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Mobilização do legado de Pierre Bourdieu 20 anos depois: a atualidade de um debate para a educação

RESUMO

O presente artigo se propõe a discutir o legado de Pierre Bourdieu para os debates em Educação, 20 anos após seu falecimento. Inicia-se com a exposição de obras inéditas de e sobre o sociólogo, que podem auxiliar a tarefa de apropriação e utilização de seu quadro teórico de análise. Como forma de atestar a profícua utilização de seu arcabouço, realiza-se uma exposição de pesquisa inédita realizada em bases de dados que contemplam as produções de pós-graduação, tentando identificar quantitativamente e qualitativamente, teses e dissertações que referenciam o sociólogo no título, resumo ou entre as palavras-chave, predispondo que o utilizam para tecer suas argumentações e a inferência de dados produzidos empiricamente e, a partir do mesmo, constroem conhecimento em Educação. Finaliza-se o texto com a recuperação do exposto ao longo do artigo, culminando com a sustentação do argumento da imprescindível presença e das mobilizações de Bourdieu para o campo científico educacional brasileiro.

Palavras-chave:
Pierre Bourdieu; Mobilização; Atualidade; Legado; Educação

ABSTRACT

This article proposes at discussing Pierre Bourdieu’s legacy for debates in Education, 20 years after his death. It begins with exhibition of unpublished works by and about the sociologist, which can help the task of appropriation and use of his theoretical framework of analysis. As a way of attesting to the fruitful use of its framework, an exhibition of unpublished research carried out in databases that contemplate postgraduate productions is carried out, trying to quantitatively and qualitatively identify theses and dissertations that refer to the sociologist in the title, abstract or between the keywords, predisposing that the authors use it to weave their arguments and the inference of empirically produced data, and from it, build knowledge in Education. The text ends with the recovery of what was exposed throughout the article, culminating with the support of the argument of the essential presence and mobilizations of Bourdieu for Brazilian educational scientific field.

Keywords:
Pierre Bourdieu; Mobilization; Topicality; Legacy; Education

Pierre Bourdieu, 20 anos depois: legados impressos

Um comunicado do Palácio do Eliseu, residência oficial do presidente da República Francesa, em 23 de janeiro de 2002, lamentou a morte de Pierre Bourdieu afirmando que o sociólogo vivia a Sociologia como uma ciência inseparável de um engajamento. Depois de seu sepultamento no cemitério Père-Lachaise, em Paris, ao lado de nomes como Chopin, Molière, Balzac, Auguste Comte, Isadora Duncan e Jim Morrison, algumas homenagens lhe foram concedidas, com a presença de intelectuais, artistas, sindicalistas, pesquisadores, professores e anônimos. Alvo de manchetes, nos meios de comunicação, referindo-se a ele como um dos intelectuais mais influentes, um grande sociólogo, “un grand monsieur”, mas também um grande crítico da mídia, seu falecimento, entretanto, teve uma cobertura midiática menos intensa e mais localizada ao polo intelectual, diferente do que aconteceu por ocasião da morte de Jean-Paul Sartre, em 1980 (GAYON, 2020GAYON, Vincent. Décès In: SAPIRO, Gisèle (org.) Dictionnaire Internacional Bourdieu. Paris: CNRS Éditions, 2020. p. 4 - 8.).

Gayon (2020GAYON, Vincent. Décès In: SAPIRO, Gisèle (org.) Dictionnaire Internacional Bourdieu. Paris: CNRS Éditions, 2020. p. 4 - 8.) destaca que, a partir de quatro ângulos, abordando o intelectual, o sociólogo, o homem, o crítico das mídias, a imprensa de esquerda e centro esquerda, como o Libération e o Le Monde, destacaram mais a notícia do falecimento de Bourdieu que os jornais de centro-direita e direita, como o Le Figaro. O mesmo aconteceu com os canais de televisão mais comerciais, como o TF1, que consagraram um tempo mais limitado que as estações de rádio e televisão do polo cultural como a France Culture, que realizaram uma programação especial.

Agora, vinte anos depois, livros inéditos e reedições, artigos em revistas especializadas e colóquios têm sido sistematicamente lançados, assinalando com variadas formas de homenagem o marco temporal do aniversário de sua morte. Colegas de pesquisa, orientandos, estudiosos e divulgadores de sua obra, têm se dedicado a essas publicações, tanto para lhe prestar reconhecimento, como para divulgar seu quadro teórico de análise, mais útil do que nunca para tentar entender as lógicas das práticas do mundo social na contemporaneidade.

Entre outras ações, objetivando difundir seu legado, está a publicização da coleção de arquivos de Pierre Bourdieu, confiada, desde 2020 para inventário, ao GED (Grand Équipement Documentaire), no campus Condorcet, na biblioteca universitária, em Aubervilliers, França. Trata-se de uma plataforma para pesquisas com um acervo de mais de cinquenta bibliotecas e fundos documentais, contando com ampla oferta de material digital. Significa um laboratório compartilhado para pesquisas nas áreas de ciências humanas e sociais, pretendo ser o ponto de convergência entre disciplinas, recursos e pesquisadores.

Segundo o site da GED1 1 A partir de https://www.campus-condorcet.fr/fr/pour-la-recherche/le-grand-equipement-documentaire/collections-et-archives/le-fonds-pierre-bourdieu. Acesso em 29.04.2022. , a “Coleção de Bourdieu” é composta por um vasto acervo documental que abrange toda a atividade profissional de Pierre Bourdieu, desde a década de 1950 até sua morte em 2002, incluindo manuscritos originais de livros e artigos com documentação relacionada, materiais de pesquisa, materiais de cursos e seminários, notas, cartazes, relatórios produzidos para várias instituições, documentos relacionados com o trabalho editorial, bem como correspondência. No total, o fundo ocupa aproximadamente cem metros lineares de arquivos, para mais de mil dossiers, aos quais se soma uma parte significativa da biblioteca pessoal de Pierre Bourdieu. A trajetória internacional de Pierre Bourdieu e a influência de sua obra no exterior, se refletem na grande diversidade linguística e geográfica da coleção. O acesso ao acervo está sujeito à permissão da Comissão de Avaliação Científica do Fundo Pierre Bourdieu que, atualmente, é composta por nove membros: Etienne Anheim (EHESS), Jérôme Bourdieu (EHESS), Julien Duval (CNRS), Paul Pasquali (CNRS), Amín Pérez (Uqam), Franck Poupeau (CNRS), Nicolas Renahy (Inrae), Marie-Christine Rivière (Collège de France) e Gisèle Sapiro (EHESS).

Em se tratando de publicações relevantes, pode ser citado o Dictionnaire Internacional Bourdieu, sob a organização de sua colaboradora em vida, Gisèle Sapiro, lançado em 2020, ano em que Bourdieu faria 90 anos. Trata-se de um livro com aproximadamente 600 verbetes, a partir de uma abordagem pedagógica e reflexiva, escritos por uma equipe de 126 autores, vindos de 20 países, entre sociólogos, filósofos, historiadores e antropólogos. Em entrevista a Naudet e Duvoux (2021NAUDET, Jules; DUVOUX, Nicolas. Au fil du labyrinthe Bourdieu, Entretien avec Gisèle Sapiro et Franck Poupeau. 5 mars, 2021. Disponível em https://laviedesidees.fr/Au-fil-du-labyrinthe-Bourdieu.html. Acesso em 27 abril. 2021.
https://laviedesidees.fr/Au-fil-du-labyr...
), Sapiro e Poupeau, organizadora e membro do comité editorial do livro, respectivamente, afirmaram que o dicionário visa evitar os usos ocasionais e aleatórios dos conceitos legados por Bourdieu, intencionando também retificar uma série de mal-entendidos, mesmo distorções deliberadas que tendem a desviá-los dos significados pretendido pelo sociólogo. Para tanto, procuraram historicizar os conceitos, para reconstituir sua elaboração teórica e as possíveis inflexões que sofreram em sua obra, com base em usos empíricos. O livro poderia tornar possível, portanto, guiar o leitor nesta imensa obra e de recolocar a teoria no diálogo que manteve com as ciências humanas e sociais de seu tempo.

