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Código de Defesa do Consumidor: é suficiente o que as empresas estão fazendo

NOTAS E COMENTÁRIOS

Código de Defesa do Consumidor: é suficiente o que as empresas estão fazendo

Francesco M. G. A. F. de Cicco

Diretor Executivo do QSP - Centro Brasileiro da Qualidade, Segurança e Produtividade. Diretor Geral do ITSEMAP do Brasil - Instituto Tecnológico MAPERE de Segurança e Engenharia Ambiental

RESUMO

Este texto fornece uma visão geral do que as empresas, cujos produtos possam causar danos à saúde e à segurança do consumidor, ainda têm pela frente para gerenciar seus riscos de responsabilidade de maneira adequada.

Mostram-se as linhas de um programa corporativo de Segurança de Produtos, com as atribuições dos vários níveis gerenciais e as principais tarefas e funções de segurança dos diversos setores da organização.

Palavras-chave: Consumidor, produto, programa saúde, segurança.

ABSTRACT

This text provides a global view of what manufacturers, whose products could cause health or safety damage to consumers, must do to properly manage their responsability's risks.

The general lines of a Product Safety Program are also presented, including the attributions of the various managerial levels and the main safety tasks and functions of organization's different areas.

Key words: Consumer, product, program health, safety.

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Diversas reportagens sobre o novo Código de Defesa do Consumidor têm mostrado como as empresas estão se preparando para melhor atender seus clientes, e o que elas estão fazendo internamente para reduzir o risco de serem acionadas na Justiça por danos causados por seus produtos ao consumidor. Isso sem falar dos inúmeros seminários que estão sendo realizados nos quatro cantos do país.

Todas essas iniciativas são, indubitavelmente, muito importantes, principalmente nesse período que antecedeu a entrada em vigor da nova legislação. Mas, se o código "pegar" - e esperamos que isso efetivamente ocorra - forçosamente será necessária a adoção de medidas mais consistentes e duradouras, a fim de que os fabricantes possam gerenciar seus riscos de responsabilidade de maneira adequada. O que precisaria então ser feito?

Responder a essa questão não é tarefa fácil para ser detalhada em poucas linhas. Entretanto, vamos procurar dar uma visão panorâmica do que as empresas ainda têm pela frente, principalmente aquelas cujos produtos possam pôr em risco a saúde e a segurança do consumidor.

Nos países em que a legislação de proteção e defesa do consumidor já está consolidada, a Justiça e os órgãos governamentais envolvidos com o tema esperam que os fabricantes tomem os devidos cuidados no projeto e na manufatura de seus produtos. A maioria desses órgãos está adotando políticas efetivas de prevenção de acidentes, exigindo que as empresas se antecipem e resolvam os problemas de segurança, antes que seus produtos sejam lançados no mercado.

Para atender tais exigências e reduzir seus problemas legais, os fabricantes devem produzir os mais seguros produtos possíveis, dentro de suas limitações de custos. Para fazer isso, são necessários programas sistemáticos e coordenados, que envolvam praticamente toda a organização, em todos os aspectos de desenvolvimento, produção, distribuição e suporte operacional de seus produtos.

Para que o programa de segurança atinja seus objetivos a um custo mínimo, ele deve ser iniciado o mais imediatamente possível, logo após ser gerada a idéia de fabricar ou modificar um determinado produto.

Todas as tarefas de um programa eficiente podem ser separadas pelas várias fases do ciclo de vida que qualquer produto deve seguir. É importante frisar que em todas essas fases há dois fatores que devem ser sempre evidenciados: a responsabilidade da direção e o controle administrativo.

O principal executivo envolvido com o produto deve ser o responsável para que ele seja seguro. O dirigente pode delegar as tarefas a serem executadas, mas não pode delegar a responsabilidade de assegurar que as mesmas tenham sido realizadas.

As atribuições dos vários níveis gerenciais devem incluir:

• a preparação de diretrizes que indiquem a política da companhia ou do departamento em relação à segurança do produto;

• a definição de responsabilidades pela implementação e coordenação dos programas de segurança;

• a criação de mecanismos que garantam o treinamento contínuo do pessoal em suas funções nos programas de segurança, bem como as informações necessárias sobre metas, princípios e métodos;

• a realização periódica de auditorias que atestem que todos os setores envolvidos estão cumprindo suas tarefas dentro dos limites de tempo estabelecidos;

• a garantia de que foi elaborado um orçamento adequado e de que existem os fundos necessários para as atividades previstas.

