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O Projeto Nacional de Saneamento Rural (1985-1989) no Brasil: limites e potencialidades 1 1 Os autores agradecem à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig), pela bolsa de doutorado fornecida à primeira autora; à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), pelo apoio financeiro ao Programa de Pós-Graduação; e ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), pela bolsa de produtividade em pesquisa fornecida à autora Sonaly Rezende.

Resumo

Neste artigo são analisados os princípios do Projeto Nacional de Saneamento Rural (PNSR), elaborado na década de 1980, discutindo-se os avanços e limites alcançados no desenvolvimento do saneamento rural no Brasil no período. Empregou-se como metodologia a análise de conteúdo de documentos e de entrevistas com atores-chave. Os resultados demonstram que a formulação do PNSR promoveu um novo aporte de conhecimentos ao setor de saneamento no país, com inovações no que se refere à abordagem sobre saneamento básico em áreas rurais, especialmente em sua integração à saúde, aos processos de educação e participação social, à descentralização dos serviços, ao emprego de tecnologias apropriadas e ao envolvimento comunitário na gestão dos serviços. Embora não tenha sido efetivado como um programa de governo, o PNSR deixou como legado uma vasta contribuição sob a forma de estudos, ainda hoje pertinentes.

Palavras-chave:
Abastecimento de Água; Área Rural; Esgotamento Sanitário; Formulação de Políticas Públicas; PNSR

Abstract

In this article, the principles of the National Rural Water and Sanitation Project (PNSR), elaborated during the 1980s, are analyzed, discussing the advances and the limits reached in the development of rural water supply and sanitation in Brazil. The methodology used was an analysis of the content of documents and interviews with key actors. The results have demonstrated that the formulation of the PNSR promoted a new contribution of knowledge to the water and sanitation sector in Brazil, bringing innovations concerning the approach to water and basic sanitation in rural areas, especially relating to its integration with health, the processes of education and social participation, the decentralization of services, the use of appropriate technologies and community involvement in the management of services. Although it did not result in a government program, the legacy left by the PNSR has provided a great contribution in the form of studies, which are still relevant today.

Keywords:
Water Supply; Rural Area; Sanitation; Formulation of Public Policies; PNSR

Introdução

A prestação de serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário em áreas rurais apresenta características distintas daquela de áreas urbanas. Nesse sentido, o processo de formulação de políticas públicas deveria ser capaz de contemplar diferentes especificidades, um desafio em escala mundial. Em geral, as particularidades relacionadas às áreas rurais, como a maior dispersão populacional no território ou a distribuição em pequenas aglomerações, a necessidade de adoção de tecnologias não convencionais e as dificuldades de se garantir assistência técnica e capacitação aos prestadores de serviços locais, dificultam a formulação e a execução de políticas públicas direcionadas às demandas rurais (MANTILLA, 2011 MANTILLA, W. C. Políticas públicas para la prestación de los servicios de agua potable y saneamiento en las áreas rurales. Documento de proyecto n. 388. Santiago del Chile: CEPAL, 2011. Disponível em: https://repositorio.cepal.org/bitstream/handle/11362/3842/1/S2011912.pdf . Acesso em: mar. 2020.
https://repositorio.cepal.org/bitstream/...
).

No Brasil, a partir da década de 1970, o planejamento do setor de saneamento foi fortemente influenciado pelo Plano Nacional de Saneamento (Planasa). A implementação desse plano contribuiu para elevar a cobertura de água e, em menor nível, de esgotamento sanitário, privilegiando as áreas urbanas de regiões de economia mais dinâmica. Além de criar um descompasso entre as ações voltadas para o abastecimento de água e o esgotamento sanitário, as primazias do plano acabaram por aumentar as desigualdades, uma vez que os moradores das periferias urbanas e das áreas rurais foram preteridos na execução da política pública (Britto et al., 2008 BRITTO, A. L. N. P. et al. Da fragmentação à articulação: a política nacional de saneamento e seu legado histórico. Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionais, v. 14, n. 1, p. 65-83, 2012.). Nas áreas rurais, a atuação governamental manteve a mesma característica que moldou as obras de saneamento no passado, como aponta Melo (1989 MELO, M. A. B. C. O padrão brasileiro de intervenção pública no saneamento básico. Revista de Administração Pública, v. 23, n. 1, p. 84-102, 1989.), com forte dispersão de ações limitadas, em uma multiplicidade de órgãos e ministérios que atuavam no setor de forma descoordenada, diante da ausência de planejamento de longo prazo.

O quadro de atendimento por serviços de saneamento básico no Brasil evidencia a necessidade de maior atuação e investimentos nas áreas rurais. No que se refere ao abastecimento de água, apenas 23% dos domicílios rurais são abastecidos por rede geral com canalização interna. Com relação ao esgotamento sanitário, 64% dos domicílios rurais dispõem as águas residuárias em fossas rudimentares e 11%, diretamente no ambiente, em valas, rios, lagos ou mar (IBGE, 2011IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo Demográfico de 2010. Rio de Janeiro: IBGE, 2011.).

Com o declínio do Planasa, em meio à crise econômica vivenciada no Brasil nos anos 1980, observou-se um vazio institucional no setor. O Projeto Nacional de Saneamento Rural (PNSR) surgiu como uma iniciativa inédita, em âmbito nacional, para o planejamento da atuação em saneamento rural, após anos de ações isoladas. Elaborado no período de 1985 a 1989, manteve-se sob supervisão da Secretaria de Planejamento da Presidência da República (Seplan), com ação executiva do Instituto de Planejamento Econômico e Social (Ipea)2 2 Atualmente denominado Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). e participação dos Ministérios da Saúde e do Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente. Contava com assessoria técnica da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) e financiamento parcial, por empréstimo, do Banco Internacional para a Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD).

