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Prevalência de cinesiofobia e catastrofização em pacientes com disfunção temporomandibular

RESUMO

Objetivo:

identificar a frequência e os níveis de cinesiofobia e catastrofização em pacientes com Disfunção Temporomandibular que realizaram terapia fonoaudiológica.

Métodos:

a amostra compreendeu pacientes com Disfunção Temporomandibular muscular e mista com predominância muscular, grupo de estudo e adultos saudáveis, o grupo controle. Os instrumentos utilizados foram: Diagnostic Criteria for Temporomandibular Disorders, Escala Tampa para Cinesiofobia e Escala de Catastrofização da Dor. A análise estatística foi composta do Teste de Mann-Whitney para comparar as médias entre os grupos de cada escala e o teste de Coeficiente de Correlação de Spearman para analisar a correlação entre as escalas em cada grupo e sua significância.

Resultados:

foi identificado um alto índice de catastrofização da dor no grupo de estudo em comparação ao grupo controle. Quanto à cinesiofobia, houve maior índice positivo para essa variável no grupo de estudo e menor para o grupo controle. Além disso, identificou-se correlação moderada e positiva entre a cinesiofobia e catastrofização no grupo de estudo.

Conclusão:

Pacientes com Disfunção Temporomandibular possuem níveis de cinesiofobia e catastrofização mais altos que pacientes que não foram diagnosticados com o distúrbio.

Descritores:
Síndrome da Disfunção da Articulação Temporomandibular; Catastrofização; Dor Facial

ABSTRACT

Purpose:

to identify the frequency and levels of kinesiophobia and catastrophizing in patients with temporomandibular disorders who had been submitted to speech-language-hearing therapy.

Methods:

the sample comprised patients with myogenous (predominantly) and mixed temporomandibular disorders in the study group and healthy individuals in the control group. The instruments used were the Diagnostic Criteria for Temporomandibular Disorders, Tampa Scale for Kinesiophobia, and Pain Catastrophizing Scale. Statistical analyses were performed with the Mann-Whitney test (to compare the means on each scale between the groups) and the Spearman’s correlation coefficient test (to analyze the correlation between the scales in each group and its significance).

Results:

the study group had a higher pain catastrophizing index than the control group. Likewise, the study group had greater kinesiophobia positive indices, whereas the control group had lower ones. A moderate positive correlation was also identified between kinesiophobia and catastrophizing in the study group.

Conclusion:

patients presented with temporomandibular disorders have higher levels of kinesiophobia and catastrophizing than subjects not diagnosed with the disorder.

Keywords:
Temporomandibular Joint Dysfunction Syndrome; Catastrophization; Facial Pain

Introdução

Entre as dores orofaciais que afetam uma amostra considerável da população está a disfunção temporomandibular (DTM), apresentando alta prevalência, sendo que cerca de 20% a 70% da população apresenta algum sinal ou sintoma11. Alkhudhairy MW, Ramel FA, Jader GA, Saegh LA, Hadad AA, Alalwan T et al. A self-reported association between temporomandibular joint disorders, headaches, and stress. J Int Soc Prevent Communit Dent. 2018;8(4):371-89.,22. Fernandes G, Gonçalves DAG, Conti P. Musculoskeletal disorders. Dent Clin North Am. 2018;62(4):553-64.. Entre eles está a dor na região da articulação temporomandibular (ATM) causada durante a função, seja ela fala ou mastigação, limitação de abertura de boca e ruídos na ATM22. Fernandes G, Gonçalves DAG, Conti P. Musculoskeletal disorders. Dent Clin North Am. 2018;62(4):553-64.