Já como obra inédita, cita-se L’intérêt au désintéressement, Cours au Collège de France (1987-1989) (2022) pela Editora Raison d’Agir-Seuil, que trata de suas aulas entre 1987 e 1989 no Collège de France, em que se dedicou a examinar o serviço público, abordando os funcionários, a formação de campos como o jurídico e o burocrático, ponderando que os agentes sociais nestes espaços são levados a servir, ao mesmo tempo, a seus próprios interesses, mas também ir além dos mesmos. Afirma que, se ações desinteressadas, orientadas para o universal são possíveis, é porque existe, nesses universos sociais, um interesse pelo desinteresse2 2 Esta obra encerra a iniciativa da publicação de todos os cursos de Bourdieu no Collège de France na cadeira de Sociologia, de 1982 a 2001, que também inclui: Sur LÉtat. Cours au Collège de France, 1989-1992. Paris: Raisons d’agir/Seuil, 2012 (tradução para o português: BOURDIEU, Pierre. Sobre o Estado: Cursos no Collège de France (1989-92). São Paulo: Companhia das Letras, 2014); Manet. Une révolution symbolique. Cours au Collège de France, 1998-2000. Paris: Raisons d’agir/Seuil, 2013; Sociologie générale, vol 1. Paris: Raisons d’agir/Seuil, 2015 (traduzido para o português como BOURDIEU, Pierre Sociologia Geral, vol 1: Lutas de Classificação. Curso no Collège de France (1981-1982). Petrópolis: Vozes, 2021); Sociologie générale, vol 2. Paris: Raisons d’agir/Seuil, 2016 (traduzido para o português como BOURDIEU, Pierre. Sociologia Geral, vol. 2: Habitus e Campo. Curso no Collège de France (1982-1983). Petrópolis: Vozes, 2021); Anthropologie économique. Cours au Collège de France, 1992-1993. Paris: Raisons d’agir/Seuil, 2017. Verificar também https://www.youtube.com/watch?v=Li4fw8-DIXU. Acesso em 27/04/2022. Vídeo em que um dos editores, Julien Duval, apresenta e comenta este último livro. .

Outro livro inédito e, pode-se dizer, muito aguardado pelos leitores de Bourdieu já que traz uma reconstrução póstuma do grande trabalho que ele planejou para apresentar sua teoria dos campos, é Microcosmes. Théorie des champs (2022), pela Editora Raisons d’Agir3 3 Verificar também https://www.youtube.com/watch?v=jlTiEvDGpns. Acesso em 27/04/2022. Vídeo em que um dos principais continuadores do trabalho de Bourdieu e coeditor do livro, Franck Poupeau, apresenta e comenta o mesmo. . Neste livro o sociólogo apresenta uma das dimensões mais inovadoras do seu trabalho, cujos elementos e formulações parciais são encontradas em muitas de suas obras, tanto que o livro traz uma reunião de textos já publicados, mas de forma esparsa. Não menos importante que as noções de habitus ou capitais4 4 Habitus é um conceito central na Sociologia de Bourdieu. Noção mediadora entre o individual e o coletivo, é um sistema de disposições adquirido no processo de socialização, ou seja, modos de perceber, de pensar e fazer que leva o agente a agir de determinada forma, sendo um princípio gerador de práticas. Já os capitais, os recursos ou lucros sociais, de sentido ampliado ao da economia, podem ser capital cultural (incorporado, objetivado, institucionalizado); capital social, ou conjunto de relações sociais, de sociabilidade; simbólico, crédito, reconhecimento da posse das outras formas de capital, virtude simbólica. A partir desses surgem outros, tenham sido desenvolvidos pelo próprio Bourdieu ou por comentadores. , não contava ainda com uma sistematização mais elaborada publicada. O livro aborda o campo como um instrumento de análise que é capaz de mobilizar um conjunto de domínios, ou microcosmos, componentes do cosmos social ou macrocosmo, bastante diversificados, como o Direito, a religião, o mundo acadêmico, a economia, a arte, a literatura, mostrando o que têm de particulares, mas também em comum, com lutas específicas e motes de disputa. A intenção de Bourdieu com o livro, em seu projeto, era a destacar a força operatória e a coerência teórica do conceito. Segundo os editores, para a organização da obra, levou-se em consideração as notas deixadas pelo autor, sobre seus textos originais para este fim e compilando uma coleção de seus escritos, que ele tinha a intenção de retrabalhar, como era seu hábito.

Em Bourdieu (2005BOURDIEU, Pierre. Entrevista. In: DELSAULT, Yvette. Entrevista de Pierre Bourdieu com Yvette Delsaut. Sobre o espírito da pesquisa. Tempo Social, São Paulo, v.17, n. 1, p.175-210, 2005. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S0103-20702005000100008. Acesso em: 07 jul. 2022.
https://doi.org/10.1590/S0103-2070200500...
, p. 184) lê-se que,

Na verdade, até os anos de 1980 considerei a maior parte de minhas publicações - os artigos, é claro, mas também os livros - rascunhos (...) eu sabia que recomeçaria, de maneira melhor, mais definitiva, em outro artigo ou em outro livro. Várias vezes exigi dos editores que prometessem deixar-me corrigir meu livro por ocasião da segunda edição. É o caso de L’Amour de l’art que praticamente reescrevi na segunda edição, ou de L’Esquisse d’une théorie de la pratique que, como diz o título, era apenas um esboço, que deveria ser retirado de venda quando aparecesse o livro ‘definitivo’, Le Sens Pratique (...) Estou sempre voltando aos textos, tudo é revisto, linha a linha, mudo uma palavra aqui, uma palavra ali. Por exemplo, alguém observou que, num certo momento, onde eu dizia ‘sistema’, passei a dizer ‘campo’ por ocasião de uma reedição ou de uma republicação (...) em realidade, substituir ‘sistema’ por ‘campo’ é uma mudança de teoria. Só que essas mudanças se fazem aos poucos, passo a passo, por correções sucessivas que são, na verdade, rupturas.

Os editores afirmam que o livro, desejado por seu autor e refeito sem ele, para ele, é um livro incontornável para entender o alcance do aspecto relacional de seu trabalho, completando o sistema conceitual, científico e metodológico de Bourdieu.

No índice de Microcosmes. Théorie des champs, encontram-se temas como as estruturas fundamentais dos campos; o fetichismo; o processo de autonomização; o trabalho de universalização; as disposições como princípios de ação; as relações entre os campos; a noção de campo, elementos para uma teoria geral; notas sobre os campos; além de proposições gerais precedidas de uma nota introdutória dos editores. Resta torcer para seu breve aparecimento traduzido para o português no Brasil, como tem sido a prática para muitos de seus livros ainda inéditos, que ao serem lançados no país, contemplam um número significativo de consumidores que fazem uso de seu arcabouço teórico.

