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Direito, exceção e segurança na repressão aos protestos de junho de 2013 em São Paulo

Law, exception and security in the repression of the June 2013 protests in São Paulo

Resumo

Este trabalho apresenta uma análise das estratégias e sujeitos políticos envolvidos nos protestos de junho de 2013 e sua repressão pelo Estado, considerando (a) o sentido das técnicas mobilizadas pelo Estado para a repressão dos protestos, bem como o das técnicas mobilizadas por movimentos sociais e instituições para a resistência a essa repressão; e (b) os diferentes arranjos construídos entre sujeitos políticos e técnicas de repressão e resistência naquele contexto.

Palavras-chave:
Protestos; Repressão; Movimentos Sociais

Abstract

This work presents an analysis of the strategies and political subjects engaged in the protests in June 2013, and its repression by the State, considering (a) the meaning of the techniques used by the State to repress the protests and the meaning of the techniques used by social movements and institutions to resist to that repression; and (b) the different sets of relations between political subjects and those techniques of repression and resistance.

Keywords:
Protest; Repression; Social Movements

Introdução

“Todo preso é um preso político” e “na periferia a bala não é de borracha” foram palavras de ordem presentes nos protestos de junho de 2013 que sintetizam o problema que este artigo pretende analisar: o da legitimidade da repressão estatal, pensada não só em termos dos seus fundamentos sociopolíticos e normativos, mas também da diferenciação entre os sujeitos políticos submetidos a essa repressão. A repressão estatal aos protestos de junho de 2013 - e as diferentes capacidades de resistência a elas - significam uma inflexão nos padrões históricos do controle social repressivo, com especificidades em função da natureza politicamente contenciosa da situação-problema? Ou apenas reproduzem aqueles padrões, aplicados indistintamente à “criminalidade comum” e à “criminalidade política”, na periferia e no centro da metrópole? Os padrões de legalidade/ilegalidade da ação policial (e das possibilidades de controle sobre ela) verificados em junho de 2013 são os mesmos conhecidos da literatura sociológica sobre trabalho policial e controle do crime no Brasil, em geral?

Para enfrentar esse problema e responder a essas questões, este artigo se desenvolve da seguinte maneira: na seção seguinte, apresenta os referenciais teóricos mobilizados para a análise, centrados nos conceitos de técnicas de Estado, gramáticas jurídicas e topologias do poder; em seguida, duas seções apresentam as evidências empíricas organizadas conforme aqueles referenciais teóricos, descrevendo as técnicas e gramáticas de repressão e resistência e, após, os arranjos estabelecidos entre os sujeitos políticos e aquelas técnicas em suas mobilizações para a repressão ou a resistência à repressão; ao final, apresenta uma análise daquelas evidências, destacando como os diferentes arranjos topológicos identificados pela pesquisa demonstram as articulações entre legalidade e exceção no Brasil e as continuidades e diferenças entre os padrões conhecidos de controle do crime e as inovações do controle estatal do protesto no Brasil.

1. Técnicas de Estado, gramáticas jurídicas e topologias do poder

Günter Frankenberg (2018FRANKENBERG, G. Técnicas de Estado: perspectivas sobre o Estado de Direito e o Estado de Exceção. São Paulo: Editora Unesp, 2018., p. 15) entende as técnicas de Estado como “a forma como o poder político é exercido”, abrangendo “a totalidade dos procedimentos, normas e princípios, formas de conhecimento e competências, estratégias, táticas e cálculos operacionalizados por atores e instituições”. Por sua vez, a gramática jurídica é concebida por Frankenberg (2006) como conjunto de arranjos argumentativos de tradução dos conflitos sociais e políticos em termos jurídicos.

Formulados a partir da noção foucaultiana de governamentalidade (FOUCAULT, 2006FOUCAULT, M. Microfísica do poder. 22. ed. Rio de Janeiro: Graal, 2006.), o emprego conjunto dos conceitos de técnicas de Estado e gramáticas jurídicas “acentua, por um lado, a estatalidade como campo de ação e intervenção de objetivos e técnicas que se entrecruzam e, por outro, a importância do direito como forma e autoridade do exercício legítimo do poder” (FRANKENBERG, 2018FRANKENBERG, G. Técnicas de Estado: perspectivas sobre o Estado de Direito e o Estado de Exceção. São Paulo: Editora Unesp, 2018., p. 15-16). Frankenberg pensa as possibilidades concretas de técnicas de Estado a partir de três tipos-ideais formulados no debate com as teorias políticas de Maquiavel, Hobbes e Locke, e um terceiro método pensado como síntese do diagnóstico sócio-histórico de Foucault sobre a emergência da segurança como técnica de governo de populações1 1 Importante destacar que o uso que Frankenberg (2018) faz dos autores de teoria política não é dedutivo, nem de leitura estrutural, mas sim o de considerá-los, de maneira esquemática, como ilustrativos de uma racionalidade política emergente em suas épocas históricas, mas que não se resume nem tem por origem seus textos teóricos. Nesse sentido, Frankenberg claramente se baseia nas mobilizações que Foucault faz de autores de teoria política em suas investigações e cursos sobre a racionalidades governamentais (ou artes de governo). Nesse sentido ver, por exemplo, como este autor lida com os autores de economia política em sua análise da emergência do liberalismo como arte de governo (FOUCAULT, 2008), e da segurança do Estado como princípio de uma racionalidade securitária, ilustrada pelo Leviatã de Hobbes, e que acompanha a emergência do Estado moderno contra discursos sectários e de guerra que resistiam a esse processo (FOUCAULT, 2010). .

O método Maquiavel seria o exercício puro do poder político, pelo soberano, com o objetivo apenas de preservação do próprio poder. Contudo, por ignorar os “grilhões jurídicos” das democracias de estado de direito contemporâneas, as técnicas de Estado associadas a esse modelo não são centralmente consideradas na análise de Frankenberg, para quem elas retrocederam a “âmbitos com regras e estruturas menos desenvolvidas do ponto de vista do Estado de direito, como, por exemplo, as direções partidárias e empresariais” (FRANKENBERG, 2018FRANKENBERG, G. Técnicas de Estado: perspectivas sobre o Estado de Direito e o Estado de Exceção. São Paulo: Editora Unesp, 2018., p. 26).

