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Caso Povo Indígena Xukuru vs. Brasil: Uma trajetória processual perante a Corte Interamericana de Direitos Humanos

Resumo

O artigo busca explorar o percurso processual do Caso Povo Indígena Xukuru vs. Brasil, no âmbito da Corte Interamericana de Direitos Humanos, sobretudo com a culminância de sua sentença em 2018 e os desdobramentos de monitoramento do cumprimento desta. Evocando uma viagem que envolve o passado histórico das violações até adentrar o campo jurídico de tramitação da denúncia no Sistema Interamericano o artigo se propõe a dar visibilidade às estratégias e caminhos utilizados pelos peticionários do caso com vistas ao alcance da decisão favorável à luta do Povo Indígena Xukuru – legítimos protagonistas do processo de conquista de Direitos.

Palavras-chaves:
Povo Indígena Xukuru; Corte Interamericana de Direitos Humanos; trâmite processual; Sentença

Abstract

The article seeks to explore the procedural path of the Case of the Xukuru Indigenous People v. Brazil, within the scope of the Inter-American Court of Human Rights, especially with the court's decision in 2018 and the consequences of monitoring its compliance. Evoking a journey that involves the historical past of the violations up to the processing of the complaint in the Inter-American System, the article proposal is to give visibility to the strategies and paths used by the petitioners to obtain a favorable decision to the struggle of the Xukuru Indigenous People – the legitimate protagonists in the process of achieving their Rights.

Keywords:
Indigenous Xukuru People; Inter-American Court of Human Rights; Procedural Law; Legal Sentence

1. Histórico e características gerais do Povo Indígena Xukuru de Ororubá

O Povo Indígena Xukuru do Ororubá é formado por de 2.354 famílias, residentes em 2.265 casas, com 7.726 indígenas aldeados, distribuídos em 24 aldeias em um território de 27.555 hectares. Dados históricos do Século XVI já registravam a sua presença no território, segundo Vânia R. Fialho1 1 FIALHO, Vânia Rocha. As fronteiras do ser Xukuru. Recife: Massangana, 1998. e Kelly Oliveira2 2 OLIVEIRA, Kelly. Guerreiros do Ororubá: o processo de organização política e elaboração simbólica do povo indígena Xukuru. Recife: Ed. Universitária da UFPE, 2014. . Encontra-se encravado na Serra do Ororubá, Município de Pesqueira, estado de Pernambuco, na região nordeste do Brasil. Ademais, vivem no perímetro urbano da cidade de Pesqueira, outros 4.228 indígenas desaldeados, pertencentes ao mesmo povo indígena Xukuru do Ororubá. Desta forma, as questões que serão analisadas no presente artigo, impactam diretamente uma população total de 11.954 indígenas e toda uma cultura e imaginário que venceram os séculos com a resistência que é a característica principal desse povo.

Apresentam um modelo de organização social com características próprias. Se poderá perceber ainda que tal estrutura foi sendo constituída, no decorrer dos anos, também pautada no horizonte de enfrentamento das demandas e problemáticas pelos Xukurus. Assim, uma série de instâncias de decisão compartilhadas e dentro das suas especificidades, assumem espaço com uma hierarquia tradicional assentada nas figuras do Cacique e do Pajé, como pontes de todo um povo com o mundo externo, seja na representação política junto ao Estado, seja perante as divindades do reino dos seres encantados, de onde a crença na perpetuação da ancestralidade em outros níveis de realidade encontra guarida no coração da população Xukuru.

Ainda no âmbito histórico, é relevante pontuar a participação de indígenas Xukurus durante a Guerra do Paraguai(1864 - 1870). Tal fato, segundo relato dos próprios indígenas se deu até mesmo por meio de alistamento forçado. Há diversos relatos que apontam para a participação dos Xukuru do Ororubá no conflito, inclusive por meio de alistamento forçado3 3 SILVA, Edson Hely. História, memórias e identidade entre os Xukuru do Ororubá. Disponível em: <https://www3.ufpe.br/remdipe/images/documentos/fontes_xukuru/silva%20edson%20hely2007.pdf> Acesso em: 09 jun. 2020. . Esse fato é importante para o Povo Xukuru, devido ao chamado grupo dos “30 de Ororubá” – guerreiros que se alistaram ao exército brasileiro e retornaram da Guerra com a promessa de terem a propriedade do território tradicional repassada para o povo indígena, por ato de vontade do Império brasileiro à época4 4 SILVA, Edson Hely. Índios organizados, mobilizados e atuantes: história indígena em Pernambuco nos documentos do Arquivo Público. Disponível em: <http://www.funai.gov.br/arquivos/conteudo/cogedi/pdf/revista_estudos_pesquisas_v3_n1_2/07indios_organizados_mobilizados_e_atuantes_Edson_Silva.pdf >. Acesso em: 09 jun. 2020. . Entretanto, em 1879, sob o lastro da Lei de Terras (Lei nº 601, de 1850), que visou regular a administração das terras devolutas do Império brasileiro, o então “Aldeamento dos Xukuru” terminou por ser extinto oficialmente5 5 POVOS INDÍGENAS NO BRASIL. XUKURU. Brasília,DF: 2020. Disponível em: <https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Xukuru>. Acesso em: 09 jun. 2020. . Tal medida por óbvio foi de grande impacto negativo para o Povo Xukuru e a manutenção de seu território, que foi completamente devassado por fazendeiros, invasores e membros da elite local6 6 SILVA, Edson Hely. História, memórias e identidade entre os Xukuru do Ororubá. Disponível em: <https://www3.ufpe.br/remdipe/images/documentos/fontes_xukuru/silva%20edson%20hely2007.pdf >. Acesso em: 09 jun. 2020. . Assim se deu um momento dos mais críticos da história do povo indígena da Serra de Ororubá – a Diáspora Xukuru.7 7 SILVA, Edson Hely. Índios organizados, mobilizados e atuantes: história indígena em Pernambuco nos documentos do Arquivo Público. Disponível em: <http://www.funai.gov.br/arquivos/conteudo/cogedi/pdf/revista_estudos_pesquisas_v3_n1_2/07indios_organizados_mobilizados_e_atuantes_Edson_Silva.pdf >. Acesso em: 09 jun. 2020.

