Acessibilidade / Reportar erro

Ação patronal, poder e organização no setor siderúrgico de Minas Gerais

ARTIGO

Ação patronal, poder e organização no setor siderúrgico de Minas Gerais* * Esse trabalho faz parte de uma pesquisa mais ampla sobre a Organização da produção no setor siderúrgico de Minas Gerais, onde se procurou analisar as formas de sujeição do trabalho ao capital, e a conseqüente resposta operária e sindical. O autor agradece o apoio financeiro e institucional da Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP), bem como os comentários de Marco Aurélio Rodrigues, Reynaldo Maia Muniz, Antônio Greco e Carlos Sidney Coutinho.

Fernando Coutinho Garcia

Professor adjunto e pesquisador do Curso de Mestrado em Administração na Universidade Federal de Minas Gerais

"Não se julgue que prodigalizamos mimos aos

nossos operários. Limitamo-nos a um equitativo

toma-lá-dá-cá. No tempo em que aumentamos os

salários, também aumentamos de vigilância e

averiguamos da vida particular de cada um, para

saber o destino que davam aos seus salários..."

(Henry Ford).

"O administrador do futuro deve ser capaz de

compreender os fatos humano-sociais como na

realidade são, livre de suas próprias emoções..."

(Élton Mayo).

1. INTRODUÇÃO

O objetivo deste artigo é fazer uma análise profunda e exaustiva das principais estratégias patronais de controle político da força de trabalho, tendo como base empírica um rol de entrevistas em profundidade, feitas com os principais executivos das áreas de produção, relações industriais e administrativa de duas importantes empresas siderúrgicas atuando em Minas Gerais, já há algum tempo, bem como consultas aos chamados manuais de organização e manuais de pessoal.

As variáveis a serem analisadas, em número de seis, compreendem: a) sistema disciplinar; b) política de recursos humanos; c) formas de controle; d) política salarial; e) plano de carreira; f) ideologia da empresa-mecanismos implícitos de integração (Pagès, 1979, e Gaudemar, 1982).

No próximo item iremos analisar esse conjunto de dados das empresas A e B, para, finalmente, nas conclusões, tecermos a nossa consideração e análise em face da literatura mais recente sobre o tema.

2. A AÇÃO PATRONAL NAS EMPRESAS A E B

2.1 O sistema disciplinar

Antes de mais nada, é necessário entendermos dois conceitos importantíssimos: pena e disciplina.

No que diz respeito às disciplinas, elas têm uma dupla função política e econômica; do ponto de vista econômico, a disciplina tem por finalidade aumentar as forças do corpo (economia de utilidade), enquanto que na vertente política a intenção é diminuir essas mesmas forças, através da obediência, ou seja, enquanto por um lado ela aumenta a produtividade dos corpos, por outro ela dociliza esses mesmos corpos (nesse momento é que entendemos a força da dimensão ideológica do poder disciplinar).

Mas as disciplinas necessitam de um sistema operacional capaz de dar concretude e eficiência no interior das grandes empresas, e isso se faz através de quatro componentes - a vigilância hierárquica, o controle da atividade pelo horário, a sanção normalizadora e o exame.

O controle da atividade pelo horário significa que aquele que. controla deve usar sinais, códigos, perceber logo a ordem e decifrá-la em termos práticos... Não há tempo para explicações; tudo se passa de uma forma cronometrada; já a vigilância hierárquica (a hierarquia para os clássicos da administração - penso em Fayol) tem por função vigiar, fiscalizar e, portanto, facilitar o controle; o sistema de normas, a sanção normalizadora, diferentemente da hierarquia que vigia, tem como função punir, reprimir através de uma "micropenalidade", atuando em todas as dimensões do cotidiano organizacional; é preciso que o sistema de normas esteja atento a todas as possibilidades de rebeldia organizacional, utilizando os mecanismos mais sutis, por exemplo privações ligeiras ou pequenas humilhações, como advertência, escrita ou oral, fiscalização sobre a qualidade do trabalho etc.

Enfim, normalizar os indivíduos, no poder disciplinar, constitui, a bem da verdade, uma arte de punir; já o exame, por sua vez, combina as duas operações anteriores com a finalidade de classificar, qualificar e punir, ou seja, ele estabelece sobre os indivíduos uma visibilidade através da qual eles são diferenciados e sancionados. É por isso que, em todos os dispositivos de disciplina, o exame é altamente ritualizado; isso torna evidente, seja no nível escolar, seja no nível da seleção de pessoal para a indústria, porque o exame assume a forma do poder simbólico, pois o poder elege o exame para ser legitimado através da universalização, através de uma técnica "neutra" que diferencia os disciplinados e "competentes" daqueles que são rebeldes e "incompetentes".

À pena (o código penal) está reservada a noção de caracterização do castigo, uma antítese do prêmio que o "crime" proporciona; isso quer dizer que o criminoso tem que imaginar o que significa uma pena ao roubar uma mercadoria; o operário tem que compreender qual o risco que ele corre ao faltar ao trabalho, ao incitar os companheiros à greve ou ao cometer quaisquer indisciplinas.

Toda a operacionalização do sistema de disciplinas e das penas se dá através de um objetivo claro e definido, cunhado por Foucault de "recursos para o bom adestramento"; recursos para a conformidade à organização, recursos para a desintegração do ego dos funcionários e sua transformação no ideal de ego da organização; hoje já é comum a contabilidade de quantas horas vivemos no interior das organizações versus o tempo que passamos em casa ou em atividades de lazer, com clara vantagem para o tempo organizacional; já se deixa escovas de dente, camisas para serem trocadas à noite (em indústrias, após um banho), almoça-se dentro delas etc.

A reprodução, ipsis literis, desses regimentos internos se justificam pelo fato de que "um dos instrumentos privilegiados de observação histórica é ainda fornecido pela análise dos regulamentos internos das empresas, veículo formal e preferencial do modo de disciplina. As ideologias e práticas patronais aparecem freqüentemente claras" (Gaudemar, 1982, p. 27).

Isto porque o que se observa na literatura convencional de administração é que a "indústria moderna seus proprietários ou mandatários executivos - procura transformar suas estratégias de controle ideológico em 'teorias científicas' de administração, atribuindo a elas status de modelos tecnológicos da racionalização do processo de produção, alocação de pessoal e elaboração de orçamentos" (Prates, 1981, p. 121).

As empresas da nossa amostra entendem por disciplina "a exata observância de preceitos e cumprimento dos deveres de cada um, em todas as classes hierárquicas, e o reconhecimento da autoridade do investido em cargo mais elevado ou de maior graduação.

São manifestações essenciais de disciplina:

• a obediência pronta às ordens e orientações de seu superior hierárquico;

• a rigorosa observância às prescrições das normas;

• o respeito mútuo entre colegas;

• a colaboração espontânea à disciplina coletiva e à eficiência dos trabalhos da empresa.

As ordens devem ser prontamente executadas, cabendo inteira responsabilidade às autoridades que as determinam. Quando a ordem recebida parecer obscura ou inadequada, compete ao subordinado solicitar os esclarecimentos necessários, antes de executá-la.

Aos superiores compete tratar seus subordinados com justiça e consideração. Por sua vez, o subordinado deve dar todas as provas de respeito e cooperação para com os seus superiores".

Os recursos para o bom adestramento, portanto, atuam através de uma "micropenalidade" de várias instâncias, a saber:

1. Tempo - atrasos, ausências, interrupções das tarefas.

2. Atividade - desatenção, negligência, falta de zelo.

3. Discurso - tagarelice, insolência.

4. Maneira de ser - grosseira, desobediência.

5. Corpo - atitudes incorretas, gestos não conformes, sujeira.

6. Sexualidade - imodéstia, indecência.

7. Comportamento e desvio - sem educação, vícios (Foucault, 1977).

Vejamos, portanto, como as empresas A e B praticam essa micropenalidades:

1. Tempo:

"É obrigação de todo empregado entender aos aspectos de assiduidade e pontualidade, comunicando imediatamente à sua chefia a razão da falta ou atraso.

Desempenhar com eficiência, presteza e atenção todas as tarefas determinadas pelo seu cargo, de forma a assegurar os melhores resultados no trabalho.

É proibido ausentar-se do local de trabalho ou participar de atividades de lazer durante o horário a cumprir, sem autorização da chefia."