3. Cruz JHA, Sousa LX, Oliveira BF, Andrade Junior FP, Alves MASG, Oliveira Filho AA. Disfunção temporomandibular: revisão sistematizada. Arch Health Invest. 2020;9(6):570-5.
-44. Leew R. Orofacial pain: guidelines for assessment, classification, and management. The American Academy of Orofacial Pain. 5ed. Quintessence Publishing; 2013.. Tais fatores ocorrem em todas as classificações (articular, muscular ou mista)55. Schiffman EL, Truelove EL, Ohrbach R, Anderson GC, John MT, List Thomas et al. The research diagnostic criteria for temporomandibular disorders. I: overview and methodology for assessment of validity. J Orofac Pain. 2010;24(1):7-24.,66. Le Resche L. Epidemiology of temporomandibular disorders: implications for the investigation of etiologic. Crit Rev Oral Biol Med. 1997;8(3):291-305..

A presença da dor musculoesquelética na DTM pode evoluir para um quadro de cronicidade, definido pela Associação Internacional para Estudo da Dor (IASP) como contínua ou recorrente em um período superior a três meses77. Treede RD, Rief W, Barke A, Aziz Q, Bennet MI, Benoliel R et al. Chronic pain as a symptom or a disease: the IASP Classification of Chronic Pain for the International Classification of Diseases (ICD-11). Pain. 2019;160(1):19-27.. A experiência de conviver frequentemente com a dor possui potencial para despertar alterações complexas no paciente como: alterações emocionais, psicossociais, sensoriais e dos mecanismos centrais mantenedores da dor, com o aumento da atividade neuronal e dos circuitos da via nociceptiva88. Fernández-De-Las-Peñas C, Galán-Del-Río F, Fernández-Carnero J, Pesquera J, Arendt-Nielsen L, Svensson P. Bilateral widespread mechanical pain sensitivity in women with myofascial temporomandibular disorder: evidence of impairment in central nociceptive processing. Journal Pain. 2009;10(11):1170-8., podendo ser precipitantes e/ou perpetuantes dessas condições.

Nesse cenário, os fatores cognitivos, comportamentais e psicossociais agem como moduladores da dor mencionada acima, resultando em incapacidade99. Boersma K, Linton SJ. How does persistent pain develop? An analysis of the relationship between psychological variables, pain and function across stages of chronicity. Behav Res Ther. 2005;43(11):1495-507.. Em adição, verifica-se a possibilidade de desenvolvimento da cinesiofobia, representada pelo medo excessivo relacionado ao movimento para não provocar dor1010. Kri S, Todd D. Kinesiophobia: a new view of chronic pain behavior. Pain Manag. 1990;3:35-43.. Dessa forma, esse comportamento é frequentemente observado no paciente com DTM, pois a dor em função é uma de suas principais características. Essa condição limita, por vezes, o uso da biomecânica articular, restringindo assim a excursão mandibular, mesmo sem a presença da dor, podendo gerar prejuízo em sua funcionalidade1111. Gil-Martínez A, Grande-Alonso M, Villanueva ILU, López-López A, Carnero JF, La Touche R. Chronic temporomandibular disorders: disability, pain intensity and fear of movement. J Headache Pain. 2016;17(1):103.,1212. Aguiar AD, Bataglion C, Visscher CM, Grossi DB, Chaves TC. Cross-cultural adaptation, reliability and construct validity of the Tampa scale for kinesiophobia for temporomandibular disorders (TSK/TMD-Br) into Brazilian Portuguese. J Oral Rehabil. 2017;44(7):500-10..