São centrais em sua análise os outros três métodos: o método Hobbes das técnicas de Estado seria aquele no qual o soberano tem a autorização dos súditos para agir como for necessário para garantir a segurança da comunidade política; o método Locke seria o do governo liberal das leis, que pensa o direito e os direitos civis como limitadores do poder estatal; por fim, o método Foucault seria o da securitização dos dispositivos de poder, em combinação com a lógica dos dispositivos jurídicos e disciplinares que caracterizaram a construção do Estado moderno até o século XIX:

A partir da contraperspectiva sobre o Estado de direito e o estado de exceção é possível delinear métodos distintos da técnica de Estado. Os critérios de referência para a distinção e a construção do modelo são: primeiro, se a técnica de Estado opera no contexto de uma diferença entre caso normal e caso de exceção que lhe é pré-fixada; segundo - relacionado com o primeiro: se e em que medida ela é limitada por regras jurídicas externas ou segue suas próprias regras; terceiro: quais objetivos estratégicos lhes são pré-fixados pela cambiante figura de argumentação da segurança.(FRANKENBERG, 2018FRANKENBERG, G. Técnicas de Estado: perspectivas sobre o Estado de Direito e o Estado de Exceção. São Paulo: Editora Unesp, 2018., p. 24)

A cada um desses modelos corresponderia, portanto, a maior ou menor aproximação das técnicas de Estado ao estado de exceção (método Hobbes), ao estado de direito (método Locke) ou ao estado securitário (método Foucault). Com base nos fundamentos históricos e analíticos que sustentam a formulação do método Foucault, Frankenberg (2018FRANKENBERG, G. Técnicas de Estado: perspectivas sobre o Estado de Direito e o Estado de Exceção. São Paulo: Editora Unesp, 2018.) vai apontar a possibilidade de que, valendo-se das gramáticas do direito, as técnicas de Estado de exceção sejam normalizadas em um regime formal do estado de direito, pela sua construção securitária no interior de uma estrutura e de uma linguagem típicas do estado de direito liberal. Dessa forma, o conceito de técnicas de Estado como recorte analítico de um objeto empírico permite entender as tensões entre direito e exceção, entre lei e ordem, e entre liberdade e segurança que ocorrem na construção dessas técnicas, nas suas gramáticas justificadoras e na sua efetivação.

Desloca-se, assim, o foco do regime político-jurídico como um macro-arranjo institucional para a verificação de suas características em microdimensões da manifestação do poder de Estado:

É de regimes de Estado de direito ou de exceção que a racionalidade da técnica de Estado recebe seu significado específico e sua direção ofensiva nos campos de conflito da prevenção jurídica de abusos (contra a arbitrariedade do poder soberano) ou da prevenção de perigos no âmbito de um estado de exceção (contra motins, guerras civis e catástrofes). Em um contraste ideal-típico, direito normal e direito de exceção demarcam e estruturam as zonas em que são atribuídas às técnicas de Estado, enquanto técnica securitária, tarefas diferentes - conforme lhe tenha sido dado regular, dirigir, controlar, informar ou disciplinar, no âmbito do direito normal, ou vigiar, submeter, reprimir ou pacificar, no âmbito do direito de exceção. (FRANKENBERG, 2018FRANKENBERG, G. Técnicas de Estado: perspectivas sobre o Estado de Direito e o Estado de Exceção. São Paulo: Editora Unesp, 2018., p. 19)

A partir desse contraste ideal-típico entre os regimes que informam as técnicas de Estado, Frankemberg diferencia dois tipos de técnicas voltadas para o problema da manutenção da lei e da ordem: as técnicas legislativas e as técnicas executivas (Quadro 1).

Quadro 1:
características típico-ideais das técnicas de Estado legislativa e executiva

As técnicas legislativas são aquelas típicas do Estado de direito pensado no método Locke: baseiam-se no pressuposto da separação de poderes, que permite distinguir a elaboração (Legislativo), a aplicação (Executivo) e o julgamento da adequação da lei aos fatos (Judiciário); possuem racionalidade formal, ou seja, baseada em “formas universais de interação” (FRANKENBERG, 2018FRANKENBERG, G. Técnicas de Estado: perspectivas sobre o Estado de Direito e o Estado de Exceção. São Paulo: Editora Unesp, 2018., p. 217), legalmente previstas; têm por objetivos sociais e políticos a previsibilidade, a liberdade e a segurança individuais contra abusos do poder estatal. Suas expressões jurídicas são a supremacia do direito produzido pelo poder Legislativo, as garantias constitucionais individuais e a forma das leis gerais; os principais exemplos desse tipo de técnica são os mecanismos de controles recíprocos da separação de poderes, as regras do devido processo legal e o princípio da legalidade.

As técnicas de Estado executivas são aquelas associadas ao método Hobbes: possuem racionalidade material, ou seja, determinada pelo conteúdo específico das normas e das situações (igualmente específicas, quando não excepcionais) que pretendem regular; tem por objetivo a hiperprevisibilidade de riscos e a “repulsa a perigos”. Assume as expressões jurídicas de um direito administrativo fortemente autônomo em relação a controles de outros poderes; de um “direito de combate”, marcado pela disposição para um ativismo estatal permanente na repulsa dos perigos; de um “direito penal do inimigo”, distinto de um “direito penal do cidadão” e de um “direito policial especial”, não necessariamente positivado como tal, mas que dá às forças policiais e agências administrativas de lei e ordem amplas margens de discricionariedade para a eleição de perigos e das respostas a eles. Os principais exemplos dessas técnicas, elencados por Frankenberg (2018FRANKENBERG, G. Técnicas de Estado: perspectivas sobre o Estado de Direito e o Estado de Exceção. São Paulo: Editora Unesp, 2018.) a partir de seu estudo do caso alemão, são as possibilidades institucionalmente autorizadas de flexibilização da separação de poderes, as normas em branco (que permitem a discricionariedade administrativa e do direito policial), práticas de vigilância, tortura para obtenção de provas e autorização para o abate de inimigos e ameaças.

A securitização do Estado se daria, portanto, com a ampliação das técnicas executivas e dos seus fundamentos excepcionais, dentro da estrutura formal e da gramática do estado de direito democrático, sem rupturas de sua institucionalidade ou de seu ordenamento jurídico. Neste trabalho, a securitização é a hipótese explicativa dos sentidos e dos arranjos políticos entre repressão aos protestos e resistências em junho de 2013.

Para a verificação desses arranjos, utilizo o conceito de topologias do poder formulada por Stephen J. Collier (2011COLLIER, S. J. Topologias de poder: a análise de Foucault sobre o governo político para além da “governamentalidade”. Revista Brasileira de Ciência Política, n. 5, p. 245-284, 2011.) para compreender a série soberania-disciplina-segurança na obra de Foucault não como sequência histórica de sucessão de modelos de artes de governo, mas como sistema de possibilidades de correlação e recombinação entre dispositivos jurídico-legais, disciplinares e securitários:

Uma análise topológica, por contraste, traz à luz um espaço heterogêneo, constituído através de múltiplas determinações, e não redutível a uma forma de conhecimento-poder. Ela é mais adequada para analisar o processo dinâmico por meio do qual elementos existentes, como técnicas, esquemas de análise e formas materiais, são selecionados e realocados, e através dos quais são formadas novas combinações de elementos. (COLLIER, 2011COLLIER, S. J. Topologias de poder: a análise de Foucault sobre o governo político para além da “governamentalidade”. Revista Brasileira de Ciência Política, n. 5, p. 245-284, 2011., p. 277)

