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Otimização da relação produto-mercado

ARTIGOS

Otimização da relação produto-mercado* * Traduzido do original em espanhol por Fernando Arantes Vieira

Alberto Levy

Doutor em ciências econômicas, Universidade de Buenos Aires

O método mais organizado para analisar o funcionamento da área de comercialização, e, por conseguinte, os processos de otimização da relação produto-mercado, é o da teoria dos sistemas de ação, que consiste em duas etapas: a primeira baseada no enfoque fenomenalista ou da caixa negra, onde se descreve um acondicionamento dos outputs ou saídas, pelos inputs ou entradas, em função de um mecanismo interno ou operador. No nosso caso, esse operador é o complexo de procedimentos da tomada de decisões.

A segunda etapa baseia-se no enfoque denominado mecanicista, que consiste na análise do funcionamento interno do dito operador, seu tratamento da entrada input, que consistirá em informação, recursos, etc., e seu conseqüente desenho de um output em função de determinados objetivos e metas operativas.

A restrição fundamental consiste em que o modelo seja a interpretação mais aproximada possível de seu correlato real. É a restrição de isomorfismo com a situação empírica. Portanto, tal interpretação deve procurar levar em consideração todas as variáveis que intervenham na situação empírica, variáveis que podem ser classificadas como independentes, dependentes e parâmetros (ou variáveis congeladas). O modelo apresentará, então, um esquema de relação constante entre tais variáveis.

Podemos assim, arriscar uma definição de marketing - termo que pode ser empregado como sinônimo de comercialização. Marketing é o processo decisório integrado e sistemático dirigido para o desenvolvimento constante do sistema empresa, baseado na otimização das relações produto-mercado mediante a descoberta, criação, excitação, aceleração e satisfação das necessidades do consumidor.

Vemos, por este ponto de vista, a área de marketing exercendo três tipos de funções que detalhamos na figura 1.

Se considerarmos o consumidor uma variável do contexto - como variável exógena - e as preferências deste consumidor como um atributo do mesmo, o modelo considera que uma mudança nesse atributo, ou seja, uma mudança em suas preferências, produz uma mudança no interior do sistema. Ou melhor dizendo: o contexto influi sobre o mecanismo operador do sistema que está imerso nele próprio.

Já podemos considerar a otimização da relação produto-mercado como uma adaptação permanente do sistema-empresa às mudanças produzidas fora do sistema. Isto nos fixa a característica fundamentalmente dinâmica do processo de otimização. O que implica, assim mesmo, a impossibilidade de determinar um ideal que possa ser considerado permanente.

Por outro lado, a possibilidade que tem o sistema de operar sobre o contexto, as ferramentas de que dispõe para produzir mudanças no contexto, faz com que esta restrição de adaptação não seja completamente incontrolável. As funções de preferência do consumidor - ou seja, os atributos das variáveis exógenas - podem, de algum modo, ser adaptadas às necessidades do próprio sistema.

Denominamos o nexo entre sistema e contexto de estratégia integrada de marketing. No primeiro caso, esta é desenhada como meio de adaptação ao contexto, levando em conta as variáveis ali operantes (consumidor, competência, etc); no segundo, a estratégia é construída como meio de adaptação do contexto, e de tal modo que vá influir sobre tais variáveis.

No processo de otimização da relação produto-mercado é necessário operar com dois tipos de conceitos: a diferenciação de produto e a segmentação de mercado. Por um lado, a diferenciação de produto - conceito que frutificou a teoria econômica, como resultado do trabalho de Chamberlin e Robinson - consiste na tática de adaptar os produtos que o sistema-empresa oferece, de acordo com as características que se tenham considerado como mais identificáveis às funções de preferência do consumidor nos seus respectivos mercados.

Por outro lado, a segmentação de mercado consistirá na localização daqueles segmentos de mercado cujas características de preferência tenham sido investigadas como mais compatíveis com as possibilidades de desenho do produto.

De outro modo, podemos considerar a diferenciação de produto como a adaptação do sistema ao contexto. Neste caso o produto é decidido, conceitualizado e desenhado de acordo com sua melhor adaptação (compatibilização) ao seu respectivo contexto ou mercado factível.

Em contrapartida, este é o primeiro passo no intento do controle ou redução de incerteza. Assim mesmo, podemos considerar a segmentação do mercado como a adaptação do contexto ao sistema; o procedimento consiste em localizar as diferenças relevantes no contexto, que possam ser mais bem aproveitadas pelo sistema-empresa para otimizar ou maximizar o desempenho do produto.

A primeira conclusão que pode ser extraída desta análise é que estes não são conceitos taxativamente diferentes. A otimização da relação produto-mercado será conseguida por um compromisso dentro de um espectro contínuo entre diferenciação de produto e segmentação de mercado. Isto deve ser adotado para cada variedade de produto integrante da mescla de produtos (product mix) e para cada um dos segmentos de seus respectivos mercados.

Neste ponto são necessários alguns pressupostos ou hipóteses de trabalho que determinamos a seguir.