Outro material de 2022, lançado pelo Raisons d’Agir, é Pierre Bourdieu, une bibliographie, de Yvette Delsaut e Marie-Christina Rivière. Segundo os editores, esta bibliografia de referência lista todos os textos (artigos, livros, relatórios, etc.) escritos por Pierre Bourdieu e quaisquer traduções que possam ter sido produzidas. Iniciado pela socióloga Yvette Delsaut, uma das primeiras colaboradoras de Pierre Bourdieu, depois continuado por Marie-Christine Rivière, associada por muito tempo à direção de seu laboratório, o livro já tinha tido uma edição que contava com um compilado até 2002 (DELSAUT; RIVIÈRE, 2002DELSAUT, Yvette.; RIVIÈRE, Marie-Christine. Bibliographie des travaux de Pierre Bourdieu. Pantin: Le Temps des Cérises, 2002.). Completado agora para anos recentes, o índice do livro descreve um prólogo que aborda o gênero bibliográfico, a parte principal do livro dedicada ao inventário dos textos, e termina com uma entrevista datada do outono de 2001, na qual Pierre Bourdieu e Yvette Delsaut questionam a lógica que inspira a bibliografia e discutem o espírito coletivo da pesquisa.

Comentando esses lançamentos, Isabelle Péradon (2022PÉRADON, Isabelle. Pierre Bourdieu: um sociologie critique et émancipatrice. Mollat, 2022. Disponível em https://www.mollat.com/dossiers/pierre-bourdieu-une-sociologie-critique-et-emancipatrice. Acesso em 29 abril. 2022.
https://www.mollat.com/dossiers/pierre-b...
, p. 01) afirma que,

Faz vinte anos que Pierre Bourdieu nos deixou. Se as últimas décadas do século XX foram marcadas pela forte personalidade do sociólogo de temperamento decidido, há que se admitir que, desde 2002, a sua obra suscitou muitas querelas paroquiais e poucas análises construtivas. As editoras Agone, Seuil e Raisons d’Agir reviveram esse pensador da dominação, cuja escrita árdua não era fácil de ler, mas cujas ideias e conceitos literalmente infundiam a sociedade (tradução livre da autoria do artigo do original em francês).

Mobilização da obra de Bourdieu na Educação: atualidade de um debate

Já entre algumas reedições de seus livros na França, destaca-se a segunda edição da obra Interventions, 1961-2001. Science Sociale & Action politique, revisada, completada e atualizada pela Editora Agone. Tendo sido lançado em 2002, a primeira edição intencionou documentar as intervenções de Bourdieu, até mesmo para desfazer o equívoco de que o sociólogo começou a se manifestar, no espaço público sobre política, a partir das greves de 1995, na França. A verdade é que, como aponta o prefácio do livro, tais intervenções estão presentes por toda a obra do autor, iniciadas nos anos 1960, na sua entrada na vida intelectual, se tornando uma reflexão constante sobre as condições sociais de existência, parte integral do seu ofício de sociólogo (POUPEAU; DISCEPOLO, 2002POUPEAU, Franck; DISCEPOLO, Thierry. Éducation & politique de l’Éducation. d’un rapport d’État à l’autre. In: BOURDIEU, Pierre. Interventions, 1961-2001. Science Sociale & Action politique. Marseille: Agone, 2002. p. 185 - 188.). Tanto na primeira edição como agora, na de 2022, se trata de mostrar uma articulação entre pesquisa científica e intervenção política, a partir de uma coleção de artigos publicado em revistas não científicas, assim como intervenções orais, precedidos por uma introdução destinada a contextualizar a aparição das mesmas a partir dos eventos históricos, dos campos intelectuais e científicos e da obra do próprio Bourdieu, seguindo uma ordem cronológica que engloba sete períodos (POUPEAU, 2020).

Segundo Martinache (2022MARTINACHE, Igor. Pierre Bourdieu, Interventions. 1961-2001, Lectures (En ligne), Les comptes rendus, 14/03/2022. Disponível em http://journals.openedition.org/lectures/54955. Acesso em 29 abril. 2022..
http://journals.openedition.org/lectures...
), na antologia editorial que acompanha as homenagens póstumas que marcam o aniversário de vinte anos de falecimento de Pierre Bourdieu, essa coleção de vários textos de “intervenções” do sociólogo ao longo de quase cinco décadas, mesmo vinte anos depois da primeira edição, está, se não mais, em sintonia com a atualidade e mostra a clarividência do sociólogo. Vem também e, sobretudo, demonstrar o vínculo entre o cientista e o político, demolindo as liminares da “neutralidade axiológica” de Bourdieu, apontadas, por vezes, por leituras muito precipitadas e mal interpretadas de sua obra.

Para o comentador, Bourdieu faz críticas aos analistas políticos, ou como ele chama, os “doxósofos”, semiacadêmicos autorizados pelo campo midiático para comentar notícias políticas e, cujas observações cientificamente mal concebidas, mantêm numerosos chavões mistificadores, sendo que somente uma crítica das formas de circulação de informação, poderia impedir o desencantamento com a política. É por isso que a prioridade deve ser a conscientização crítica sobre os mecanismos de violência simbólica5 5 ⁵ Violência simbólica é um conceito cunhado por Bourdieu (2002a) para designar um tipo de violência velada, uma forma particular de constrangimento, exercida com a cumplicidade daqueles que dela são vítimas, tornando-se também vítimas de esquemas de percepção e de apreciação incorporados, a saber, vítimas da ordem socialmente estabelecida e da imposição de arbitrariedades que atendem a grupos dominantes. Extorque submissões que não são percebidas como submissões, uma vez que a forma incorporada da estrutura da relação de cominação faz com que esta relação pareça natural. extorquindo também crenças socialmente inculcadas. Repousa, portanto, em uma teoria da produção da crença, aspecto responsável pela convicção do pertencimento a um campo social. que operam na política. Por meio de suas intervenções, Pierre Bourdieu defendeu a necessidade de politizar as coisas cientificando-as e, assim, pensar a política sem pensar politicamente (MARTINACHE, 2022MARTINACHE, Igor. Pierre Bourdieu, Interventions. 1961-2001, Lectures (En ligne), Les comptes rendus, 14/03/2022. Disponível em http://journals.openedition.org/lectures/54955. Acesso em 29 abril. 2022..
http://journals.openedition.org/lectures...
, p. 02). Para Poupeau e Discepolo (2002POUPEAU, Franck; DISCEPOLO, Thierry. Éducation & politique de l’Éducation. d’un rapport d’État à l’autre. In: BOURDIEU, Pierre. Interventions, 1961-2001. Science Sociale & Action politique. Marseille: Agone, 2002. p. 185 - 188., p. 08), organizadores do livro anterior e desta nova edição,

a gênese de um modo específico de intervenção política que se traça: ciência social e ativismo, longe de se oporem, podem ser concebidos como duas faces de uma mesma realidade social para auxiliar sua transformação. A trajetória ilustrada pelos textos desta coletânea mostra como a própria sociologia é enriquecida pelo compromisso político e pela reflexão sobre as condições desse compromisso.

A capa do livro6 6 ⁶ A partir de https://agone.org/livres/interventions-1961-2001-2. Acesso em 29/04/2022. retrata Pierre Bourdieu fotografado por Jean François Campos na Gare de Lyon, em 12 de dezembro de 1995, ao lado de grevistas que se opunham à reforma da Previdência e ao sistema previdenciário liderado pelo governo de Alain Juppé, na presidência de Jaques Chirac. Segundo Catani (2017CATANI, Afrânio Mendes. Interventions, 1961-2001. Science Sociale & Action politique. In: CATANI, Afrânio Mendes; NOGUEIRA, Maria Alice; HEY, Ana Paula; MEDEIROS, Cristina Carta Cardoso de. Vocabulário Bourdieu. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2017. p. 239 - 240., p. 44), “Bourdieu acompanhou de perto o conjunto de manifestações de rua ocorridos na França em dezembro de 1995 e, na ocasião, fez brilhante intervenção na Gare de Lyon (‘Contra a destruição de uma civilização’), posteriormente incluída em seu livro Contrafogos: táticas para enfrentar a invasão neoliberal (1998)”.