Portanto, pensar o espaço topológico como espaço de identificação e problematização de processos recombinatórios permite a construção de diagramas de poder, que possibilitam a análise de configurações situadas das relações entre técnicas de Estado e suas gramáticas, de um lado, e de sujeitos e instituições, de outro. Permite, também, investigar as relações entre poder e resistência e, assim, compreender não apenas a racionalidade interna do poder do Estado (representadas pela matriz teórica dos modelos de técnicas de Estado), mas também a produção da estatalidade a partir do “antagonismo das estratégias” (FOUCAULT, 1995FOUCAULT, M. O sujeito e o poder. Em: RABINOW, P.; DREYFUS, H. (Eds.). Michel Foucault: uma trajetória filosófica - para além do estruturalismo e da hermenêutica. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1995. p. 231-239.) de instituições políticas, judiciais e movimentos sociais, nos termos de uma perspectiva antropológica segundo a qual os “limites do Estado, assim como também sua morfologia interna, variam de acordo com as diferentes maneiras nas quais se determina o pertencimento ou a inclusão, o dentro e o fora, a lei e a exceção” (ASAD, 2008ASAD, T. ¿Dónde están los márgenes del estado? Cuadernos de Antropología Social, n. 27, p. 53-62, 2008., p. 53-54).

2. Técnicas de repressão e resistência

A partir desses referenciais teóricos, analiso nesta seção do trabalho um conjunto de evidências empíricas sobre a repressão aos protestos do Movimento Passe Livre (MPL) na cidade de São Paulo no período 2013-2016. Além dos dados produzidos em pesquisas próprias2 2 Os dados aqui analisados foram coletados no projeto de pesquisa “Conflito político e sistema de justiça: a judicialização criminal dos protestos urbanos em São Paulo (2013-2015), financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo - FAPESP (Auxílio Regular n. 2015/002554); e nos projetos de Iniciação Científica, sob minha orientação, de Marília Alves, de Marina Moura Souza e de Rodrigo Cruz Lopes (ALVES; ALMEIDA, 2018; LOPES; ALMEIDA, 2017; SOUZA; ALMEIDA, 2021), todos financiados pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq no âmbito do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica da Universidade Estadual de Campinas. Para outros resultados e análises decorrentes daquele projeto, ver Almeida (2020); Almeida, Monteiro e Smiderle (2020); Almeida e Lopes (2019). , o debate com outros estudos contemporâneos sobre o mesmo objeto servirá de base para o mapeamento dos sentidos das técnicas de Estado e suas gramáticas políticas, bem como dos arranjos entre essas técnicas e os sujeitos políticos envolvidos naquele contexto.

De maneira geral, o protesto pode ser considerado uma situação na qual a violência latente ou manifesta do protesto e o uso ou a ameaça do uso da força pelas forças policiais tensionam as definições políticas e jurídicas de liberdades civis, participação política e violência legítima. Segundo Donatella Della Porta, o protesto é a forma característica de movimentos sociais que buscam mudanças políticas, mas dispõem de poucos recursos institucionalizados e convencionais para isso (DELLA PORTA, 2008DELLA PORTA, D. Eventful protest, global conflicts. Conference of the Nordic Sociological Association. Anais...Aahrus: 2008.; DELLA PORTA; DIANI, 2006).

Por isso, o conflito é constitutivo da ação dos movimentos sociais e dos atos de protesto; da mesma forma, a repressão estatal (especialmente policial) deve ser compreendida como parte do mesmo fenômeno, x. Para P. A. J. Waddington (1994WADDINGTON, P. A. J. Liberty and Order. London: UCL Press, 1994., 2010), são as polícias que fazem a delimitação dos limites da liberdade de manifestação política, com mandato legal, mas em condições de discricionariedade e conflituosidade pouco exploradas pelos estudos de protestos. Para além do policiamento de protestos, contudo, Carolijn Terwindt (2014TERWINDT, C. Criminalization of Social Protest: future research. Oñati Socio-Legal Serires, v. 4, n. 1, p. 161-169, 2014.) sugere que a investigação da criminalização dos protestos considere as disputas sobre o caráter jurídico-criminal das ações de protesto; identifique padrões, tipologias e estratégias de criminalização e de construção de contra-estratégias de resistência, por parte dos movimentos sociais; e analise os efeitos da criminalização na exclusão de atores políticos dos processos de tomada de decisão.

Os dados das pesquisas que conduzi sobre a repressão aos protestos do Movimento Passe Livre (MPL) na cidade de São Paulo3 3 A pesquisa analisou procedimentos criminais (cinco inquéritos policiais e duas ações penais, fornecidas pelos advogados do MPL); oito notas coletadas no site do Ministério Público (MP) e trinta e três da Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo (SSP); catorze notas coletadas no site do MPL; entrevistas com manifestantes e operadores da justiça criminal (advogados, defensores públicos, juízes, um policial); e outros documentos (como textos jornalísticos e peças processuais selecionadas de procedimentos administrativos e judiciais não constantes na amostra original de procedimentos criminais fornecidos pelos advogados do MPL). Também foi feita observação participante de dois protestos do MPL contra o aumento da tarifa de transporte público na cidade de São Paulo em janeiro de 2015, do início do protesto até sua dispersão pela repressão policial, se estendendo depois até o trabalho de advogados em um Distrito Policial, acompanhando a situação de manifestantes presos. permitiram a identificação e a sistematização das relações entre técnicas de Estado, instituições e sujeitos políticos conforme diagrama abaixo (Figura 1). No diagrama, construído de acordo com a noção de topologias do poder, apresentada anteriormente, as técnicas de Estado são identificadas pelos heptágonos; os sujeitos e instituições políticas pelas elipses; as setas bidirecionais indicam relações de repressão e resistência, enquanto as linhas pontilhadas representam relações de coordenação, aliança ou cooperação entre sujeitos e instituições políticas.

Figura 1:
diagrama de relações entre técnicas de Estado, sujeitos políticos e instituições na repressão aos protestos do MPL (2013-2015)

As técnicas de Estado da repressão aos protestos são tipicamente executivas, nos termos da tipologia de Frankenberg (2018FRANKENBERG, G. Técnicas de Estado: perspectivas sobre o Estado de Direito e o Estado de Exceção. São Paulo: Editora Unesp, 2018.), e estão apresentadas em azul no diagrama; a partir delas, há setas que indicam seus efeitos repressivos sobre os sujeitos políticos do protesto - embora partamos do pressuposto que toda relação de poder é também uma relação de resistência (razão pela qual as setas são bidirecionais) são azuis as setas que indicam relações predominantemente de repressão.