A formulação do PNSR e sua inserção na agenda pública se deram em um período de intensas transições no Brasil, após 20 anos de ditadura militar (1964-1984). O processo de redemocratização que ora se instalava trazia em seu cerne a busca da garantia de direitos sociais e o fortalecimento da atuação dos movimentos sociais. Em sua concepção, o PNSR abordou um conjunto de princípios inovadores, que reproduziam as novas questões que emergiam em um contexto de mudanças profundas no plano político e social (ROLAND; HELLER; REZENDE, 2020 ROLAND, N.; HELLER, L.; REZENDE, S. Access to the Brazilian agenda of The National Rural Water Supply and Sanitation Project (1985). Revista de Administração Pública , v. 54, n.6, p. 1654-1671, 2020. http://dx.doi.org/10.1590/0034-7612201900392x
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).

O PNSR se destacou pela visão ampla do território e atuação pautada em um escopo abrangente de ações, de forma distinta de programas desenvolvidos anteriormente pelo governo federal. Contudo, sua implementação foi restrita, não sendo capaz de se expandir para todo o território nacional. Alguns dos princípios idealizados durante a criação do projeto sofreram distorções na fase de execução, apresentando falhas que prejudicaram a sustentabilidade dos sistemas de abastecimento de água e esgotamento sanitário construídos (ROLAND; HELLER; REZENDE, 2022 ROLAND, N.; HELLER, L.; REZENDE, S. Assessment of the failure to implement a much-needed rural water and sanitation project in Brazil. Water International [online], 2022. doi 10.1080/02508060.2022.2040147.
https://doi.org/10.1080/02508060.2022.20...
).

Neste artigo busca-se analisar o processo de concepção do PNSR, com ênfase em seus princípios e diretrizes, à luz do contexto em que foi desenvolvido. A análise traz elementos que permitem avançar na compreensão dos problemas enfrentados e das realizações alcançadas, contribuindo para a construção da atual política de saneamento rural no Brasil, que vive importante momento com o lançamento do Programa Saneamento Brasil Rural, em dezembro de 2019 (BRASIL, 2019aBRASIL. Fundação Nacional de Saúde. Programa Nacional de Saneamento Rural. Brasília, DF: Ministério da Saúde, Fundação Nacional de Saúde, 2019a. Disponível em: http://www.funasa.gov.br/documents/20182/38564/MNL_PNSR_2019.pdf/08d94216-fb09-468e-ac98-afb4ed0483eb . Acesso em: dez. 2019.
http://www.funasa.gov.br/documents/20182...
; 2019bBRASIL. Ministério da Saúde. Portaria nº. 3.174, de 02 de dezembro de 2019. Dispõe sobre o Programa Nacional de Saneamento Rural e dá outras providências. Brasília, DF: Ministério da Saúde, 2019b.).

2. Metodologia

Trata-se de uma pesquisa qualitativa cuja coleta de dados baseou-se na consulta a documentos públicos oficiais e na realização de entrevistas individuais com especialistas. Os documentos englobam a versão preliminar do Programa Nacional de Saneamento Rural (BRASIL, 1987BRASIL. Programa Nacional de Saneamento Rural. Versão preliminar elaborada em dezembro de 1987. Brasília, DF: Instituto de Planejamento Econômico e Social, 1987.) e os nove volumes que compõem a Série Saneamento Rural (IPEA, 1989aIPEA. Instituto de Planejamento Econômico e Social. Projeto Local de Saneamento Rural. Série saneamento rural 1. Brasília, DF: IPEA, 1989a. ; 1989bIPEA. Instituto de Planejamento Econômico e Social. Bases para formulação de políticas e programas em saneamento rural. Série saneamento rural 2. Brasília, DF: IPEA , 1989b. ; 1989cIPEA. Instituto de Planejamento Econômico e Social. Subsídios para elaboração de programas estaduais de saneamento rural. Série saneamento rural 3. Brasília, DF: IPEA , 1989c. ; 1990aIPEA. Instituto de Planejamento Econômico e Social. Fundamentos conceituais e metodológicos da educação e participação em saneamento rural. Série saneamento rural 4. 2. ed. Brasília, DF: IPEA , 1990a. ; 1990bIPEA. Instituto de Planejamento Econômico e Social. Subsídios metodológicos para a prática de educação e participação em saneamento rural. Série saneamento rural 5. 2. ed. Brasília, DF: IPEA , 1990b. ; 1990cIPEA. Instituto de Planejamento Econômico e Social. Subsídios para a discussão da questão tarifária em saneamento rural. Série saneamento rural 6. 2. ed. Brasília, DF: IPEA , 1990c. ; 1990dIPEA. Instituto de Planejamento Econômico e Social. Modelo computacional para programação financeira em saneamento rural. Série saneamento rural 7. 2. ed. Brasília, DF: IPEA , 1990d. ; 1990eIPEA. Instituto de Planejamento Econômico e Social. Estudos de caso para uma alternativa metodológica de elaboração de material educativo em saneamento rural (ações experimentais do PNSR). Série saneamento rural 8. 2. ed. Brasília, DF: IPEA , 1990e. ; 1990fIPEA. Instituto de Planejamento Econômico e Social. Subsídios para o estabelecimento de um programa de desenvolvimento de recursos humanos para o saneamento rural. Série saneamento rural 9. 2. ed. Brasília, DF: IPEA , 1990f. ). Esses documentos expressam a concepção do PNSR para o desenvolvimento do saneamento rural no país, a partir de estudos que abarcam o planejamento e a formulação de políticas públicas de saneamento rural para os três níveis de governo, abordando temas como: gestão, educação, participação social, tecnologias e recursos humanos e financeiros. As entrevistas semiestruturadas (FLICK, 2011 FLICK, U. Introdução à pesquisa qualitativa. Porto Alegre: Artmed, 2011. ) foram realizadas com 14 atores: técnicos e consultores que integraram a equipe responsável pela elaboração e implementação do PNSR no Ipea, Opas, Ministério do Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente, Ministério da Saúde, Governo de Minas Gerais e Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa) e um representante comunitário de comunidade atendida pelo Projeto.