Apenas 65 anos depois, já no início da segunda metade do século XX o Estado brasileiro volta a lançar um olhar sobre o Povo Xukuru, com a produção do “(...) primeiro relatório oficial contemporâneo sobre os Xukuru datado de 1944, e foi feito pelo sertanista e funcionário do Serviço de Proteção ao Índio (SPI), Cícero Cavalcanti (...)”8 8 SILVA, Edson Hely. Índios organizados, mobilizados e atuantes: história indígena em Pernambuco nos documentos do Arquivo Público. Disponível em: <http://www.funai.gov.br/arquivos/conteudo/cogedi/pdf/revista_estudos_pesquisas_v3_n1_2/07indios_organizados_mobilizados_e_atuantes_Edson_Silva.pdf>. Acesso em: 09 jun. 2020. . Este levantamento é emblemático pois relata a forma como historicamente o Povo Xukuru de Ororubá veio sendo constantemente perseguido no que tange à sua cultura, sua identidade espiritual e organizacional, em função da disputa pelo território tradicional. O autor do relatório denuncia que “caboclos mais velhos” se reuniam para realizar atos e rituais, e que foram denunciados como praticantes de feitiçaria, por fazendeiros brancos, à polícia. Afirma também que lideranças espirituais do povo indígena foram levadas à delegacia, e os índios Xukuru foram terminantemente proibidos de praticar seus rituais e fazer uso de sua medicina tradicional. Mas mesmo diante deste cenário, consta do relatório sobre o Povo Xukuru de Yorubá que “alguns costumes Xukurus ainda vivem em seu coração”9 9 SILVA, Edson Hely. Índios organizados, mobilizados e atuantes: história indígena em Pernambuco nos documentos do Arquivo Público. Disponível em:<http://www.funai.gov.br/arquivos/conteudo/cogedi/pdf/revista_estudos_pesquisas_v3_n1_2/07indios_organizados_mobilizados_e_atuantes_Edson_Silva.pdf>. Acesso em: 09 jun. 2020. .

Com a vigência da Constituição de 1988, os Xukuru iniciam uma mobilização pela retomada da posse de suas terras, pressionando as autoridades pela garantia de seus direitos. Com todo processo constituinte que desembocou na Carta Magna de 1988, no qual os povos indígenas tiveram destacada participação – em especial o Cacique Xicão Xukuru, os povos indígenas brasileiros conseguiram que constasse do texto final do documento constitucional o reconhecimento de “sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam” (art. 231, caput); além do direito “à utilização de suas línguas maternas e processos próprios de aprendizagem” no ensino fundamental regular (art. 210, § 2.º), e o reconhecimento dos índios como “partes legítimas para ingressar em juízo em defesa de seus direitos e interesses” (art. 232). Entretanto, a letra escrita do texto constitucional não se tornou padrão aplicável automaticamente para os povos indígenas brasileiros. A luta pelo território tradicional entrava em uma nova fase.

2. O período das retomadas de território e o aprofundamento do conflito

Até a Constituição Federal de 1988, os indígenas, dentro da normativa brasileira, eram considerados tutelados e não possuíam capacidade postulatória para ingressar em juízo por seus direitos.

Com um capítulo especial de garantias, foi inaugurado um novo tempo de direitos para os povos indígenas brasileiros, ao menos formalmente. Além disso, o artigo 67 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) estabeleceu um prazo de cinco anos para a demarcação de todas as terras indígenas no país.

Assim é que o Povo Xukuru passou a exigir a demarcação de seu território tradicional, em 1989, dando-se início ao processo de demarcação da terra Xukuru.

Entretanto, com a demora em alcançar respostas sobre essa nova fase do fluxo de exigibilidade em torno da terra indígena, e vendo que a mesma estava sobre o pleno controle de posseiros e fazendeiros variados, o Povo Xukuru começa a avançar com a retomada do domínio do território10 10 FERREIRA. Ivson J.; BRASILEIRO, Sheila; FIALHO, Vânia. Dossiê Chicão Xukuru - TERRA INDÍGENA XUKURU/PE (1988-1998): BREVE HISTÓRICO DE UM CONFLITO PERMANENTE. In: "Plantaram" Xicão: Os Xukuru do Ororubá e a Criminalização do direito ao território / Vânia Fialho, Rita de Cássia Maria Neves, Mariana Carneiro Leão Figueiroa (Organizadoras). Manaus: PNCSA- UEA/UEA Edições, 2011 .

Dois anos após, mais uma vez paralisado o processo de demarcação, os Xukuru, retomam a Fazenda Caípe, a qual estava em posse do fazendeiro Milton Rego Didier. Este fazendeiro, por conseguinte, inicia uma Ação de Reintegração de Posse referente aos 300 hectares da fazenda. Esse processo é emblemático pois alcançou ganho de causa em favor do fazendeiro em várias instâncias, sendo um fator patente de insegurança jurídica do direito ao usufruto pleno e exclusivo da terra pelo próprio Povo Xukuru.

Com a Portaria 259 do Ministério da Justiça, ainda em 1992, houve o reconhecimento da área de 26 mil hectares ao Povo Xukuru. Isso foi o estopim para o assassinato de José Bispo, filho do pajé. O fato ocorreu dentro da terra indígena e visou abalar o pilar espiritual dos Xukurus. Em reposta, novas retomadas foram feitas. Já com o prazo estabelecido no artigo 67, ADCT, para que fossem concluídas as demarcações de terras no país, o Povo Xukuru continuou com as retomadas. Em janeiro de 1995, são iniciados os trabalhos para a demarcação física do território Xukuru, totalizando pouco mais de 27.555 hectares. Assim como no caso do filho do pajé, meses depois da demarcação física, o advogado Geraldo Rolim, da FUNAI, defensor assíduo do povo Xukuru foi assassinado.

Em 1997, 90% do território Xukuru ainda estava ocupado por terceiros não-indígenas. Dentre os posseiros, se encontravam fazendeiros e políticos de influência na região. Ou seja, o Estado não agiu efetivamente no sentido de retirar esses posseiros ou garantir a proteção da terra ancestral. Neste ano mais três retomadas são feitas e o Cacique Xicão Xukuru expande a divulgação das recorrentes ameaças que vinha sofrendo contra a sua própria vida, encaminhando tais fatos às autoridades, que nada fizeram a respeito. Em 20 de maio do ano seguinte, o cacique Xicão Xukuru foi assassinado.

Com a morte do líder máximo do povo Xukuru, e figura emblemática na luta pelos direitos dos povos indígenas no cenário nacional, se estabeleceu toda uma reestruturação sócio-política da comunidade indígena.