A primeira técnica de Estado, dentre essas, é o policiamento ostensivo militarizado. Esse protagonismo diz respeito ao papel que a Polícia Militar (PM) adquire na gestão de conflitos no Brasil pós-redemocratização, com crescentes graus de discricionariedade no patrulhamento ostensivo e no emprego do tirocínio policial para o arbitramento desses conflitos e para a manutenção da ordem, inclusive com soluções violentas ilegais, seletivas e letais, baseadas em concepções autoritárias, belicistas e racistas que reforçam e produzem desigualdades. Essa técnica de Estado é produzida a partir de legados autoritários da formação das polícias no Brasil, mas ganha configurações novas com processos próprios do regime democrático, como o aumento da discricionariedade policial, o reforço de seu caráter militarizado e o aumento do campo de ação policial nas dinâmicas contemporâneas do controle social (SCHLITTLER, 2016SCHLITTLER, M. C. “Matar muito, prender mal”: A produção da desigualdade racial como efeito do policiamento ostensivo militarizado em SP. Doutorado (Sociologia)-São Carlos: Universidade Federal de São Carlos, 2016.; SINHORETTO, 2014SINHORETTO, J. Reforma da Justiça: gerindo conflitos em uma sociedade rica e violenta. Diálogos sobre Justiça, n. 2, 2014.; SINHORETTO; LIMA, 2015).

No caso da repressão aos protestos do MPL em São Paulo, essa técnica de Estado manifestou-se pelo (a) emprego de estratégias de dissuasão, negociação e acompanhamento da circulação de manifestantes por diferentes tipos de policiamentos, mais ou menos especializados; (b) pela dispersão violenta de multidões e pelo enfrentamento com manifestantes, com emprego de armas não letais e embates corporais; (c) pela ocorrência de prisões para averiguação e desmobilização de manifestantes, sem suporte legal e sem encaminhamentos judiciais posteriores (registro de ocorrência, inquéritos, denúncias, etc). A esse conjunto de procedimentos, saberes e estratégias a pesquisa identificou o acréscimo de outros, posteriores, decorrentes de processos de interação e aprendizado entre manifestantes e policiais: (d) a organização de uma tropa de policiais treinados em artes marciais para confronto direto e imobilização de manifestantes, apelidada de “tropa do braço”; (e) a associação entre dispersão, cercamento e prisão de manifestantes, com maior economia de tempo e violência física direta; e (f) o envelopamento do tipo “caldeirão de Hamburgo” (ALMEIDA; MONTEIRO; SMIDERLE, 2020ALMEIDA, F.; MONTEIRO, F. J.; SMIDERLE, A. A criminalização dos protestos do Movimento Passe Livre em São Paulo (2013-2015). Revista Brasileira de Ciências Sociais, v. 35, n. 102, p. e3510211, 2020.).

O segundo conjunto de intervenções do poder estatal nos protestos, que caracterizo como técnicas de Estado, é o do inquérito inquisitorial-burocrático a cargo da Polícia Civil (PC) em sua função legal de polícia judiciária. Denomino procedimento inquisitorial-burocrático o modo de produção do inquérito administrativo policial como peça acusatória no Brasil, com caraterísticas bem identificadas pela sociologia da justiça criminal no Brasil: (a) seu caráter inquisitorial, administrativo e cartorial, com (b) alto grau de discricionariedade da PC na sua condução e no trabalho do produção probatória, mas com (c) baixa articulação com as demais instâncias do fluxo do sistema de justiça (MISSE, 2011MISSE, M. O papel do inquérito policial no processo de incriminação no Brasil: algumas reflexões a partir de uma pesquisa. Revista Sociedade e Estado, v. 26, n. 1, p. 15-27, 2011.; MISSE et al., 2010; RATTON; TORRES; BASTOS, 2011RATTON, J. L.; TORRES, V.; BASTOS, C. Inquérito policial, Sistema de Justiça Criminal e políticas públicas de segurança: dilemas e limites da Governança. Revista Sociedade e Estado, v. 26, n. 1, p. 29-58, 2011.; VARGAS; RODRIGUES, 2011VARGAS, J. D.; RODRIGUES, J. N. L. Controle e Cerimônia: o inquérito policial em um sistema de justiça criminal frouxamente ajustado. Revista Sociedade e Estado, v. 26, n. 1, p. 77-96, 2011.).

Os dados da pesquisa sobre a repressão aos protestos do MPL mostram que manifestantes que não eram presos apenas para averiguação e desmobilização eram encaminhados a Distritos Policiais, onde eram lavrados Boletins de Ocorrência (BO) dos crimes dos quais eram acusados. Há uma forte conexão entre esta técnica de Estado e o policiamento ostensivo militarizado, anteriormente descrito: a pesquisa identificou que acusação registrada nos BO eram narrativas apresentadas pelos policiais militares responsáveis pela prisão em flagrante, confirmadas por outros policiais militares, categorizados como testemunhas naqueles registros feitos pela PC, sem maiores possibilidades de que as versões alternativas dos fatos apresentadas pelos acusados e seus advogados se impusessem.

Embora apenas dois dos sete inquéritos criminais analisados tenham se transformado em ações penais judiciais, a pesquisa identificou nesses casos a reprodução da narrativa acusatória original dos policiais militares tanto na denúncia feita pelo Ministério Público (MP) quanto no seu acatamento pelo Judiciário, dando início à ação penal. Mesmo que a maior parte dos inquéritos analisados não tenham resultado em manutenção das prisões em flagrante ou em denúncias e condenações judiciais, a pesquisa identificou efeitos de desmobilização e inculcação de medo e estigma em manifestantes entrevistados, em função das potenciais consequências daqueles procedimentos criminais (custos materiais e psíquicos da defesa, possibilidade de “ficha suja” prejudicar empregabilidade, etc) (ALMEIDA; MONTEIRO; SMIDERLE, 2020ALMEIDA, F.; MONTEIRO, F. J.; SMIDERLE, A. A criminalização dos protestos do Movimento Passe Livre em São Paulo (2013-2015). Revista Brasileira de Ciências Sociais, v. 35, n. 102, p. e3510211, 2020.).

A terceira técnica de Estado identificada na repressão aos protestos é a da vigilância. Entendo por vigilância as práticas de monitoramento de potenciais ameaças à ordem política que, conforme a literatura comparada, caracteriza tipicamente a função de polícia política (EMSLEY, 1997EMSLEY, C. Introduction: Political police and the European Nation-State in the 19th century. Em: MAZOWER, M. (Ed.). The Policing of Politics in the Twentieth Century: Historical Perspectives. Providence: Berghahn Books, 1997.; REZNIK, 2004REZNIK, L. Democracia e Segurança Nacional: a Polícia Política no pós-guerra. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2004.). Na minha pesquisa, contudo, foi possível verificar que essa vigilância não se resume a um órgão de polícia política, embora realizada por divisões burocráticas tanto da PM quanto da PC. No caso da PM, a vigilância ocorre com a filmagem de atos de protestos e manifestantes, cujas imagens são depois analisadas pelo Centro de Operações da Polícia Militar (COPOM). No caso da PC a vigilância foi verificada especialmente por meio do “inquérito black-bloc”, instaurado pelo Departamento de Investigações Criminais (DEIC) para identificar uma suposta organização criminosa voltada para atos de vandalismo e protestos violentos; por meio desse inquérito, que não individualizava atos ou pessoas investigadas, foi feito o monitoramento (com fotografias e relatórios) de protestos e de páginas e usuários de redes sociais, que a partir de certa identificação de vínculos e padrões de comportamento naquelas redes, foram convocados a prestar depoimentos, juntamente com manifestantes acusados em outros inquéritos específicos, em dias de manifestações agendadas.