O material coletado e organizado foi submetido à análise de conteúdo (BARDIN, 2011BARDIN, L. Análise de conteúdo. 5. ed. Lisboa: Edições 70, 2011. ), sendo estabelecidas cinco categorias analíticas: visão do saneamento, tecnologia, educação e participação, aspectos econômico-financeiros e gestão e prestação de serviços.

3. Resultados e discussão

O PNSR previa a materialização da política de saneamento básico em áreas rurais no país a partir da formulação de três instrumentos: o Projeto Local de Saneamento Rural (PLSR), os Programas Estaduais de Saneamento Rural (PESR) e o Programa Nacional (IPEA, 1989bIPEA. Instituto de Planejamento Econômico e Social. Bases para formulação de políticas e programas em saneamento rural. Série saneamento rural 2. Brasília, DF: IPEA , 1989b. ). A composição do PLSR, menor unidade do planejamento proposto pelo PNSR, baseava-se em três eixos de desenvolvimento: o tecnológico, o social e o econômico-financeiro. O eixo tecnológico englobava a implantação de sistemas de abastecimento de água, esgotamento sanitário e melhorias sanitárias (módulos sanitários domiciliares e/ou públicos), bem como sua operação e manutenção. Buscando superar a visão puramente tecnicista do saneamento, o projeto trazia a educação e a participação social como temas centrais do eixo social, que também abordava a capacitação de recursos humanos, a organização institucional e aspectos culturais das localidades rurais. Por fim, fatores econômico-financeiros, como custos para execução e fontes de financiamento, completavam a tríade base do PNSR (IPEA, 1989aIPEA. Instituto de Planejamento Econômico e Social. Projeto Local de Saneamento Rural. Série saneamento rural 1. Brasília, DF: IPEA, 1989a. ).

Cerca de 30 anos após o desenvolvimento do PNSR, tal tríade serviu como fonte de inspiração para o Programa Saneamento Brasil Rural (BRASIL, 2019aBRASIL. Fundação Nacional de Saúde. Programa Nacional de Saneamento Rural. Brasília, DF: Ministério da Saúde, Fundação Nacional de Saúde, 2019a. Disponível em: http://www.funasa.gov.br/documents/20182/38564/MNL_PNSR_2019.pdf/08d94216-fb09-468e-ac98-afb4ed0483eb . Acesso em: dez. 2019.
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; 2019bBRASIL. Ministério da Saúde. Portaria nº. 3.174, de 02 de dezembro de 2019. Dispõe sobre o Programa Nacional de Saneamento Rural e dá outras providências. Brasília, DF: Ministério da Saúde, 2019b.), que também se alicerça sobre três eixos estratégicos: 1) gestão dos serviços; 2) educação e participação social; e 3) tecnologia. Ambos, em diferentes épocas e com suas particularidades, procuram ir além das abordagens predominantemente tecnocêntricas. Em sua concepção, o PNSR apresentava, portanto, inovações relacionadas às tecnologias utilizadas, aspectos de educação, participação social e gestão dos serviços.

3.1 Visão do saneamento e estrutura institucional

A definição de saneamento adotada pelo PNSR consiste em um conjunto de medidas voltadas para preservar e/ou modificar as condições do meio ambiente, com vistas a contribuir para a prevenção de doenças e a promoção da saúde, do bem-estar e da cidadania. Na visão do projeto, para que o saneamento tenha eficácia, deve-se buscar solução que integre o abastecimento de água, o esgotamento sanitário e as melhorias sanitárias domiciliares (BRASIL, 1989a).

A elevação dos níveis de cobertura dos serviços de saneamento constituía um dos objetivos intermediários do PLSR. Seu objetivo final, além da implantação de infraestrutura física de saneamento, consistia em criar condições para satisfazer as necessidades de saneamento e para gerar melhorias na qualidade de vida da população rural (BRASIL, 1989b). O PNSR baseava-se, como indicado, em uma visão integrada de saneamento, saúde e educação como o cerne para o desenvolvimento de uma política nacional.