Outro comportamento comumente encontrado no paciente com DTM crônica é a catastrofizacão. Esta, é caracterizada por “um conjunto de pensamentos negativos exagerados durante experiências dolorosas reais ou previstas”1313. Sullivan MJL, Stanish W, Waite H, Sullivan M, Tripp DA. Catastrophizing pain disability in patients with soft-tissue injuries. Pain. 1998;77(3):253-60.. Levando o paciente a obter expectativas pessimistas futuras sobre a DTM, aumentando o seu sofrimento e, possivelmente, limitando sua atividade mandibular. Dessa forma, pesquisadores buscam entender o perfil psicossocial dos pacientes com algum tipo de DTM. Pesquisas recentes relatam que pacientes com dor na ATM possuem catastrofização e cinesiofobia elevados quando comparados às pessoas sem dor1414. Poluha RL, Bonjardim LR, Canales GT, Conti PCR. Somatosensory and psychosocial profile of patients with painful temporomandibular joint clicking. J Oral Rehabil. 2020;44(11):1346-57., assim como sofrimento psicossocial e quadro mais complexo de DTM devido ao elevado grau dos distúrbios supracitados1515. Lira MR, Silva RRL, Bataglion C, Aguiar AS, Greghi SM, Chaves TC. Multiple diagnoses, increased kinesiophobia? Patients with high kinesiophobia levels showed a greater number of temporomandibular disorder diagnoses. Musculoskelet Sci Pract. 2019;44:102054.. Além disso, todo o sofrimento psicológico resultante disso pode dificultar o manejo da dor1616. Marin R, Rolim GS, Granner KM, Moraes ABA. Disfunções temporomandibulares e fatores psicológicos: uma revisão de literatura. Psicol. Estud. 2022;27:e47363..

O cenário relatado é uma realidade que necessita ser estudada pelos profissionais envolvidos no tratamento da DTM, tais como dentista, fonoaudiólogo, psicólogo, entre outros. Ainda, é necessário compreender os processos desencadeantes e perpetuadores para que seja possível o planejamento de enfrentamento das causas e consequências da DTM. Afinal, o medo e a ampliação da dor poderão prejudicar o tratamento de controle da DTM, visto que são necessários movimentos mandibulares e manejo com a musculatura, dentro do limite de conforto, durante os exercícios miofuncionais, além de impactar os aspectos psicossociais do paciente.

Portanto, essa pesquisa buscou identificar a frequência e os níveis de cinesiofobia e catastrofização em pacientes com Disfunção Temporomandibular que realizaram terapia fonoaudiológica anteriormente. Os achados contribuirão para a elaboração de estratégias efetivas para o tratamento na clínica fonoaudiológica, minimizando os danos e atenuando as causas dos distúrbios.

Métodos

O estudo é do tipo observacional, descritivo, quantitativo e de caráter transversal. Possui aprovação do Comitê de Ética do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal da Paraíba, Brasil, pelo número 3.349.187, resguardando todos os direitos dos participantes.

A população experimental do estudo foi composta por indivíduos de ambos os sexos atendidos pelo Serviço de Fonoaudiologia no Ambulatório da Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial de um hospital universitário no período de 2 anos. A amostra possuía diagnóstico de DTM muscular ou mista. Todos haviam realizado terapia fonoaudiológica anteriormente pelo mesmo serviço com os objetivos de auxiliar no controle da dor e promover o restabelecimento e gerenciamento do quadro disfuncional orofacial, recebendo alta do tratamento quando o objetivo era alcançado e a dor controlada.

Os critérios de inclusão contemplaram pacientes de ambos os sexos que apresentavam DTM muscular ou mista, diagnosticada por meio do DC/TMD (Diagnostic Criteria for Temporomandibular Disorders), há pelo menos 6 meses antes da pesquisa. Os critérios de exclusão envolveram pacientes portadores de síndromes craniofaciais ou que possuíam déficits cognitivos; tumor na região orofacial; pacientes submetidos à intervenção cirúrgica na região de ATM; com doenças neuromusculares como Parkinson, Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA), fibromialgia ou doença articular degenerativa.

A amostra do grupo controle (GC) foi selecionada por conveniência, composta por indivíduos saudáveis e sem diagnóstico de DTM, pareados por idade. A pesquisa foi realizada durante a pandemia da Covid-19, sendo que houve a necessidade de ser adotada a modalidade remota para a coleta dos dados. A coleta compreendeu o período de maio a julho de 2021.