A luta do operário no interior da unidade fabril contra o tempo é algo desesperador, como afirma uma testemunha do mundo da produção:

"Chega o contramestre: 'Quantas você faz? 400 por hora? É preciso 800. Se não, você não fica. Se, a partir de agora, você fizer 800 talvez eu concorde e você fica'. Fala sem levantar a voz. Para que levantar a voz, se com uma palavra pode provocar tanta angústia? Que responder? 'Vou tentar'. Forçar. Forçar ainda. Vencer, em cada segundo, este desgosto, este desânimo que paralisam. Mais depressa. Trata-se de dobrar a cadência. Quantas fiz ao fim de uma hora? 600. O sinal. Bater ponto, vestir-se, sair da fábrica com o corpo esvaziado de toda energia vital, a alma oca de pensamentos, o coração mergulhado no desgosto, raiva muda e, acima de tudo isso, um sentimento de impotência e de submissão. Porque a única esperança para o dia seguinte é que se dignem deixar-me passar ainda um dia como este. Quanto aos dias que virão depois, estão muito longe. A imaginação se recusa a percorrer um número tão grande de minutos tristes" (Weil, 1979, p. 100).

2. Atividade:

"É proibido ao empregado dedicar-se a assuntos particulares durante o expediente.

É proibido ao empregado dormir no serviço.

É obrigação do empregado manter as condições de higiene e segurança do local de trabalho e contribuir para a sua melhoria."

Qualquer desatenção ou negligência no trabalho pode ser motivo para uma advertência formal ou, até mesmo, uma punição mais drástica; senão vejamos:

"No dia seguinte condescendem em deixar-me voltar à máquina, embora na véspera eu não tivesse conseguido fazer as 800 peças exigidas. Mas vai ser preciso fazê-las agora de manhã. Mais depressa. Vem o chefe. Que será que vai me dizer? 'Pare.' Paro. O que é que querem? Me mandar embora? Espero uma ordem. Em vez de uma ordem o que vem é uma bronca seca, sempre no mesmo tom breve: 'Quando se diz para parar é preciso ficar de pé para ir a outra máquina. Aqui ninguém dorme.' Que fazer? Calar-me. Obedecer imediatamente. Ir imediatamente para a máquina para a qual me designam. Executar docemente os gestos que me indicam. Nem um movimento de impaciência; qualquer movimento de impaciência se traduz em lentidão ou desajeitamento. A irritação é boa para os que comandam, para os que obedecem é proibida. Uma peça. Ainda uma peça. Será que faço bastante? Depressa. Cuidado, quase estraguei uma peça. Cuidado! Estou diminuindo o ritmo. Depressa. Mais depressa..."(Weil, 1979, p. 101).

A preocupação com a atividade é muito bem explicada no fordismo, uma vez que "nosso primeiro passo no aperfeiçoamento da montagem constituiu em trazer o trabalho ao operário ao invés de levar o operário ao trabalho. Hoje todas as operações se inspiram no princípio de que nenhum operário deve ter mais que um passo a dar; nenhum operário deve ter que se abaixar" (Ford, 1954, p. 70).

3. Discurso:

"Não desperdiçar tempo de trabalho, em conversas com colegas ou estranhos durante o expediente, sobre assuntos alheios ao serviço.

É proibido ao empregado exercer atividade político-partidária ou aliciar empregados para tal fim, no recinto da empresa."

A dedicação ao trabalho é constante, atenta, pela própria característica da produção capitalista (por lote ou em massa); nesse sentido não é permitido sequer trocar palavras ou correspondências, visto que "uma empresa consiste num ajuntamento de homens reunidos para trabalhar e não para trocar correspondência. Não é necessário que uma seção qualquer saiba o que se passa na outra. A quem está seriamente ocupado no seu trabalho não sobra tempo para cuidar do vizinho" (Ford, 1954, p. 77).

4. Maneira de ser:

"É proibido ao empregado organizar, orientar ou tomar parte em manifestações de apreço ou desapreço, no âmbito da empresa.

É proibido ao empregado praticar esportes em local não permitido, no recinto da empresa.

É proibido distribuir leitura no recinto da empresa sem a devida autorização.

O empregado é obrigado a acatar as normas legais, administrativas e técnicas, bem como obedecer às ordens de seus superiores e atender às convocações que lhe forem feitas para execução de serviços extraordinários."

Essa situação generalizada de submissão aos padrões organizacionais tem provocado questionamentos tanto por parte da psicanálise como por parte dos sociólogos do trabalho (Doray, 1981), já que a própria estrutura empresarial assentada nos mecanismos disciplinares tem provocado uma verdadeira repressão organizacional - no sentido de "não conter as pulsões, mas inibi-las, negá-las, ou seja mesmo aniquilá-las totalmente" (Enriquez, 1974, p. 87) - com efeitos perversos na saúde física e mental dos trabalhadores, pois pesquisas na Europa têm demonstrado que

"determinados operários com atividades monótonas, pouco âmbito para decisões independentes e forte concentração no movimento da máquina revelam o mais alto grau de perturbação mental. Gadourek, em seu estudo de 1965, descobriu que a insatisfação com o trabalho exigido, o status social inferior do trabalho executado, mais o fato de serem os operários observados durante o trabalho correlacionam-se com o mais alto índice de perturbações psicossomáticas. Kornhauser, num estudo realizado com operários fabris de Detroit, chegou à conclusão de que trabalhadores não-especializados, com tarefas repetitivas, seguidos dos trabalhadores especializados ou não, com tarefas não-repetitivas, apresentam o mais baixo índice de saúde mental. O fator que se correlaciona mais fortemente com a doença mental é a impossibilidade de empregar os próprios talentos no seu trabalho. As perturbações psicossomáticas aumentam, de modo correspondente, entre os operários de mais baixa qualificação. Segundo Planz, a úlcera estomacal é encontrada particularmente entre os 'empregados das camadas sociais mais baixas, que vivem sob o peso de um trabalho onde só têm superiores e nenhum subalterno'. A úlcera estomacal tornou-se a medida da doença psicossomática entre a população operária, e a população que sofre de câncer emerge com mais freqüência da mais baixa camada social, os não-especializados. As operárias da camada inferior, mulheres sem especializações, são as que mais freqüentemente sofrem, física e mentalmente, de obesidade" (Schneider, 1977, p. 220-1).

5. Corpo:

É dever do empregado apresentar-se no local de trabalho em trajes adequados e em boas condições de higiene.

É obrigação do funcionário submeter-se à fiscalização e identificar-se, quando solicitado, a qualquer tempo, dentro da área da empresa.

É dever do empregado atender aos aspectos de urbanidade, discrição e apresentação pessoal."

A ênfase numa apresentação pessoal em trajes adequados - no caso das empresas pesquisadas os uniformes são homogêneos e obrigatórios para o nível mais baixo da hierarquia até o nível gerencial nas respectivas usinas - encontra explicação outra vez no campo da psicanálise, uma vez que "os indivíduos são confrontados a uma série de imagens diferentes (e não somente à imagem da organização e à sua própria imagem): o que eles representam para seus superiores, seus colegas, seus amigos, seus subordinados ...É na medida em que são reconhecidos pelos outros na sua identidade e no seu poder que podem conquistar sua identidade e ter efetivamente um certo tipo de poder" (Enriquez, 1974, p. 67).

6. Sexualidade:

"É dever do empregado tratar com o devido respeito e consideração os seus superiores, demais empregados e ser ainda atencioso no trato com qualquer pessoa.

É obrigação do empregado contribuir para que no local de trabalho e em toda a empresa seja mantido o máximo respeito, higiene, moralidade, ordem e segurança."

É do conhecimento de todos nós, e Freud já demonstrou essa tese maravilhosamente, que as organizações homossexuais são as mais duráveis e sólidas - exemplo: Igreja e Exército - e "quando uma organização não pode colocar totalmente à parte um dos sexos, ela nega a diferença dos sexos ou estabelece uma divisão rigorosa entre os dois" (Enriquez, 1974, p. 71).

7. Comportamento e desvio:

"É proibido entregar-se à prática de jogos durante o expediente ou em recinto da empresa, salvo em local destinado exclusivamente para este fim, nos horários de lazer.

E proibido portar ou ingerir, dentro do recinto da empresa, bebidas alcoólicas ou entorpecentes, assim como apresentar-se ao serviço sob seus efeitos."