Somente 1 ano e 7 meses depois da perda do Grande Cacique Xicão, é que a comunidade indígena, sob a orientação dos seres encantados da natureza – seguindo suas crenças religiosas particulares – voltou a ter um novo cacique. Em 06 de janeiro de 2000, o filho de Xicão, Marquinhos Xukuru, já sob diversas ameaças, assume o cacicado. 20 dias após, novas retomadas de território pelos indígenas foram estabelecidas.

Foi apenas em 30 de abril de 2001, que o território ancestral do Povo Xukuru foi homologado. Uma nova e grande sequência de retomadas. Como resposta, o indígena Chico Quelé foi assassinado. Mas as retomadas não pararam e em meio a uma batalha de recursos administrativos no âmbito do processo de demarcação, a Polícia Federal realiza, no início de 2002, a exumação do corpo do cacique Xicão. Com requintes de crueldade, a exumação do corpo – que na cultura Xukuru é plantando, e não sepultado –, na frente de crianças e demais membros do povo, sem condições técnicas mínimas para realização da perícia, foi um novo duro golpe no povo Xukuru.

O povo Xukuru, com o cacique Marquinhos Xukuru à frente, realiza até o final do ano de 2002, mais 21 retomadas de território que estavam nas mãos de posseiros e fazendeiros.

Como um padrão de atuação que se repetiu ao longo da luta do povo Xukuru por seu território, a resposta às retomadas foi, em 07 de fevereiro de 2003, um atentado contra a vida do cacique Marquinhos Xukuru, no qual – apesar do cacique ter escapado acabou por se resultar na morte de dois jovens indígenas. Ato contínuo, os membros do povo Xukuru se rebelaram contra tal situação de violação, o que levou ao indiciamento de aproximadamente 50 indígenas Xukuru, incluindo o próprio cacique, pela Polícia Federal. Superando todas as adversidades, em prol da garantia plena ao exercício do usufruto de todo o território tradicional, o povo Xukuru realizou novas retomada nos anos seguintes, até 2004, mais 7 retomadas.

Paralelamente a esse cenário de ameaças e violências contra a comunidade, o processo de demarcação oficial seguia estagnado. Como já foi dito, a terra indígena foi homologada em 30 de abril de 2001. O passo seguinte do processo seria o registro da terra no Cartório, como propriedade da União, bem como na Secretaria de Patrimônio da União. No entanto, o Cartório do 1º Ofício ingressou com uma ação de suscitação de dúvida, que se arrastou por inexplicáveis três anos. Até que, em 18 de novembro 2005, foi finalmente realizado o registro da Terra Indígena Xukuru, perante o Cartório de Registro de Imóveis. Ou seja, houve um hiato de quatro anos entre duas fases do processo demarcatório que deveriam ser seqüenciais.

Em 2006, foram realizadas mais duas retomadas e em 2007, mais uma. Nesta época, o levantamento fundiário do território, identificou, ainda, o total de 624 áreas ocupadas por terceiros não-indígenas, dentro do espaço identificado como território ancestral.

No ano seguinte, em virtude das ameaças constantes, o cacique Marquinhos Xukuru foi inserido no Programa de Proteção de Defensores de Direitos Humanos, e, em 2009, o povo Xukuru fez sua última retomada.

Como desdobramento do indiciamento ocorrido após o atentado contra o cacique Marquinhos Xukuru, o Poder Judiciário condenou mais de trinta Xukurus a penas entre 4 e 12 anos de prisão e a multa de 50 mil reais. Após recurso à instância superior, as condenações foram reduzidas para uma média de 4 anos e substituídas por medidas alternativas à prisão. Entretanto, as penas pecuniárias de 50 mil reais cada foram mantidas.

Em suma, o procedimento demarcatório, que foi iniciado em 1989, apenas obteve em 1995 a demarcação física do território. Com o procedimento administrativo em vias de conclusão, restava só a desintrusão do território, mas até os anos 2000 o território ainda estava 90% ocupado por terceiros. Dessa forma, resta patente a série de violações sofridas e as ações de resistência que o povo Xukuru se viu obrigado a implementar para garantir avanços na retomada do seu território ancestral. Sem a força dos guerreiros e guerreiras Xukuru, sua organização e resistência, a terra ancestral não teria sido resguardada. Infelizmente, os órgãos do Estado apenas agiram em prol da garantia dos direitos territoriais do Povo Xukuru após muita pressão e resistência destes, situação que se repete com os demais povos indígenas do país.

3. Caso no Sistema Interamericano de Direitos Humanos (SIDH)

Considerando o cenário de ameaças que pairavam sobre o povo Xukuru, bem como a demora na finalização do processo de demarcação da terra indígena, o povo indígena decidiu, em diálogo com sua assessoria, levar o caso para o Sistema Interamericano de Direitos Humanos.

A denúncia foi apresentada à Comissão Interamericana em 16 de outubro de 2002, onde tramitou até março de 2016.11 11 CIDH - Comissão Interamericana de Direitos Humanos. Caso Povo Indígena Xucuru e seus membros Vs. Brasil. Relatório de Admissibilidade da Comissão Interamericana. Washington, D.C: CIDH, 2009. Disponível em: <http://cidh.oas.org/annualrep/2009port/Brasil4355.02port.htm>. Acesso em: 09 jun. 2020.V CIDH - Comissão Interamericana de Direitos Humanos. Caso Povo Indígena Xucuru e seus membros Vs. Brasil. Relatório de Mérito da Comissão Interamericana. Washington, D.C: CIDH, 2015. Disponível em: <https://www.oas.org/es/cidh/decisiones/corte/2016/12728FondoPt.pdf>. Acesso em: 09 jun. 2020. A petição inicial foi apresentada pelas seguintes instituições: Gabinete de Assessoria Jurídica das Organizações Populares (GAJOP), Movimento Nacional de Direitos Humanos/Regional Nordeste (MNDH), e Conselho Indigenista Missionário (CIMI). Foi apresentado ao conhecimento da Comissão Interamericana fatos que indicavam, nos dizeres dos peticionários:

suposta violação do direito à propriedade coletiva e às garantias e proteção judiciais, consagrados, respectivamente, nos artigos 21, 8 e 25 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (“a Convenção Americana” ou “a Convenção”), em relação com as obrigações gerais de respeitar os direitos e de adotar disposições de direito interno previstas nos artigos 1.1 e 2 do mesmo tratado, em detrimento do povo indígena Xucuru e seus membros, na cidade de Pesqueira, estado de Pernambuco12 12 CIDH - Comissão Interamericana de Direitos Humanos. Caso Povo Indígena Xucuru e seus membros Vs. Brasil. Relatório de Mérito da Comissão Interamericana. Washington, D.C: CIDH, 2015. Disponível em: <https://www.oas.org/es/cidh/decisiones/corte/2016/12728FondoPt.pdf>. Acesso em: 09 jun. 2020. .