A seleção do grupo de estudo (GE) foi feita por meio da triagem da American Academy of Orofacial Pain (AAOP), via contato telefônico, composta por 10 (dez) perguntas objetivas, com respostas “sim” ou “não”, sobre os sinais e sintomas prevalentes na DTM e 1 (uma) pergunta subjetiva sobre a utilização de aparelho ortodôntico. Assim, foram inseridos os pacientes com sinais e sintomas sugestivos de DTM, e, em seguida, realizada a explanação sobre a pesquisa por chamada telefônica. Na sequência, os participantes selecionados tiveram acesso a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) para assinatura. Os que aceitaram participar da pesquisa seguiram com o preenchimento dos protocolos. O GC foi recrutado por meio das redes sociais, especialmente o aplicativo WhatsApp. Aqueles que desejaram participar assinaram o TCLE e deram prosseguimento apenas ao preenchimento dos protocolos.

Quanto aos instrumentos utilizados para verificação das variáveis, utilizou-se a Escala de Tampa para Cinesiofobia para Desordens Temporomandibulares (TSK/TMD-Br) a fim de verificar a intensidade da dor, contendo 12 itens avaliados seguindo a escala Likert de 1 a 4, sendo 1 “discordo fortemente”; 2 “discordo”; 3 “concordo” e 4 “concordo fortemente”. O escore é determinado por meio da somação dos itens, tendo pontuação mínima de 12 e máxima de 481212. Aguiar AD, Bataglion C, Visscher CM, Grossi DB, Chaves TC. Cross-cultural adaptation, reliability and construct validity of the Tampa scale for kinesiophobia for temporomandibular disorders (TSK/TMD-Br) into Brazilian Portuguese. J Oral Rehabil. 2017;44(7):500-10..

Para quantificação da catastrofização da dor, foi aplicada a Escala de Catastrofização da Dor (Pain Catastrophizing Scale) - (B-PCS) com 13 itens avaliando o sentimento relacionado à dor, utilizando uma escala de cinco pontos, 0 para mínimo, 1 para leve, 2 para moderado, 3 para intenso e 4 para muito intenso1717. Sehn F, Chachamovich E, Vidor LP, Dall-Agnol L, Souza ICC, Torres ILS et al. Cross-cultural adaptation and validation of the Brazilian Portuguese version of the pain catastrophizing scale. Pain Medicine. 2012;13(11):1425-35.. A pontuação foi definida por meio dos pontos de corte: valores ≥ 30 elevada/alta dor catastrófica, 20-29 moderada e ≤19 baixa dor catastrófica1818. Reiter S, Eli I, Mahameed M, Emodi-Perlman A, Friedman-Rubin P, Reiter MA et al. Pain catastrophizing and pain persistence in temporomandibular disorder patients. J. Oral Facial Pain Headache. 2018;32(3):309-20..

Todos os protocolos acima foram aplicados por meio do Formulário da Google enviado pelo WhatsApp, Facebook ou Instagram. Os casos em que não foi possível a obtenção das respostas pelo formulário, houve o contato via ligação telefônica com agendamento prévio. Quanto à análise estatística, foi utilizado o software SPPS 17 para tabulação dos dados, extração de média, moda, desvio padrão, observação do nível de correlação entre as variáveis, através do teste de Correlação de Spearman com nível de significância de p<0,05, e comparação das médias entre os grupos de cada escala através do Teste de Mann-Whitney.

Resultados

Participaram do estudo 28 voluntários, 14 para o GE e 14 para o GC com predominância do sexo feminino em ambos os grupos. Os dados sociodemográficos mostraram que o GE apresentou idade média de 32,5±16,1 anos e o GC por idade média de 23,29±5,35 anos. Quanto ao nível de escolaridade, houve predomínio do ensino superior incompleto no GE, seguido pelo ensino médio completo, o ensino superior incompleto também foi prevalente no GC (Tabela 1).

Tabela 1:
Nível de escolaridade do Grupo de Estudo e Grupo Controle

Com relação à permanência dos sintomas no GE, 13 (92,9%) pessoas de 14 totais afirmaram ter dificuldade para realizar funções como mastigar, falar ou usar a mandíbula, 11 (78,6%) pessoas de 14 totais perceberam ruídos na ATM, sentiam a mandíbula rígida, apertada ou cansada com regularidade, afirmaram sentir dores no pescoço e/ou dentes e/ou cefaleia. Além disso, 10 (71,4%) pessoas sentiam dificuldade para abrir a boca.