Proibir operários de "saírem fora" da realidade na jornada de trabalho é uma constatação óbvia nas sociedades ocidentais; mas o que vale registrar é a excessiva importância dada à responsabilidade individual pelo fordismo:

"Queremos, sim, completa responsabilidade individual. O operário responde pelo seu trabalho; o mestre responde pelos homens sob seu comando; o contra-mestre responde pelo seu grupo; o chefe de seção responde pelo seu departamento e o inspetor geral responde por toda a fábrica. Cada um deles deve saber o que se passa no seu raio de ação" (Ford, 1954, p. 78).

2.2 Política de recursos humanos: recrutamento, seleção e desenvolvimento de pessoal

2.2.1 Empresa A1 1 Todos os dados aqui coletados foram extraídos de uma entrevista realizada com o gerente de relações industriais em 19.10.83.

Esta empresa possuía, em outubro de 1983, um efetivo de pessoal da ordem de, aproximadamente, 8 mil funcionários, sendo 70% horistas e 30% mensalistas.

A classificação salarial é feita pelo sistema de pontos, adotando-se três tabelas - universitário, administrativo (técnicos de nível médio, incluindo supervisores e mestres) e operacional - operários ligados à produção.

No que diz respeito à subcontratação, a empresa adota essa política apenas para serviços de transporte, limpeza, etc:, com um percentual mínimo em relação ao total de pessoal.

Foi feita uma pergunta sobre a evolução do mercado de trabalho na região e a resposta merece ser transcrita na íntegra:

"A comunidade deve ser o celeiro de mão-de-obra da empresa; no entanto, ela é bastante fraca. Em vista disso, a empresa deve formar a mão-de-obra. A oferta é grande e, portanto, a criminalidade tem aumentado nos últimos três anos."

Como se pode observar, a estratégia é tipicamente fordista, uma vez que a empresa, sendo a principal absorvedora da mão-de-obra local, já demonstra uma preocupação com a criminalidade crescente, em vista da recessão em curso, e, ao mesmo tempo, opta por formar seus próprios operários.

Tal formação no interior da empresa é feita por um centro de treinamento, nos moldes do Senai, com um ano de duração, depois do qual o recém-formado é admitido como aprendiz, iniciando então sua trajetória profissional.

Outro dado interessante no que diz respeito às formas de recrutamento e seleção é o fato de que se exige uma escolaridade mínima de 7ª série do primeiro grau, enquanto no passado se exigia apenas o primário; a explicação é que as inovações tecnológicas (controle de processos automatizados) levaram a empresa a admitir operários com um mínimo de conhecimento de geometria, etc.

Em suma, a estratégia de recrutamento e seleção é a de se dar preferência para os indivíduos da região, casados, trazer o aluno (de engenharia) como estagiário e admitir sempre na base da pirâmide. Para isso existem dois órgãos de seleção: um para elementos de curso superior e outro para o pessoal técnico e operacional.

No que diz respeito ao treinamento, "a missão do setor de desenvolvimento de pessoal é a qualificação. O suprimento interno é o que mais ocorre; o ideal é todo mundo entrar como aprendiz, sem vício. A empresa seria a sua escola" (o grifo é nosso).

Essas afirmações merecem uma consideração mais detalhada, pois fica explícita na política da empresa a sua determinação de formar a pessoa, de traçar-lhe um perfil próprio para ser membro da família, como diria Ouchi na sua famosa teoria Z. Envolver o indivíduo em todos os sentidos: contratar pessoas casadas, de preferência entrando como estagiários ou em sua escola de aprendiz de operário, inculcar a cultura da empresa em toda a dimensão do funcionário e aí contar, ad eternum, com a sua permanente lealdade para com os objetivos da organização.

Quanto ao treinamento, existem três tipos: o básico, que é pré-requisito para a admissão permanente (durante os três meses que a CLT estipula para experiência), aperfeiçoamento, destinado para o cargo que o funcionário ocupa naquele momento e o de desenvolvimento, visando o preenchimento de cargos futuros.

A empresa dá uma enorme importância ao treinamento, chegando inclusive a fazer um convênio com um curso de mestrado em engenharia metalúrgica da UFMG, onde, até 1983, já se tinham formado 50 mestres, com todas as teses voltadas para o interesse da organização.

Como afirma o próprio gerente de RI :

"O treinamento pode ser visto como complemento da seleção. Quanto mais treinamento interno melhor, sem perder a perspectiva do externo. Damos preferência a instrutores internos por conhecerem melhor a realidade da organização."

2.2.2 Empresa B2 2 Entrevista realizada com o gerente de RI em 17.8.83.

Esta empresa contava, na época da entrevista, com aproximadamente 12 mil funcionários, sendo, também, a maioria funcionários normais, com a composição de aproximadamente 80% horistas e os restantes 20% mensalistas.

Quanto ao pessoal universitário, a orientação também é de

"não contratar profissionais formados, mas sim admitir estagiários, pois, além de isso ser mais eficaz, nós possuímos uma divisão na GRI dedicada exclusivamente à administração de estagiários, já que ela (a empresa) não tem convênio com o Centro de Integração Empresa-Escola."

Em relação ao pessoal especializado,

"em vista de um convênio com o Senai, admite-se em caráter experimental, e os candidatos passam por um treinamento técnico-operacional na própria indústria. Caso o Senai, na oportunidade, não tenha meios de indicar candidatos, utilizam-se os meios comuns, como, por exemplo, os testes psicológicos que, aliás, não são padronizados, mas diferenciados em função do cargo, além do teste dentro da fábrica, junto às máquinas, e entrevistas."

Observamos, portanto, que não existe muita diferença entre as empresas A e B, no que se refere às formas de recrutamento e seleção, predominando a estratégia de admitir funcionários "sem vício e na base da pirâmide", com a única finalidade de melhor docilizar os corpos e torná-los mais produtivos (Foucault, 1977).

Quanto à política de treinamento, a estratégia resume-se praticamente em:

"A partir de cargos-chave, levanta-se a profissiografia e, posteriormente, cruza-se com o pessoal existente e, depois, elabora-se um programa de treinamento. Esta estratégia é complementada pelas seguintes diretrizes: levantamento de necessidades junto às chefias, treinamento técnico e comportamental, ou seja, liderança, como dar ordens, etc.

Outro fator considerado na empresa é que ela, em vez de comprar pacotes, desenvolve um treinamento voltado para dentro; um exemplo é que já existe, inclusive, um pacote desenvolvido dentro da empresa para chefias intermediárias (chefe de serviço, de divisão e mestria). Para ser chefe de divisão, por exemplo, passa-se por um treinamento específico, dividido em módulos: técnicas administrativas, conhecimento da empresa a área comportamental."

Uma outra novidade em relação ao treinamento, fruto do impacto das inovações tecnológicas no processo fabril, é, por exemplo, a seguinte:

"Para os candidatos a mestre optou-se por um treinamento em duas etapas: um nivelamento teórico, abrangendo disciplinas como resistência de materiais, matemática, física, química, etc, e outro técnico operacional. Se fôssemos, por exemplo, contratar um mestre hoje exigiríamos o diploma de 2º grau."

Para o pessoal de alta chefia - chefes de departamentos, gerentes e diretoria - a orientação é nitidamente ideológica e abrange, last but not least, temas de interesse nacional e internacional, contando para isso com órgão diretamente subordinado à presidência, com a finalidade de promover palestras dentro da empresa, congressos e cursos no Brasil e no exterior.

2.3 Formas de controle

Devido à própria natureza da evolução do desenvolvimento do capitalismo, a grande empresa industrial assume hoje formas de controle bastante semelhantes e homogêneas, devido principalmente à internacionalização do capital, com a sua extensão natural às técnicas de gestão (Bendix, 1966).

Historicamente, podemos descrever a evolução das formas de controle no interior da fábrica em quatro fases, a saber:

Quadro 1 - Clique para ampliar


Quadro 2 - Clique para ampliar


a) fábrica-fortaleza -corresponde ao ciclo das disciplinas "panópticas" - século XVIII;

b) fábrica-cidade - corresponde à fase do disciplinamento extensivo - século XIX;

c) fábrica-máquina - ciclo da disciplina da máquina sobre o homem, ou seja, o taylorismo-fordismo - primeira metade do século XX e, finalmente,

d) fábrica democrática - que corresponde à fase da disciplina contratual, ou seja, à interiorização da disciplina como procedimento de modos formais ou reais de delegação parcial do poder - enriquecimento de cargos, grupos semi-autônomos e círculos de controle de qualidade - segunda metade do século XX (Gaudemar, 1982).

