rurais da região de Telangana de Andhra Pradesh, que avaliou a prevalência do uso de álcool entre as mesmas, constatou que tal prática é inferior em 5%(2121 Potukuchi PS, Rao GP. Problem alcohol drinking in rural women of Telangana region, Andhra Pradesh. Indian J Psychiatr [Internet] 2010 [cited 2019 Mar 6]; 52 (4):339-44. Available from: http://www.indianjpsychiatry.org/temp/IndianJPsychiatry524339-7384399_203043.pdf
http://www.indianjpsychiatry.org/temp/In...
). Por essa razão é preciso considerar que existe uma relação importante com as características próprias dessas mulheres associadas ao contexto onde vivem, evidenciando que a dependência de álcool é determinada pela interação entre diversos motivos associados e não somente determinada pelo contexto onde vivem.

Quanto ao transporte para a população deste estudo, cabe salientar que para as mulheres que vivem em assentamentos, o transporte é um fator limitante para o acesso as práticas de lazer e isso contribui para o consumo de álcool, por outro lado, para as mulheres que vivem em áreas rurais, o transporte facilita o acesso a determinados serviços, assim como para atividades de lazer, que também se associam ao consumo de álcool.

Levando em consideração a realidade de ambos os contextos (assentamentos e áreas rurais), tornam-se imprescindíveis políticas intersetoriais e ações educativas, de promoção da saúde e de prevenção do alcoolismo em mulheres que vivem nessas áreas. Além disso, políticas intersetoriais (secretaria de transporte e secretaria de saúde) necessitam trabalhar coletivamente, todavia entende-se a questão política como um dispositivo importante a fim de amenizar problemas e qualificar a atenção à saúde dessas mulheres.

Limitações do estudo

Este estudo não contou com o critério de dose-padrão para caracterizar o consumo de álcool na população estudada. Além disso, os resultados apresentados neste manuscrito são um recorte do material de pesquisa de tese, o que implica em impossibilidade de totalidade dos resultados.

Contribuições para a área da Enfermagem, Saúde ou Política Pública.

O presente estudo contribuiu para evidenciar o quanto o contexto onde as mulheres vivem podem interferir no uso do álcool. No âmbito da enfermagem na Atenção Primária Rural, o estudo evidencia o quanto é necessário identificar sinais precoces de abuso de bebida alcoólica entre as mulheres rurais e traçar estratégias educativas com as mulheres e suas famílias, no sentido de levar em conta os hábitos culturais da família rural.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Conhecer os motivos associados ao consumo de álcool entre as mulheres que residem nos assentamentos de reforma agrária mostrou o quanto esse contexto pode estar associado ao consumo problemático. Além disso, as dificuldades de transporte e espaços de convivência/lazer expõem essas mulheres ao consumo de álcool, uma vez que a bebida alcoólica passa a constituir como uma forma de entretenimento na percepção das mulheres que vivem em assentamentos. Quanto às mulheres rurais, é possível que o consumo de álcool relatado seja motivado pela forma de lazer, festividades e principalmente de hábitos culturais de familiares.

Em termos de políticas públicas, há muito para avançar, visto que não há diretriz específica para o alcoolismo em mulheres rurais. É indispensável um olhar apurado para as populações do campo, conhecer as especificidades e de que forma funcionam como comunidade.

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Editado por

EDITOR CHEFE: Antonio José de Almeida Filho
EDITOR ASSOCIADO: Hugo Fernandes

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    21 Set 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    17 Ago 2019
  • Aceito
    26 Mar 2020
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