Sublinhado por Catani (2017CATANI, Afrânio Mendes. Interventions, 1961-2001. Science Sociale & Action politique. In: CATANI, Afrânio Mendes; NOGUEIRA, Maria Alice; HEY, Ana Paula; MEDEIROS, Cristina Carta Cardoso de. Vocabulário Bourdieu. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2017. p. 239 - 240., p. 43), uma simples consulta a este livro (se referindo à edição de 2002, publicada poucos meses após a morte de Bourdieu, mas que iniciou com a colaboração do mesmo, com sugestões, em 1999), “uma súmula de seu engajamento em distintos movimentos sociais franceses e estrangeiros, revela a intensidade e a contundência de seu pensamento”.

Como afirma Catani (2017CATANI, Afrânio Mendes. Interventions, 1961-2001. Science Sociale & Action politique. In: CATANI, Afrânio Mendes; NOGUEIRA, Maria Alice; HEY, Ana Paula; MEDEIROS, Cristina Carta Cardoso de. Vocabulário Bourdieu. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2017. p. 239 - 240., p. 240), “apesar da presença internacional de uma obra amplamente comentada e discutida, o livro privilegiou a dimensão francesa das intervenções e das polêmicas que por vezes suscitara”. A partir da característica transnacional da obra de Bourdieu, se destacam aqui as contribuições do texto para os debates atuais em Educação, tema constante e continuado do sociólogo. Se a ideia é renovar as leituras e considerações de Bourdieu para vários microcosmos, o campo educacional pode ganhar na recuperação de elementos que auxiliem pensar, de forma crítica, as dimensões históricas, teóricas e sociais que impactam tal espaço social.

No primeiro bloco de textos dedicados à Educação, destaca-se a discussão, feita por Bourdieu (2002bBOURDIEU, Pierre. Retour sur la réception des Héritiers et de La Reproduction. In: BOURDIEU, Pierre. Interventions, 1961-2001. Science Sociale & Action politique. Marseille: Agone, 2002b. p 73 - 77.), sobre a recepção de Os Herdeiros (1964) e A Reprodução (1970) em que avalia que, o primeiro livro, apesar de não dizer nada de tão extraordinário, uma vez que os fatos eram conhecidos pela comunidade científica, foi como um “trovão no céu político” (BOURDIEU, 2002bBOURDIEU, Pierre. Retour sur la réception des Héritiers et de La Reproduction. In: BOURDIEU, Pierre. Interventions, 1961-2001. Science Sociale & Action politique. Marseille: Agone, 2002b. p 73 - 77., p. 73), revelando os mecanismos que estavam fundamentando o que se observava empiricamente.

Falando do segundo livro, o autor afirma que o termo “reprodução” teve um efeito catastrófico, pois o termo circulou, mas nem todos leram o livro. Se por um lado se tornou um paradigma segundo o qual se identificava a contribuição do sistema escolar na reprodução da estrutura social, mostrando uma realidade que sacode as estruturas mentais e que pode mudar a visão do mundo, por outro lado bloqueou a leitura do texto. Sobre isso comenta que “a história da literatura mostra muito bem que o que é comum à vida intelectual de uma época é na maioria das vezes, não o conteúdo dos livros, mas seus títulos” (BOURDIEU, 2002bBOURDIEU, Pierre. Retour sur la réception des Héritiers et de La Reproduction. In: BOURDIEU, Pierre. Interventions, 1961-2001. Science Sociale & Action politique. Marseille: Agone, 2002b. p 73 - 77., p. 75). Assim, realizou-se um “cordão sanitário” (BOURDIEU, 2002b, p. 77) para anular, ou no mínimo neutralizar, os efeitos da mensagem que mostrava que o sistema de ensino exercia efeitos conservadores, sendo que anteriormente era considerado um sistema que proporcionava o aprendizado da cultura universal. Mesmo hoje em dia, quase sessenta anos após a publicação de Os Herdeiros e mais de cinquenta anos da publicação de A Reprodução, a defesa do sistema escolar continua a postos, esquecendo, ou não querendo lembrar que “é porque se conhecem as leis da reprodução, que se tem uma pequena chance de minimizar a ação reprodutora da instituição escolar” (BOURDIEU, 2002b, p. 77).

A polêmica em torno das duas publicações é compreensível, segundo Bourdieu (2002bBOURDIEU, Pierre. Retour sur la réception des Héritiers et de La Reproduction. In: BOURDIEU, Pierre. Interventions, 1961-2001. Science Sociale & Action politique. Marseille: Agone, 2002b. p 73 - 77.), por dois motivos. O primeiro é que os leitores dos trabalhos de Sociologia têm a tendência de ler tais textos em uma perspectiva normativa. O segundo motivo seriam os interesses e o investimento no sistema escolar feito especialmente pelos chamados “miraculados” (BOURDIEU, 2002bBOURDIEU, Pierre. Retour sur la réception des Héritiers et de La Reproduction. In: BOURDIEU, Pierre. Interventions, 1961-2001. Science Sociale & Action politique. Marseille: Agone, 2002b. p 73 - 77., p.7 3), ou seja, os raros afortunados vindo dos meios populares que conseguiram obter certo sucesso escolar e que, em vez de questionar o fato de serem exceções e tentar descobrir o que os distingue da maioria dos estudantes, observando os dados factuais das probabilidades objetivas de sucesso escolar segundo a origem social7 7 Para Chauviré e Champagne (2004) esses dados não são mais novidade para ninguém e se tornaram até parte de uma interpretação do senso comum, mas, até os anos 1960, estavam disfarçados pela ideologia do dom. A explicação de que as desigualdades de sucesso escolar residem na existência de “handicaps culturais”, teve um longo processo de reconhecimento, confrontando-se com a ideologia naturalística do dom. , teriam mais dificuldade em aceitar tal discurso anti demagógico e embasado em análises sociológicas. Discorrendo sobre esses indivíduos, o autor destaca que “aqueles que a escola liberou são os que, mais que os outros, estão inclinados a crer na escola libertadora. Alienados por sua liberação, eles têm fé na escola libertadora a serviço da escola conservadora que deve ao mito da escola libertadora, uma parte de seu poder de conservação” (BOURDIEU, 2002c, p.49).