O quadro 3 ilustra bastante esse raciocínio.


Partindo dessas premissas e, por outro lado, pelo fato de que as empresas A e B adotam formas de controle fronteiriças entre as fases c e d, analisaremos as formas de controle conjuntamente para as empresas A e B.

O que se nota na análise das entrevistas3 3 Entrevistas realizadas com gerentes de Produção em 19.9.83 e em 4.11.83. é a introdução da microeletrônica na produção industrial, provocando mudanças significativas na organização do trabalho, tais como operários mais polivalentes e, portanto, menos especializados, e o trabalho em equipes e grupos, com a institucionalização em ambos da cultura da participação e de formação de grupos de CCQ. Para se ter a idéia da importância da cultura "democrática", assim respondeu o entrevistado à pergunta - "Existe uma cultura de participação nesta organização?".

"Existe. Existe a cultura. Recentemente nós resolvemos implantar aqui grupos de CCQs. A primeira pergunta da pessoa que foi indicada para implantar os CCQs era até que ponto existia, dentro da empresa, um clima participativo, um clima de abertura para implantar esse modelo de administração. Nós respondemos, então, que havia uma possibilidade total, haja vista a cultura que foi criada. Nós temos uma cultura de participação, uma cultura de consenso, uma cultura para envolver as pessoas."

Outra preocupação que se nota hoje, em termos de controle na moderna empresa capitalista, é a verdadeira determinação de exorcizar estigmas como, por exemplo, mandar em alguém, dar ordens, etc, ou seja, um discurso autoritário é substituído por um discurso participacionista, visando, obviamente, atingir o tão propalado consenso, harmonia, etc.

"Mudou a organização do trabalho. Essa situação levou o chefe a não ser mais o especialista da área. Anteriormente era possível um gerente ter a noção de toda a indústria e, hoje, com um aprofundamento vertical na tecnologia, você tem um homem (chefe) cuja função não é mandar em alguém, mais, sim, coordenar resultados.

A especialização alta do trabalho levou a chefia a ter uma maior capacitação interpessoal. O perfil do gerente mudou bastante; o estilo não pode ser mais autoritário, tem que ser mais participativo; isto porque a tecnologia fragmentou o processo de trabalho e existe grande número de especialistas. A teoria X não dá certo. Agora é a teoria Z. Os técnicos hoje têm uma alta qualificação e não se consegue outra resposta a não ser o raciocínio lógico racional.

Todo mundo teve que estudar administração. Foi analisado mais o potencial do técnico do que a competência momentânea. Estão intimamente ligadas a adoção de novas tecnologias e a organização do trabalho."

A crer no discurso das elites gerenciais, estas nos deixam transparecer que não mais existe o taylorismo-fordismo, ou, em outros termos, as características clássicas da organização capitalista do trabalho, ou seja,

"A partir do momento em que se dava o passo para sempre à produção intensiva de mais-valia mediante a prolongação da jornada de trabalho, o capital se lançou com todos os seus brios e com plena consciência de seus atos a produzir mais-valia relativa, acelerando os progressos do sistema maquinista. Ao mesmo tempo, se produz uma mudança quanto ao caráter da mais-valia. Em geral, o método de produção de mais-valia relativa consiste em fazer com que o operário, intensificando a força produtiva do trabalho, possa produzir mais com o mesmo desgaste do trabalho e ao mesmo tempo. O mesmo tempo de trabalho agrega ao produto global, antes e depois, o mesmo valor, ainda que este valor de troca invariável se traduza agora em uma quantidade maior de valores de uso, diminuindo com isso o valor de cada mercadoria" (Marx, 1974, p. 337).

O que a ideologia patronal impede que os funcionários do capital percebam é que essas "novas" formas de organização do trabalho são, nada mais, nada menos, do que formas de maximizar a produção de mais-valia relativa, pois, como afirmou Marx brilhantemente:

"O capitalista que aplica modernos métodos de produção apropria-se em forma de trabalho excedente de uma parte maior da jornada, em comparação com os demais capitalistas do mesmo ramo industrial" (Marx, 1974, p. 256).

A rigor nada mudou, e o que houve foi apenas um desenvolvimento tecnológico, tanto do ponto de vista produtivo (capital constante), como do ponto de vista de tecnologia organizacional (Maroni, 1982). É necessário entender de forma lapidar que

"qualquer discussão acadêmica sobre satisfação do trabalho, alienação ou efeitos da automação que não descrevem o sistema de poder, pelo qual o capital define e implementa os limites dentro dos quais o trabalhador é compelido a operar, pode ser jogado imediatamente na lata de lixo; por exemplo, se não mencionar o sistema de pagamentos com o qual está trabalhando um desses chamados grupos semi-autônomos ou ainda 'esquecer' de descrever o sistema de normas e punições e os sistemas de informações automáticas nos casos desses trabalhos 'enriquecidos'. O capital não necessita controlar o trabalho através da especificação de tarefas e taxas de pagamento para o indivíduo ao invés do grupo. E não necessita também exercer este poder através de um sistema de confrontação direta de relações de poder (exemplo: capatazes, etc.). O fato é que, ao invés disso, um computador pode bloquear o pagamento do operário, mandá-lo para outro departamento como punição ou, em geral, manter vigia sobre a intensidade e qualidade do seu trabalho. Isto não quer dizer que o processo de trabalho deixou de ser capitalista" (Mepbam et alii, s.d., p. 20).

Em uma das empresas, por exemplo, cinco anos antes da implantação de grupos de CCQ, bem como das Cipas, existiam os "voluntários da segurança"4 4 Esses "voluntários" usavam uma cruz vermelha nas golas dos uniformes, para se diferenciarem dos demais. em cada departamento da produção, que são operários chamando a atenção de outros operários para os riscos de acidentes, enquanto que na outra empresa existiam também os grupos JK (sigla japonesa que significa autocontrole). A história da implantação de CCQs em uma das empresas é tão bizarra que vale a pena reproduzi-la:

"A diretoria queria o CCQ, os supervisores venderam a idéia e os operários compraram. É o fechamento do ciclo da participação em todos os níveis. O CCQ envaidece e promove a participação. O supervisor deve ser o verdadeiro líder, pois ele abre o canal de comunicação para a empresa.

De seis em seis meses existe um grande simpósio interno para o pessoal mais qualificado e, para os de menor qualificação, esse simpósio é via CCQ."

O interessante a observar é que em nenhuma das empresas se adota qualquer tipo de sistema de prêmios, existindo apenas a avaliação de desempenho nos moldes tradicionais; mas, em contrapartida, o controle tecnológico (computador) atingiu tal nível de sofisticação que

"cada material é identificado, examinado com aparelhos e visualmente, além de que em todas as seções que ele passa tem a assinatura do supervisor. Se alguma coisa ocorrer (exemplo: sabotagem) é fácil identificar qual o posto de trabalho e qual o operário. A qualidade está ótima e totalmente sob controle."

Por fás ou nefas, a verdade é que essas mudanças na administração da força de trabalho, se, por um lado, acarretaram aumentos significativos na produtividade das empresas, por outro, também, existe hoje na Europa uma forte resistência operária, pois uma "classe operária politizada não aceita esse 'enriquecimento de tarefas'. Um exemplo é a Fiat italiana, onde a luta operária gerou formas de organização autônomas de trabalhadores, a formação de comitês, de cadeias de produção, de trabalho, e isso levou a uma reação patronal" (Tragtenberg, 1981, p. 6).

No que se refere às empreas A e B, podemos concluir, então, que o controle político da mão-de-obra no interior de suas unidades fabris atinge contornos de uma verdadeira instituição total, bem nos moldes da Volkswagen, onde "existe um tipo de prisão interna, o famoso 'chá de banco', para quem comete faltas", além de existir um "circuito interno de televisão, que focaliza vários setores da fábrica, controlado pela central de segurança" (Brito, 1983, p. 31), pois, como afirma Goffman.

"o ser humano é definido como notoriamente fraco; é preciso aceitar soluções intermediárias, é preciso mostrar consideração, é preciso tomar medidas de proteção" (Goffman, 1974, p. 151).

2.4 Política salarial e planos de carreira

Pelos motivos expostos no item anterior, aqui também faremos uma única análise envolvendo as duas empresas, não só pelas semelhanças observadas nas entrevistas mas, também, pelo fato de que se dará maior ênfase aos salários indiretos e aos incentivos monetários, uma vez que não tivemos acesso à folha de pagamento, nem tampouco aos arquivos da empresa referentes a salário.

