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A face desconhecida dos institutos de seleção ("agência de emprego")

FÓRUM DE OPINIÕES

A face desconhecida dos institutos de seleção ("agência de emprego")

"Limo. Sr.

Redator-Chefe da Revista de Administração de Emprêsas

"A avaliação crítica das Agências de Emprêgo' pelo Prof. LODI (Revísta de Administração de Emprêsas, N.º 21, dezembro de 1966, Fundação Getúlio Vargas) corresponde quase que totalmente à realidade, especialmente no que se refere à técnica de funcionamento dessas organizações. Quem o confirma tem pleno conhecimento de causa, justificado por uma longa e sólida experiência nesse setor, pois há mais de dez anos dirige uma dessas emprêsas.

"O autor do artigo demonstrou relativa objetividade numa área que conhece. Gostaríamos que tivesse adotado o têrmo, por êle mesmo uma vez defendido, de "INSTITUTOS DE SELEÇÃO" em lugar de "Agências de Emprêgo", tanto mais que, reconhecidamente, além das entrevistas, na nossa organização (para citar um exemplo) aplicam-se Testes Profissionais, elaboram-se Laudos Psicológicos, realiza-se Orientação, avaliam-se resultados, mantém-se tratamento estatístico, para não falar também em Pesquisas Salariais, Avaliação de Cargos, Elaboração de Planos de Mérito, Consultoria e Assistência Psicológica Industrial, etc. Em suma, o serviço é feito em bases científicas e não de "simples agenciamento", ou seja, mera intermediação entre firma empregadora de um lado e candidato a determinado cargo, de outro lado.

"Depois desta premissa introdutória, passamos a analisar alguns dos itens tratados pelo Prof. LODI.

"Entrevistador/Selecionador - Não achamos correto o emprêgo da palavra "agenciador" para definir o Entrevistador/Selecionador, cuja figura e cujas características psicológicas - pela natureza mesma da função - bem diferem da figura do Recrutador/ Entrevistador das de mais emprêsas. Na realidade, êle deve dispor de "ôlho clínico", deve estar em contato com as emprêsas, não tanto para "vender" o candidato, e sim para saber se tem possibilidade de aproveitamento determinado candidato, possuidor de determinados antecedentes profissionais. A tarefa mais importante que se exige de um Selecionador é saber escolher a colocação mas conveniente, porque, em geral, dispõe de mais alternativas para cada candidato - e o segrêdo do sucesso consiste em saber êle conjugar com habilidade as aptidões do candidato com as exigências de um determinado cargo em aberto. Para tanto, o Selecionador deve não só dispor de uma detalhada "Descrição de Funções", mas estar também a par da política da firma, dos benefícios oferecidos, das exigências do chefe ao qual o candidato estará subordinado, etc. Se o Selecionador fornece conselhos ou dá sugestões, trata-se de preparação ética, não dirigida para conquistar uma organização, mas sim para superar um possível obstáculo inicial.

"Em outra parte o autor usa também o têrmo de "venalidade". No entanto, não poderia aparecer sob êste título o fato dos candidatos não serem acompanhados pelo Selecionador na explicação das suas atividades na Organização, na qual foram admitidos pelo Instituto de Seleção. Essa não é em absoluto tarefa do Selecionador, do qual tão somente se exige a obrigação de bem selecionar o candidato a um determinado cargo.

Falta de Formação Profissional - Sob êste título, o Prof. LODI (mesmo mencionando "honrosas exceções") frisa que os Selecionadores têm, em geral, formação ginasial, sem conhecimento dos problemas de pessoal das emprêsas. Discordamos e prazeirosamente convidamos o autor do artigo a visitar a nossa organização, na qual exercem a função de Selecionadores elementos com nível de instrução- superior ou com 2.º ciclo completo, com prática plurienal e submetidos prèviamente a rigorosos testes psicológicos para averiguar as aptidões específicas que são exigidas para tão importante e delicada função. Portanto, tem pouco fundamento a observação de que: "os resultados entre êsse tipo de trabalho e a colocação feita inteiramente ao acaso podem não ser muito diferentes". Além do mais, convém frisar que os maiores Institutos de Seleção contam com a assistência e a assessoria, sempre presente do Diretor, ao qual são encaminhados os casos considerados "difíceis".