Outro texto importante é o que comenta as Proposições para o ensino do futuro8 8 Tanto o texto “Proposições para o ensino do futuro: relatório do Collège de France (1985)”, quanto o texto “Princípios para uma reflexão sobre os conteúdos do ensino: relatório Bourdieu-Gros (1989)” foram traduzidos para o português e podem ser encontrados no livro VALLE, Ione Ribeiro; SOULIÉ, Charles. Pierre Bourdieu: uma sociologia ambiciosa da educação. Florianópolis: Editora da UFSC, 2019. (BOURDIEU, 2002dBOURDIEU, Pierre. Propositions pour l’enseignement de l’avenir. In: BOURDIEU, Pierre. Interventions, 1961-2001. Science Sociale & Action politique. Marseille: Agone, 2002d. p. 199 - 202.). Pierre Bourdieu foi eleito para o Collège de France como professor titular da cadeira de Sociologia, proferindo sua aula inaugural em 23 de abril de 1982. Em 13 de fevereiro de 1984, François Mitterrand, então presidente da França, solicitou aos professores do Collège de France que refletissem sobre o que poderia vir a ser, segundo eles, os princípios fundamentais do ensino do futuro. O documento de 1985, elaborado pelos professores, tinha a discussão de nove proposições, a saber: 1) a unidade da ciência e a pluralidade das culturas; 2) a diversificação das formas de excelência; 3) a multiplicação das chances; 4) a unidade na e pelo pluralismo; 5) a revisão periódica dos saberes ensinados; 6) a unificação dos saberes ensinados; 7) uma Educação sem interrupções e alternada; 8) o uso de técnicas modernas de Educação; 9) abertura na e para a autonomia (BOURDIEU, 2002d).

Em uma entrevista para Jean-Pierre Salgas em 1985, Bourdieu (2002eBOURDIEU, Pierre. Le rapport du Collège de France: Pierre Bourdieu s’explique. In: BOURDIEU, Pierre. Interventions, 1961-2001. Science Sociale & Action politique. Marseille: Agone, 2002e. p. 203 - 210.) declara que não existe reposta para uma questão que não implique numa redefinição da questão e que a questão nem sempre será respondida como se poderia esperar. Mesmo assim o sociólogo francês louva a iniciativa de solicitar a uma instituição como o Collège de France para que trate sobre a problemática do funcionamento do sistema escolar, enquanto um ato político importante pelo reconhecimento desta autonomia do campo intelectual. O texto, portanto, expressa uma coletividade autorizada, diz Bourdieu (2002g), não sendo uma produção só sua, já que a partir de suas análises sociológicas, não realiza um discurso normativo. Cita inclusive como exemplo seu livro “A Reprodução” afirmando: “Nós não dizíamos que a escola produzia ou reproduzia as desigualdades. Nós dizíamos que ela contribuía para reproduzi-las de certa maneira. É esta maneira, quem sabe, que é possível de controlar” (BOURDIEU, 2002eBOURDIEU, Pierre. Le rapport du Collège de France: Pierre Bourdieu s’explique. In: BOURDIEU, Pierre. Interventions, 1961-2001. Science Sociale & Action politique. Marseille: Agone, 2002e. p. 203 - 210., p. 205).

Para o sociólogo as duas contribuições principais do sistema escolar para a reprodução são o efeito de veredicto e o efeito de hierarquização. O primeiro age como um efeito de destino que rotula o indivíduo afirmando o que ele é e o que pode se tornar. A situação é grave quando se pensa que o veredicto é sancionado por uma instituição indiscutível, reconhecida por todos. Isto causa “traumatismos de identidade” (BOURDIEU, 2002eBOURDIEU, Pierre. Le rapport du Collège de France: Pierre Bourdieu s’explique. In: BOURDIEU, Pierre. Interventions, 1961-2001. Science Sociale & Action politique. Marseille: Agone, 2002e. p. 203 - 210., p. 205) que são sem dúvida um dos grandes fatores constituintes dos quadros patológicos encontrados na sociedade. Segundo Bourdieu (2002gBOURDIEU, Pierre. Instituer efficacement l’attitude critique. In: BOURDIEU, Pierre. Interventions, 1961-2001. Science Sociale & Action politique. Marseille: Agone, 2002g. p. 470 - 475.), falando da função do professor, “pode-se perguntar se um dos charmes desta profissão desvalorizada não reside na possibilidade que ela oferece de dispensar os veredictos, ou seja, ser Deus Todo Poderoso, sê-lo para trinta pessoas” (BOURDIEU, 2002e, p. 205).

Assim, como comentam os organizadores e apresentadores dos textos de Pierre Bourdieu em Interventions, 1961-2001. Science Sociale & Action politique, o envolvimento de Pierre Bourdieu nas “Proposições para o ensino do futuro”, constitui a ocasião de colocar em prática um envolvimento ligado à posição de “herético consagrado” (POUPEAU; DISCEPOLO, 2002POUPEAU, Franck; DISCEPOLO, Thierry. Éducation & politique de l’Éducation. d’un rapport d’État à l’autre. In: BOURDIEU, Pierre. Interventions, 1961-2001. Science Sociale & Action politique. Marseille: Agone, 2002. p. 185 - 188., p. 185). Destas proposições, o meio pedagógico parece ter prestado atenção às críticas da “indiferença às diferenças” (POUPEAU; DISCEPOLO, 2002, p. 185), mas o documento, bem mais abrangente, visava “preconizar a valorização das experimentações científicas e artísticas, o desenvolvimento de disposições críticas, a instauração de um ‘mínimo comum’, a revisão periódica dos saberes ensinados, o direito à Educação para todas as faixas etárias, bem como o uso de técnicas modernas de difusão...” (POUPEAU; DISCEPOLO, 2002, p. 185).

Mesmo que Bourdieu, segundo Poupeau e Discepolo (2002POUPEAU, Franck; DISCEPOLO, Thierry. Éducation & politique de l’Éducation. d’un rapport d’État à l’autre. In: BOURDIEU, Pierre. Interventions, 1961-2001. Science Sociale & Action politique. Marseille: Agone, 2002. p. 185 - 188.), tenha se mostrado bastante crítico com relação ao uso que foi feito desse relatório, o sociólogo aceita presidir com François Gros em 1989, uma comissão sobre os conteúdos de ensino, instalada por Lionel Jospin, Ministro da Educação do governo de Michel Rocard. O documento denominado de “Princípios para uma reflexão sobre os conteúdos de ensino”, chamado popularmente de “Relatório Bourdieu-Gros”, se propunha a proceder a uma revisão dos saberes ensinados no sentido de reforçar a coerência e a unidade destes saberes e as condições de sua transmissão. Mais uma vez, longe de deixar de lado a sua Sociologia crítica para acomodar-se a uma ação teórico-reformadora, o trabalho de Bourdieu e seus colaboradores era o de questionar a porção das desigualdades do sistema de ensino que era possível corrigir, deixando em suspensão o que o sistema de ensino ainda não conseguia lidar. A missão não era a de interferir diretamente na definição dos programas, mas desenhar orientações gerais da transformação progressiva dos conteúdos de ensino.

O documento trazia sete princípios que giravam em torno do questionamento periódico dos programas para inclusão de novos conteúdos; da aplicabilidade dos ensinamentos propostos que deveriam oferecer modos de pensar, de validade e aplicabilidade gerais; abertos, leves e revisáveis os programas deveriam ser elaborados com a colaboração dos professores como um quadro e não como uma camisa de força; o exame crítico dos conteúdos deveria conciliar duas variáveis, sua exigibilidade e sua transmissibilidade; para o melhor rendimento do saber e diversificação das formas de comunicação pedagógica, sugeria-se o trabalho em grupos de professores de especialidades diversas, seja para tarefas coletivas, seja para realizar observações e laboratórios; dever-se-ia também repensar as divisões das disciplinas e buscar o equilíbrio e a integração entre as diferentes especialidades.