Mas, em geral, essas duas empresas não têm salários indiretos significativos; o que se verificou é que apenas uma adota o sistema pelo qual, a cada ano de permanência no emprego, o empregado tem direito a 10% a mais do seu salário, a título de gratificação, chegando, portanto, a ter 14 salários ao fim de 10 anos de empresa, 15 em 20 anos, etc.

Mas a expectativa do GRI é de que, em 1984, essa gratificação terminará, em função da recessão e da grave crise que atinge o setor, principalmente na exportação para os EUA.

Em função da própria natureza do trabalho na siderurgia, os operários ligados à produção têm apenas uns 30 minutos para o almoço, levando, geralmente, marmitas; por causa disso, as empresas não têm restaurantes mas, contudo, oferecem lanches e refeições em horário extra.

Existe uma assistência médica subsidiada, variando de 20 a 60% do valor fixado pelo Inamps, com a justificativa de "evitar abusos dos funcionários", pois no passado, argumenta o GRI da empresa A, "ela foi muito paternalista".

Não existe um plano de carreira formalizado em nenhuma das duas indústrias, sendo que o único mecanismo existente é a avaliação de desempenho, tanto horizontal como vertical, mas nos últimos anos (sempre em função da crise, observam os gerentes) não tem havido praticamente nenhuma promoção. A avaliação na empresa A contém elementos interessantes, pois está intimamente associada com os resultados e com a docilidade dos operários. Assim se pronunciou o GRI a respeito:

"O primeiro momento da avaliação é feito pelo supervisor em relação à equipe e não individual; o segundo momento é pessoa por pessoa e se tenta relacionar o rendimento de cada um com a produção da equipe, além de também entrar o prontuário,5 5 Nota-se que a linguagem é a mesma usada pelo aparelho médico e policial. ou seja, registro de atitudes - punição, faltas, elogios, etc".

Essa situação de uma política salarial tímida e pouco agressiva talvez seja explicada pelo ótimo relacionamento que as empresas têm com os seus respectivos sindicatos, que, diga-se de passagem, formam uma bela dupla do mais puro peleguismo hoje existente no Brasil.

À pergunta "como é o relacionamento da empresa com os sindicatos?" - assim respondeu o GRI da empresa A:

"O relacionamento com o sindicato é muito bom. Todas as modificações conjunturais são negociadas com o sindicato. O sindicato é o representante legítimo do operariado. O desafio mesmo é a capacidade de negociar"; enquanto o representante da empresa B assim se pronunciou:

"Excelente. Resolvo muitos problemas até mesmo por telefone. Não é só na época dos acordos coletivos, mas permanentemente. Até agora tem sido muito bom."

2.5 A ideologia da empresa

Por ideologia da empresa entendemos os mecanismos implícitos (intrapsíquicos) de integração, bem como os mecanismos explícitos - comunicações, jornais internos, caixa de sugestões, interação com a comunidade, etc. no sentido de captarmos os procedimentos ideológicos de que a moderna empresa capitalista lança mão com o intuito de buscar a integração na relação capital-trabalho.

Em geral, o que se observa no interior da empresa é que

"a organização, enquanto conjunto estruturado e estabilizado, vai colocar cada um no desafio de provar sua existência e vai instaurar a gramática da luta pela vida. Neste sentido, tudo será colocado para permitir a expressão do narcisismo individual e para dar a ilusão do ego sólido e não dividido" (Enriquez, 1974, p. 65).

E é exatamente nesse sentido de percepção do fenômeno organizacional que o GRI da empresa A opinou a respeito da existência ou não de uma forte identidade dos funcionários com a organização:

"Existe uma forte identidade dos funcionários com a organização; quando foi estruturada a empresa, nós tínhamos uma preocupação de reunir todo o pessoal de nível superior e ocupantes de cargos de chefia... E para todos eles mostramos a estrutura que estava sendo implantada e mais ou menos qual era a nossa expectativa de funcionamento dessa organização e aplicamos um texto, logo depois de implantar essa nova estrutura, sobre como o participante da reunião estava vendo a nova organização, quais os pontos fracos que ele percebia, etc, quais as sugestões que ele daria e pedimos para que todos dessem uma nota de 1 a 10. A partir daí se pode calcular qual seria a possibilidade de sucesso da nova estrutura" (o grifo é nosso.)

Essa aparente idéia de participação, para depois montar um esquema o menos conflitivo possível nas organizações, é bastante conhecido com o nome de delegação de competência e centralização de poder, bem na linha de Fayol, APO, DO e outras manipulações grotescas da força de trabalho.

Uma outra forma de integração são as famosas promoções sociais, esportivas, associações atléticas e, principalmente, as associações de funcionários, que são, indiscutivelmente, manipuladas pelas respectivas diretorias.

A empresa A chega ao extremo, por exemplo, de promover olimpíadas internas, possuir um clube completo com lagoa, e convênios com outros clubes da cidade; mas o mais interessante mesmo, na perspectiva do fordismo, é que ela formulou o Plano de Assistência Comunitária (PAC), com o objetivo de integrar ao máximo a população da cidade com a empresa, através de festivais de música, de campanhas de saúde, de plantação de hortas, de higiene pública e até mesmo de implantar um verdadeiro carnaval na cidade. (Entrevista com o GRI da empresa A em 19 de outubro de 1983.)

No interior desta luta surda, de se promover a integração através de estratégias sutis e subliminares, o que se pode observar é

"que cada um vai pôr em jogo seu ego, para tentar realizar o que se pode chamar o ideal de ego da organização. Onde se poderia encontrar a espontaneidade, a criatividade, o sonho, em tal caso? Em parte alguma. As organizações não sonham, elas não querem a mudança mas sim a repetição, não a interrogação mas o poder" (Enriquez, 1974, p. 72).

3. CONCLUSÕES

Em todo o desenvolvimento histórico da administração, desde o final do século XVIII (1780) até os dias de hoje (anos 80), as estratégias gerenciais têm obedecido à lógica de dividir para reinar, quer no plano político, quer no enfrentamento empresa/operário/sindicato, (Friedman, 1977).

Isso vem demonstrar que os funcionários do capital - e a entrevista com os gerentes das empresas A e B deixam transparecer isso nitidamente - estão preocupados, em primeiro lugar, com a busca da integração via estratégias do tipo fordismo e teoria Z, e, em segundo, com a busca do aprimoramento de novas técnicas de gestão da mão-de-obra - enriquecimento de cargos, grupos semi-autônomos e círculos de controle de qualidade - com o objetivo de alcançar um patamar mínimo de estabilidade organizacional.

Quanto à primeira estratégia - busca da integração - constitui um verdadeiro dilema na história do desenvolvimento capitalista, principalmente após o taylorismo - fordismo, no final da segunda década deste século, pois, como observou atentamente um historiador desse período, é necessário entender que "para o estudo das ideologias de direção não interessa a origem do espírito capitalista; interessam bem mais as armas ideológicas usadas na luta em favor ou contra a industrialização. Em qualquer lugar onde se introduz pela primeira vez a indústria moderna, as atividades empresariais têm pouco prestígio social" (Bendix, 1966, p. 208), e, para tanto, a ação patronal nesse período, em resposta à campanha de um dia livre na fábrica, no âmbito dos EUA, provocou imediatamente a reação dos empresários, no sentido de que:

"Posto que nós, como empregadores, somos responsáveis pelo trabalho realizado pelos nossos operários, devemos ter completa liberdade para designar os homens que consideramos competentes para realizar o trabalho e para determinar as condições em que realizarão este trabalho, já que a questão da competência dos operários só deve ser determinada por nós mesmos. Ao mesmo tempo que negamos qualquer intenção de obstaculizar as funções próprias das organizações operárias, não admitiremos nenhuma intervenção na direção de nossos negócios" (Bendix, 1966, p. 281).

E para levar tal projeto adiante, "os empregadores estabeleceram contra-organizações que atuavam paralelamente com os diferentes níveis das organizações sindicais. Utilizaram seu poder absoluto de empregar e despedir para fazer discriminações a favor dos empregados cooperativos e contra os que se negavam a cooperar" (Bendix, 1966, p. 281).

