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Discurso de transmissão de cargo do professor José Alberto Pedra Curitiba, 16 de Setembro de 1986

ARTIGOS DE DEMANDA CONTÍNUA

Discurso de transmissão de cargo do professor José Alberto Pedra Curitiba, 16 de Setembro de 1986

O que deve ser dito em um discurso de transmissão de cargo por aquele que o deixa? Relatório do feito? das dificuldades interpostas às intenções? Tive dúvidas ao construir este pequeno discurso. Recordei-me, então, de uma das histórias do Rabi narrada por Martin Buber que assim conclui: 'mais que o pobre precisa do rico, precisa o rico do pobre". Compreendi, então, que poderia iniciar este discurso parafraseando o Rabi Schmelk da história: "precisa mais o administrador dos professores e funcionários do que estes daquele". Por tal entendimento agradeço àqueles funcionários que comigo trabalharam, que, no silêncio do exercício de suas tarefas, garantiram que este Setor de Educação mantivesse seus serviços, mesmo quando vendavais mais adversos investiam contra a administração. Agradeço aos agentes de portaria, aos serventes que, não obstante as péssimas condições de trabalho mantida pelo poder público, jamais se recusaram ao trabalho anônimo.

Agradeço aos professores, àqueles professores que sabendo ser a educação um ato político, jamais confundiram política com educação. Agradeço àqueles professores que estoicamente, quase com um sentido religioso, dedicaram-se às suas tarefas, freqüentemente com elevada carga horária, afastando-se das ideologias que corrompem e afastam a Universidade do seu verdadeiro sentido social. Devo agradecer também, por uma questão de justiça, àqueles professores que se opuseram de modo contumaz à minha administração, sem ao menos conceder o benefício do diálogo. A estes agradeço, pois ensinaram-me a ser mais atento, ensinaram-me a conviver com a divergência.

Agradeço, de forma enfática, a um professor em particular, administrador dedicado e de tempo integral, que jamais sonegou tempo quando estava em jogo o destino desta Universidade Federal. Refiro-me ao ex-Magnífico Reitor, professor Ocyron Cunha, que em 1981 convocou-me para exercer "pro-tempore", o cargo de Diretor do Setor de Educação. Agradeço-lhe, não pela honraria, mas pela amizade que desde então se iniciou.

Magnífico Reitor, Senhor Diretor, autoridades presentes, senhores, senhoras. Acredito, de forma definitiva, nesta instituição, hoje tão atacada, que é a família; de uma vim como filho, outra constituí como pai, e como pai, quero agradecer aos meus filhos e à Nilcéa, minha mulher, por terem sido pacientes e generosos, e por nunca terem deixado faltar o carinho e a compreensão que só os que vivem juntos os momentos de alegrias e tristezas podem compreender.

Meu caro professor Carlos Avosani, Vice-Diretor, agradeço a Deus por tê-lo colocado ao meu lado na administração do Setor; sua ponderação e humanidade não serão esquecidas.

Magnífico Reitor, Sr. Diretor, professores, funcionários, quando assumi o cargo de Diretor deste Setor de Educação, em 1982, iniciei meu discurso de posse com uma citacão do Manifesto dos Pioneiros da Educacão Nova:

Na hierarquia dos problemas nacionais nenhum sobreleva em importância e gravidade ao da educação. Nem mesmo os de caráter econômico lhe podem disputar a primazia nos planos de reconstrução nacional. Pois, se a evolução orgânica do sistema cultural de um país depende de suas condições econômicas, é impossível desenvolver as forças econômicas ou de produção, sem o preparo intensivo das forças culturais e o desenvolvimento das aptidões à invenção e ã iniciativa que são os fatores fundamentais do acréscimo de riqueza de uma sociedade.

O Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, senhoras e senhores, foilançado à nação há 54 anos atrás. Se hoje fosse relançado, nada haveria de mais atual e pertinente, afinal, não se encontra hoje a educação lançada à sorte, à má sorte? A universidade transformou-se numa instituição de "faz-de-conta", garante GIANOTTI em seu excelente trabalho: A Universidade em Ritmo de Barbárie.

Não é verdade que o populismo transformou-se em sinônimo de qualidade? Por acaso, não é um descalabro quando a política partidária e o patrulhamento ideológico comandam a produção científica e transformam-se em critério para a escolha de cargos na estrutura universitária?

Estamos à beira da barbárie, quando a burocracia está a serviço de si mesma ou para garantir o ego "pseudodemocrata" daqueles que a deveriam gerir em benefício da coletividade. Estamos à beira do crime contra a nação, quando deixamos de atender às demandas sociais e nos lançamos ao discurso vazio, sem nada a oferecer a esta nação que padece.

Mas, senhores, a esperança deve ser a profissão de fé daqueles que trabalham com a educação. E foi com muita esperança que assumimos, em 1982, a Direção do Setor de Educação e hoje a passamos aos ilustres professores Archimedes Peres Maranhão e Gilda Moreira Weiss. Passamos um Setor renovado e mais expressivo. Passamos o Centro de Pesquisas e Estudos Educacionais e Biblioteconômicos, criado há pouco menos de 2 anos, envolvido direta e indiretamente com o gerenciamento de aproximados 400 mil dólares, aplicados em convênios e pesquisas. Deixamos a Revista Educar, em seu terceiro ano de existência, hoje permutada com mais de 114 outras similares nacionais e internacionais; deixamos um Programa de Pós-Graduação consolidado, oferecendo nova área de concentração e com um anteprojeto para implantação do doutoramento em Educação; deixamos, criadas e em funcionamento, novas habilitações no Curso de Pedagogia; foram abertos cursos noturnos, abrigando camadas sociais de trabalhadores antes afastadas dos estudos universitários. As matrículas do Curso de Pedagogia foram triplicadas, a Biblioteconomia teve suas matrículas duplicadas. Deixamos implantados e em desenvolvimento dezenas de convênios e projetos, todos de alta relevância social e educacional, em consórcio com organismos nacionais e internacionais. Tudo isso foi possível porque, no Setor de Educação, ainda temos aquele tipo raro de professor e funcionário que faz do trabalho um motivo de alegria, que faz do trabalho um instrumento de santificação, que entende, tal como nos disse João Paulo II, que o trabalho nos faz, antes de tudo, "colaboradores de Deus no prosseguir a obra de Sua criação". (Discurso aos trabalhadores, S. Paulo, 3-7-80)

Termino este breve discurso, citando um conselho de São Paulo a Timóteo: "Esta é a instrução que te confio: combata o bom combate, com fé e boa consciência; pois alguns, rejeitando a boa consciência, vieram a perder a fé".

É bom, senhoras e senhores, poder concluir um mandato e com humildade repetir São Paulo: "Chegou o tempo de minha partida. Combati o bom combate, terminei a minha carreira, guardei a fé." (2 Timóteo, 4,6)

Muito Obrigado.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Mar 2015
  • Data do Fascículo
    Dez 1987
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