Na Tabela 2, observa-se a distribuição dos escores da Escala de Catastrofização da Dor por categorização. A maioria dos participantes do GE obteve nível alto de catastrofização, contrário a isso, o GC obteve concentração em baixo nível.

Com relação à pontuação da Escala de Tampa para Cinesiofobia, houve uma média de 32,57±4,50 pontos para o GE e 26,50±7,34 pontos para o GC.

Tabela 2:
Tabulação dos dados da Escala de Catastrofização do Grupo de Estudo e Grupo Controle

A Tabela 3 apresenta a comparação das médias dos escores entre os grupos GE e GC na escala de catastrofização, sem a sua categorização em baixa, intermediária e alta. Verifica-se que houve diferença estatisticamente significante entre o GE e GC, apontando para o aumento em GE.

Tabela 3:
Comparação das médias da Escala de Catastrofização da Dor (B-PCS) entre os grupos por meio do Teste de Mann-Whitney

Na Tabela 4 mostra-se a diferença significativa dos escores de cinesiofobia entre o GE e GC, evidenciando o índice maior para o GE.

Tabela 4:
Comparação das médias da Escala de Tampa para Cinesiofobia (TSK/TMD-Br) entre os grupos por meio do Teste de Mann-Whitney

Para observar a correlação entre a cinesiofobia e catastrofização no GE e GC, foi realizado teste de Correlação de Spearman, apontando uma correlação moderada e positiva apenas para o GE, concluindo que à medida que o nível de cinesiofobia aumenta, há aumento também no nível de catastrofização neste grupo. (Tabela 5).

Tabela 5:
Coeficiente de correlação de Spearman para o grupo de estudo e grupo controle para o cruzamento entre os escores da Escala de Tampa para Cinesiofobia (TSK/TMD-Br) e Escala de Catastrofização da Dor (B-PCS)

Discussão

Os estudos epidemiológicos que envolvem a DTM apontam que o perfil dessa população, atingida pelo distúrbio, apresenta predominância do sexo feminino, faixa etária de adultos jovens, relato de dor muscular66. Le Resche L. Epidemiology of temporomandibular disorders: implications for the investigation of etiologic. Crit Rev Oral Biol Med. 1997;8(3):291-305.,1919. de Melo LA, Bezerra de Medeiros AK, Campos MFTP, Bastos Machado de Resende CM, Barbosa GAS, de Almeida EO. Manual therapy in the treatment of myofascial pain related to temporomandibular disorders: a systematic review. J Oral Facial Pain Headache. 2020;34(2):141-8.,2020. Galdino LMBG, Silva TVS, Silva HFV, Soares VMRS, Carvalho LIM, Castanha DM et al. Perfil epidemiológico dos pacientes atendidos na clínica da dor do Centro Universitário de João Pessoa-Unipê. Res., Soc. Dev. 2021;10(13):e306101321379. e cefaleia2121. Di Paolo C, D'Urso A, Papi P, Sabato FD, Rosella D, Pompa G et al. Temporomandibular disorders and headache: a retrospective analysis of 1198 patients. Pain Res Manag. 2017;2017:3203027. como sintomas, correspondentes ao perfil da população dessa pesquisa1111. Gil-Martínez A, Grande-Alonso M, Villanueva ILU, López-López A, Carnero JF, La Touche R. Chronic temporomandibular disorders: disability, pain intensity and fear of movement. J Headache Pain. 2016;17(1):103.,1515. Lira MR, Silva RRL, Bataglion C, Aguiar AS, Greghi SM, Chaves TC. Multiple diagnoses, increased kinesiophobia? Patients with high kinesiophobia levels showed a greater number of temporomandibular disorder diagnoses. Musculoskelet Sci Pract. 2019;44:102054.,2222. Moreno AGUT, Bezerra AGV, Alves-Silva EG, Melo EL de, Gerbi MEM de M, Bispo MEA et al. Influence of estrogen on pain modulation in temporomandibular disorder and its prevalence in females: an integrative review. Res., Soc. Dev. 2021;10(2):e38510212453.. O nível de escolaridade favoreceu para um entendimento rápido e efetivo das escalas pelos voluntários, o que contribuiu para a pesquisa ser realizada na modalidade remota.