Para fundamentar suas alegações, os peticionários aduziram ao longo tempo para efetivação do processo de demarcação do território ancestral, além da patente ineficácia da proteção judicial, somada à falta de recursos judiciais eficazes e acessíveis, voltada à garantia desse direito. Ademais, quando o caso já se encontrava na etapa de mérito, os peticionários buscaram adicionar alegações referentes aos artigos 4 e 5 da Convenção Americana.

O Estado brasileiro, em contrapartida, argumentou continuamente que a petição referente ao caso deveria ser considerada improcedente, ante o entendimento de que processo administrativo de demarcação da “Terra Indígena Xukuru”, que teve início nos idos de 1989, se encontrava concluído, ao menos no aspecto formal, já que reconheceu que a desintrusão do território indígena, ou seja, a retirada completa dos ocupantes não indígenas da região, ainda não havia sido finalizada. A dimensão do prazo razoável de demarcação do território indígena também foi alvo da argumentação do Estado brasileiro, que alegou que todo o trâmite seguia um andamento razoável ante “a complexidade da questão e a necessidade de garantir o devido processo legal aos terceiros não indígenas, assim como o direito destes a uma indenização justa”13 13 CIDH - Comissão Interamericana de Direitos Humanos. Caso Povo Indígena Xucuru e seus membros Vs. Brasil. Relatório de Mérito da Comissão Interamericana. Washington, D.C: CIDH, 2015. Disponível em: <https://www.oas.org/es/cidh/decisiones/corte/2016/12728FondoPt.pdf>. Acesso em: 09 jun. 2020. .

A Comissão Interamericana, ante às argumentações expostas pelas partes durante o trâmite, em sede de relatório de mérito concluiu que o Brasil violou o artigo XXIII da Declaração Americana de Direitos e Deveres do Homem. Vale ressaltar que tal responsabilidade internacional pautada na Declaração Americana de Direitos e Deveres do Homem abarcou o período dos fatos ocorridos até a ratificação da Convenção Americana pelo Brasil, ou seja, até 25 de setembro de 1992. Ademais, a Comissão Interamericana, adicionalmente também concluiu que em relação aos fatos ocorridos após a data de ratificação da Convenção Americana pelo Brasil, o Estado deveria ser considerado responsável pela violação do direito à integridade pessoal, propriedade coletiva, às garantias judiciais e à proteção judicial, conforme os artigos 5, 21, 8.1 e 25.1 da Convenção Americana, em relação com as obrigações previstas nos artigos 1.1 e 2 do mesmo tratado, em prejuízo do povo indígena Xukuru e seus membros14 14 CIDH - Comissão Interamericana de Direitos Humanos. Caso Povo Indígena Xucuru e seus membros Vs. Brasil. Relatório de Mérito da Comissão Interamericana. Washington, D.C: CIDH, 2015. Disponível em: <https://www.oas.org/es/cidh/decisiones/corte/2016/12728FondoPt.pdf>. Acesso em: 09 jun. 2020. .

Ao término do Relatório de Mérito, datado de 28 de julho de 2015, a Comissão Interamericana recomendou ao Estado brasileiro, as seguintes ações:

a. Adotar, com a brevidade possível, as medidas necessárias, inclusive as medidas legislativas, administrativas ou de outra natureza, indispensáveis à realização do saneamento efetivo do território ancestral do Povo Indígena Xucuru, de acordo com seu direito consuetudinário, valores, usos e costumes. Consequentemente, garantir aos membros do povo que possam continuar vivendo de maneira pacífica seu modo de vida tradicional, conforme sua identidade cultural, estrutura social, sistema econômico, costumes, crenças e tradições particulares.

b. Adotar, com a brevidade possível, as medidas necessárias para concluir os processos judiciais interpostos por pessoas não indígenas sobre parte do território do Povo Indígena Xucuru. Em cumprimento a essa recomendação, o Estado deveria zelar para que suas autoridades judiciais resolvessem as respectivas ações conforme as normas sobre direitos dos povos indígenas expostos no Relatório de Mérito.

c. Reparar, nos âmbitos individual e coletivo, as consequências da violação dos direitos enunciados no Relatório de Mérito. Em especial, considerar os danos provocados aos membros do Povo Indígena Xucuru, pela demora no reconhecimento, demarcação e delimitação, e pela falta de saneamento oportuno e efetivo de seu território ancestral.

d. Adotar as medidas necessárias para evitar que no futuro ocorram fatos similares; em especial, adotar um recurso simples, rápido e efetivo, que tutele o direito dos povos indígenas do Brasil de reivindicar seus territórios ancestrais e de exercer pacificamente sua propriedade coletiva

O Relatório de Mérito concedeu um prazo de dois meses para que o Estado informasse sobre o cumprimento das recomendações emitidas pela Comissão Interamericana. Findo o prazo e após a concessão de uma prorrogação, a CIDH constatou que o Estado não havia conseguido avançar em termos substanciais no cumprimento das recomendações, até mesmo no que se refere a reparação ao Povo Indígena Xukuru pelas violações sofridas. É digno de nota que apesar de a Comissão Interamericana ter identificado alguns avanços no tocante à desintrusão formal do território ancestral do Povo Indígena Xukuru, o exercício pacífico desse direito ao território ainda não era uma realidade.

Foi então que, em 16 de março de 2016, a Comissão submeteu o caso à Corte Interamericana, solicitando que fosse declarada a responsabilidade internacional do Brasil pelas violações já declaradas no Relatório de Mérito, e que fosse ordenado ao Estado brasileiro que cumprisse as medidas de reparação constantes no relatório. Na prática, a Comissão Interamericana apresentou todo o conjunto de ações e omissões promovido pelo Estado brasileiro que efetivamente ocorreram, ou que continuaram a ocorrer, após a data de 10 de dezembro de 1998, quando houve a aceitação, pelo Brasil, da cláusula facultativa de jurisdição obrigatória em relação à competência da Corte Interamericana.

A Corte Interamericana notificou o Estado, bem como os representantes das supostas vítimas, em 19 de abril de 2016, sobre o caso. Neste período, a crise de investimentos que assolou muitas organizações não-governamentais e fragilizou a atuação das equipes, impossibilitou a apresentação do escrito de pedidos, argumentos e provas. O que fez com que novas parcerias fossem constituídas, concretizadas no ingresso da organização Justiça Global no rol de representantes das vítimas, visando a implicação de um universo mais amplo de atores na sustentação técnica, política e financeira para a continuidade do caso.