As técnicas de Estado de resistência são tipicamente legislativas, segundo a tipologia de Frankenberg (2018FRANKENBERG, G. Técnicas de Estado: perspectivas sobre o Estado de Direito e o Estado de Exceção. São Paulo: Editora Unesp, 2018.), e estão identificadas em vermelho no diagrama da figura 1; a partir delas há setas bidirecionais, também na cor vermelha, que indicam relações predominantemente de resistência.

A primeira dessas técnicas de Estado é o devido processo legal, por meio do qual advogados de manifestantes presos e acusados buscaram garantir a defesa técnica daqueles sujeitos políticos, reverter suas prisões em flagrante, exercer algum controle sobre as decisões administrativas tomadas nos inquéritos policiais e, nos casos que prosseguiram para a fase judicial, garantir a produção probatória, o contraditório e a não-responsabilização jurídica dos acusados. No geral, o manejo dessas técnicas pelos advogados foi relativamente bem-sucedida, tendo em vista que, de todos os procedimentos criminais analisados na pesquisa, em nenhum deles houve a manutenção da prisão dos acusados nem tão pouco sua condenação nas ações penais que se seguiram. É preciso destacar, porém, que esses resultados se deram todos após a repressão aos protestos, e foram incapazes de reverter os efeitos imediatos de criminalização operados pelo manejo das técnicas de Estado repressivas, especialmente aqueles produzidos pelo policiamento ostensivo militarizado e pela instauração dos inquéritos policiais (ALMEIDA; MONTEIRO; SMIDERLE, 2020ALMEIDA, F.; MONTEIRO, F. J.; SMIDERLE, A. A criminalização dos protestos do Movimento Passe Livre em São Paulo (2013-2015). Revista Brasileira de Ciências Sociais, v. 35, n. 102, p. e3510211, 2020.).

A segunda técnica de Estado de resistência identificada na pesquisa é o controle externo da atividade policial. Classifico dessa forma o conjunto de procedimentos, saberes e estratégias mobilizados por MPL, advogados, Defensoria Pública do Estado de São Paulo (DEPESP) e organizações de direitos humanos para efetivarem, por diferentes vias institucionais baseadas na separação de poderes, o controle externo do uso da força policial e, assim, diminuir a margem de discricionariedade da PM no exercício do policiamento ostensivo militarizado no momento do protesto. Essa técnica de Estado inclui procedimentos distintos, como pedidos de publicização e efetividade dos Procedimentos Operacionais Padrão (POP), que regulam o policiamento de protestos e o uso de armas não letais, por parte de organizações de direitos humanos; habeas corpus preventivos para evitar a prisão de manifestantes que já haviam sido abordados ou presos pela PM em atos anteriores de protestos; pedidos de abertura de procedimentos administrativos disciplinares para a responsabilização de policiais militares por abusos cometidos no policiamento dos protestos, feitos por organizações de direitos humanos e pela DEPESP; uma ação civil pública, proposta pela DEPESP, que pedia a proibição do uso do elastômero (“balas de borracha”) e a determinação de uma série de providências de limitação da discricionariedade policial; e a elaboração de uma lei, pela Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (ALESP), que proibia o uso do elastômero pela PM (ALMEIDA; MONTEIRO; SMIDERLE, 2020ALMEIDA, F.; MONTEIRO, F. J.; SMIDERLE, A. A criminalização dos protestos do Movimento Passe Livre em São Paulo (2013-2015). Revista Brasileira de Ciências Sociais, v. 35, n. 102, p. e3510211, 2020.; ALMEIDA; LOPES, 2019).

Em um balanço geral, a técnica de Estado do controle externo da atividade policial não foi bem-sucedida, apesar de vitórias pontuais e temporárias de movimentos, advogados, DEPESP e organizações de direitos humanos em algumas de suas estratégias e procedimentos. Elas encontraram seus limites em decisões de cúpulas dos poderes Executivo e Judiciário no caso do elastômero; no formalismo e na burocratização de certas estratégias de controle, no caso dos POP e dos procedimentos administrativos disciplinares; e no alto nível de insulamento burocrático da PM.

Há, por fim, um conjunto de procedimentos, saberes e estratégias identificadas na pesquisa cujas características demandas uma análise apartada. Refiro-me ao que os estudos sobre comunicação definem como agenda-setting, “um tipo de efeito social da mídia que compreende a seleção, disposição e incidência de notícias sobre os temas que o público falará e discutirá” (BRUM, 2003). Mais do que apenas um efeito, contudo, considero aqui o agenda-setting como um conjunto de procedimentos, saberes e estratégias mobilizados ativa e intencionalmente pelos sujeitos políticos e instituições estatais analisadas em minhas pesquisas. Essa concepção se baseia na identificação, pelos estudos de comunicação, de diferentes dimensões do processo de agenda-setting, conforme detalhamento feito por Davi de Castro (2014): a capacidade das mídias em influenciarem a agenda pública, verificável empiricamente pela centralidade dos protestos e da sua repressão no debate midiático e público pós-2013 (BUCCI, 2016); a necessidade de orientação por parte de públicos pouco familiarizados ou com poucas informações sobre certos fatos, temas ou fenômenos, o que no caso analisado está presente na novidade e na surpresa representadas pelos protestos de junho de 2013; o agendamento de atributos dos objetos levados à agenda midiática, verificável no contexto de junho de 2013 pelas disputas discursivas sobre a legitimidade dos protestos e da violência de manifestantes e forças policiais (ALMEIDA, 2020ALMEIDA, F.; MONTEIRO, F. J.; SMIDERLE, A. A criminalização dos protestos do Movimento Passe Livre em São Paulo (2013-2015). Revista Brasileira de Ciências Sociais, v. 35, n. 102, p. e3510211, 2020.; DE OLIVEIRA, 2015; MALINI; MOURA; PASSOS, 2014); as interações complexas entre atores midiáticos e do debate público mais amplo na definição de objetos e atributos da agenda midiática e da agenda pública, o que na minha pesquisa se revela nas intensas mobilizações de instituições políticas, assessorias de imprensa, movimentos sociais, manifestantes e advogados junto a jornalistas e meios de comunicação da grande imprensa ou da mídia alternativa nas disputas de narrativas sobre a legitimidade dos protestos e do emprego da violência (ALMEIDA, 2020; ALMEIDA; NORONHA, 2017).