Improvisação Técnica - A respeito dos testes que, muitas vêzes, seriam mal elaborados, mal aplicados e mal interpretados, podemos frisar que é cuidado dos bons diretores de bons Institutos de Seleção manter uma boa Bateria de Testes bem elaborados, bem aplicados e bem interpretados. Uma dessas Baterias de Testes, quando exibida a Administradores de Pessoal competentes, mereceu grandes elogios. Aliás é praxe dêstes Institutos de Seleção manter sempre em dia os testes ligados com modificações de tipo fiscal, trabalhista, etc., assim como fazer periódico tratamento estatístico, a fim de assegurar validade de avaliação.

Concorrência entre Clientes - Discordamos de que o empregador possa ser prejudicado pelo fato de um Instituto de Seleção trabalhar para emprêsas que sejam concorrentes no mesmo mercado de mão-de-obra. A nossa longa experiência intervém mais uma vez, para dizer que é muito difícil ou quase impossível que emprêsas do mesmo ramo precisem no mesmo momento dos mesmos funcionários. Tivemos oportunidade de trabalhar, por exemplo, no setor automotivo, com quatro grandes firmas ao mesmo tempo. Averiguamos que a emprêsa A estava pedindo um "Engenheiro de Processos"; a emprêsa B um "Cronoanalista"; a emprêsa C um "Técnico em Tratamento Térmico" e a emprêsa D um "Inspetor de Segurança", Poderiam surgir problemas com solicitações de "Secretárias" ou "Ferramenteiros". Mas a solução dêstes casos é óbvia.

Inflação de Salários - A acusação de que os Institutos de Seleção provocariam inflação de salários não tem fundamento, porque os Institutos de Seleção não têm nenhum interêsse em anunciar salários artificiais. Não teriam nenhuma vantagem com isso; atrairiam elementos que não poderiam colocar e o único a lucrar seria o jornal que publicou o anúncio.

Conduta Ética - A afirmação (que, felizmente, passa sob a denominação de "outra lenda que corre") dos Institutos de Seleção manterem um "plantel" de candidatos que passam de empregador para empregador, é injusta. Em primeiro lugar ofende abertamente a moral dos Institutos de Seleção; em segundo lugar, seria fácilmente descoberta; em terceiro lugar, deveria contar com a cumplicidade perigosa dos candidatos. É muito mais fácil e mais prático servir-se de novos elementos (há muitos à procura de uma boa colocação) e deixar os já colocados bem sossegados com votos de longa permanência no mesmo emprêgo. Além do mais, o bom nome dos Institutos de Seleção vale bem mais de uma simples taxa.

Taxas Cobradas Aos Candidatos - A respeito dêste assunto, diremos tão-sòmente que procuram os Institutos de Seleção os candidatos que acreditam ter uma vantagem, que acham conveniente pagar uma taxa para um serviço que lhes ccnvém, porque podem escolher firmas, localidades de trabalho, condições, etc. São muitos (falamos dos Executivos e dos Técnicos de categoria) que se sentiram humilhados em "oferecer-se" diretamente. Preferem confiar, para devido estudo, aos Institutos de Seleção seu "Curriculum" e ponderar, junto aos Selecionadores os prós e os contras de uma ou outra colocação. Temos, ainda, o caso de inúmeros candidatos que, embora trabalhando, pretendem procurar colocação melhor. Há também o caso de candidatos que escrevem do Interior ou até do Exterior e que acham conveniente pagar uma taxa para um serviço que consideram útil e, por isso mesmo, digno de ser retribuído.

É verdade que candidato e firma são clientes do Instituto de Seleção ao mesmo tempo, mas a função do Instituto de Seleção permanece em perfeito equilíbrio entre as duas partes operando simultáneamente em benefício das duas. A demonstração disso é serem as taxas cobradas um mês após a admissão do candidato - prazo suficiente para que as duas partes possam controlar imparcialmente o serviço recebido. O que se pode exigir mais de uma organização? A mesma adianta tôdas as despesas (aluguel, publicidade, pessoal, impostos, etc.) e nada pede a não ser a taxa após um período de prova mutuamente satisfatória. E a nossa longa experiência intervém mais uma vez para afirmar que um mês é um período suficiente para a firma poder avaliar um funcionário nas qualificações e no potencial.