O Estado apresentou o seu escrito de contestação, no qual foram opostas cinco exceções preliminares, em 14 de setembro de 2016. A Comissão Interamericana deu a conhecer suas observações sobre as exceções preliminares apresentadas pelo Estado brasileiro, em 26 de outubro de 2016, ao tempo em que solicitou que fossem todas elas julgadas improcedentes.

Um marco importante para o trâmite do Caso Povo Indígena Xukuru e seus membros vs. Brasil, foi desencadeado com a resolução de 31 de janeiro de 2017, do Presidente da Corte Interamericana, quando convocou as partes e a Comissão Interamericana para uma audiência pública, com o intuito de ouvir suas alegações e observações finais orais tanto sobre as exceções preliminares, quanto sobre as eventuais questões de mérito, reparações e custas.

No procedimento perante a Corte Interamericana, foram de suma importância as peritagens apresentadas pelo professor Carlos Frederico Marés e Victoria Tauli-Corpuz, Relatora Especial das Nações Unidas para os Direitos dos Povos Indígenas. Os peritos apresentaram relatórios impressionantes sobre o regime jurídico das terras indígenas no Brasil, bem como sobre padrões internacionais no tocante à garantia do direito de propriedade indígena, que vinculam os Estados, respectivamente.

A audiência teve lugar na Cidade da Guatemala, em 21 de março de 2017 e contou com a presença dos representantes das organizações assessoras (CIMI, GAJOP e Justiça Global), a antropóloga Vânia Fialho e o Cacique Marquinhos Xukuru. 15 15 CORTE IDH. Audiencia Pública. Caso Pueblo Indígena Xucuru y sus miembros Vs. Brasil. Cidade da Guatemala: CORTE IDH, 2017. 1 vídeo (1h26min17). Disponível em: <https://vimeopro.com/corteidh/caso-pueblo-indigena-xucuru-y-sus-miembros-vs-brasil>. Acesso em: 09 jun. 2020.

A Corte Interamericana recebeu ao menos cinco escritos de amicus curiae16 16 1) de forma conjunta, pela Clínica de Direitos Humanos da Universidade de Ottawa, pela Fundação para o Devido Processo, pelo Núcleo de Estudos em Sistemas Internacionais de Direitos Humanos da Universidade Federal do Paraná e pela Rede de Cooperação Amazônica; 2) também de forma conjunta, pela Clínica de Direitos Humanos e Direito Ambiental da Universidade do Estado do Amazonas e pelo Grupo de Pesquisa de Direitos Humanos do Amazonas; 3) pela Associação de Juízes para a Democracia; 4) pela Clínica de Direitos Humanos do Amazonas, vinculada ao Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal do Pará; e 5) pela Defensoria Pública da União, do Brasil. Corte IDH. Caso do Povo Indígena Xucuru e seus Membros Vs. Brasil. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 05 de fevereiro de 2018, Serie C, No. 346. Disponível em: <https://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_346_por.pdf>. Acesso em: 09 jun. 2020 , apresentados por Clínicas de Direitos Humanos de universidades brasileiras e estrangeiras, pela Associação Juízes para a Democracia e pela Defensoria Pública da União. Sobre tais amici curiae, o Estado apresentou objeções afirmando desde que os mesmos pretendiam ampliar o campo de análise da Corte ao abranger projetos de lei e outras medidas legislativas fora do caso concreto, passando pela indicação de que alguns escritos eram abertamente parciais e que neles eram trabalhadas questões alheias ao objeto do caso. Com relação a um dos escritos, o Estado chegou a alegar que o mesmo não apresentava um tratamento técnico e imparcial das questões teóricas relevantes para o caso, ao ter assumido abertamente as teses sustentadas pelos representantes. Sobre tais argumentos do Estado, a Corte Interamericana se manifestou afirmando que “as observações do Estado sobre a admissibilidade dos amici curiae no presente caso não foram apresentadas no prazo estabelecido para esse efeito, qual seja, em suas alegações finais escritas”17 17 Corte IDH. Caso do Povo Indígena Xucuru e seus Membros Vs. Brasil. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 05 de fevereiro de 2018, Serie C, No. 346. Disponível em: <https://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_346_por.pdf>. Acesso em: 09 jun. 2020 , tendo sido consideradas intempestivas. Ainda afirmou a Corte IDH que “as observações sobre o conteúdo e o alcance dos referidos amici curiae não afetam sua admissibilidade, sem prejuízo de que essas observações possam ser consideradas, substancialmente, no momento de avaliar a informação que neles figure, caso seja considerada apropriada.”18 18 Caso do Povo Indígena Xucuru e seus Membros Vs. Brasil. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 05 de fevereiro de 2018, Serie C, No. 346. Disponível em: <https://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_346_por.pdf>. Acesso em: 09 jun. 2020

Após o envio das alegações finais escritas e determinados anexos, tanto pelos representantes das vítimas, quanto pelo Estado, na data de 24 de abril de 2017, e a Comissão Interamericana ter apresentado suas observações finais escritas, a Secretaria da Corte encaminhou toda a documentação das alegações finais escritas, solicitando possíveis apontamentos aos representantes, ao Estado e à Ilustre Comissão. Apenas os representantes das vítimas e o Estado apresentaram observações.

É importante mencionar que durante a realização da Audiência Pública, a Corte Interamericana requisitou que fossem apresentados determinados documentos e informações como provas para melhor resolver. Desse modo, o Estado e os representantes, respectivamente, em 2 e 3 de março de 2017, apresentaram os dados solicitados19 19 Documentos solicitados ao Estado: 1) Autos completos da Ação Ordinária No. 0002246-51.2002.4.05.8300 (número original 2002.83.00.002246-6), interposta por Paulo Pessoa Cavalcanti de Petribu e outros; 2) Atualização, desde 1996, da Ação de Reintegração de Posse No. 0002697-28.1992.4.05.8300 (número original 92.0002697-4), interposta por Milton do Rego Barros Didier e outros; e 3) Informação detalhada sobre a situação jurídica das seis ocupações não indígenas ainda não indenizadas e retiradas da Terra indígena Xucuru. Documento solicitado aos representantes: informação sobre os membros do Povo Indígena Xukuru, sua identificação e composição atual. Corte IDH. Caso do Povo Indígena Xucuru e seus Membros Vs. Brasil. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 05 de fevereiro de 2018, Serie C, No. 346. Disponível em: <https://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_346_por.pdf>. Acesso em: 09 jun. 2020 .