O saneamento tem raízes históricas entrelaçadas às origens da saúde pública no Brasil, remontando aos primeiros esforços de combate à propagação de enfermidades (HOCHMAN, 2006 HOCHMAN, G. A era do saneamento: as bases da política de saúde pública no Brasil. 2. ed. São Paulo: Hucitec, 2006.). Porém, houve o distanciamento entre as ações de saúde e saneamento a partir da década de 1960, o que resultou em políticas desconexas. O setor de saúde avançou rumo ao modelo assistencialista, com substancial expansão da assistência médica previdenciária de forma a constituir um novo padrão de atenção à saúde no país, até então, em grande parte, de natureza privada. Já o de saneamento, sob a égide do Planasa, desenvolveu-se com foco na ampliação da cobertura dos serviços e no desenvolvimento urbano (MENICUCCI; D’ALBUQUERQUE, 2018 MENICUCCI, T.; D’ALBUQUERQUE, R. Política de saneamento vis-à-vis à política de saúde: encontros, desencontros e seus efeitos. In: HELLER, L. (Org.). Saneamento como política pública: um olhar a partir dos desafios do SUS. Rio de Janeiro: Centro de Estudos Estratégicos da Fiocruz, 2018. p. 9-52.).

O diagnóstico da situação do saneamento básico nas áreas rurais do Brasil, realizado no âmbito dos estudos para o desenvolvimento do PNSR, apontava um enfoque mecanicista na implantação de sistemas de abastecimento de água, com prevalência, em grande medida, da “visão da engenharia”. O projeto intentava, portanto, superar essa visão ao promover a extensão do conceito de saneamento ao âmbito da saúde pública. O PNSR também reconhecia o papel da cultura local, considerando sua influência nos hábitos de saúde e sua relação direta com a concepção de saneamento, o que confere características únicas a cada localidade (IPEA, 1989bIPEA. Instituto de Planejamento Econômico e Social. Bases para formulação de políticas e programas em saneamento rural. Série saneamento rural 2. Brasília, DF: IPEA , 1989b. ).

É importante mencionar que, além do abastecimento de água e do esgotamento sanitário, o PNSR abordava outros aspectos do saneamento básico, como o manejo de resíduos sólidos, o controle de vetores e a drenagem de águas pluviais. No entanto, diante da ausência de recursos financeiros para a realização de investimentos em serviços e infraestruturas, propunha a abordagem desses componentes por meio de processos educativos e de conscientização da população (IPEA, 1990aIPEA. Instituto de Planejamento Econômico e Social. Fundamentos conceituais e metodológicos da educação e participação em saneamento rural. Série saneamento rural 4. 2. ed. Brasília, DF: IPEA , 1990a. ).

De acordo com a visão apresentada pelo PNSR, era dever do Estado promover as medidas adequadas, tanto para implantar o saneamento nas localidades rurais quanto para garantir a sustentabilidade dos serviços. Contudo, a partir do diagnóstico realizado, foi constatado que a estrutura institucional de governo, voltada para a execução de ações de saneamento rural, consistia em uma “colcha de retalhos”. Os recursos financeiros para investimentos eram, geralmente, viabilizados por programas especiais, que, quando extintos, provocavam a descontinuidade da ação governamental (IPEA, 1989bIPEA. Instituto de Planejamento Econômico e Social. Bases para formulação de políticas e programas em saneamento rural. Série saneamento rural 2. Brasília, DF: IPEA , 1989b. ).

No Brasil, a descontinuidade político-administrativa é comumente identificada como um empecilho ao desenvolvimento de políticas públicas (MACHADO; COTTA; SOARES, 2015 MACHADO, J. C.; COTTA, R. M. M.; SOARES, J. B. Reflexões sobre o processo de municipalização das políticas de saúde: a questão da descontinuidade político-administrativa. Interface - Comunicação, Saúde, Educação, v. 19, n. 52, p. 159-70, 2015. ; NOGUEIRA, 2006 NOGUEIRA, F. A. Continuidade e descontinuidade administrativa em governos locais: fatores que sustentam a ação pública ao longo dos anos. 2006. Dissertação (Mestrado em Administração Pública e Governo) - Escola de Administração de Empresas de São Paulo, Fundação Getúlio Vargas, São Paulo, 2006.). A fim de superar esse problema e alcançar maior efetividade nas ações de saneamento, o PNSR apontava em sua formulação a necessidade de equacionamento de um conjunto de medidas voltadas para a harmonização das questões institucionais, de financiamento, de participação e educação, de desenvolvimento de recursos humanos e de tecnologias apropriadas, com a atuação integrada dos vários níveis de governo e das comunidades organizadas (IPEA, 1989bIPEA. Instituto de Planejamento Econômico e Social. Bases para formulação de políticas e programas em saneamento rural. Série saneamento rural 2. Brasília, DF: IPEA , 1989b. ). Em suma, o projeto apresentava uma visão de saneamento que ultrapassava a mera construção de infraestrutura, considerando a intersetorialidade, o planejamento em diferentes esferas de governo, o envolvimento comunitário e as especificidades locais: “o que se rejeita é a possibilidade de um modelo único para implantação de projetos de saneamento rural num país tão vasto e complexo como o Brasil” (IPEA, 1989bIPEA. Instituto de Planejamento Econômico e Social. Bases para formulação de políticas e programas em saneamento rural. Série saneamento rural 2. Brasília, DF: IPEA , 1989b. , p. 78).

3.2 Tecnologia

O aspecto tecnológico representa um dos três eixos principais para o planejamento do saneamento rural nas esferas locais. As tecnologias empregadas pelo PNSR eram caracterizadas pelo dinamismo, evidenciando-se a rejeição à adoção de modelos convencionais. De acordo com o diagnóstico realizado pelo projeto, os sistemas até então desenvolvidos para pequenas comunidades apresentavam, em geral, os mesmos critérios e normas padrões das tecnologias convencionais, com redução apenas da escala, sem levar em consideração as condições ambientais e culturais locais (IPEA, 1989bIPEA. Instituto de Planejamento Econômico e Social. Bases para formulação de políticas e programas em saneamento rural. Série saneamento rural 2. Brasília, DF: IPEA , 1989b. ).