Para Bouveresse (2003BOUVERESSE, Jacques. Bourdieu, savant & politique. Marseille: Agone, 2003.), Bourdieu se deixou implicar nesta comissão por nunca ter renunciado à sua intenção de mudança, presente desde a época de Os Herdeiros, provando com suas intervenções nesses estudos, sua crença otimista nas possibilidades de reformar o sistema de ensino de uma maneira inteligente e suscetível de melhorar realmente. Já o próprio Bourdieu (2002f) afirma que, por uma vez, um corpo constituído de sábios reconhecidos, recebeu um mandato do poder político para se ocupar de seus próprios assuntos, pois normalmente sentia que os homens políticos só gostam dos sábios mortos. Serviam-se de seus trabalhos para justificar medidas que não tinham nenhuma relação com suas pesquisas e, como se tivessem sido produzidos por um autor do passado, não lhes ocorria perguntar sua opinião.

Apropriações de Bourdieu no campo científico educacional brasileiro: interpretação e utilização de uma herança

Em artigo anterior, que fez parte do marco dos 10 anos de falecimento de Bourdieu, Medeiros (2013MEDEIROS, Cristina Carta Cardoso de. Bourdieu, 10 anos depois. Educar em revista, Curitiba, nº. 47, p. 315-328, 2013.) realizou um recenseamento de teses e dissertações que utilizaram o sociólogo na produção científica em Educação, a partir de dados empíricos produzidos com a localização de resumos de teses e dissertações defendidos em Programas de Pós-Graduação em Educação no Brasil, com o descritor mais direto “Bourdieu”, no banco de teses e dissertações da CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior). Na ocasião, foram localizados, nos anos de 2007 até 2010, 301 produções, defendidas em Programas de Pós-Graduação em Educação (225 dissertações e 76 teses). A fim de continuar tal inventário, se procedeu a uma nova investigação, na mesma base de dados, utilizando como recorte temporal os anos de 2011 a 2022.

Em produção de dados feita em 02 de maio de 2022, a partir do descritor “Bourdieu”, se obteve 5437 resultados, no banco de teses e dissertações da Capes. Refinando, a partir de parâmetros tais como tipo (mestrado e doutorado), ano (de 2011 a 2022), grande área de conhecimento (Ciências Humanas) área de conhecimento (Educação), área de avaliação (Educação), chegou-se a 1194 produções, 753 dissertações de mestrado e 441 teses de doutorado, que continham o termo “Bourdieu”. Percebe-se assim um crescimento exponencial no número de trabalhos localizados, em relação ao encontrado na pesquisa feita por Medeiros (2013MEDEIROS, Cristina Carta Cardoso de. Bourdieu, 10 anos depois. Educar em revista, Curitiba, nº. 47, p. 315-328, 2013.).

Como critério de inclusão e exclusão, no intuito de conseguir examinar mais detalhadamente as produções de pós-graduação, aplicou-se como filtro o parâmetro segundo o qual só permaneceriam no corpus da pesquisa textos orientados por indivíduos que tivessem cinco ou mais orientações vinculadas, uma vez que se prospecta assim a existência de nichos de pesquisa ou centros produtores (MEDEIROS, 2013MEDEIROS, Cristina Carta Cardoso de. Bourdieu, 10 anos depois. Educar em revista, Curitiba, nº. 47, p. 315-328, 2013.), que utilizem o autor em prevalência para argumentações e análises, ao contrário de uma utilização esporádica, que poderia se tratar de uma opção do discente autor do trabalho. Após a aplicação deste filtro, dos 657 orientadores, permaneceram para o exame, 295 produções (180 dissertações de mestrado e 115 teses de doutorado), que citaram Bourdieu, seja no título, no resumo ou nas palavras-chave, partindo do pressuposto que, a partir destes critérios, se alcançariam textos que demonstravam um maior comprometimento com a utilização do autor, orientadas por 38 professores de Programas de Pós-Graduação em Educação.

Os trabalhos foram catalogados para a realização da primeira etapa da análise, identificando título, programa de defesa, ano de defesa, produções de mestrado ou doutorado. No Gráfico 1 abaixo, é possível verificar a quantidade de trabalhos defendidos por ano. Ressalta-se que não se trata do número total de defesas por ano com o descritor “Bourdieu” e sim o número obtido pelo critério de inclusão e exclusão. Verifica-se, na exposição, uma elevação vultuosa das defesas por ano, dentro dos parâmetros utilizados. O número de defesas em 2020, 2021 pode ter ocorrido de forma mais esparsa, em hipótese, por conta da situação da pandemia de Covid-19 e seu impacto nas pós-graduações, alterando o fluxo discente. As produções de 2022, ano em curso, ainda estão sendo defendidas e em processo de depósito.

GRÁFICO 1
produções defendidas por ano.

Com relação aos centros produtores (MEDEIROS, 2013MEDEIROS, Cristina Carta Cardoso de. Bourdieu, 10 anos depois. Educar em revista, Curitiba, nº. 47, p. 315-328, 2013.), ou seja, programas responsáveis por trabalhos que utilizam o quadro teórico de análise de Bourdieu para a construção das pesquisas, verifica-se no Gráfico 2 as instituições que mais defenderam teses ou dissertações, destacando-se a PUCSP, PUC GOIÁS e a PUCPR. Logo em seguida, em termos de número de defesas por programas, sublinha-se a UFSM, UEPG, UFS e UFPR. Se forem comparados esses dados com os obtidos no artigo de Medeiros (2013MEDEIROS, Cristina Carta Cardoso de. Bourdieu, 10 anos depois. Educar em revista, Curitiba, nº. 47, p. 315-328, 2013.), se pode perceber a permanência de alguns programas em um grupo de regularidade de produções que utilizam o quadro sociológico de Bourdieu. Em contrapartida, percebe-se que alguns programas passaram a fazer parte deste grupo, que possui tal utilização de forma mais sistemática, assim como outros que começam a apresentar indícios de certa assimetria e rarefatibilidade, como é o caso da UFMG e da USP que nem aparece no gráfico e que antes compunha um espaço importante dos centros produtores de 2013. Em um futuro nível de análise pode-se realizar um cruzamento de dados entre os nomes dos orientadores e das orientadoras, suas produções em artigos, livros e outros, além de grupos de pesquisa que coordenam, para tentar identificar o fator preponderante que favoreceu a produção de textos que se utilizaram dos conceitos e noções de Bourdieu.

GRÁFICO 2
Produções defendidas nos ppges.

Partindo para outro padrão de análise, foi possível detectar que, das produções verificadas, muitas já trazem o nome de Bourdieu ou bourdieusiana (forma de análise) no título. Nomina-se seu conceito de habitus e se referem a disposições (como em atitudes/princípios inconscientes de ação, de percepção e de reflexão), sendo que a maior parte dos trabalhos intencionou investigar o habitus docente/professoral e estudantil. Como outros conceitos e noções citados, destaca-se o conceito de campo, capital cultural, a noção de trajetória e trajetória social, violência simbólica, revelando textos que indicam a produção realizada a partir de uma abordagem sociológica e a partir do uso da praxiologia de Pierre Bourdieu, lembrando que a orientação de seu método praxiológico, procura articular o plano de ação e o plano das estruturas. No Gráfico 3 abaixo, é apresentada a sistematização desses dados.

GRÁFICO 3
Conceitos, noções e termos relacionados a bourdieu utilizados nas teses e dissertações.

É interessante notar a presença do termo trajetória em várias produções. Para Brito (2017BRITO, Angela Xavier de. Trajetória In: CATANI, Afrânio Mendes; NOGUEIRA, Maria Alice; HEY, Ana Paula; MEDEIROS, Cristina Carta Cardoso de. Vocabulário Bourdieu. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2017. p. 354 - 356.), Bourdieu integra a noção aos seus principais conceitos - habitus, campo e capitais - para se referir à evolução ao longo do tempo de propriedades, tais como o volume e a estrutura do capital do agente, fornecendo um princípio explicativo de práticas e a origem das representações inerentes à posição objetivamente ocupada em determinado campo, sendo necessário para identificar tal caminho, detectar os estados sucessivos do campo e o conjunto das relações objetivas que ligam este indivíduo a este espaço social.