Pela sua própria conceituação, mas também pelas evidências empíricas coletadas pela pesquisa, o agenda-setting pode apenas em alguns aspectos ser caracterizado como técnica de Estado: apenas na medida em que envolvem estratégias de posicionamento público de lideranças estatais, combinadas com o trabalho de assessorias de imprensa profissionais de instituições públicas, especialmente a Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo (SSP), que buscam pautar a imprensa e a opinião pública sobre o enquadramento dos conflitos expressos na repressão aos protestos, bem como sobre a valoração de movimentos sociais, manifestantes e atos de protesto. Assim, e por estar apenas parcialmente relacionado à estatalidade, entendo preferível classificar o agenda-setting como tecnologia de poder (COLLIER, 2011COLLIER, S. J. Topologias de poder: a análise de Foucault sobre o governo político para além da “governamentalidade”. Revista Brasileira de Ciência Política, n. 5, p. 245-284, 2011.; FOUCAULT, 2010FOUCAULT, M. Em defesa da sociedade: curso no Collège de France (1975-1976). 2. ed. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2010.) - em um sentido mais amplo, portanto, do que o de técnicas de Estado.

Além disso, a pesquisa identificou que o agenda-setting é uma tecnologia política mobilizada largamente tanto por sujeitos políticos associados aos protestos quanto pelas instituições estatais; e, ao contrário do que ocorre com as técnicas predominantemente repressivas ou de resistência, o agenda-setting apresentou-se na pesquisa como um espaço de disputas intensas entre aqueles sujeitos e instituições políticos, com efeitos variáveis no tempo e no espaço, não podendo ser caracterizado como predominantemente repressivo ou de resistência - por isso, no diagrama ele está identificado pela cor verde.

Os procedimentos, saberes e estratégias do agenda-setting incluem, por parte das instituições estatais, as declarações públicas de lideranças políticas (prefeito de São Paulo, governador do Estado, ministro da Justiça), as entrevistas coletivas à imprensa e as notas públicas produzidas pelas assessorias de imprensa institucionais, com destaque para a SSP. Por parte dos sujeitos políticos ligados às manifestações, incluem também coletivas de imprensa e declarações públicas (especialmente por parte da DEPESP e de organizações de direitos humanos), notas públicas (especialmente no caso do MPL, que recusou interações mais diretas com a imprensa), e a mobilização de jornalistas na linha de frente e de mídias alternativas para a denúncia de violência policial no momento dos protestos e para a realização de denúncias posteriores e construção de narrativas sobre a legitimidade dos protestos, alternativas àquelas produzidas pelas instituições estatais repressivas.

3. Sujeitos políticos, gramáticas jurídicas e topologias do poder

Para avançar na análise, apresento abaixo uma nova versão do diagrama analisado anteriormente, desta vez acrescido da delimitação do espaço topológico de produção de repressão e resistência, identificados por certos arranjos significativos entre técnicas de Estado, gramáticas, sujeitos políticos e instituições (Figura 2).

Figura 2:
diagrama de relações entre técnicas de Estado, sujeitos políticos e instituições na repressão aos protestos do MPL, com delimitação do espaço topológico (2013-2015)

Os triângulos de cor laranja delimitam esses arranjos, que denomino como setores, na figura 2, acima. O primeiro deles (setor A) identifica o núcleo da repressão aos protestos, baseado no comando da SSP sobre a ação da PM e da PC na mobilização direta das técnicas de Estado repressivas; no papel da assessoria de imprensa da SSP em difundir uma narrativa acerca da violência e da legitimidade dos protestos e da repressão; e, acima delas, com a blindagem do aparato de segurança pública feito pelo Executivo em relação às tentativas legislativas e judiciais de controle externo da polícia.

O caso da proibição do uso do elastômero é bastante ilustrativo do isolamento desse núcleo político repressivo e das gramáticas produzidas por ele. Embora um projeto de lei tenha sido aprovado pela ALESP, e uma decisão judicial liminar de primeira instância tenha efetivamente proibido o uso da bala de borracha, ambas as estratégias de controle externo da polícia foram bloqueadas por decisões de cúpula do Executivo (veto ao projeto de lei) e do Judiciário (cassação da liminar pela segunda instância do Tribunal de Justiça do estado). Em ambas as decisões, sobressaem elementos de um gramática política claramente excepcional, que dá aos policiais na linha de frente ampla margem de discricionariedade no emprego da força, ao legitimar um “direito policial administrativo” imune a controles externos e a distinção entre “manifestantes pacíficos” e “vândalos”, que só poderia ser feita contextualmente e in loco pela PM (ALMEIDA; LOPES, 2019ALMEIDA, F. N. R.; LOPES, R. C. Movimentos sociais, justiça e política nas estratégias de resistência à repressão aos protestos de junho de 2013 em São Paulo. . Paper apresentado em 43o Encontro Anual da ANPOCS. Caxambu, 2019.).

Aliás, a distinção entre “bons” e “maus” manifestantes é um elemento central da gramática excepcional da repressão, e seus efeitos vão além do caso do elastômero, incidindo diretamente na mobilização do agenda-setting pela SSP e alcançando efeitos nos inquéritos e ações penais analisados na pesquisa. Essa distinção é parte de um processo de sujeição criminal, nos termos propostos por Michel Misse (2010MISSE, M. Crime, sujeito e sujeição criminal: aspectos de uma contribuição analítica sobre a categoria “bandido”. Lua Nova, n. 79, p. 15-38, 2010., 2014): a construção de tipos sociais tidos como preventivamente propensos ao crime, e contra os quais seriam justificadas medidas excepcionais - não raro ilegais e violentas - em função dos riscos potenciais e difusos que tais tipos representariam à segurança da sociedade. Na repressão aos protestos, porém, não se trata do “bandido” ou do “marginal” analisados por Misse, mas sim do “vândalo”: o sujeito político predisposto à violência, identificado por vestes pretas e máscaras faciais, posições políticas radicais e pela ameaça potencial tanto aos “manifestantes pacíficos” quanto aos “cidadãos” que não participam dos protestos (ALMEIDA, 2020ALMEIDA, F.; MONTEIRO, F. J.; SMIDERLE, A. A criminalização dos protestos do Movimento Passe Livre em São Paulo (2013-2015). Revista Brasileira de Ciências Sociais, v. 35, n. 102, p. e3510211, 2020.; ALVES; ALMEIDA, 2018ALVES, M. S. C.; ALMEIDA, F. N. R.. A criminalização dos protestos políticos na ditadura militar brasileira: especificidades da ação da polícia e Judiciário. Revista dos Trabalhos de Iniciação Científica da UNICAMP, n. 26, 2018.).

O segundo arranjo significativo (setor B) é justamente aquele identificado pelas mobilizações do agenda-setting feitas por instituições repressivas e por sujeitos políticos ligados aos protestos. Do lado das instituições repressivas, esse espaço topológico é o lugar de produção do discurso sobre o vandalismo, da distinção entre “bons” e “maus” manifestantes e da justificação do uso da força policial e da valorização da ordem pública em detrimento do direito ao protesto; por parte dos sujeitos políticos ligados aos protestos, esse espaço serve para a produção de um discurso alternativo e de uma gramática política que nega a acusação do vandalismo, recusa a distinção entre “bons” e “maus” manifestantes e afirma a primazia da liberdade de manifestação política contra a defesa preventiva da ordem. Além da técnica do agenda-setting e dos usos feitos dela por sujeitos políticos e instituições estatais, esse espaço demonstra também a centralidade dos jornalistas, dos veículos da grande imprensa e das mídias alternativas como mediadores dos discursos produzidos por diferentes fontes.