O PNSR estipulava que as soluções técnicas deveriam ser simples e de baixo custo, bem como apresentar condições operativas viáveis, de forma a permitir seu manejo pela própria comunidade. A solução conjunta água-esgoto-melhorias deveria ser considerada como um sistema indivisível, constituindo uma única infraestrutura sanitária. Propunha também a adoção de soluções técnicas adequadas às diferentes regiões do país. Além disso, a operação e a manutenção dos sistemas mereciam particular atenção, uma vez que os procedimentos deveriam ser passíveis de incorporação pela cultura local. O conhecimento, as práticas e as experiências locais deveriam ser valorizados, garantindo-se a utilização de mão de obra e materiais da região (IPEA, 1989aIPEA. Instituto de Planejamento Econômico e Social. Projeto Local de Saneamento Rural. Série saneamento rural 1. Brasília, DF: IPEA, 1989a. ).

A adoção de tecnologias apropriadas ao saneamento rural não era uma novidade no período. Durante as décadas de 1970 e 1980 houve grande proliferação de grupos de pesquisa partidários da ideia (DAGNINO; BRANDÃO; NOVAES, 2004 DAGNINO, R.; BRANDÃO, F. C.; NOVAES, H. T. Sobre o marco analítico-conceitual da tecnologia social. In: LASSANCE Jr., A. E. et al. (Org.). Tecnologia social: uma estratégia para o desenvolvimento. Rio de Janeiro: Fundação Banco do Brasil, 2004. ). O Banco Mundial publicou uma série de documentos sobre experiências internacionais na área de saneamento que apontavam, entre outras coisas, para o fato de que a imposição de projetos pautados em tecnologias mais modernas às áreas rurais frequentemente resultava em soluções inapropriadas e em seu consequente fracasso (KALBERMATTEN; JULIUS; GUNNERSON, 1980 KALBERMATTEN, J. M.; JULIUS A. S.; GUNNERSON, C. G. Appropriate technology for water supply and sanitation: a summary of technical and economic options. World Bank research project (RPO 671-46). Washington, DC: World Bank, 1980. Disponível em: http://documents.worldbank.org/curated/pt/426461468765916413/Appropriate-technology-for-water-supply-and-sanitation-a-summary-of-technical-and-economic-options . Acesso em: jun. 2020.
http://documents.worldbank.org/curated/p...
). Nesse contexto, Pasha e McGarry (1989 PASHA, H. A.; MCGARRY, M. G. Rural water supply and sanitation in Pakistan: lessons from experience. World Bank technical paper number 105. Washington, DC, 1989. Disponível em: http://documents.worldbank.org/curated/en/339521468775504591/pdf/multi-page.pdf . Acesso em: mar. 2020.
http://documents.worldbank.org/curated/e...
) e Karp e Cox (1982 KARP, A. W.; COX, S. B. Building water and sanitation projects in rural Guatemala. Journal American Water Works Association, v. 74, n. 4, p. 163-169, 1982.) apresentaram estudos de caso de projetos de saneamento básico bem-sucedidos em áreas rurais do Paquistão e da Guatemala, respectivamente, que faziam uso de tecnologias apropriadas e incentivavam a participação da comunidade, priorizando o emprego de mão de obra e materiais locais. Nesses estudos, a utilização do termo tecnologias apropriadas relacionava-se principalmente à redução de custos de implantação e à possibilidade de construção e operação dos sistemas pelos usuários. A proposta do PNSR, entretanto, se mostrava um pouco mais abrangente. Suas publicações enfatizavam também os aspectos socioculturais e as particularidades regionais das comunidades. Um importante ponto apresentado com o conceito de tecnologia apropriada pelo PNSR diz respeito à sua aceitação pela população. Casos de abandono dos sistemas de saneamento nas áreas rurais são recorrentes, sendo a sustentabilidade dos sistemas um dos grandes desafios enfrentados após a sua construção (KAMINSKY; JAVERNICK-WILL, 2014 KAMINSKY, J. A.; JAVERNICK-WILL, A. N. The internal social sustainability of sanitation infrastructure. Environmental Science & Technology (Eletronic), v. 48, n. 17, p. 10028-10035, 2014.). Um dos fatores essenciais para a superação desse desafio consiste no envolvimento da comunidade no planejamento, execução e gestão das soluções sanitárias (SARA; KATZ, 2005 SARA, J.; KATZ, T. Making rural water supply sustainable: report on the impact of project rules. Water and Sanitation Program. World Bank, 2005. Disponível em: http://documents.worldbank.org/curated/en/495261468135922056/Making-rural-water-supply-sustainable-report-on-the-impact-of-project-rules . Acesso em: dez. 2019.
http://documents.worldbank.org/curated/e...
; NARAYAN, 1995 NARAYAN, D. The contribution of people’s participation: evidence from 121 rural water supply projects. Environmentally Suistainable Development Occasional Paper Series No. 1. Washington DC: The World Bank, 1995. Disponível em: http://documents.worldbank.org/curated/pt/750421468762366856/The-contribution-of-peoples-participation-evidence-from-121-rural-water-supply-projects . Acesso em: dez. 2019.
http://documents.worldbank.org/curated/p...
).