A política de integração levada a cabo pelas empresas, como se pode observar historicamente, possui, dialeticamente, contornos ora tipicamente repressivos ora tipicamente ideológicos, bem no sentido althusseriano do termo.6 6 Sobre o cenário da luta de classes nos EUA na década de 50, é imprescindível a leitura do trabalho "Les greves sauvages de l'industrie automobile americaine. In: Castoriadis, C. L'Expérience du mouvement ouvrier. Paris, UGE, 1974, tomo 1.

Em grandes empresas multinacionais e, geralmente, nos países desenvolvidos, a ação patronal é orientada por ideologias administrativas hipermodernas, com o intuito de suavizar ao máximo as contradições capital-trabalho, ou seja, as organizações procuram "tratar"7 7 "O desclocamento das contradições faz-se assim em duas etapas: a) em primeiro lugar, deslocam-se as contradições entre os trabalhadores e a organização (nível 1) através de uma política organizacional contraditória (nível 2), por sua combinação de imposições e de vantagens oferecidas aos indivíduos, que permite integrá-los aos objetivos da organização e ao mesmo tempo separá-los, impedindo a formação de coletividades autônomas de trabalhadores que se oponham à organização. As contradições dos trabalhadores permanecem latentes ou inconscientes: elas se reencontram, transformadas e absorvidas na política contraditória da organização; b) em segundo lugar, transformam-se as contradições da política contraditória da organização (2) em contradições psicológicas vividas pelo indivíduo (3). O indivíduo, mergulhado na organização, que o isola dos outros trabalhadores, vive uma situação contraditória da qual não compreende a origem. Ele interioriza (mais precisamente ele introjeta) as imposições e as vantagens oferecidas pela organização, as quais se transformam em angústia e em ideal, que passam a ser os dois elos fundamentais de sua estrutura inconsciente. Seus conflitos essenciais e fundamentais que são, a nosso ver, aqueles que surgem da confrontação entre o desejo e as limitações para satisfazê-lo, e da confrontação com a morte, e que aparecem cotidianamente em sua relação com os outros (pois a relação com os outros se constrói na defrontação com seus próprios limites) encontram-se profundamente transformados pela organização. A defrontação com a morte, que permite o conflito produtivo e os conflitos nas relações com os outros, transforma-se ao contato com uma organização todo-poderosa e ameaçadora em angústia de morte inconsciente, quer dizer, em uma ameaça de destruição inconsciente e permanente. Os conflitos que nascem dos desejos espontâneos do indivíduo, de suas relações com os outros, são então repelidos, pois fazem pairar sobre o indivíduo uma ameaça insustentável. Ao mesmo tempo, a organização propõe uma saída ao conflito sob a forma de uma identificação a um ideal agressivo, da identificação a si própria e suas finalidades, que constitui uma defesa contra o conflito repelido. O indivíduo nesta situação vive um conflito perpétuo com a organização, ele se sente ao mesmo tempo ameaçado e assegurado por ela, feliz e infeliz, cheio de satisfações e aprisionado, livre e drogado" (Pages et alii, 1978, p 21 e 22). essas contradições subjacentes, "deslocando-as" e "transformando-as, com o objetivo de ocultá-las", para evitar que essas contradições acabem em conflitos inadministráveis, e, nesse sentido, as organizações propõem um sistema unificado e coerente, com vistas a

"assegurar uma produção coletiva, minimizando os riscos de conflitos abertos entre grupos de trabalhadores (os conflitos são ritualizados e transformados em conflitos individuais de carreira que reforçam a organização, pois, para fazer carreira é preciso servir às finalidades da organização), minimizar os riscos de conflitos dos trabalhadores com a organização, bem como minimizar os conflitos intrapsíquicos, transformando-os também, e oferecendo-lhes uma saída de derivação em direção à identificação com a organização" (Pages et alii, 1978, p. 19).

No caso específico do Brasil, a par de toda a legislação autoritária que rege as relações de trabalho, o processo de integração capital-trabalho tem apresentado um desenvolvimento mais intenso, principalmente após as paralisações de pós-1978; mesmo assim, podemos observar que os nossos empresários ainda respiram bem os ventos da década de 30, onde a questão social era questão de polícia, pois uma das recomendações do Sindicato da Indústria de Máquinas do Estado de São Paulo, na eventualidade de uma greve, é no sentido de que

"havendo perigo iminente de perturbação da ordem (concentrada num determinado setor ou generalizada a toda a fábrica), dilapidação do patrimônio ou danos físicos pessoais, requisitar guarnição pessoal para permanecer de prontidão ou, se for o caso, tomar as medidas que, a critério da autoridade competente, sejam julgadas oportunas" (Lobos, 1982, p. 130).

O que nos deixa incrédulos é que as recomendações dos empresários do setor não definem o que é perturbação da ordem e nem tampouco, pelo menos, o que é tomar medidas oportunas! Sabemos, todavia, através da imprensa, que essas medidas competentes, na maioria das vezes, são a repressão policial pura e simples, com graves danos físicos e morais para a classe trabalhadora. Em Minas Gerais, no setor siderúrgico, a estratégia patronal não só reproduz seus pares de São Paulo mas, em determinados momentos, vai além e abre as portas da fábrica para o aparelho policial-militar evitar piquetes.8 8 Em São Paulo, no ano de 1978, por ocasião da greve na Villares, que tinha mais ou menos 2.500 operários na época, foi adotada a seguinte estratégia: "Cada mestre chamava os operários um por um e lhes dizia o seguinte: que o nome dos integrantes da comissão já estava no SNI, em Brasília; para pôr medo no pessoal diziam também que os operários não podiam fazer greve, porque era contra a lei; que a empresa não podia dar aumento porque o governo não autorizava (...). Com isso 'eles' esperavam quebrar o movimento, e o movimento acabou por se dividir mesmo" (Maroni, 1982, p. 53).

Em linhas gerais, portanto, no que diz respeito às diretrizes patronais de integração operária, as empresas atuam de diversas maneiras, sendo predominantes as ações voltadas para a participação do empregado em comissões de fábricas, tais como a Ford, Mercedes-Benz, Volkswagen e outras, eleitas democraticamente entre seus pares.

Mas, mesmo assim, a contra-estratégia operária tem atuado, pois, além de ser instrumento de "greves-pipoca" - paralisações parciais alternadas por fábricas, cujo efeito seria mais eficaz que o de uma greve geral - é "também instrumento de pequenas negociações que melhoram a vida dos trabalhadores dentro da empresa", pois, "desde o início do ano atrasado, quando a Comissão da Ford foi reconhecida, os quase 12 mil empregados conseguiram a criação de um departamento de assistência social, a implantação de 23 novas linhas de ônibus para o transporte de trabalhadores e a redução de 10% para 6,5% dos juros sobre empréstimos cobrados pela agência bancária instalada na fábrica".9 9 Na leitura de vários números do jornal Em Tempo, nos anos de 1978-79, conseguimos sistematizar as seguintes estratégias gerenciais do setor siderúrgico, de Minas Gerais, em períodos de greve: 1. Antecipar o horário de entrada de turno dos operários, com a finalidade de esvaziar a assembléia da categoria. 2. Abrir vagas para operários e fazer as inscrições dentro da fábrica (chantagem psicológica), para lembrar aos operários que se fossem à greve poderiam ser demitidos. 3. Publicar boletins sobre a crise internacional, índices de desemprego no país, os interesses recíprocos entre patrões e empregados, a necessidade do diálogo e da moderação dos dirigentes sindicais. 4. Elaborar listas negras e fazê-las circular entre as grandes empresas do setor. 5. Eleger uma comissão de representantes de uma determinada empresa com a diretoria desta, a fim de se formar uma "comissão de negociação". 6. Julgar o dissídio coletivo na respectiva Delegacia Regional do Trabalho (DRT). 7. Incitar os operários à greve, quando uma determinada empresa está com o nível de estoque elevado e com problemas de abastecimento de insumos. 8. Ameaçar supervisores e contramestres. 9. Demitir as principais lideranças do movimento. É interessante observar também que a "participação dentro das fábricas estaria ocorrendo de forma tão acelerada que o medo de represálias por pertencer a uma comissão estaria desaparecendo. Os membros das comissões da Volkswagen e da Ford usam camisetas com identificação no peito, que facilitam seu reconhecimento pelos colegas de trabalho. Na Ford, por exemplo, seus 20 integrantes reúnem-se por setores duas vezes por semana - às terças e sextas-feiras - com cerca de 50 empregados, em média, que fazem parte dos chamados "grupos de apoio". Além disso, reúnem-se uma vez por mês com a diretoria da empresa, e a qualquer momento podem convocar reuniões amplas com todos os empregados" ( Isto É, 6 abr. 1983).

