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APRESENTAÇÃO

O terceiro e último número de 2016 da Alfa traz um conjunto de trabalhos expressivos da pesquisa inovativa e questionadora que tem marcado o melhor dos desenvolvimentos recentes da Linguística no Brasil.

O primeiro artigo, de Mulico e Tilio, historia o percurso de constituição e transformação de uma área de pesquisa tanto consolidada como em franca expansão nos estudos da linguagem – a Linguística Aplicada. Recuperam-se as abordagens iniciais – com preocupações teóricas, natureza experimental e interesse no ensino/aprendizagem de línguas, para em seguida destacar a emergência do que se denomina hoje Linguística Aplicada Contemporânea. Caracterizando essa proposta teórica como crítica, transgressiva e indisciplinar, híbrida e transitória, os autores defendem que seja pensada como um Sistema Adaptativo Complexo, conceito filiado à Teoria da Complexidade.

Angelo e Menegassi, ainda sob o espírito da Linguística Aplicada, trazem uma reflexão a partir de um estudo empírico, em que focalizaram o tema da produção escrita na prática docente. Seu estudo se pauta em observação participante e intervenções colaborativas junto a um docente em um contexto específico – o trabalho de produção do gênero textual resposta em atividade na Sala de Apoio à Aprendizagem de Língua Portuguesa (SAALP). A análise resulta na constatação da necessidade de acompanhamento e orientação dos profissionais, num processo efetivo de formação continuada. O estudo vem reforçar a percepção de quão necessária é a construção de uma ponte entre o saber produzido no meio acadêmico e a prática docente e que, se a tarefa é urgente, é também factível.

Nosso terceiro artigo – de Butturi Junior – também se debruça sobre a escrita, mas para pensar sobre a noção de autoria e o processo de criação, a partir do lugar e papel do sujeito: os limites da (des)subjetivação na escrita. Objetiva-se analisar essas questões na perspectiva foucaultiana, ou mais precisamente, verificar até que ponto e como elas podem ser analisadas nessa perspectiva.

A escrita ainda é lugar de reflexão no quarto artigo deste número, em que Calil analisa o sentido das palavras, tal como construído no processo de escritura de uma díade de alunas recém-alfabetizadas. Ainda que a escrita seja o locus de ancoragem, o autor mostra que é no contexto enunciativo que os sentidos se formam, pelas trocas multimodais entre as participantes (que vão muito além do verbal). A análise de um corpus de registros fílmicos, segundo a abordagem da Genética Textual, desvela o próprio processo de criação textual, com todas as marcas (feituras, refeituras, “rasuras orais”) e conhecimentos linguísticos do eunciador que o texto – produto final – não deixa entrever.

O papel da coenunciação, tão presente no artigo de Calil, é também peça fundamental para a apreensão do processo de montagem da cadeia referencial do texto, questão central do artigo de Neves e Souza. As autoras investigam o modo de criação e de manutenção dessas redes em sequências narrativas presentes em um conjunto de romances brasileiros, mostrando que o processo passa pela seleção não aleatória de elementos fóricos. O estudo conclui que a escolha de tais elementos serve a funções precisas na construção de cada texto e que, portanto, não é possível reduzi-los a uma classe com valores e papeis pré-definidos.

O último artigo deste número, de Viaro e Bizzocchi, traz à luz uma proposta inovadora para as pesquisas em Etimologia, relacionada ao projeto de elaboração do Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa (DELPo), desenvolvido no âmbito do NEHiLP-USP. Ainda que tendo surgido a partir de um projeto específico, as contribuições teórico-metodológicas apresentadas têm um alcance muito maior, representando um aporte de grande relevância para essa área da Linguística e para outras áreas que dela se beneficiam. Nunca é demais lembrar que os estudos etimológicos são base para a compreensão de muitos processos linguísticos, em particular históricos.

Nosso número se encerra com duas resenhas, um tipo de texto nem sempre presente nas páginas da Alfa, mas sempre bem-vindo, por seu importante papel de dar a conhecer produções recentes e relevantes. Ambas analisam obras de um mesmo domínio – o Discurso, abordado em cada obra a partir de uma perpectiva teórica diferente.

Marchezan avalia e comenta a obra Dialogismo: teoria e(m) prática, conjunto de estudos de orientação bakhtiniana, organizada por Brait e Magalhães. Souza analisa Linguagem e discurso: modos de organização, que reúne organicamente um conjunto de textos de Patrick Charaudeau, em uma publicação inédita em língua portuguesa da obra desse importante pesquisador, criador da Teoria Semiolinguística de Análise do Discurso.

Desejamos que esse conjunto de instigantes estudos sejam para os nossos leitores uma fonte prazerosa de conhecimento renovado.

Rosane de Andrade Berlinck

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Sep-Dec 2016
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