As propostas de tecnologia apropriada começaram a perder o seu ímpeto ainda em meados da década de 1980, dada sua associação a uma imagem de atraso (RODRIGUES; BARBIERI, 2008 RODRIGUES, I.; BARBIERI, J. C. A emergência da tecnologia social: revisitando o movimento da tecnologia apropriada como estratégia de desenvolvimento sustentável. Revista de Administração Pública , v. 42, n. 6, p. 1069-1094, 2008.). Na última década, o termo tecnologia social ganhou destaque na discussão de soluções capazes de superar o déficit de saneamento básico em áreas rurais, sendo adotado pelo atual Programa Saneamento Brasil Rural (BRASIL, 2019aBRASIL. Fundação Nacional de Saúde. Programa Nacional de Saneamento Rural. Brasília, DF: Ministério da Saúde, Fundação Nacional de Saúde, 2019a. Disponível em: http://www.funasa.gov.br/documents/20182/38564/MNL_PNSR_2019.pdf/08d94216-fb09-468e-ac98-afb4ed0483eb . Acesso em: dez. 2019.
http://www.funasa.gov.br/documents/20182...
; 2019bBRASIL. Ministério da Saúde. Portaria nº. 3.174, de 02 de dezembro de 2019. Dispõe sobre o Programa Nacional de Saneamento Rural e dá outras providências. Brasília, DF: Ministério da Saúde, 2019b.). A tecnologia social implica construção de soluções de modo coletivo pelos seus beneficiários, para que atuem com autonomia (ITS, 2004ITS. Instituto de Tecnologia Social. Reflexões sobre a construção do conceito de tecnologia social. In: LASSANCE Jr., A. E. et al. (Org.). Tecnologia social: uma estratégia para o desenvolvimento. Rio de Janeiro: Fundação Banco do Brasil , 2004. p. 117-134.). Portanto, não são apenas usuários de soluções produzidas por especialistas, a exemplo de muitas propostas das diferentes correntes da tecnologia apropriada.

Outro ponto mencionado pelo PNSR refere-se à qualidade dos serviços prestados. No caso do abastecimento de água, a simples presença de infraestrutura física não garante a prestação dos serviços com qualidade e em quantidade suficiente (ALEIXO et al., 2019 ALEIXO, B. et al. Infrastructure is a necessary but insufficient condition to eliminate inequalities in access to water: research of a rural community intervention in Northeast Brazil. Science of the Total Environment, v. 652, s.n., p. 1445-1455, 2019.). Estudos demonstram que, em casos em que há longos períodos de intermitência ou distribuição de água fora dos padrões de potabilidade, os sistemas de distribuição podem continuar expondo a população à situações de vulnerabilidade (MAJURU; JAGALS; HUNTER, 2012 MAJURU, B.; JAGALS, P.; HUNTER, P. R. Assessing rural small community water supply in Limpopo, South Africa: Water service benchmarks and reliability. Science of the Total Environment , v. 435-436, n. 2012, p. 479-486, 2012.; GUARDIOLA; GONZÁLEZ-GÓMEZ; GRAJALES, 2010 GUARDIOLA, J.; GONZÁLEZ-GÓMEZ, F.; GRAJALES, Á. L. Is access to water as good as the data claim? Case study of Yucatan. International Journal of Water Resources Development, v. 26, n. 2, p. 219-233, 2010.).

Além da adoção de tecnologias apropriadas, na estratégia de atendimento das comunidades rurais proposta pelo PNSR, havia a possibilidade de considerar a implantação de soluções de maneira progressiva, conforme a expansão das comunidades. Assim, o ponto de partida era representado pelas soluções com chafarizes e fossas secas até se atingir a demanda de ligações intradomiciliares de água e de redes de esgoto (IPEA, 1989cIPEA. Instituto de Planejamento Econômico e Social. Subsídios para elaboração de programas estaduais de saneamento rural. Série saneamento rural 3. Brasília, DF: IPEA , 1989c. ). Esse avanço progressivo não denota um aspecto negativo. Um dos princípios gerais estabelecidos pela Organização das Nações Unidas (ONU) para os direitos humanos consiste na realização progressiva e não retrocesso (ALBUQUERQUE, 2014 ALBUQUERQUE, C. Realising the human rights to water and sanitation: a handbook by the UN special rapporteur. Booklet 1: Introduction. Portugal: Human Rights to Water & Sanitation, 2014. Disponível em: https://www.ohchr.org/EN/Issues/WaterAndSanitation/SRWater/Pages/Handbook.aspx . Acesso em: ago. 2018.
https://www.ohchr.org/EN/Issues/WaterAnd...
). O cumprimento dos direitos humanos à água e ao esgotamento sanitário depende da disponibilidade de recursos, geralmente não sendo alcançado em um curto espaço de tempo. Sendo assim, os Estados são obrigados a tomar medidas destinadas à realização progressiva desses direitos, não sendo admitidas situações que levem a redução no gozo dos direitos humanos.

As proposições tecnológicas ensejadas pelo PNSR se encontravam, portanto, dentro dos padrões vigentes à época de sua elaboração. A visão de acesso adequado aos serviços de saneamento evoluiu até a abordagem de Direitos Humanos à Água e ao Esgotamento Sanitário (ONU, 2010ONU. Organização das Nações Unidas. The human right to safe drink water and sanitation. General Assembly Resolution A/RES/64/292. Organização das Nações Unidas, 2010. Disponível em: http://www.un.org/en/ga/search/view_doc.asp?symbol=A/RES/64/292 . Acesso em: mar. 2021.
http://www.un.org/en/ga/search/view_doc....
), o que representa uma mudança de paradigma no setor ao incorporar vários aspectos que devem ser considerados para garantir esses direitos, por exemplo, as questões ligadas a gênero, grupos minoritários e vulneráveis, os aspectos culturais da população e seu potencial de participação social, a qualidade do serviço prestado e a aceitabilidade por parte dos usuários e a acessibilidade financeira.