Em 05 de fevereiro de 2018, o caso teve finalmente um desfecho, com a publicação da sentença.

A Corte Interamericana entendeu que a violação aos direitos territoriais do Povo Xukuru não cessou com a conclusão da fase formal da demarcação, isto é, com o registro da terra no Cartório do 1º Ofício de Registro de Imóveis, de Pesqueira, Pernambuco, mas que a violação era permanente enquanto pessoas não indígenas continuassem ocupando o território.

Assim, o Brasil foi condenado a finalizar o processo de desintrusão do território, realizando todos os pagamentos de benfeitorias aos ocupantes de boa-fé, garantindo o domínio pleno e efetivo do povo Xukuru sobre o seu território. A Corte Interamericana ordenou ainda que o Estado garantisse a proteção do território contra invasão, interferência ou dano, por parte de terceiros ou agentes de Estado.

Em outras palavras, o Estado foi obrigado a garantir tanto que os não-indígenas fossem retirados da terra, quanto impedir que novas ocupações e invasões acontecessem. O Estado, enfim, foi obrigado a proteger a autonomia dos Xukuru sobre seu território. A Corte ainda condenou o Brasil ao pagamento de custas e indenizações, sendo que a última seria feita na forma da constituição de um fundo, que seria administrado pelo povo Xukuru.

A condenação do Brasil no caso Povo Indígena Xucuru e seus Membros Vs. Brasil foi um feito histórico, resultado de anos de luta do povo Xukuru por justiça e pela demarcação de seu território20 20 Corte IDH. Caso do Povo Indígena Xucuru e seus Membros Vs. Brasil. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 05 de fevereiro de 2018, Serie C, No. 346. Disponível em: <https://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_346_por.pdf>. Acesso em: 09 jun. 2020 . Além disso, foi a primeira condenação do país envolvendo a violação de direitos territoriais indígenas, ou seja, pela primeira vez, o país foi condenado pela violação ao artigo 21, da Convenção Americana de Direitos Humanos, em relação a povos indígenas.

A Corte Interamericana de Direitos Humanos tem parâmetros muito avançados no tocante à garantia dos direitos territoriais indígenas e essa jurisprudência foi reafirmada no caso Povo Indígena Xucuru e seus Membros Vs. Brasil, valendo, portanto, não apenas para esse caso específico, mas para outros povos indígenas no continente inteiro que estivessem em uma situação similar de luta pelo seu território.

Os parâmetros para interpretação do direito coletivo à propriedade, de acordo com a jurisprudência consolidada da Corte Interamericana de Direitos Humanos são os seguintes: 1) Equivalem-se em efeitos a posse tradicional exercida por povos indígenas sobre seus territórios e o título de domínio outorgado pelo Estado; 2) A posse tradicional exercida por indígenas dá-lhes o direito de tê-la reconhecida oficialmente pelo Estado e o seu registro; 3) A perda ou saída do território por razões alheias à sua vontade não significa para os membros de povos indígenas a perda do direito de propriedade sobre elas, apesar da ausência de título legal, salvo nos casos em que as terras tenham sido legitimamente transferidas a terceiros de boa-fé; 4) No caso da transferência a terceiros de boa-fé, depois da perda involuntária da posse da terra, a comunidade indígena tem o direito de recuperar essas terras ou obter outras de igual extensão e qualidade; 5) O Estado tem a obrigação de delimitar, demarcar e conceder o título coletivo das terras às comunidades indígenas; 6) O Estado deve garantir a propriedade efetiva dos povos indígenas sobre suas terras, protegendo tal direito da interferência tanto de agentes do próprio Estado, quanto de agentes privados; 7) Aos povos indígenas deve ser garantido o direito de controlar efetivamente o seu território, sem nenhum tipo de interferência externa; 8) O Estado deve garantir que as comunidades indígenas possam controlar e usar o seu território e os recursos naturais daí decorrentes21 21 Corte IDH. Caso do Povo Indígena Xucuru e seus Membros Vs. Brasil. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 05 de fevereiro de 2018, Serie C, No. 346. Disponível em: <https://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_346_por.pdf>. Acesso em: 09 jun. 2020; Corte IDH. Caso Povos Kaliña e Lokono Vs. Suriname. Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 25 de novembro de 2015, Serie C, No. 309, par. 131-132. Disponível em: <https://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_309_esp.pdf>. Acesso em: 09 jun. 2020. .

Assim, aplicando tais parâmetros de interpretação do artigo 21, a Corte Interamericana afirmou a obrigação do Estado Brasileiro de concretizar e dar segurança jurídica à posse tradicional de povos indígenas sobre o seu território. O processo administrativo de delimitação, demarcação, titulação e desintrusão de territórios indígenas, existente no ordenamento jurídico brasileiro, é meio idôneo para a garantia desse direito.

No caso dos Xukuru, havia um conflito entre o direito individual de propriedade (não-indígenas que possuíam terras no interior da terra indígena) e o direito coletivo indígena, que tinha a comunidade como titular. Na perspectiva da Corte Interamericana, ambos os direitos são igualmente resguardados pela Convenção Americana, em que pese o direito coletivo ser tradicional e ter efeitos equivalentes ao título de domínio conferido pelo Estado.

Assim, em caso de conflito entre os dois direitos, caberia exclusivamente ao Estado realizar uma ponderação no caso a caso entre os dois direitos, para tentar compatibilizá-los com restrições mútuas, sem que, no entanto, a limitação ao direito às terras tradicionais implicasse na “denegação de sua subsistência como povo”22 22 Corte IDH. Caso do Povo Indígena Xucuru e seus Membros Vs. Brasil. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 05 de fevereiro de 2018, Serie C, No. 346. Disponível em: <https://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_346_por.pdf>. Acesso em: 09 jun. 2020 .

No entanto, no caso brasileiro, a Corte Interamericana afirma que esse sopesamento já fora realizado pela Constituição da República e sua interpretação feita pelo Supremo Tribunal Federal:

[...] a qual confere proeminência ao direito à propriedade coletiva sobre o direito à propriedade privada, quando se estabelece a posse histórica e os laços tradicionais do povo indígena ou tradicional com o território, ou seja, os direitos dos povos indígenas ou originários prevalecem frente a terceiros de boa-fé e ocupantes não-indígenas. Além disso, o Estado afirmou que tem o dever constitucional de proteger as terras indígenas23 23 Ibidem, par. 127. .