Por ter sido feito o filtro pela área de Educação, não foi surpresa encontrar o termo em vários títulos seguido, em número de aparições, o termo ensino, escola/escolar/escolares, práticas e uma grande incidência de trabalhos que abordaram o professor/docente/docência, assim como aspectos relacionados à formação. Como demais abordagens detectou-se alunos/estudantes/jovens/crianças, política e avaliação/aprendizagem. No Gráfico 4, na sequência, é possível ver a organização dos dados produzidos.

GRÁFICO 4
Termos relacionados à área da educação.

No exame dos resumos, também foi uma constante detectar a referência ao autor, seja como principal debatedor, para a fundamentação teórico-metodológica da investigação, a utilização de seu método de trabalho, como autor de referência para sustentar as análises a partir de seu aporte teórico, a partir de sua sociologia reflexiva, análises fundamentadas nos conceitos por ele desenvolvidos, entre outras referências, demonstrando assim que os autores das produções se valeram do construto de Bourdieu para o desenvolvimento de suas investigações, de temas bastante variáveis tais como direitos humanos e ações afirmativas, formação inicial e continuada de professores, políticas públicas e programas de governo, trajetórias estudantis e profissionais, gestão escolar, violência na escola, avaliação, desempenho escolar e juízo professoral, processos de socialização, arte, esporte, dança, entre outros, atestando as possibilidades múltiplas da utilização de seu arcabouço teórico-metodológico para a construção de conhecimento em Educação.

Como próximas ações a serem empreendidas para uma investigação qualitativa mais aprofundada, além do cruzamento dos dados, se deve concluir a leitura dos resumos na íntegra, trabalhando seus conteúdos em uma análise capaz de poder responder os aspectos da apropriação de Bourdieu, as metodologias empregadas para o desenvolvimento das teses e dissertações e principais achados das pesquisas. Como um terceiro nível de análise, podem ser selecionadas produções para leitura na íntegra, fichando seu teor e as contribuições para a exemplificação do uso do sociólogo.

O legado de Bourdieu, arremates para a mobilização

O presente artigo pretendeu sublinhar a atualidade do debate de Bourdieu no campo educacional e que seu legado continua em foco, seja a partir da publicação de material em textos inéditos, reeditados ou em sua vasta obra já propalada, além de suas participações em vídeos e entrevistas de fácil acesso em diversas plataformas.

No Brasil, estudar o autor e empregar seu quadro teórico de análise em investigações e reflexões, para pensar a educação no país, continua de fundamental importância, ainda mais em se pensando em sua veia militante e denunciadora, desvelando lógicas de práticas, mecanismos de dominação simbólica e as relações veladas de força e poder. O exemplo de suas intervenções, ligando ciência social e argumentos mobilizáveis para ação política, deve auxiliar no debate para denunciar automatismos verbais e mentais.

Pode-se muito bem aproveitar do pioneirismo de intelectuais e estudiosos que auxiliaram a divulgação da obra de Bourdieu no país. Rocha (2022ROCHA, Maria Eduarda da Mota. Uma travessia transatlântica: a primeira geração de mediadores e mediadoras da obra de Bourdieu no Brasil. Tempo Social, [S. l.], v. 34, n. 1, p. 31-53, 2022. Disponível em: https://doi.org/10.11606/0103-2070.ts.2022.191190. Acesso em: 04 maio. 2022.
https://doi.org/10.11606/0103-2070.ts.20...
, p. 31) explica essa “travessia transatlântica” do autor, o colocando no centro de uma rede científica brasileira criada em torno do sociólogo e seus colaboradores nos anos 1970 e 1980, responsável pela difusão de sua obra, ao mesmo tempo em que se buscavam respostas para problemas de campos de investigação no país. Entre os momentos decisivos da trajetória desses leitores e divulgadores pioneiros tem-se, segunda a comentadora, o processo de socialização de brasileiros no grupo de pesquisa de Bourdieu, momento de aquisição de um modus operandi de pesquisa bourdieusiano e, mais tarde, com o estabelecimento desses agentes em seus próprios programas de pesquisa e postos importantes em instituições de ensino e pesquisa, a consolidação do autor em programas de pós-graduação e centros de pesquisa, quando esse se tornava um “pensador global” (ROCHA, 2022ROCHA, Maria Eduarda da Mota. Uma travessia transatlântica: a primeira geração de mediadores e mediadoras da obra de Bourdieu no Brasil. Tempo Social, [S. l.], v. 34, n. 1, p. 31-53, 2022. Disponível em: https://doi.org/10.11606/0103-2070.ts.2022.191190. Acesso em: 04 maio. 2022.
https://doi.org/10.11606/0103-2070.ts.20...
, p. 32).

Percebe-se o quanto o legado continua profícuo, pelos números apontados nas produções de pós-graduação em Educação que utilizam o autor para realizarem suas pesquisas, números derivados de centros produtores, de nichos de pesquisa, em que se encontram legitimidade e autoridade científica, responsáveis por difundir uma lógica de apropriação do autor, formando esses autores discentes em um percurso específico. Este percurso é desenhado em uma rede de relações configurada no campo científico educacional para a formação de disposições científicas.

Para encerrar este artigo, é importante lembrar as reflexões de Grenfell (2018GRENFELL, Michael. Introdução In: GRENFELL, Michael. Pierre Bourdieu: conceitos fundamentais. Petrópolis: Vozes, 2018. p. 15 - 21.) sobre Bourdieu. Segundo o comentador, o sociólogo ofereceu conceitos e noções que ele chamava de “ferramentas para pensar” (GRENFELL, 2018GRENFELL, Michael. Introdução In: GRENFELL, Michael. Pierre Bourdieu: conceitos fundamentais. Petrópolis: Vozes, 2018. p. 15 - 21., p. 16), como conceitos-chave, que não são simplesmente termos descritivos, mas que incorporam uma epistemologia dinâmica que agem como um antídoto da linguagem cotidiana, pedindo, entretanto, aos seus leitores que mantivessem em mente a sociogênese de sua obra, ou seja, alerta que deve ser rememorada para a observação de contextos práticos reais.

Na mesma linha de advertência, Wacquant (2020WACQUANT, Loïc. Quatro princípios transversais para mobilizar Bourdieu na pesquisa. In PEREIRA, Virgílio Borges. Em (re) construção. Elementos para uma sociologia da atividade na indústria da construção em Portugal. Porto: U.Porto, 2020. p. 51 - 66.) se refere às muitas maneiras de “dividir e segmentar” a teoria sociológica de Bourdieu para seu uso, sendo importante cuidar com as capsulas pedagógicas que negligenciam a maioria do corpus de Bourdieu e que, os vieses disciplinares dificilmente tem indicado como traduzir esta teoria em projetos e operações de pesquisa prática. Se reporta, igualmente, às três armadilhas dos exploradores do sociólogo, a saber, a fetichização de conceitos (que interrompe a investigação onde a mesma deveria começar); a sedução de “falar bourdieusiano” (WACQUANT, 2020WACQUANT, Loïc. Quatro princípios transversais para mobilizar Bourdieu na pesquisa. In PEREIRA, Virgílio Borges. Em (re) construção. Elementos para uma sociologia da atividade na indústria da construção em Portugal. Porto: U.Porto, 2020. p. 51 - 66., p. 52) porque é a linguagem acadêmica do dia; e, por fim, a forçada imposição do seu quadro teórico de análise.