3.3 Educação e participação

Na década de 1980, as ações voltadas ao abastecimento de água potável e à disposição de dejetos em localidades rurais de países em desenvolvimento financiadas pelo Banco Mundial abrangiam o âmbito comunitário, no qual os usuários seriam responsáveis pelas escolhas e pela manutenção dos sistemas com base na adoção de tecnologias apropriadas, de baixo custo e fácil manutenção (KLEEMEIER, 2000 KLEEMEIER, E. The impact of participation on sustainability: an analysis of the Malawi rural piped scheme program. World Development, v. 28, n. 5, p. 929-944, 2000.). Essa filosofia foi incorporada durante a concepção do PNSR.

O PNSR defendia que o processo de educação e participação social se desenvolveria a partir de uma consciência crítica dos cidadãos sobre as práticas de saneamento básico. A população deveria se sentir “dona do projeto”, sendo envolvida desde a sua formulação, passando pela aprendizagem acerca da instalação e funcionamento dos sistemas, até o fornecimento de mão de obra e materiais. A gestão dos serviços, por sua vez, necessitava ser perene. Previa-se a associação comunitária como responsável por selecionar operadores locais que se responsabilizariam pelo adequado funcionamento dos sistemas. Os trabalhadores receberiam capacitação técnica para o desempenho das atividades de operação e manutenção dos sistemas, assim como para a administração financeira. A população participaria do processo educativo, no qual se desenvolveriam conteúdos relacionados ao uso e aos cuidados com os sistemas e à preservação da salubridade ambiental (IPEA, 1990aIPEA. Instituto de Planejamento Econômico e Social. Fundamentos conceituais e metodológicos da educação e participação em saneamento rural. Série saneamento rural 4. 2. ed. Brasília, DF: IPEA , 1990a. ; 1990bIPEA. Instituto de Planejamento Econômico e Social. Subsídios metodológicos para a prática de educação e participação em saneamento rural. Série saneamento rural 5. 2. ed. Brasília, DF: IPEA , 1990b. ).

Dessa maneira, foi estabelecida pelo PNSR uma metodologia pautada na educação e participação social, alicerçada nos ideais de Paulo Freire3 3 Paulo Freire (1921-1997) foi um educador e filósofo brasileiro que influenciou o movimento da pedagogia crítica, a partir da visão de que a educação é um ato político. Ver FREIRE, P. Pedagogia do oprimido. Paz e Terra: São Paulo, 1974. 253 p. , que destacavam as relações de aprendizagem e comunicação dialógica entre educador/educando no processo de produção de conhecimento. O projeto salientava a necessidade de tal procedimento enraizar-se de forma permanente. Todavia, a proposição de envolvimento popular se encerrava na esfera local, onde seriam elaborados os PLSR e implementados os sistemas, não atingindo a formulação da política nacional.

Embora a participação comunitária seja reconhecida atualmente como um fator fundamental para o sucesso e a sustentabilidade de sistemas de saneamento em áreas rurais (MARKS; KOMIVES; DAVIS, 2014 MARKS, S. J.; KOMIVES, K.; DAVIS, J. Community participation and water supply sustainability: evidence from handpump projects in rural Ghana. Journal of Planning Education and Research, v. 34, n. 3, p. 276-286, 2014.; RÍOS-CARMENADO; GUILLÉN-TORRES; HERRERA-REYES, 2013RÍOS-CARMENADO, I.; GUILLÉN-TORRES, J.; HERRERA-REYES, A. T. Complexity in the management of rural development projects: case of Lasesa (Spain). Cuadernos de Desarrollo Rural, v. 10, n. 71, p. 167-186, 2013. ; MARKS; DAVIS, 2012 MARKS, S. J.; DAVIS, J. Does user participation lead to sense of ownership for rural water systems? Evidence from Kenya. World Development , v. 40, n. 8, p. 1569-1576, 2012.), na década de 1980, o diagnóstico realizado pela equipe do PNSR apontava para os desafios de estabelecer essa prática no Brasil, uma vez que os órgãos públicos responsáveis pelas ações de saneamento rural, em geral, não adotavam uma metodologia de trabalho que propiciasse a participação da população (IPEA, 1989bIPEA. Instituto de Planejamento Econômico e Social. Bases para formulação de políticas e programas em saneamento rural. Série saneamento rural 2. Brasília, DF: IPEA , 1989b. ).

A falta de organização por parte da sociedade também foi mencionada pelo PNSR como uma característica a ser superada. O diagnóstico da situação do saneamento rural no Brasil mostrava que as organizações comunitárias eram, muitas vezes, constituídas meramente para cumprir exigências formais para o recebimento de benefícios (IPEA, 1989bIPEA. Instituto de Planejamento Econômico e Social. Bases para formulação de políticas e programas em saneamento rural. Série saneamento rural 2. Brasília, DF: IPEA , 1989b. ). Não se caracterizavam, portanto, como movimentos populares orgânicos em busca de direitos. Pontue-se que as características do associativismo comunitário exercem influência direta no sucesso do empreendimento. Fatores como mobilização coletiva, forte liderança e transparência institucional afetam positivamente diferentes estágios da prestação dos serviços de saneamento. Nos casos em que o associativismo ocorre pro forma, são difíceis o alcance e a manutenção desses fatores (HUTCHINGS et al., 2015 HUTCHINGS, P. et al. A systematic review of success factors in the community management of rural water supplies over the past 30 years. Water Policy, v. 17, n. 5, p. 963-983, 2015.).