Por sua vez, o staff de segurança do produto - que pode ter apenas uma ou um grande número de pessoas, dependendo do tamanho da empresa - deve ter uma série de atribuições, dentre as quais podemos destacar: preparar o programa de segurança e os meios para monitorá-lo; definir os critérios de segurança a serem observados pela companhia, subcontratados e fornecedores; revisar séries históricas de riscos, falhas e incidentes que ocorreram com produtos similares; assessorar os projetistas em selecionar alternativas para eliminar ou reduzir riscos de acidentes; avaliar o produto utilizando metodologias estruturadas de Análise de Riscos; determinar se o produto requer dispositivos de proteção e advertência, equipamentos de emergência etc; revisar procedimentos operacionais e instruções de manutenção do produto; revisar rótulos de advertência verificando se eles são adequados, se atendem às normas e exigências legais e se correspondem aos avisos contidos nos manuais de instrução.

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Finalmente, é importante enumerar as principais tarefas e funções de segurança que competem aos diversos setores da organização, os quais obviamente podem variar em função da estrutura organizacional de cada empresa.

Engenharia de projetos: depois dos dirigentes, provavelmente os projetistas são os maiores responsáveis para que um produto seja seguro. A maioria dos engenheiros nunca recebeu um treinamento formal sobre prevenção de acidentes. Seus esforços nessa área, via de regra, são baseados somente em suas próprias opiniões sobre se existe ou não um determinado risco, em condições óbvias e aparentes ou em informações passadas a eles por supervisores, colegas de trabalho ou através de publicações técnicas. Para minimizar os problemas que essa situação pode acarretar, resultando em produtos inseguros, é necessário que os engenheiros de projeto recebam um treinamento adequado sobre Segurança de Produtos e observem os critérios estabelecidos pelo staff de segurança (isto é válido também para todos os outros setores relacionados a seguir).

Engenharia de produção: os engenheiros de produção devem assegurar que os defeitos ou mudanças de manufatura não degradem a segurança do produto como, por exemplo, a existência de pontos ou bordas ponteagudas ou superfícies ásperas desnecessárias que podem ferir pessoas, ou podem cortar ou danificar o isolamento de fios, provocando choques elétricos nos usuários.

Controle de qualidade: o pessoal da garantia da qualidade deve assegurar que não somente os funcionários da companhia eliminaram ou reduziram os defeitos de manufatura que afetam a segurança do produto, mas também que os subcontratados e fornecedores cumpriram os requisitos e práticas exigidos.

Compras: materiais, componentes etc. devem ser adquiridos de acordo com as especificações estabelecidas. Deve existir um estreito relacionamento com o staff de segurança do produto, a fim de serem controlados os itens que são críticos em termos de segurança, e aqueles em que devem ser enfatizados sua confiabilidade e controle de qualidade.

Marketing e publicidade: as peças publicitárias devem ser revisadas pelo departamento jurídico e pelo staff de segurança para assegurar que não há informações incorretas ou falsas, ou pontos que inadvertidamente possam estipular uma garantia que não pode ser atendida.

Vendas: este departamento pode indicar se alguma das características de segurança do produto atrai o consumidor, ou se a ausência de alguma delas provoca uma retração nas vendas. O staff de segurança deve indicar ao pessoal de vendas qualquer item de segurança que foi acrescido e que pode tornar o produto mais atrativo para o público.

Centro de atendimento: consumidores, diretamente ou através de vendedores e distribuidores, podem ter queixas quanto à segurança do produto. Tais reclamações podem ou não ser válidas, mas devem ser revisadas pelo pessoal competente, bem como devem ser tomadas as providências necessárias, caso as queixas sejam justificadas. Vendedores e distribuidores devem ser instruídos para reconhecer um eventual problema de segurança, as ações a serem adotadas para corrigilo, e como o fabricante deve ser notificado para que possa investigar e solucionar tal problema.

Falhas na adoção de medidas corretivas, após uma reclamação do consumidor, provocam sérios embaraços à empresa na Justiça, se esse ou outro consumidor vier a sofrer uma lesão decorrente da mesma causa, e se ficar constatado que nenhuma providência foi tomada.

Estes e muitos outros aspectos de um Programa de Segurança de Produtos merecem ser discutidos com maior profundidade. Com o novo Código brasileiro, as empresas realmente preocupadas com o assunto deverão estruturar-se de forma mais adequada, para enfrentar incertezas e atender às crescentes exigências dos novos tempos, que por aqui talvez não estejam tão distantes assim.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    18 Jun 2013
  • Data do Fascículo
    Jun 1991
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