Ao realizar a triagem para identificar a presença do quadro de dor nos voluntários na ocasião da coleta, foi possível observar que 10 (71,4%) dos 14 participantes do GE relataram sentir dor nas ou ao redor das orelhas, região temporal e masseter, conferindo a persistência da dor por mais de 3 meses desde o último atendimento, indicando a dor crônica77. Treede RD, Rief W, Barke A, Aziz Q, Bennet MI, Benoliel R et al. Chronic pain as a symptom or a disease: the IASP Classification of Chronic Pain for the International Classification of Diseases (ICD-11). Pain. 2019;160(1):19-27., desses, sete relataram ter cefaleia constante. Tal cronicidade pode resultar em comportamentos indesejados, catastrofização e cinesiofobia, afetando a funcionalidade mandibular. O aspecto crônico pode ter sido inicialmente observado ainda durante os atendimentos no ambulatório, por meio do índice de intensidade da dor, aplicado para avaliação do progresso terapêutico, sendo constatada sua continuação após o término dos atendimentos, pela triagem. Pois, pontuações mais altas nesse índice e presença de dor miofascial (diagnóstico presente em maioria da amostra do presente trabalho) na fase inicial são preditores para cronificação2323. Kapos FP, Look JO, Zhang L, Hodges JS, Schiffman EL. Predictors of long-term temporomandibular disorder pain intensity: an 8-year cohort study. J. Oral Facial Pain Headache. 2018;32(2):113-22..

Quanto ao alto índice de catastrofização do GE, pode-se observar que há ampliação do pensamento negativo. Sabe-se que a dor associada à DTM pode gerar medo e repulsa ao pensar no estímulo muscular doloroso, o que pode ser associado ao medo do movimento. Por vezes, associados, fatores psicológicos como esses podem aumentar a sensibilização central para dor e a ampliação dos sintomas corporais, podendo gerar persistência do distúrbio pela acumulação de desregulação de vários sistemas2424. Ohrbach R, Slade GD, Bair E, Rathnayaka N, Diatchenko L, Greenspan JD et al. Premorbid and concurrent predictors of TMD onset and persistence. Eur J Pain. 2020;24(1):145-58.. Nesse sentido, destaca-se o contexto em que foi realizada a pesquisa (pandemia da COVID-19) e os desdobramentos negativos, que chegaram à população por meio da mídia. Esses eventos podem ter contribuído para a ampliação dos pensamentos catastróficos relacionados a qualquer questão de saúde existente, incluindo a DTM.

Na casuística não houve nível máximo de cinesiofobia para o GE que é representado pela somatória máxima de 48 pontos. Porém, houve uma média de 32 pontos, mostrando que, direta ou indiretamente, há interferência na rotina do indivíduo, confirmando que há limitação na funcionalidade do complexo mandibular. Para as pontuações abaixo da média, acredita-se que os sinais da cinesiofobia só foram percebidos após os questionamentos levantados pela escala. As questões presentes na TSK/TMD-Br ajudaram a entender a somatização e a restrição do movimento em decorrência da lesão ou dor, sendo essencial sua observação durante a avaliação individual.

