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Chrónos & Kairós: o tempo nos tempos da escola

Resumos

O artigo aborda a questão dos tempos escolares. Reflete a respeito da noção de tempo e do modo como esta é constituída histórica e culturalmente. Analisa diferentes formas pelas quais passou e tem passado o tempo escolar, suas diferentes configurações e significados.

tempos escolares; jornada escolar; ciclos de aprendizagem


This paper deals with school times. It offers a reflection on timing notion and in both ways it is understood - historically and culturally. It analyses different ways schools have been submitted to and their consequent meanings and configurations.

school times; school load; learning cycles


DOSSIÊ - CULTURA E ESCOLA: SABERES, TEMPOS E ESPAÇOS COMO DIMENSÕES DO CURRÍCULO

Chrónos & Kairós: o tempo nos tempos da escola

Valéria Milena Röhrich FerreiraI; Yvelise Freitas de Souza Arco-VerdeII

IMestranda em Educação do Programa História, Política, Sociedade da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e Pedagoga da Rede Municipal de Educação de Curitiba e da Rede Estadual de Educação do Paraná. vmilena@ig.com.br

IIProfessora Adjunto IV do Setor de Educação da Universidade Federal do Paraná. Mestre em Educação na área de Currículo pela Universidade Federal do Paraná. Doutoranda em Educação do Programa História, Política, Sociedade da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. arcoverde@onda.com.br

RESUMO

O artigo aborda a questão dos tempos escolares. Reflete a respeito da noção de tempo e do modo como esta é constituída histórica e culturalmente. Analisa diferentes formas pelas quais passou e tem passado o tempo escolar, suas diferentes configurações e significados.

Palavras-chave: tempos escolares, jornada escolar, ciclos de aprendizagem.

ABSTRACT

This paper deals with school times. It offers a reflection on timing notion and in both ways it is understood - historically and culturally. It analyses different ways schools have been submitted to and their consequent meanings and configurations.

Key-words: school times, school load, learning cycles.

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1 Chrónos, que representa o tempo objetivo, cronológico, contado, aparece na mitologia como o deus grego que representa o tempo, incitado pela mãe e ajudado pelos irmãos, os titãs, castrou o pai (Urano, o céu), separando-o de sua mãe (Géia ou Gé, a terra), e tornou-se o primeiro rei dos deuses. Seu reinado era ameaçado pela profecia segundo a qual um dos seus filhos o destronaria. Chrónos então devorava todos os filhos que lhe dava sua mulher, Réia, até que esta o enganou e salvou Zeus. Este, quando cresceu, arrebatou o trono do pai e o expulsou do Olimpo, banindo-o para o lugar do tormento. Segundo a interpretação clássica, Chrónos simbolizava o tempo e por isso Zeus, ao derrotá-lo, conferira, então, a imortalidade aos deuses. (Enciclopédia Barsa, 1999).

2 Como divindades siderais, os gregos adotam Sol ou Hélios, que surge todas as manhãs do Oceano para conduzir o carro do sol, puxado por cavalos que expelem fogo pelas narinas. É irmão de Selene, deusa Lua, linda, de braços brancos, com longas asas, que percorre o céu sobre um carro para levar sua plácida luz aos homens. O Dia é anunciado pela deusa Éos, representada conduzindo o carro da luz, guiando os cavalos, com uma tocha na mão. A Noite, criatura primordial, doma os deuses e os homens submetendo-os, com o auxílio do Sono, ao repouso e à vigília.(SISSA; DETIENNE, 1990, p. 60-61)

3 O dia solar como intervalo entre duas passagens consecutivas do sol pela Terra, foi redefinido até encontrar o segundo solar médio, definido como "1/86.400 do dia solar" e hoje, com a exatidão da ciência moderna, conforme os fundamentos da Física, segundo RAMALHO et al., "um segundo é a duração de 9.192.631.770 períodos da radiação correspondente à transição entre os dois níveis hiperfinos do estado fundamental do átomo de césio 133". (RAMALHO et al., 1998, p. 480)