Em relação à segunda estratégia patronal, de busca de "novas" formas alternativas de gerência da mão-de-obra, é importante destacar que constitui, a bem da verdade, uma tentativa de antecipação de conflitos, ora procurando desmitificar os princípios básicos do taylorismo, ora introduzindo um discurso "humanista" de "satisfação" no trabalho, além de inovações tecnológicas com base na automação industrial - MFCN, CAD/CAM, CIM e robôs - com profundos impactos na composição da classe operária, principalmente na desqualificação/qualificação e no desemprego tecnológico. O quadro 4 ilustra bem esse raciocínio.


Já falamos anteriormente do engodo dessas novas formas de organização do trabalho, seja do ponto de vista da valorização do trabalho com o objetivo de preservar a lucratividade do capital, onde encontramos uma extensa obra de críticas contumazes a essas manobras do capital,10 10 Hirata, H. Firmas multinacionales en Brasa: tecnologias y organización del trabajo. México, UNAM, 1981, mimeogr.; Montmollin, M. Taylorisme et antitaylorisme, la: Sociologie du Travail, Paris, Éditions du Seuil, (4), oct.-déc. 1974; Thorsrud, É. La democratization du travail et le processus de transformation de l'organization. In: Sociologie du Travail, Paris, Éditions du Seuil, (3), juin-sept. 1975; Weil, R. Formes nouvelles d'organization du travail dans i'enterprise automobile européene. In: Sociologie du Travail, Paris, Éditions du Seuil, (1), jan-mars 1976; Durand, C. Les politiques patronales d'enrichissement des tâches. In: Sociologie du Travail, Paris, Éditions du Seuil, (4), oct.-déc. 1974; Chave D. Neotaylorisme ou autonomie ouvrière? Reflexions sur trois experiences de reorganization du travail. In: Sociologie du travail, Paris, Éditions du Seuil, (1), jan-mars 1976. seja do ponto de vista da classe operária através dos sindicatos.

Os CCQs - círculos de controle de qualidade têm sido o alvo predominante dos sindicatos brasileiros, quer pelo caráter de transferência de práticas gerenciais japonesas, quer pelo seu claro objetivo de maior exploração e nenhuma recompensa.11 11 Tragtenberg, M. Ainda sobre os círculos de controle de qualidade. In. Folha de São Paulo, 27 e 28 jul. 1982.

Para usarmos uma expressão de Palloix, a verdade é que o "neofordismo é uma tentativa puramente formal de abolir o trabalhador coletivo, levando em conta as tensões sociais que exigem a instauração de um despotismo absoluto na coordenação dos processos de trabalho, baseado na automação de vários grupos de trabalhadores, aparentemente autônomos, mas na realidade forçados a se submeterem à lógica do trabalhador coletivo" (Tronti et alii, 1982, p. 97).

Se a ação patronal encontra na organização do processo de trabalho o steady state de busca de hegemonia sobre a classe operária, esta, por sua vez, lançará sempre mão de seus instrumentos disponíveis, tais como greves e ações espontâneas no interior da fábrica - operação tartaruga, sabotagem, ludismo, etc. (Brown, 1977) como bem demonstra o quadro 5, em relação às greves no setor metalúrgico em 1983.


Desses dados, depreende-se que a resistência operária tem alcançado grandes êxitos nesse setor em Minas Gerais, pois o que se observa é que no ano de 1983 o Brasil apresentou um saldo de 429 dias e 19 h de paralisação no setor, envolvendo um contingente de 258.698 empregados, sendo que Minas Gerais foi responsável pelo maior número de dias parados, logo após São Paulo, o que bem demonstra a não-passividade do movimento sindical metalúrgico, com toda a debilidade e o "peleguismo" de dois importantes sindicatos, como o das empresas da amostra.12 12 Toda a reconstituição histórica do movimento sindical metalúrgico em Minas Gerais, principalmente a explicação para o anacronismo do movimento operário no Vale do Aço, está no estimulante trabalho de Muniz, Reynaldo Maia. A Estrutura Sindical brasileira e suas repercussões no setor metalúrgico de Minas Gerais; 1960-83. Belo Horizonte, Face/UFMG, 1984. mimeogr.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Brito, José C.A. A Tomada da Ford: O nascimento de um sindicato livre. Petrópolis, Vozes, 1983.

Brown, G. Sabotage. London, Spokesman Bopks, 1977.

Doray, Bernard. Le Taylorisme, une folie rationnelle. Paris, Dunod, 1981.

Enriquez, Eugène. Imaginário social, recalcamento e repressão nas organizações. Revista Tempo Brasileiro, Rio de Janeiro, jan-jun. 1974.

Ford, Henry. Minha vida, minha obra. Rio de Janeiro, Brand, 1954.

Foucault, Michel. Vigiar e Punir. Petrópolis, Vozes, 1977.

Friedman, Andrew. Industry and labour, London, Mac-Millan, 1977.

Gaudemar, Jean P. L'Ordre et la production: naissance et formes de la discipline d'usine. Paris, Dunod, 1982,

Goffman, Erving. Manicômios, prisões e conventos. São Paulo, Perspectivas, 1974.

Lobos, Júlio. Sindicalismo e negociação. São Paulo, Embranews, 1982.

Maroni Amnéris. A Estratégia da recusa. São Paulo, Brasiliense, 1982.

Marx, Karl. El Capital: critica de la economia política. México, FCE, 1974.

Mepbam, John et alii, O Processo de trabalho capitalista. Rio de Janeiro, s.d. mimeogr.

Pagès, Max et alii. L'Emprise de l'organization. Paris, PUF, 1979.

• Elementos de uma teoria de poder nas organizações. Recife, NAI, 1978. mimeogr.

Prates, Antônio A.P. Burocratização e controle organizacional: o contexto da grande empresa industrial. Revista de Administração Pública, Rio de Janeiro, 15(2):112-28, abr./jun. 1981.

Schneider, M. Neurose e classes sociais. Rio de Janeiro, Zahar, 1977.

Tragtenberg, M. Mudanças na administração do trabalho. São Paulo, ABAP, 1981. mimeogr.

Tronti, M. et alii. Processo de trabalho e estratégias de classe. Rio de Janeiro, Zahar, 1982.

Weil, Simone. A Condição operária e outros estudos sobre a opressão. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1979.