A restrição dos movimentos mandibulares para realizar as funções orofaciais, especialmente da mastigação e fala, pode influenciar no resultado da terapia fonoaudiológica e, portanto, prejudicar o prognóstico. Sabe-se que esse tratamento exige movimentação e manipulação das estruturas relacionadas, além do aumento da extensibilidade do tecido muscular mastigatório e lubrificação articular. Nesse sentido, torna-se difícil a realização do manejo necessário para diminuição da tensão, manobras posturais, de mobilidade mandibular e treinos funcionais. Assim, o manejo clínico é mais complexo para pacientes com tal sensibilidade à dor1515. Lira MR, Silva RRL, Bataglion C, Aguiar AS, Greghi SM, Chaves TC. Multiple diagnoses, increased kinesiophobia? Patients with high kinesiophobia levels showed a greater number of temporomandibular disorder diagnoses. Musculoskelet Sci Pract. 2019;44:102054..

Acredita-se que a razão pela qual voluntários do GE obtiveram escores baixos ou intermediários de catastrofização e escores decrescentes de cinesiofobia, ocorreu pelas instruções anteriormente dadas sobre o controle das crises, como: realizar massagens e compressas quentes no local, evitar alimentos muito duros e controle no nível de estresse. Além disso, pode ter ocorrido adaptação à dor, melhorando o aspecto biopsicossocial em associação com a condição da DTM2525. Fillingim RB, Slade GD, Greenspan JD, Dubner R, Maixner W, Bair E et al. Long-term changes in biopsychosocial characteristics related to temporomandibular disorder: findings from the OPPERA study. Pain. 2018;159(11):2403-13..

Quanto à população do GC que teve escores altos nas escalas, acredita-se que foi favorecido pelo conhecimento prévio sobre a disfunção e suas consequências, sendo indicativos da presença do distúrbio, necessitando, assim, da procura por especialistas.

Atualmente a avaliação e diagnóstico da DTM envolvem aspectos biológicos e psicossociais33. Cruz JHA, Sousa LX, Oliveira BF, Andrade Junior FP, Alves MASG, Oliveira Filho AA. Disfunção temporomandibular: revisão sistematizada. Arch Health Invest. 2020;9(6):570-5.,1616. Marin R, Rolim GS, Granner KM, Moraes ABA. Disfunções temporomandibulares e fatores psicológicos: uma revisão de literatura. Psicol. Estud. 2022;27:e47363., dando um maior campo de visão ao profissional quanto às análises de alterações somáticas. Portanto, é possível utilizar também as medidas psicossociais como preditores do desenvolvimento de DTM persistente, além das medidas clínicas observadas2626. Meloto CB, Slade GD, Lichtenwalter RN, Bair E, Rathnayaka N, Diatchenko L et al. Clinical predictors of persistent temporomandibular disorder in people with first-onset temporomandibular disorder: a prospective case-control study. J Am Dent Assoc. 2019;150(7):572-581.e10. e realizar melhor manejo da dor, evitando sua amplificação e sofrimento psicológico1616. Marin R, Rolim GS, Granner KM, Moraes ABA. Disfunções temporomandibulares e fatores psicológicos: uma revisão de literatura. Psicol. Estud. 2022;27:e47363..

As limitações do estudo se deram pela amostra pequena, acreditando-se ter sido consequência da modalidade remota, pois não foi possível estabelecer comunicação com todos os pacientes atendidos no serviço. O período pandêmico pode ter influenciado nas respostas, principalmente à catastrofização da dor.

Obter informações acerca da funcionalidade mandibular do paciente e o receio de fazê-la é de extrema importância para a condução do tratamento fonoaudiológico, assim como para as demais especialidades que estão envolvidas no tratamento da DTM. Afinal, durante a terapia é realizado o manejo das estruturas na clínica, com o profissional, e em casa para continuação do trabalho clínico, sendo necessário boa adaptação e adesão ao tratamento, o que podem ser comprometidos devido aos níveis altos de catastrofização e cinesiofobia.

Conclusão

Foi visto que pacientes com DTM possuem níveis de cinesiofobia e catastrofização mais altos que pessoas sem diagnóstico. Assim, ampliam o medo do movimento à dor e anteveem ocorrências futuras de forma negativa, mesmo tendo realizado terapia fonoaudiológica anteriormente.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Dez 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    08 Jun 2022
  • Aceito
    28 Out 2022
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