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Debate sobre licenciatura em ciências

ARTIGOS DE DEMANDA CONTÍNUA

Debate sobre licenciatura em ciências

Verner Artur Conrado Barthelmess

Professor Adjunto do Departamento de Métodos e Técnicas da Educação do Setor de Educação da Universidade Federal do Paraná. Docente Livre pela Universidade Federal do Paraná. Coordenador do Curso de Mestrado em Educação da Universidade Federal do Paraná

No inicio do coerente ano o Conselho Federal de Educação convocou uma grupo de especialistas para um debate, em Brasília, sobre Licenciatura em Ciências.

Como subsídio para os estudos os participantes receberam, antecipadamente, dois documentos:

- Minuta da indicação sobre a formação de professor em Ciências, elaborado por uma Comissão de Especialistas em Ensino de Ciências.

- Sugestões para a formação de professores da área científica para as escolas de 1º e 2º graus elaborado com a participação de várias sociedades científicas, e encaminhado a Secretaria de Ensino Superior - SESU/MEC, pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência.

O texto adiante reproduzido e a apreciação preliminar dos documentos acima, feita pelo autor como especialista convidado.

1 - A questão básica.

Lendo-se atentamente os trabalhos em debate, sobre o currículo das licenciaturas destinadas à formação dos professores de ciências, nota-se que a questão que realmente divide as águas e diante da qual os espíritos divergem não se acha ali suficienteme

A pretexto de mais um currículo para formação de professores, disputa-se, na realidade, sobre a questão de fundo de uma tomada de posição quanto ao ensino de primeiro e de segundo grau onde ditos professores hão de atuar. Dize-me o que deve ensinar o futuro professor e dir-te-ei o que este deve aprender.

A Comissão de Especialistas professa a fé no ensino por áreas, nas series 5ª a 8ª, cujo credo tem a sanção da lei atual, mas cuja aplicação na prática tem sido sistematicamente burlada, desde o nascedouro até os presentes dias e nem só em nível de sala de aula. Será interessante, a propósito, examinar aqui um exemplo concreto, que por felicidade não pertence ao campo das ora aqui denominadas ciências. Trata-se do parecer 853 que se reporta à Área de Estudos Sociais. Lá está, nos próprios termos do Parecer a origem da dicotomia. Na primeira linha se explica que se quer é ensinar a viver e conviver (existirá formulação mais promissora?); da segunda linha em diante manda-se ensinar dom-João-Sexto, as fases da lua e Pedro Álvares Cabral. Mulheres de Jerusalém! se isto sucede ao lenho verde, que há de ser do lenho ressequido!

Procura então o eminente grupo de especialistas salvar, ainda, ou salvar finalmente, o ensino por áreas, dez anos depois, ao menos quanto às ciências, por meio de fornecer-lhe, por fim, uma geração de professores de nova formação, o que dentro de uma ordem mais normal em que não andasse o carro o dia, antes mesmo da implantação da 5692.

Por outro lado as comissões ou grupos de trabalho: que em nome da comunidade científica profissional elaboraram a réplica, descreem, ao que se nota, definitivamente, do ensino de primeiro e segundo graus, tal com almente, tal como é realizado na prática.

Desejam vê-lo rendido por outro em que a mentalidade científica seja despertada o mais cedo possível e metodicamente construída, já com o endereço espiritual da ciência propriamente dita, sem recurso à intermediação das chamadas aéreas, para alientam, não existe paradigma na história do pensamento científico humano.

A discussão é relevante e oportuna. Há de se convir, entretanto, que não pode ser pela via travessa de uma Resolução sobre matéria diversa, embora afim e decorrente, que se há de dirimir questão de tamanha magnitude. A Resolução sobre currículo de Licenciatura não é a via própria para reforma ou revisão do ensino de 1º e 2º graus. Já porque nem mesmo o melhor dos currículos de licenciatura nem o melhor dos professores podem resultar em que se ensine Química na sétima série se não existir escola de primeiro grau em que nessa série a Química seja ensinada.

É preciso, portanto, assumir as posições profundas e deslocar o debate, abertamente, para o terreno a que pertence: que destino quer a Nação dar a seu ensino de primeiro e segundo grau?

2 - Licenciatura longa ou curta?

Do ponto de vista de uma teoria de currículo baseada em propósitos e valores, também a duração dos cursos de licenciatura toma outras cores, permitindo abir novas alternativas ao debate.

Não há razão lógica nem pedagógica para supor que é mais fácil ensinar a crianças mais pequenas ou que o professor de tais crianças precisa saber menos ou estudar menos tempo. O que pode ocorrer é um deslocamento das prioridades: o professor do aluno de idade menor precisa de uma formação em que se de maior ênfase aos aspectos pedagógicos no sentido estrito deste termo, ao passo que o aluno mais crescido, mais fácil de se e epistemológico.

Em ambos os casos a duração dos cursos de licenciatura pode ser, em tese, a mesma e em ambos é relevante que as disciplinas pedagógicas e filosóficas sejam introduzidas desde o inicio do curso de licenciatura, para não serem, depois, sentidas como um apêndice heterogêneo, quiçá incômodo, para quem já está se sentindo no limiar do exercício de uma ciência desinteressada, numa atitude mais própria para o bacharel que para o licenciado.

Pode existir uma licenciatura (plena) para professor de pré-escola, outra licenciatura (plena) para professores de 1ª a 4ª série, outra para os de 5ª a 8ª e assim por diante, todas igualmente plenas, mas cada qual com dosagem diferente de conteúdos filosóficos, pedagógicos e de ciências exatas. E nem se vê por que não ensinar conteúdos, por exemplo de biologia, desde a pré-escola, pela observação informal de animais e plantas, pela tomada de consciência da própria respiração e pelo cultivo de hábitos de nutrição e higiene.

A questão de ter ou não ter o País número suficiente de professores plenamente habilitados constitui limitação histórica temporária e como tal precisa ser encarada. É claro que não se pode estatuir, por ora, o monopólio do exercício do magistério pelos plenamente habilitados, mas é justo e exeqüível assegurar-lhes preferência de ingresso e acesso e garantia legal de remuneração destacada.

E pode-se, também, é claro, conceder ao universitário que já realizou parte de seu curso, a permissão de ir lecionando, nas circuntâncias que a lei estabelecer, ou mesmo àquele que precocemente interrompeu o curso, a faculdade legal de exercer tarefa compatível com a formação que já tenha alcançado.

Para tanto não é preciso mais que aperfeiçoar as regras do registro profissional. Nem é mister outro diploma, mas nada obsta, tão pouco, que se confira pelo curso parcial algum certificado acadêmico, além do Histórico Escolar, como já se faz, por exemplo, na Pós-Graduação onde um curso incompleto em nível de mestrado pode dar direito a um Certificado de Especialização, sem necessidade de ter sido o aluno matriculado num Curso de Especialização.

Tal raciocínio não vale só para licenciatura, nem só para educação. Aplica-se a qualquer curso ou ramo do conhecimento. Será sempre possível, em país carente de profissionais, aproveitar aquilo que o cidadão já sabe.

Estas idéias são aqui apresentadas, não como proposta alternativa, S moda de terceira vertente, mas unicamente como estímulo ao alargamento do debate, com integração de todos, em busca de saídas abertas, encorajando todas as formas de criatividade e, como diz o preâmulo da Lei, "todas as audácias".

Até mais ver, em Brasília, dia 24, s.D.q.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Mar 2015
  • Data do Fascículo
    Dez 1981
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