4 No fordismo, por exemplo, um novo tipo de sociedade deveria ser construída a partir do poder corporativo. Ao definir o dia de trabalho de oito horas a cinco dólares, Ford entendia que o trabalhador adquiria a disciplina, a alta produtividade, mas além disso dava ao trabalhador a renda e o tempo de lazer suficientes para o consumo dos produtos produzidos em massa e as corporações ficavam interessadas em fabricarem quantidades cada vez maiores. (HARVEY, 1992, p. 122)

5 Em O capital e em Teorias da mais-valia, MARX, ao analisar "o valor pelo tempo de trabalho", aponta, nas lutas dos trabalhadores das manufaturas inglesas, para a necessidade da limitação da jornada de trabalho, ao analisar a instauração, na fábrica de New-Lamark, de 10 horas diárias de trabalho. MARX indica a complexidade da lida com a questão temporal, uma vez que as condições de trabalho nas fábricas e a exploração trazem como conseqüência para o operário o embrutecimento do corpo e o esvaziamento nos cérebros. O capitalista usurpa até o tempo livre criado pelo operário para a sociedade. (MARX, 1983, p. 275)

6 No grego bíblico, há distinção nítida entre Chrónos e Kairós, em que Káiros significaria: tempo do Dom, hora da graça, da salvação; tempo propício, dia da libertação; hora da "visitação"; momento em que "o anjo passa"; dia do Senhor; shabat; jubileu. Kairós representa o tempo subjetivo, vivencial. A junção de Chrónos e Kairós é traduzida pelo poema bíblico: Tudo tem o seu tempo. (ASSMAN, 1998, p. 213)

7 Segundo FARIA FILHO e VIDAL (2000), o método individual se constituiu com um professor ensinando cada aluno individualmente em uma classe formada por vários alunos. A introdução do método mútuo, indicava a presença de um único professor que poderia dar aulas até para 1000 alunos, contando com o apoio de alunos-monitores, espaço e materiais adequados. O ensino simultâneo, por sua vez, ou seja a utilização do método misto, podia ser reconhecido como as classes de alunos, divididas segundo um mesmo nível de conhecimentos e idade dos alunos, entregues a uma professora que propõe tarefas coletivas, para as quais cada um, e todos os alunos, devem executar uma mesma atividade a um só tempo. (FARIA FILHO; VIDAL, 2000, p. 21-23)

8 Desde a década de 80, inspirados nas idéias e concretizações de Anísio Teixeira, sobre escola de tempo integral, tendo como modelo a Escola Parque da Bahia, são implantados programas e projetos especiais de atendimento aos alunos em tempo integral, como o Centro Integrado de Educação Pública - CIEP, no Rio de Janeiro, o Programa de Formação Integral à Criança - Profic, em São Paulo, a Escola de Tempo Integral - ETI, em Curitiba, o Projeto Curumim, em Minas Gerais, o Centro de Educação Integral - CEI, em Curitiba, o Centro Integrado de Apoio à Criança - CIAC, convertidos em Centro de Atenção Integral à Criança e ao Adolescente - CAIC, em nível nacional, bem como outros programas em diferentes municípios e estados do Brasil, todos com o objetivo de dar assistência ampla à infância, além da escolarização fundamental.

9 O problema da repetência é recorrente na educação brasileira, tendo seu índice oscilando entre 60% e 50% nas estatísticas educacionais referentes à passagem da 1.ª para a 2.ª série do ensino fundamental durante 40 anos: de 1940 a 1980. (BARRETO; MITRULIS, 1999, p. 28)

10 Ibid., p. 29.

11 Recomendações de ALMEIDA JÚNIOR em Congresso de 1956 sobre: "Repetência ou promoção automática?" (BARRETO; MITRULIS, 1999, p. 30)

12 BOURDIEU já apontava para esta questão afirmando que o habitus consiste em "...sistema de disposições duradouras e transferíveis, estruturas predispostas a funcionarem como estruturantes, ou seja, como princípios geradores e organizadores de práticas e de representações que podem estar objetivamente adaptadas ao seu fim, sem supor a busca consciente de fins e o domínio expresso das operações necessárias para alcançá-los, objetivamente 'reguladas' e 'regulares', sem ser o produto da obediência a regras e, ao mesmo tempo, coletivamente orquestradas sem ser produto da ação organizadora de um diretor de orquestra." (BOURDIEU, 1975, p. 92)

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    05 Mar 2015
  • Data do Fascículo
    Jun 2001
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