Testes Psicológicos - A nosso ver, pouca importância foi dada pelo Prof. LODI aos Exames Psicológicos. No Fluxograma da Seleção, esta é, atualmente, uma fase da máxima importância. Uma vez admitido o candidato a um determinado cargo, muitas firmas solicitam o Psicoteste, pois estão interessadas em conhecer o Psicograma do futuro funcionário. De conformidade com a Descrição da Função e dos Requisitos Funcionais (constantes da respectiva Ficha Profissiográfica), o pesquisado é submetido a uma série de exames para averiguar as aptidões específicas e a personalidade. Temos inúmeros casos de ótimos profissionais que não servem para determinada função. É tarefa do Psicólogo dar o Laudo de "Apto" ou "Contra indicado" para o cargo. E o verdadeiro Psicólogo, digno deste nome, não sofre vinculações econômicas, mesmo pertencendo ao Instituto de Seleção que escolheu o candidato. Aliás, a tarefa do Psicólogo vai mais longe: orienta o elemento humano endereçando-o para o caminho certo.

AERESP - Depois das observações acima, devemos reconhecer que existem alguns Institutos de Seleção improvisados. Para fiscalizá-los, foi criada, há dois anos, a AERESP (Associação das Emprêsas de Recrutamento e Seleção de Pessoal), cuja tarefa é zelar pela defesa e pelo piestígio da classe.

Com as nossas palavras não temos a intenção de fazer propaganda dos Institutos de Seleção. Nossa intenção foi somente a de responder a alguns itens que nos pareceram errados. Usamos o mesmo estile simples e sincero do Prof. LODI, achando de nosso dever não nos furtarmos em dar a nossa opinião, no que diz respeito às vantagens das empresas servirem-se dos serviços profissionais dos Institutos de Seleção categorizados. Demonstramos por alto a outra face dos Institutos de Seleção, desconhecida ao Prof. LODI, pelo simples fato dêle ter-se afastado dêsse setor há mais de cinco anos, durante os quais houve real progresso nesta área específica.

MARIA CONCETTA SCHIRONI

São Paulo, SP

Resposta:

Lima. Sra.

Maria Concetta Schironi

Prezada Senhora,

É uma satisfação perceber em sua carta o interêsse com que examinou meu artigo. A intenção ao escrevê-lo foi de dar um cunho polêmico que permitisse um debate franco num nível elevado, nesta que é a melhor revista de administração do país.

O artigo saiu numa época de grave recessão econômica pela qual as agências foram duramente afetadas. Durante essa crise algumas pessoas perderam a cabeça e culparam o artigo pela conjuntura econômica da nação...

Em meio à pressão pessoal que senti durante os meses que se seguiram à publicação do artigo, a sua resposta deu a satisfação de ver que algumas pessoas entenderam que o repto deveria ser feito em têrmos elevados. Sua carta levanta alguns pontos cujo exame tomo a liberdade de compartilhar com o leitor da RAE.

Em primeiro lugar a questão do nome "Agência de Emprêgo". Agência é um nome genérico que já obteve sanção acadêmica e popular. É um eufemismo comercial substituí-lo por consultoria ou per instituto, quando isto não se justifica. A senhora dirá que agência é um nome prosaico e que se deveria buscar uma denominação mais elegante. De acordo. Porém, Instituto não é mais a nobre palavra de outros tempos, sendo usada hoje para coisas como instituto de beleza e instituto de halterofilismo. Qualquer que seja o sutil véu de fantasia que se lhe queira dar, agência é agência. É claro que êste nome não abrange uma emprêsa cujo objetivo principal é prestar consultoria psicológica ou consultoria de organização, mas aplica-se a uma emprêsa onde o objetivo principal é agenciar candidatos.

Pessoalmente, acredito que as transformações por que passa a emprêsa brasileira levarão algumas das atuais agências a se transformarem, num futuro próximo, em consultorias de organização, em que o recrutamento de pessoal seja uma atividade subsidiária.

Na agência, o entrevistador ou o selecionador tanto podem ser agenciadores como podem fazer apenas seleção. Na agência existem as funções de recrutar, entrevistar, selecionar e agenciar candidatos. Essas funções tanto podem ser acumuladas pelo ocupante de um só cargo, como podem ser desempenhadas por especialistas diversos. Acumulando ou não, a função de agenciador (negociador, encaminhador) não desaparece da agência. O que se deseja é que os agenciadores sejam mais selecicnadores. Como vê estamos prestidigitando com palavras e com significados. As palavras, como sempre desgastadas e envelhecidas. Louvo sua intenção de dar mais elegância aos nomes.