Em outro texto, este colaborador em vida de Bourdieu, afirma que se trata de um autor visceral, epistemologicamente anti teoricista. Dá a dica de que não se deve ler Bourdieu como a maioria é ensinada a ler os autores clássicos, como textos de escrituras sagradas a serem reverenciadas. No caso de Bourdieu isso seria um erro categórico e representaria um obstáculo para entender seu trabalho. A maneira correta seria abordar seus textos como se fossem guias de instruções para formular perguntas científicas inteligentes e fazer o difícil trabalho manual que é necessário para resolver tais perguntas empiricamente. Por fim, indica que é preciso ter atenção para não fazer parte do tsunami de pesquisas que invocam o sociólogo, restituídas em periódicos, mas que em muitos casos se limitam a realizar uma retórica que soa como Bourdieu embora não tenham conexão com sua Sociologia. Para Wacquant (2018WACQUANT, Loïc; AKÇAOĞLU, Aksu. Prática e poder simbólico em Bourdieu: a visão de Berkeley. BIB - Revista Brasileira de Informação Bibliográfica em Ciências Sociais, [S. l.], n. 85, p. 148-163, 2018. Disponível em: http://anpocs.com/index.php/current-issue/11113-pratica-e-poder-simbolico-em-bourdieu-a-visao-de-berkeley-traducao. Acesso em: 22 jul. 2022.
http://anpocs.com/index.php/current-issu...
, p. 154) se deve fazer um teste simples:

pegue uma caneta e risque todas as menções a ‘habitus, capital e campo’: se nada for perdido ao excluí-los, isso significa que nada foi ganho ao listá-los, a não ser participar do modismo intelectual do momento. A contrário, quando os conceitos e princípios analíticos de Bourdieu guiam operações concretas de pesquisa, você está imediatamente em condição de articular novas questões e pintar uma nova paisagem empírica [...].

O desafio, portanto, para Bourdieu (2002gBOURDIEU, Pierre. Instituer efficacement l’attitude critique. In: BOURDIEU, Pierre. Interventions, 1961-2001. Science Sociale & Action politique. Marseille: Agone, 2002g. p. 470 - 475.) é levar essas observações em consideração e atender ao chamado do autor para o engajamento para intervir, arriscando a se expor à decepção ou pior, a chocar aqueles que escolhem a facilidade virtuosa de só cuidar de seus interesses em sua torre de marfim e que percebem no comprometimento uma falha na neutralidade axiológica, identificada erroneamente como objetividade científica. As intervenções são fundamentais, mas agora definindo estratégias, conectando intelectuais em uma empreitada coletiva, interdisciplinar, internacional.

REFERÊNCIAS

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  • WACQUANT, Loïc. Quatro princípios transversais para mobilizar Bourdieu na pesquisa. In PEREIRA, Virgílio Borges. Em (re) construção. Elementos para uma sociologia da atividade na indústria da construção em Portugal. Porto: U.Porto, 2020. p. 51 - 66.
  • 1
    A partir de https://www.campus-condorcet.fr/fr/pour-la-recherche/le-grand-equipement-documentaire/collections-et-archives/le-fonds-pierre-bourdieu. Acesso em 29.04.2022.
  • 2
    Esta obra encerra a iniciativa da publicação de todos os cursos de Bourdieu no Collège de France na cadeira de Sociologia, de 1982 a 2001, que também inclui: Sur LÉtat. Cours au Collège de France, 1989-1992. Paris: Raisons d’agir/Seuil, 2012 (tradução para o português: BOURDIEU, Pierre. Sobre o Estado: Cursos no Collège de France (1989-92). São Paulo: Companhia das Letras, 2014); Manet. Une révolution symbolique. Cours au Collège de France, 1998-2000. Paris: Raisons d’agir/Seuil, 2013; Sociologie générale, vol 1. Paris: Raisons d’agir/Seuil, 2015 (traduzido para o português como BOURDIEU, Pierre Sociologia Geral, vol 1: Lutas de Classificação. Curso no Collège de France (1981-1982). Petrópolis: Vozes, 2021); Sociologie générale, vol 2. Paris: Raisons d’agir/Seuil, 2016 (traduzido para o português como BOURDIEU, Pierre. Sociologia Geral, vol. 2: Habitus e Campo. Curso no Collège de France (1982-1983). Petrópolis: Vozes, 2021); Anthropologie économique. Cours au Collège de France, 1992-1993. Paris: Raisons d’agir/Seuil, 2017. Verificar também https://www.youtube.com/watch?v=Li4fw8-DIXU. Acesso em 27/04/2022. Vídeo em que um dos editores, Julien Duval, apresenta e comenta este último livro.
  • 3
    Verificar também https://www.youtube.com/watch?v=jlTiEvDGpns. Acesso em 27/04/2022. Vídeo em que um dos principais continuadores do trabalho de Bourdieu e coeditor do livro, Franck Poupeau, apresenta e comenta o mesmo.
  • 4
    Habitus é um conceito central na Sociologia de Bourdieu. Noção mediadora entre o individual e o coletivo, é um sistema de disposições adquirido no processo de socialização, ou seja, modos de perceber, de pensar e fazer que leva o agente a agir de determinada forma, sendo um princípio gerador de práticas. Já os capitais, os recursos ou lucros sociais, de sentido ampliado ao da economia, podem ser capital cultural (incorporado, objetivado, institucionalizado); capital social, ou conjunto de relações sociais, de sociabilidade; simbólico, crédito, reconhecimento da posse das outras formas de capital, virtude simbólica. A partir desses surgem outros, tenham sido desenvolvidos pelo próprio Bourdieu ou por comentadores.
  • 5
    ⁵ Violência simbólica é um conceito cunhado por Bourdieu (2002a) para designar um tipo de violência velada, uma forma particular de constrangimento, exercida com a cumplicidade daqueles que dela são vítimas, tornando-se também vítimas de esquemas de percepção e de apreciação incorporados, a saber, vítimas da ordem socialmente estabelecida e da imposição de arbitrariedades que atendem a grupos dominantes. Extorque submissões que não são percebidas como submissões, uma vez que a forma incorporada da estrutura da relação de cominação faz com que esta relação pareça natural. extorquindo também crenças socialmente inculcadas. Repousa, portanto, em uma teoria da produção da crença, aspecto responsável pela convicção do pertencimento a um campo social.
  • 6
    ⁶ A partir de https://agone.org/livres/interventions-1961-2001-2. Acesso em 29/04/2022.
  • 7
    Para Chauviré e Champagne (2004) esses dados não são mais novidade para ninguém e se tornaram até parte de uma interpretação do senso comum, mas, até os anos 1960, estavam disfarçados pela ideologia do dom. A explicação de que as desigualdades de sucesso escolar residem na existência de “handicaps culturais”, teve um longo processo de reconhecimento, confrontando-se com a ideologia naturalística do dom.
  • 8
    Tanto o texto “Proposições para o ensino do futuro: relatório do Collège de France (1985)”, quanto o texto “Princípios para uma reflexão sobre os conteúdos do ensino: relatório Bourdieu-Gros (1989)” foram traduzidos para o português e podem ser encontrados no livro VALLE, Ione Ribeiro; SOULIÉ, Charles. Pierre Bourdieu: uma sociologia ambiciosa da educação. Florianópolis: Editora da UFSC, 2019.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Jan 2023
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    07 Maio 2022
  • Aceito
    24 Ago 2022
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