  • Brito, José C.A. A Tomada da Ford: O nascimento de um sindicato livre. Petrópolis, Vozes, 1983.
  • Brown, G. Sabotage. London, Spokesman Bopks, 1977.
  • Doray, Bernard. Le Taylorisme, une folie rationnelle. Paris, Dunod, 1981.
  • Enriquez, Eugène. Imaginário social, recalcamento e repressão nas organizações. Revista Tempo Brasileiro, Rio de Janeiro, jan-jun. 1974.
  • Ford, Henry. Minha vida, minha obra. Rio de Janeiro, Brand, 1954.
  • Foucault, Michel. Vigiar e Punir. Petrópolis, Vozes, 1977.
  • Friedman, Andrew. Industry and labour, London, Mac-Millan, 1977.
  • Gaudemar, Jean P. L'Ordre et la production: naissance et formes de la discipline d'usine. Paris, Dunod, 1982,
  • Goffman, Erving. Manicômios, prisões e conventos. São Paulo, Perspectivas, 1974.
  • Lobos, Júlio. Sindicalismo e negociação. São Paulo, Embranews, 1982.
  • Maroni Amnéris. A Estratégia da recusa. São Paulo, Brasiliense, 1982.
  • Marx, Karl. El Capital: critica de la economia política. México, FCE, 1974.
  • Mepbam, John et alii, O Processo de trabalho capitalista. Rio de Janeiro, s.d. mimeogr.
  • Pagès, Max et alii. L'Emprise de l'organization. Paris, PUF, 1979.
  • Elementos de uma teoria de poder nas organizações. Recife, NAI, 1978. mimeogr.
  • Prates, Antônio A.P. Burocratização e controle organizacional: o contexto da grande empresa industrial. Revista de Administração Pública, Rio de Janeiro, 15(2):112-28, abr./jun. 1981.
  • Schneider, M. Neurose e classes sociais. Rio de Janeiro, Zahar, 1977.
  • Tragtenberg, M. Mudanças na administração do trabalho. São Paulo, ABAP, 1981. mimeogr.
  • Tronti, M. et alii. Processo de trabalho e estratégias de classe. Rio de Janeiro, Zahar, 1982.
  • Weil, Simone. A Condição operária e outros estudos sobre a opressão. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1979.
  • *
    Esse trabalho faz parte de uma pesquisa mais ampla sobre a Organização da produção no setor siderúrgico de Minas Gerais, onde se procurou analisar as formas de sujeição do trabalho ao capital, e a conseqüente resposta operária e sindical.
    O autor agradece o apoio financeiro e institucional da Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP), bem como os comentários de Marco Aurélio Rodrigues, Reynaldo Maia Muniz, Antônio Greco e Carlos Sidney Coutinho.
  • 1
    Todos os dados aqui coletados foram extraídos de uma entrevista realizada com o gerente de relações industriais em 19.10.83.
  • 2
    Entrevista realizada com o gerente de RI em 17.8.83.
  • 3
    Entrevistas realizadas com gerentes de Produção em 19.9.83 e em 4.11.83.
  • 4
    Esses "voluntários" usavam uma cruz vermelha nas golas dos uniformes, para se diferenciarem dos demais.
  • 5
    Nota-se que a linguagem é a mesma usada pelo aparelho médico e policial.
  • 6
    Sobre o cenário da luta de classes nos EUA na década de 50, é imprescindível a leitura do trabalho "Les greves sauvages de l'industrie automobile americaine. In: Castoriadis, C.
    L'Expérience du mouvement ouvrier. Paris, UGE, 1974, tomo 1.
  • 7
    "O
    desclocamento das contradições faz-se assim em duas etapas:
    a) em primeiro lugar, deslocam-se as contradições entre os trabalhadores e a organização (nível 1) através de uma política organizacional contraditória (nível 2), por sua combinação de imposições e de vantagens oferecidas aos indivíduos, que permite integrá-los aos objetivos da organização e ao mesmo tempo separá-los, impedindo a formação de coletividades autônomas de trabalhadores que se oponham à organização. As contradições dos trabalhadores permanecem latentes ou inconscientes: elas se reencontram, transformadas e absorvidas na política contraditória da organização;
    b) em segundo lugar, transformam-se as contradições da política contraditória da organização (2) em contradições psicológicas vividas pelo indivíduo (3). O indivíduo, mergulhado na organização, que o isola dos outros trabalhadores, vive uma situação contraditória da qual não compreende a origem. Ele interioriza (mais precisamente ele introjeta) as imposições e as vantagens oferecidas pela organização, as quais se transformam em angústia e em ideal, que passam a ser os dois elos fundamentais de sua estrutura inconsciente. Seus conflitos essenciais e fundamentais que são, a nosso ver, aqueles que surgem da confrontação entre o desejo e as limitações para satisfazê-lo, e da confrontação com a morte, e que aparecem cotidianamente em sua relação com os outros (pois a relação com os outros se constrói na defrontação com seus próprios limites) encontram-se profundamente transformados pela organização. A defrontação com a morte, que permite o conflito produtivo e os conflitos nas relações com os outros, transforma-se ao contato com uma organização todo-poderosa e ameaçadora em angústia de morte inconsciente, quer dizer, em uma ameaça de destruição inconsciente e permanente. Os conflitos que nascem dos desejos espontâneos do indivíduo, de suas relações com os outros, são então repelidos, pois fazem pairar sobre o indivíduo uma ameaça insustentável. Ao mesmo tempo, a organização propõe uma saída ao conflito sob a forma de uma identificação a um ideal agressivo, da identificação a si própria e suas finalidades, que constitui uma defesa contra o conflito repelido. O indivíduo nesta situação vive um conflito perpétuo com a organização, ele se sente ao mesmo tempo ameaçado e assegurado por ela, feliz e infeliz, cheio de satisfações e aprisionado, livre e drogado" (Pages et alii, 1978, p 21 e 22).
  • 8
    Em São Paulo, no ano de 1978, por ocasião da greve na Villares, que tinha mais ou menos 2.500 operários na época, foi adotada a seguinte estratégia: "Cada mestre chamava os operários um por um e lhes dizia o seguinte: que o nome dos integrantes da comissão já estava no SNI, em Brasília; para pôr medo no pessoal diziam também que os operários não podiam fazer greve, porque era contra a lei; que a empresa não podia dar aumento porque o governo não autorizava (...). Com isso 'eles' esperavam quebrar o movimento, e o movimento acabou por se dividir mesmo" (Maroni, 1982, p. 53).
  • 9
    Na leitura de vários números do jornal
    Em Tempo, nos anos de 1978-79, conseguimos sistematizar as seguintes estratégias gerenciais do setor siderúrgico, de Minas Gerais, em períodos de greve:
    1. Antecipar o horário de entrada de turno dos operários, com a finalidade de esvaziar a assembléia da categoria.
    2. Abrir vagas para operários e fazer as inscrições dentro da fábrica (chantagem psicológica), para lembrar aos operários que se fossem à greve poderiam ser demitidos.
    3. Publicar boletins sobre a crise internacional, índices de desemprego no país, os interesses recíprocos entre patrões e empregados, a necessidade do diálogo e da moderação dos dirigentes sindicais.
    4. Elaborar listas negras e fazê-las circular entre as grandes empresas do setor.
    5. Eleger uma comissão de representantes de uma determinada empresa com a diretoria desta, a fim de se formar uma "comissão de negociação".
    6. Julgar o dissídio coletivo na respectiva Delegacia Regional do Trabalho (DRT).
    7. Incitar os operários à greve, quando uma determinada empresa está com o nível de estoque elevado e com problemas de abastecimento de insumos.
    8. Ameaçar supervisores e contramestres.
    9. Demitir as principais lideranças do movimento.
    É interessante observar também que a "participação dentro das fábricas estaria ocorrendo de forma tão acelerada que o medo de represálias por pertencer a uma comissão estaria desaparecendo. Os membros das comissões da Volkswagen e da Ford usam camisetas com identificação no peito, que facilitam seu reconhecimento pelos colegas de trabalho. Na Ford, por exemplo, seus 20 integrantes reúnem-se por setores duas vezes por semana - às terças e sextas-feiras - com cerca de 50 empregados, em média, que fazem parte dos chamados "grupos de apoio". Além disso, reúnem-se uma vez por mês com a diretoria da empresa, e a qualquer momento podem convocar reuniões amplas com todos os empregados" (
    Isto É, 6 abr. 1983).
  • 10
    Hirata, H.
    Firmas multinacionales en Brasa: tecnologias y organización del trabajo. México, UNAM, 1981, mimeogr.; Montmollin, M. Taylorisme et antitaylorisme,
    la: Sociologie du Travail, Paris, Éditions du Seuil, (4), oct.-déc. 1974; Thorsrud, É. La democratization du travail et le processus de transformation de l'organization. In:
    Sociologie du Travail, Paris, Éditions du Seuil, (3), juin-sept. 1975; Weil, R. Formes nouvelles d'organization du travail dans i'enterprise automobile européene. In:
    Sociologie du Travail, Paris, Éditions du Seuil, (1), jan-mars 1976; Durand, C. Les politiques patronales d'enrichissement des tâches. In:
    Sociologie du Travail, Paris, Éditions du Seuil, (4), oct.-déc. 1974; Chave D. Neotaylorisme ou autonomie ouvrière? Reflexions sur trois experiences de reorganization du travail. In:
    Sociologie du travail, Paris, Éditions du Seuil, (1), jan-mars 1976.
  • 11
    Tragtenberg, M. Ainda sobre os círculos de controle de qualidade. In.
    Folha de São Paulo, 27 e 28 jul. 1982.
  • 12
    Toda a reconstituição histórica do movimento sindical metalúrgico em Minas Gerais, principalmente a explicação para o anacronismo do movimento operário no Vale do Aço, está no estimulante trabalho de Muniz, Reynaldo Maia.
    A Estrutura Sindical brasileira e suas repercussões no setor metalúrgico de Minas Gerais; 1960-83. Belo Horizonte, Face/UFMG, 1984. mimeogr.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      26 Jun 2013
    • Data do Fascículo
      Set 1984
    Fundação Getulio Vargas, Escola de Administração de Empresas de S.Paulo Av 9 de Julho, 2029, 01313-902 S. Paulo - SP Brasil, Tel.: (55 11) 3799-7999, Fax: (55 11) 3799-7871 - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: rae@fgv.br