A Corte constatou ainda que a titulação de um território indígena no Brasil tem caráter declaratório, e não constitutivo do direito, sendo tão somente um instrumento para conferir segurança jurídica ao direito constitucionalmente garantido dos povos indígenas a seu território.

Sem embargo, esse processo, no caso dos Xukuru, falhou em conceder segurança jurídica ao povo indígena, na medida em que se arrastou por aproximadamente vinte anos, a contar do ano em que foi iniciado (1998) e a data da sentença da Corte, bem como porque implicou um agravo direto ao direito de propriedade indígena.

Por outro lado, é importante destacar que alguns pontos considerados muito importantes pelas vítimas foram deixados de lado pelos juízes da Corte Interamericana. Por exemplo, o tema da violação à integridade pessoal (artigo 5, da Convenção Americana): o dano psicológico ao povo indígena, que teve que viver por tantos anos em uma situação de muitas ameaças, assassinato de lideranças e insegurança jurídica quanto ao seu território não foi reconhecido pela Corte Interamericana, infelizmente.

Decorridos mais de três anos da sentença da Corte Interamericana, os representantes das vítimas ainda se encontram envolvidos no processo de implementação da sentença da Corte Interamericana. O pagamento da indenização de um milhão de dólares foi concluído em fevereiro de 2020, porém a comunidade segue à espera da conclusão do processo de desintrusão do seu território. Com efeito, seis famílias não-indígenas seguem ocupando 160 hectares da TI Xukuru, sendo que há uma sentença de reintegração de posse a ser executada em uma área de 300 hectares24 24 CIMI – Conselho Indigenista Missionário. Povo Xukuru recebe indenização do governo após sentença da CIDH que condenou o Estado por violações de direitos humanos. Brasília, DF: CIMI, 2020. Disponível em: <https://cimi.org.br/2020/02/povo-xukuru-recebe-indenizacao-do-governo-federal-como-sentenca-da-cidh-que-condenou-o-estado-por-violacoes-de-direitos-humanos/>. Acesso em: 05 jun. 2020. .

A demora no pagamento da indenização, ordenada pela Corte Interamericana deveu-se a uma controvérsia sobre o modo como tal reparação deveria se dar. Finalmente, com o aval da Corte Interamericana, o Estado Brasileiro aceitou fazer o pagamento diretamente à associação Xukuru, com o intuito de constituir um Fundo de Desenvolvimento Comunitário.

Se por um lado o pagamento realizado pela União diretamente aos membros do Povo Indígena Xukuru consiste em uma grande conquista, por representar uma medida de respeito à autonomia e auto-determinação do povo indígena, ao mesmo tempo pode se tornar um grande revés nesses mesmos aspectos, a depender se os órgãos do Estado exigirão algum tipo de contrapartida para o gasto dos recursos do fundo, por parte da comunidade indígena.

Conclusões

Depois de muitos anos de luta e de muitas vidas perdidas, os Xukuru alcançaram uma vitória importantíssima para a garantia dos seus direitos. Mas mais do que uma vitória do povo Xukuru, a sentença da Corte Interamericana foi uma conquista dos povos indígenas, que viram parâmetros muito avançados no tocante à interpretação do artigo 21 da Convenção Americana de Direitos Humanos serem reafirmados pelo órgão máximo do Sistema Interamericano.

Especificamente no caso do Brasil, a sentença do caso Xukuru traz elementos contundentes que podem ser muito estratégicos em um momento de tantos retrocessos na política indígena do país.

Assim, por exemplo, a afirmação do direito territorial indígena como anterior ao título que lhe dá validade, o direito à titulação do território, assim como a concepção de que uma comunidade indígena mantém o direito ao seu território ainda que tenha sido involuntariamente expulsa do mesmo, podem ser argumentos muito valiosos para combater ameaças aos direitos territoriais indígenas25 25 A título de exemplo, podemos citar a Proposta de Emenda Constitucional no. 215/2000, que passa para o Congresso Nacional a competência para a aprovação de demarcação de terras indígenas e a ratificação das demarcações já homologadas (de conteúdo similar, o Projeto de Lei 490/07); e o Parecer no. 01/2017 e Portaria no. 303/2012, ambos da Advocacia Geral da União (esta última já foi revogada), que estabelecem o caráter vinculante das dezenove condicionantes afirmadas no caso Raposa Serra do Sol, sendo uma delas justamente a tese do marco temporal, e que restringem a demarcação de terras no país. . Dentre estas, pode-se mencionar a tese do marco temporal, que ganhou relevância no julgamento do caso Raposa Serra do Sol (Petição 3388) 26 26 Na decisão, o STF afirmou que a Constituição da República estabeleceu a sua data de promulgação da Constituição, 05 de outubro de 1988, como “insubstituível referencial para o dado da ocupação de um determinado espaço geográfico por essa ou aquela etnia aborígene; ou seja, para o reconhecimento, aos índios, dos direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam”. Algumas demarcações de terras indígenas têm sido desconstituídas pela aplicação da tese do marco temporal, ainda que o pleno do STF ainda não tenha afirmado a sua constitucionalidade. Para conferir o acórdão desse julgamento, ver: <http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticianoticiastf/anexo/pet3388ma.pdf>. Acesso em: 09 jun. 2020. .

Deste modo, a sentença da Corte Interamericana também convoca tribunais brasileiros a realizarem o controle de convencionalidade, isto é, a análise de compatibilidade com tratados e convenções internacionais, sobre atos e normas editadas pelos diversos órgãos do Estado Brasileiro, em seus três níveis: municipal, estadual e federal.

Outro ponto que chama a atenção sobre o caso Xukuru no Sistema Interamericano é que o caso viabilizou o quanto os povos indígenas do Brasil poderiam fazer um uso mais consistente do Sistema para garantia dos seus direitos, pois apenas em 2016 a Corte Interamericana teve a chance de se pronunciar sobre o caso envolvendo o Estado Brasileiro, de um lado, e uma comunidade indígena, de outro.

É certo que o Sistema Interamericano tem seus limites, pois uma nova batalha está sendo travada neste momento pelos representantes das vítimas, para dar efetividade à sentença. No entanto, trata-se de importante contribuição, que pode fortalecer a luta dos povos indígenas nacionalmente e contribuir para o alcance de algumas vitórias.