O terceiro arranjo político é aquele formado pelas relações estabelecidas entre MPL, manifestantes, advogados e DEPESP (setor C). Esse espaço topológico delimita tanto a incidência dos efeitos das técnicas de Estado repressivas sobre aqueles sujeitos, quanto as possibilidades de resistência a partir de técnicas de Estado e gramáticas políticas mobilizadas por eles. Nesse sentido, as setas azuis do diagrama acima demonstram que é sobre esses sujeitos, e no momento imediato do protesto que a repressão surte seus efeitos; por sua vez, as linhas pontilhadas e as setas vermelhas que saem dessa delimitação espacial mostram a importância do MPL e dos advogados na construção de alianças e estratégias de resistência que, contudo, se mostraram pouco eficazes, seja por se projetarem em uma temporalidade distinta daquela dos efeitos das técnicas de Estado repressivas, seja pelos bloqueios políticos e burocráticos acima descritos. E é justamente pelos limites dessas estratégias de resistência que o espaço representado pela grande imprensa, pelos jornalistas e pelas mídias alternativas (setor B) surge como um locus privilegiado de disputa simbólica sobre a legitimidade do protesto e pela afirmação da liberdade de manifestação em seu conflito potencial com a manutenção da ordem pública.

A partir desse espaço de articulação de resistências é que se projeta um outro espaço mais amplo delimitado no diagrama da figura 2 (setor D, de linhas pontilhadas). Nesse espaço ampliado surgiram possibilidades novas e de efeitos estruturais para a resistência à repressão, representadas pelas tentativas de controle externo da atividade policial feitas em alianças temporárias dos sujeitos do setor C com organizações de direitos humanos, e ilustrada pela ação civil pública proposta pela DEPESP contra o uso do elastômero e pela determinação de restrições ao uso da força policial, estratégia construída em conjunto pelos sujeitos delimitados no setor D. Além de pontuais, limitadas por bloqueios políticos e burocráticos e retardadas pelos efeitos imediatos do policiamento ostensivo, dos inquéritos policiais e da vigilância, essas alianças se tornaram precárias e provisórias em função de desconfianças mútuas captadas nas entrevistas com manifestantes e advogados, sejam a dos movimentos sociais em relação a organizações de direitos humanos, sejam as expressas entre advogados de diferentes trajetórias e engajamentos nos protestos (ALMEIDA; NORONHA, 2017ALMEIDA, F.; NORONHA, R. Advogando nas ruas: advocacia em protestos urbanos no Rio de Janeiro e em São Paulo (2013-2015). Caderno Eletrônico de Ciências Sociais, v. 4, n. 2, p. 5-28, 2017.).

Essas desconfianças, por sua vez, decorrem de visões de mundo radicalmente distintas entre os sujeitos desse setor, expressas por diferentes gramáticas políticas: enquanto DEPESP e organizações de direitos humanos atuavam em nome do “direito ao protesto” e do controle legal e social da atividade policial, ambos referenciados constitucionalmente, o MPL mostrou resistências em desviar seu foco da pauta dos transportes e do “direito à cidade” para a da segurança pública e do “direito ao protesto”; enquanto manifestantes inorgânicos e advogados afirmavam a existência de “presos políticos” na repressão aos protestos, o MPL recusava tal distinção, afirmando que “todo preso é um preso político”; enquanto advogados, DEPESP e organizações de direitos humanos atuavam nos marcos da legalidade e da institucionalidade do estado democrático de direito, o MPL denunciava de maneira global o capitalismo, os limites da democracia representativa, a seletividade e o autoritarismo estruturais das instituições estatais repressivas (ALMEIDA, 2020ALMEIDA, F.; MONTEIRO, F. J.; SMIDERLE, A. A criminalização dos protestos do Movimento Passe Livre em São Paulo (2013-2015). Revista Brasileira de Ciências Sociais, v. 35, n. 102, p. e3510211, 2020.).

4. Considerações finais

A caracterização das técnicas de Estado e das gramáticas políticas da repressão aos protestos do MPL em São Paulo, bem como a topologia das relações estabelecidas a partir dos setores A e C do diagrama acima (figura 2) confirmam a hipótese da securitização: as instituições estatais articulam-se em torno de técnicas de Estado tipicamente executivas, justificadas por gramáticas políticas de exceção, mobilizadas por órgãos do poder Executivo refratários a controles jurídicos ou políticos externos; por sua vez, a mobilização das técnicas de Estado de resistência, tipicamente legislativas, por advogados, DEPESP e organizações de direitos humanos, se mostram limitadas em efetividade, ao mesmo tempo em que afirmam a gramática política do estado de direito liberal, baseada na separação de poderes, no devido processo legal e na supremacia dos direitos constitucionais.

Atuando no mesmo contexto, mas diferidas no espaço e no tempo, as mobilizações das técnicas e gramáticas de repressão e resistência formam um todo que demonstra a resiliência formal das instituições democráticas e a emergência de arranjos políticos securitários no interior desse conjunto de relações. Estado de direito e estado de exceção convivem, mas não se confrontam nas configurações da estatalidade verificada na repressão aos protestos do MPL em São Paulo.

Por outro lado, a caracterização das técnicas de Estado de resistência, e especialmente as de repressão, mostram que não há novidades no que se refere ao conteúdo dessas técnicas, analisadas isoladamente. O policiamento ostensivo militarizado e o inquérito policial inquisitorial e burocrático são elementos construídos em processos de longa e média duração, e são mobilizados pelas mesmas instituições de segurança (SSP, PM e PC) há tempos no controle social do crime, surtindo efeitos bastantes conhecidos sobre os grupos sociais subalternos que são a clientela preferencial de um sistema de justiça seletivo e reprodutor de desigualdades. Da mesma forma, as limitações do controle externo da polícia, da separação dos poderes e do devido processo legal para conter abusos do poder são conhecidas há tempos pela literatura da sociologia do direito, da antropologia jurídica e da ciência política das instituições judiciais. Essa evidência demonstra a utilidade da análise topológica para identificar processos de recombinações e correlações dinâmicas que expressam lógicas específicas, quando as comparamos com as lógicas usuais da mobilização rotineira daquelas técnicas de Estado.