Depois, vem a questão da formação profissional. A existência dêste ou daquele profissional de formação superior não invalida a observação de fato: grande parte dos que operam nas agências têm formação educacional mais modesta. Conheço excelentes profissionais de sólida formação universitária e de educação fina, como a leitora que me honra com sua carta, que dão às emprêsas de recrutamento uma dimensão maior. Seria também injusto não reconhecer que alguns profissionais suprem a formação universitária per uma autc-educação, dedicação e objetividade, que não se encontram em muitos universitários. Aqui, novamente, minha intenção foi acautelar o leitor da RAE, que ê um homem de emprêsa, sôbre os riscos de basear-se no conselho de gente despreparada.

Chegamos à questão da improvisação técnica. O entrevistador de agência atende diàriamente várias dezenas de pessoas, sempre além de quarenta, nos bons dias de trabalho, num horário de oito heras. Basta dividir o número de candidatos por oito para se perceber quão poucos minutos dedica a cada um. Que pode conseguir numa entrevista de dez minutes um entrevistador pcuco treinado? A entrevista aflora à superfície mais fatual do candidato, esquecendo seus conhecimentos profissionais, seus hábitos pessoais de trabalho, enfim a complexidade de sua experiênca.

Os testes de conhecimentos profissionais em algumas das agências não foram elaborados por especialistas em testes. São questionários inócuos em que acertar metade das questões equivale a ter nota cinqüenta. O ingênuo elaborador desses testes esqueceu de constatar a pertinência das questões, seu índice de dificuldade progressiva, a validade predi t iva e o valor estatístico dos "scores" obtidos. Algumas agências usam testes psicológicos, com o Raven e os Dominós, que pela excessiva divulgação pcuco ou nenhum valer apresentam. Em praticamente qualquer livraria de São Paulo, qualquer pessoa pode comprar um dêsses testes e preparar-se em casa. Teste para ter valor deve ser como filme virgem, quanto menor exposição, melhor a fotografia. A vantagem está em testar o candidato numa situação inusitada.

Agora sôbre a questão da inflação dos salários. Quando o empregador requisita um funcionário à agência, êle indica uma faixa salarial, de x a y. O candidato ideal deverá entrar pelo mínimo da faixa para poder progredir durante seu treinamento até o têrmo médio. Só excepcionalmente o candidato entrará na média da faixa salarial. Por uma questão de simplificação, as más agências são levadas a indicar no anúncio do jornal apenas o salário máximo da faixa. Mas como podem então colocar candidatos? Simplesmente convencendo-os a reduzir suas pretensões. O candidato aceita ganhar menos, mas sabe que o salário anunciado foi maior, e isto o deixa contrariado. Minha afirmação de que algumas agências inflacionam salários é genérica porque não posso citar casos.

O que escrevi sôbre taxas de agências cobradas de candidatos parece ter tido dom profético, pois algumas semanas após a publicação do artigo as agências filiadas à AERESP comunicaram ao público a suspensão das taxas para candidatos. Essa iniciativa só pode ser elogiada pelo respeito à economia popular.

Concordo com a leitora que dei pouco tratamento à questão dos testes psicológicos, mas não pretendi reduzir a importância dos mesmos. O fato é que na maior parte das agências não há exames psicológicos ficando isso a critério do empregador. Afirmei que em tais casos esses exames deveriam ser feitos na própria emprêsa ou por um Psicólogo-Consultor.

Não estou "afastado das agências há mais de cinco anos" como V.ª S.ª afirma, mas pelo contrário tenho usado uma ou outra agência nesses últimos cinco anos como consultor de empresários. Além disso, meu amplo contato com as classes de gerentes de pessoal, selecionadores, recrutadores e psicólogos levou-me a confirmar minha impressão. O artigo é uma v*isão do problema do ponto de vista do empresário.

Finalmente, cabe esclarecer que meu artigo não visava a atacar as agências como instituição social. A emprêsa privada sempre precisará contar com elas, assim como precisará de consultores externos. É minha convicção pessoal que as agências exercem um papel importante na distribuição dos recursos humanos da comunidade e, portanto, são socialmente benéficas. Não acredito que êsse ramo de atividade possa ser suprimido ou estatizado sem prejuízo para o mundo empresarial, especialmente médio e pequeno. Até hoje, as tentativas de criar agências governamentais resultaram teóricas e burocratizantes. Não me parece que o govêrno deva monopolizar essa atividade num regime de economia privada.

Para terminar, é a esperança do autor do artigo, que as agências melhorem seus serviços porque são instituições úteis tanto para o empregador como para quem procura emprêgo.

JOÃO BOSCO LODI

São Paulo, SP

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    06 Jul 2015
  • Data do Fascículo
    Jun 1967
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