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    CORTE IDH. Audiencia Pública. Caso Pueblo Indígena Xucuru y sus miembros Vs. Brasil. Cidade da Guatemala: CORTE IDH, 2017CORTE IDH. Audiencia Pública. Caso Pueblo Indígena Xucuru y sus miembros Vs. Brasil. Cidade da Guatemala: CORTE IDH, 2017. 1 vídeo (1h26min17). Disponível em: <https://vimeopro.com/corteidh/caso-pueblo-indigena-xucuru-y-sus-miembros-vs-brasil>. Acesso em: 09 jun. 2020.
    https://vimeopro.com/corteidh/caso-puebl...
    . 1 vídeo (1h26min17). Disponível em: <https://vimeopro.com/corteidh/caso-pueblo-indigena-xucuru-y-sus-miembros-vs-brasil>. Acesso em: 09 jun. 2020.
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    1) de forma conjunta, pela Clínica de Direitos Humanos da Universidade de Ottawa, pela Fundação para o Devido Processo, pelo Núcleo de Estudos em Sistemas Internacionais de Direitos Humanos da Universidade Federal do Paraná e pela Rede de Cooperação Amazônica; 2) também de forma conjunta, pela Clínica de Direitos Humanos e Direito Ambiental da Universidade do Estado do Amazonas e pelo Grupo de Pesquisa de Direitos Humanos do Amazonas; 3) pela Associação de Juízes para a Democracia; 4) pela Clínica de Direitos Humanos do Amazonas, vinculada ao Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal do Pará; e 5) pela Defensoria Pública da União, do Brasil. Corte IDH. Caso do Povo Indígena Xucuru e seus Membros Vs. Brasil. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 05 de fevereiro de 2018, Serie C, No. 346. Disponível em: <https://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_346_por.pdf>. Acesso em: 09 jun. 2020
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    Corte IDH. Caso do Povo Indígena Xucuru e seus Membros Vs. Brasil. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 05 de fevereiro de 2018, Serie C, No. 346. Disponível em: <https://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_346_por.pdf>. Acesso em: 09 jun. 2020
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    Caso do Povo Indígena Xucuru e seus Membros Vs. Brasil. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 05 de fevereiro de 2018, Serie C, No. 346. Disponível em: <https://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_346_por.pdf>. Acesso em: 09 jun. 2020
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    Documentos solicitados ao Estado: 1) Autos completos da Ação Ordinária No. 0002246-51.2002.4.05.8300 (número original 2002.83.00.002246-6), interposta por Paulo Pessoa Cavalcanti de Petribu e outros; 2) Atualização, desde 1996, da Ação de Reintegração de Posse No. 0002697-28.1992.4.05.8300 (número original 92.0002697-4), interposta por Milton do Rego Barros Didier e outros; e 3) Informação detalhada sobre a situação jurídica das seis ocupações não indígenas ainda não indenizadas e retiradas da Terra indígena Xucuru. Documento solicitado aos representantes: informação sobre os membros do Povo Indígena Xukuru, sua identificação e composição atual. Corte IDH. Caso do Povo Indígena Xucuru e seus Membros Vs. Brasil. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 05 de fevereiro de 2018, Serie C, No. 346. Disponível em: <https://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_346_por.pdf>. Acesso em: 09 jun. 2020
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    Corte IDH. Caso do Povo Indígena Xucuru e seus Membros Vs. Brasil. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 05 de fevereiro de 2018, Serie C, No. 346. Disponível em: <https://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_346_por.pdf>. Acesso em: 09 jun. 2020
  • 21
    Corte IDH. Caso do Povo Indígena Xucuru e seus Membros Vs. Brasil. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 05 de fevereiro de 2018, Serie C, No. 346. Disponível em: <https://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_346_por.pdf>. Acesso em: 09 jun. 2020; Corte IDH. Caso Povos Kaliña e Lokono Vs. Suriname. Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 25 de novembro de 2015, Serie C, No. 309, par. 131-132. Disponível em: <https://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_309_esp.pdf>. Acesso em: 09 jun. 2020.
  • 22
    Corte IDH. Caso do Povo Indígena Xucuru e seus Membros Vs. Brasil. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 05 de fevereiro de 2018, Serie C, No. 346. Disponível em: <https://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_346_por.pdf>. Acesso em: 09 jun. 2020
  • 23
    Ibidem, par. 127.
  • 24
    CIMI – Conselho Indigenista Missionário. Povo Xukuru recebe indenização do governo após sentença da CIDH que condenou o Estado por violações de direitos humanos. Brasília, DF: CIMI, 2020CIMI – Conselho Indigenista Missionário. Povo Xukuru recebe indenização do governo após sentença da CIDH que condenou o Estado por violações de direitos humanos. Brasília, DF: CIMI, 2020. Disponível em: <https://cimi.org.br/2020/02/povo-xukuru-recebe-indenizacao-do-governo-federal-como-sentenca-da-cidh-que-condenou-o-estado-por-violacoes-de-direitos-humanos/>. Acesso em: 05 jun. 2020.
    https://cimi.org.br/2020/02/povo-xukuru-...
    . Disponível em: <https://cimi.org.br/2020/02/povo-xukuru-recebe-indenizacao-do-governo-federal-como-sentenca-da-cidh-que-condenou-o-estado-por-violacoes-de-direitos-humanos/>. Acesso em: 05 jun. 2020.
  • 25
    A título de exemplo, podemos citar a Proposta de Emenda Constitucional no. 215/2000, que passa para o Congresso Nacional a competência para a aprovação de demarcação de terras indígenas e a ratificação das demarcações já homologadas (de conteúdo similar, o Projeto de Lei 490/07); e o Parecer no. 01/2017 e Portaria no. 303/2012, ambos da Advocacia Geral da União (esta última já foi revogada), que estabelecem o caráter vinculante das dezenove condicionantes afirmadas no caso Raposa Serra do Sol, sendo uma delas justamente a tese do marco temporal, e que restringem a demarcação de terras no país.
  • 26
    Na decisão, o STF afirmou que a Constituição da República estabeleceu a sua data de promulgação da Constituição, 05 de outubro de 1988, como “insubstituível referencial para o dado da ocupação de um determinado espaço geográfico por essa ou aquela etnia aborígene; ou seja, para o reconhecimento, aos índios, dos direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam”. Algumas demarcações de terras indígenas têm sido desconstituídas pela aplicação da tese do marco temporal, ainda que o pleno do STF ainda não tenha afirmado a sua constitucionalidade. Para conferir o acórdão desse julgamento, ver: <http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticianoticiastf/anexo/pet3388ma.pdf>. Acesso em: 09 jun. 2020.

Referências Bibliográficas

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Abr 2022
  • Data do Fascículo
    Jan-Mar 2022

Histórico

  • Recebido
    31 Jan 2022
  • Aceito
    02 Fev 2022
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