A “novidade” das relações diagramadas acima está, portanto, justamente nas combinações específicas mapeadas naquela situação concreta, estabelecidas entre sujeitos políticos, instituições estatais, técnicas de Estado e gramáticas políticas que, por sua vez, tinham existência prévia e relativamente autônoma. E parece estar, também, nas condições de possibilidades dadas por essas novas configurações para momentos futuros, e que se expressam em outros achados de pesquisa: o aperfeiçoamento das técnicas de policiamento de protestos, que viriam a ser empregadas em momentos posteriores a junho de 2013 (protestos contra a Copa do Mundo de 2014 e os novos protestos do MPL em 2015) (ALMEIDA; MONTEIRO; SMIDERLE, 2020ALMEIDA, F.; MONTEIRO, F. J.; SMIDERLE, A. A criminalização dos protestos do Movimento Passe Livre em São Paulo (2013-2015). Revista Brasileira de Ciências Sociais, v. 35, n. 102, p. e3510211, 2020.; FERNANDES; CÂMARA, 2018FERNANDES, E. G.; CÂMARA, G. G. Policiamento a eventos de protesto no Brasil: repertórios e modelos policiais no ciclo de protestos de Junho de 2013 na cidade de Porto Alegre. Política & Sociedade, v. 17, n. 39, p. 368-395, 2018.); a consolidação da distinção entre “manifestantes pacíficos” e “vândalos” que passou a pautar a cobertura da imprensa e o discurso das instituições repressivas após o dia 13 de junho de 2013 (ALMEIDA, 2020), quando a repressão policial brutal levou a uma mudança de posição da opinião pública em relação às manifestações do MPL (SECCO, 2013SECCO, L. As Jornadas de Junho. Em: VAINER, C. et al. (Eds.). Cidades rebeldes: Passe Livre e as manifestações que tomaram as ruas do Brasil. São Paulo: Boitempo; Carta Maior, 2013.), permitindo a adesão de outros grupos e pautas que caracterizaria as “jornadas de junho” em âmbito nacional (BRINGEL; PLEYERS, 2015BRINGEL, B.; PLEYERS, G. Junho de 2013... dois anos depois. Nueva Sociedad - especial em português, p. 4-17, 2015.); e a recorrência de protestos de rua que acompanhariam a crise política do segundo governo Dilma (TATAGIBA; GALVÃO, 2019TATAGIBA, L.; GALVÃO, A. Os protestos no Brasil em tempos de crise (2011-2016). Opinião Pública, v. 25, n. 1, p. 63-96, 2019.; TATAGIBA; TRINDADE; TEIXEIRA, 2015), sendo que os protestos “à direita” raramente enfrentaram uma repressão tão forte quanto a sofrida pelo MPL em 2013.

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    Importante destacar que o uso que Frankenberg (2018FRANKENBERG, G. Técnicas de Estado: perspectivas sobre o Estado de Direito e o Estado de Exceção. São Paulo: Editora Unesp, 2018.) faz dos autores de teoria política não é dedutivo, nem de leitura estrutural, mas sim o de considerá-los, de maneira esquemática, como ilustrativos de uma racionalidade política emergente em suas épocas históricas, mas que não se resume nem tem por origem seus textos teóricos. Nesse sentido, Frankenberg claramente se baseia nas mobilizações que Foucault faz de autores de teoria política em suas investigações e cursos sobre a racionalidades governamentais (ou artes de governo). Nesse sentido ver, por exemplo, como este autor lida com os autores de economia política em sua análise da emergência do liberalismo como arte de governo (FOUCAULT, 2008FOUCAULT, M. Nascimento da Biopolítica. São Paulo: Martins Fontes, 2008.), e da segurança do Estado como princípio de uma racionalidade securitária, ilustrada pelo Leviatã de Hobbes, e que acompanha a emergência do Estado moderno contra discursos sectários e de guerra que resistiam a esse processo (FOUCAULT, 2010).
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    Os dados aqui analisados foram coletados no projeto de pesquisa “Conflito político e sistema de justiça: a judicialização criminal dos protestos urbanos em São Paulo (2013-2015), financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo - FAPESP (Auxílio Regular n. 2015/002554); e nos projetos de Iniciação Científica, sob minha orientação, de Marília Alves, de Marina Moura Souza e de Rodrigo Cruz Lopes (ALVES; ALMEIDA, 2018ALVES, M. S. C.; ALMEIDA, F. N. R.. A criminalização dos protestos políticos na ditadura militar brasileira: especificidades da ação da polícia e Judiciário. Revista dos Trabalhos de Iniciação Científica da UNICAMP, n. 26, 2018.; LOPES; ALMEIDA, 2017LOPES, R. C.; ALMEIDA, F. N. R. Projeto lei no 608/2013: política e burocracia na violência policial. XXIV Congresso de Iniciação Científica da UNICAMP. Anais...Campinas: 2017. Disponível em: <https://www.prp.unicamp.br/inscricao-congresso/resumos/2016P11366A9278O4808.pdf>
    https://www.prp.unicamp.br/inscricao-con...
    ; SOUZA; ALMEIDA, 2021SOUZA, M. M.; ALMEIDA, F. N. R.. ATUAÇÃO DA DEFESA TÉCNICA NO FLUXO DE PROCESSOS DE CRIMINALIZAÇÃO NAS “JORNADAS DE JUNHO”. . Em: XXIX CONGRESSO DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA DA UNICAMP. Campinas, 2021. Disponível em: <https://proceedings.science/pibic-2021/papers/atuacao-da-defesa-tecnica-no-fluxo-de-processos-de-criminalizacao-nas--jornadas-de-junho->
    https://proceedings.science/pibic-2021/p...
    ), todos financiados pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq no âmbito do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica da Universidade Estadual de Campinas. Para outros resultados e análises decorrentes daquele projeto, ver Almeida (2020ALMEIDA, F.; MONTEIRO, F. J.; SMIDERLE, A. A criminalização dos protestos do Movimento Passe Livre em São Paulo (2013-2015). Revista Brasileira de Ciências Sociais, v. 35, n. 102, p. e3510211, 2020.); Almeida, Monteiro e Smiderle (2020); Almeida e Lopes (2019).
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    A pesquisa analisou procedimentos criminais (cinco inquéritos policiais e duas ações penais, fornecidas pelos advogados do MPL); oito notas coletadas no site do Ministério Público (MP) e trinta e três da Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo (SSP); catorze notas coletadas no site do MPL; entrevistas com manifestantes e operadores da justiça criminal (advogados, defensores públicos, juízes, um policial); e outros documentos (como textos jornalísticos e peças processuais selecionadas de procedimentos administrativos e judiciais não constantes na amostra original de procedimentos criminais fornecidos pelos advogados do MPL). Também foi feita observação participante de dois protestos do MPL contra o aumento da tarifa de transporte público na cidade de São Paulo em janeiro de 2015, do início do protesto até sua dispersão pela repressão policial, se estendendo depois até o trabalho de advogados em um Distrito Policial, acompanhando a situação de manifestantes presos.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Dez 2023
  • Data do Fascículo
    Oct-Dec 2023

Histórico

  • Recebido
    15 Dez 2021
  • Aceito
    10 Ago 2022
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