1. A empresa é um sistema racional e adaptável. É racional porque toma decisões condicionadas com base num objetivo, e é adaptável porque controla o resultado de suas decisões avaliando e corrigindo os resultados para conseguir o objetivo.

2. Os objetivos a curto prazo são a conseqüência de uma prévia definição de um objetivo a longo prazo. Toda definição de um objetivo a curto prazo que não tenha sido encadeado para o logro do objetivo a longo prazo, é irracional e caótica.

3. O objetivo a longo prazo é o desenvolvimento contínuo.

4. O desenvolvimento é a conseqüência da sobrevivência e do progresso. Entendemos por sobrevivência a capacidade de reter poder no transcurso do tempo. Por progresso, a capacidade de incorporar conhecimentos tecnológicos, por um lado, e mercadológicos, por outro. O desenvolvimento é conseguido pela fertilização da sobrevivência com o progresso.

5. O critério operativo de decisão é a relação constante rentabilidade-risco. Isto é, um produto (inversão) será motriz de desenvolvimento se, mantendo o risco constante, contribui para maximizar a rentabilidade, ou se, mantendo a rentabilidade constante, contribui para maximizar o risco.

6. A rentabilidade e o risco somente são gerados pela relação produto-mercado.

7. A estratégia integrada de marketing é desenhada de tal forma que seja conseguido o objetivo a curto prazo (maximização da participação do mercado, do benefício, do volume de vendas, minimização de custos, etc.) que, otimizando a relação produto-mercado, permita satisfazer o critério rentabilidade-risco, que por sua vez torne possível o logro do objetivo a longo prazo (sobrevivência progresso - desenvolvimento).

Para cada elemento componente de produtc-mix é necessário determinar um mercado potencial, de tal forma que seja possível realizar a estimativa de rentabilidade esperada de cada relação produto-mercado. Esta determinação do mercado potencial é implementada pelos diversos processos de investigação de mercado, cuja discussão não compete ao propósito deste trabalho. O que importa considerar é que, qualquer que seja o processo de investigação empregado para a absorção da informação, nenhum proverá, em geral, essa informação de um marco de certeza. O risco começa a infiltrar-se na análise desde esta etapa inicial.

Dentro do mercado potencial assim definido, pode ser localizado aquele segmento que, por suas características, mais se adapta, por um lado, à relação rentabilidade-risco adotada (critério de demarcação) e, por outro, às possibilidades de diferenciação de produto, isto é, às restrições de conceituar o produto de tal forma que melhor compatiãbilize com o dito segmento e, assim, melhore a relação rentabilidade-risco.

Desta forma, vemos interagindo harmoniosamente os dois conceitos antes apresentados: a segmentação de mercado e a diferenciação de produto, orientados para a otimização da relação produto-mercado. Notamos, além disso, que o critério de demarcação rentabilidade-risco é tido em consideração nessa compatibilização de produto a mercado e de mercado a produto. Além do que, introduzimos pela primeira vez o conceito de restrições de comãpatibilização para significar as possibilidades de que a empresa dispõe (progresso tecnológico) para assumir a adaptação produto a mercado e mercado a produto (progresso mercadológico).

Por um lado, na adaptação produto a mercado, as restrições de compatibilização funcionam como a capacidade de que a empresa dispõe para incorporar, por exemplo, planta, equipamentos e tecnologia industrial, ou vantagens de distribuição física, ou características de preço, ou características de impulsão emocional para conceituar o produto de acordo com seu mercado correspondente. Por outro lado, na adaptação mercado a produto, as restrições de compatibilização funcionam como a capacidade de que a empresa dispõe para modificar, por exemplo, a lógica do consumidor, seu padrão de preferências, suas predisposições, atitudes e motivações, de forma tal que seja maximizado o índice de aceitações do produto.

A estratégia integrada de marketing (EIM) funciona como uma estrutura composta pelas quatro variantes controláveis ou subestratégias seguintes:

1. Subestratégia de produto.

2. Subestratégia de logística.

2.1. Subsubestratégia de canais de distribuição.

2.2. Subsubestratégia de administração de estoques.

2.3. Subsubestratégia de transporte.

2.4. Subsubestratégia de informação de suporte.

3. Subestratégia de impulsão.

3.1. Subsubestratégia de publicidade.

3.2. Subsubestratégia de promoção.

3.3. Subsubestratégia de venda pessoal.

4. Subestratégia de preço.

A EIM é o output ou complexo decisorio do sistema-empresa. Esta estratégia (estrutura) é recebida pelo sistema consumidor em forma de percepção, sendo também ela uma estrutura. Esta percepção estrutural é a entrada ou input do sistema consumidor. O sistema consumidor percebe tantas estruturas quantos sistemas-empresa (oponentes racionais) conseguem captar sua atenção.

Estas estruturas de percepção estarão compostas pelas diferenças que caracterizam cada uma das unidades (percepções diferentes de cada EIM oposta). Tais diferenças serão comparadas pelo consumidor e transformar-se-ão, por conseguinte, em vantagens diferenciais. Denominaremos, então, a cada onda perceptiva proveniente de cada sistema-empresa, de unidade perceptiva (UP) associada a cada EIM competitiva.

Para fins de esclarecimento, classificaremos as vantagens diferenciais em:

1. Racionais (para um determinado consumidor).

2. Emocionais (para esse mesmo consumidor, individualmente considerado).

3. Institucionais (que podem ser racionais ou emocionais, físicas ou simbólicas, mas que se referem ao sistema-empresa correspondente, e não ao produto em si).

Ao transformarem-se as EIM de cada empresa competitiva em UP (haverá uma recepção UP para cada transmissão EIM) - ou seja, o conceito tradicional da oferta o mecanismo de tomada de decisões do consumidor, em virtude de motivações conscientes ou inconscientes - selecionará ou não alguma das supraditas unidades perceptivas. Fá-lo-á com o fim de satisfazer um conjunto não-vazio de necessidades conscientes ou inconscientes. Esta seleção será (output) do sistema consumidor, o conceito tradicional de demanda.

Vamos supor que o mecanismo de tomada de decisões do consumidor funcionará com base na comparação de cada unidade perceptiva que percebe (cada input de UP) com uma unidade perceptiva ideal ou ótima (consciente e/ou inconsciente) que chamaremos UPo. Esta é para um determinado consumidor o fator de satisfação ideal ou ótimo que reúne todas as características que ele requer. Selecionará aquela UP que apresentar maior grau de compatibilidade com UPo.

Na figura 2 vemos graficamente estas relações. Na figura 3, a Zona A representa as características que um produto tem mas que o consumidor não percebe; a Zona B as características que o produto tem e a que, por sua vez, o consumidor atribui fator de satisfação ideal, e na Zona C as características que o consumidor requer mas que o produto não satisfaz.



O grau de compatibilidade de um produto "a", , vem dado pela expressão:

Cada marca (a, b, c ... n) ou seja, cada unidade perceptiva (cada transmissão de EIM) apresentará ou conseguirá uma determinada compatibilidade com a unidade perceptiva ideal (ótima) UPo ou fator de satisfação ideal. Na figura 4 representamos uma escala de avaliação (escala de preferências) do consumidor arquétipo daquele segmento do mercado incluído por todos aqueles consumidores cujas unidades perceptivas ótimas (UPo) são similares a UPo, ou seja, todos aqueles consumidores comum fator de satisfação ideal homogêneo. Este é o conceito de segmentação psicológica do mercado baseada nas diferenças que se conseguem detectar entre as estruturas que compõem diferentes fatores de satisfação ideais e não o conceito antigo de segmentação que se baseava em conceitos isolados e desconexos como ingresso, educação, classe social, idade, sensibilidade à publicidade, etc. Este é, em troca, um critério totalizador de segmentação estrutural e sinérgico.


O valor máximo da escala (100%) é, evidentemente, o da unidade perceptiva ótima UPo, e corresponde àquele produto que satisfaça totalmente todas as características requeridas pelo fator de satisfação ideal do consumidor típico de segmento. As diversas unidades perceptivas de cada marca são ordenadas nessa escala segundo seu grau de compatibilidade. O valor mínimo da escala (0%) é o grau Cº = 0, que corresponde a um conjunto disjunto da figura 2, onde a compatibilidade é nula. Neste caso, o produto não possui nenhuma das características pelo fator de satisfação ideal do segmento (pode estar orientado para outro segmento distinto).

Na figura 5 foi mostrada a transmissão das diferentes estratégias integradas de marketing para o consumidor típico de um determinado segmento e as respectivas UP que penetram no campo sociopsicológico desse consumidor.


Entenderemos por segmentação de mercado todas as partes disgregantes do mesmo que possamos detectar como associadas a uma unidade perceptiva ótima ou fator de satisfação ideal (UPo) distinto.

Por outro lado, nossa EIM poderá ser desenhada com diferentes conceitos de produtos, logística, impulsão e preço.

No primeiro caso, a investigação de mercado otimiza a eficiência da investigação tecnológica. No segundo dá-se o inverso.

Na figura 6, concluímos graficamente nossa análise de otimização da relação produto-mercado. Segmentamos horizontalmente o mercado de acordo com as diferenças significativas entre distintos fatores de satisfação ideal ou unidades perceptivas ótimas. No sentido vertical, cada fileira representa os distintos graus de diferenciação do produto. Cada quadrículo assim determinado representará diferentes graus de compatibilidade de cada variação do produto com relação a cada variação do mercado (tudo considerado estaticamente).


A otimização da relação produto-mercado será conseguida mediante a seleção daquele quadrículo (segmento de mercado - diferenciação de produto) que otimize o objetivo a curto prazo (maximização do benefício, da participação do mercado, do volume de vendas, minimização do custo, ou qualquer outro).

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    Traduzido do original em espanhol por Fernando Arantes Vieira
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      08 Ago 2013
    • Data do Fascículo
      Mar 1978
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