Um aspecto fundamental que integrava a estratégia da educação e participação proposta pelo PNSR referia-se à efetiva participação das mulheres, em especial nas estruturas organizativas e nas tomadas de decisões. Na visão do projeto, as mulheres seriam as principais beneficiárias diretas dos serviços de saneamento, já que, usualmente, são as responsáveis pelo abastecimento de água, higiene e limpeza doméstica (IPEA, 1990bIPEA. Instituto de Planejamento Econômico e Social. Subsídios metodológicos para a prática de educação e participação em saneamento rural. Série saneamento rural 5. 2. ed. Brasília, DF: IPEA , 1990b. ). Quando as instalações de saneamento são inadequadas, as mulheres sofrem um impacto desproporcional em sua saúde e qualidade de vida. Uma vez empoderadas, tornam-se capazes de desencadear ações na esfera domiciliar que geram impactos na saúde e bem-estar de todos os moradores. Já na esfera comunitária, a sua forte atuação pode contribuir para a elaboração de políticas públicas mais equânimes (SILVA et al., 2020 SILVA, B. B. et al. Water and sanitation are not gender-neutral: human rights in rural Brazilian communities. Water Policy , v. 22, n. 1, p. 102-120, 2020.). Embora já relevante na década de 1980, as questões de gênero e suas relações com o saneamento foram abarcadas de forma muito incipiente nas políticas públicas; atualmente vêm adquirindo maior visibilidade, sendo enfatizadas nos Direitos Humanos à Água e ao Esgotamento Sanitário (ONU, 2016ONU. Organização das Nações Unidas. Report of the Special Rapporteur on the human right to safe drinking water and sanitation. Human Rights Council, A/HRC/33/49. Organização das Nações Unidas, 2016. Disponível em: https://documents-dds-ny.un.org/doc/UNDOC/GEN/G16/167/00/pdf/G1616700.pdf?OpenElement . Acesso em: mar. 2020.
https://documents-dds-ny.un.org/doc/UNDO...
).

Ainda que as experiências de participação comunitária fossem incentivadas pelo Banco Mundial na década de 1980, seu conceito era limitado frente a visão neoliberal de redução das ações do Estado apresentada pela instituição. A participação comunitária, na perspectiva do Banco Mundial, baseava-se no alcance de quatro objetivos: compartilhar o poder, desenvolver a capacidade dos beneficiários, contribuir para elevar a eficácia do projeto e compartilhar os custos (IPEA, 1990bIPEA. Instituto de Planejamento Econômico e Social. Subsídios metodológicos para a prática de educação e participação em saneamento rural. Série saneamento rural 5. 2. ed. Brasília, DF: IPEA , 1990b. ). Observa-se, portanto, a ausência de aspectos educacionais e de gênero, bem como de acompanhamento permanente e de troca de saberes, todos abordados pelo PNSR-89 com um olhar mais abrangente que o do Banco Mundial. A perspectiva propagada pelo PNSR era a de que os processos participativos não deveriam ocorrer como uma concessão institucional; pelo contrário, deveriam ser entendidos como um direito e uma capacidade real da população de reivindicar e defender seus pontos de vista sobre assuntos que lhes dizem respeito, como saúde, saneamento e educação. Assim, o projeto assumia a participação como um exercício de cidadania (IPEA, 1990bIPEA. Instituto de Planejamento Econômico e Social. Subsídios metodológicos para a prática de educação e participação em saneamento rural. Série saneamento rural 5. 2. ed. Brasília, DF: IPEA , 1990b. ).

A proposta de educação e participação social apresentada pelo atual Programa Saneamento Brasil Rural (BRASIL, 2019aBRASIL. Fundação Nacional de Saúde. Programa Nacional de Saneamento Rural. Brasília, DF: Ministério da Saúde, Fundação Nacional de Saúde, 2019a. Disponível em: http://www.funasa.gov.br/documents/20182/38564/MNL_PNSR_2019.pdf/08d94216-fb09-468e-ac98-afb4ed0483eb . Acesso em: dez. 2019.
http://www.funasa.gov.br/documents/20182...
; 2019bBRASIL. Ministério da Saúde. Portaria nº. 3.174, de 02 de dezembro de 2019. Dispõe sobre o Programa Nacional de Saneamento Rural e dá outras providências. Brasília, DF: Ministério da Saúde, 2019b.) se aproxima da defendida pelo PNSR. O atual programa prevê a articulação de diferentes modalidades de educação como meio de consolidar as responsabilidades compartilhadas. Contudo, sua proposta de participação social é mais enfática, não sendo integrada ao processo educativo, embora haja forte interseção entre ambos. O exercício da participação e controle social é proposto a partir da instituição de fóruns estaduais (BRASIL, 2019aBRASIL. Fundação Nacional de Saúde. Programa Nacional de Saneamento Rural. Brasília, DF: Ministério da Saúde, Fundação Nacional de Saúde, 2019a. Disponível em: http://www.funasa.gov.br/documents/20182/38564/MNL_PNSR_2019.pdf/08d94216-fb09-468e-ac98-afb4ed0483eb . Acesso em: dez. 2019.
http://www.funasa.gov.br/documents/20182...
).

3.4 Aspectos econômico-financeiros

Nos anos 1980, a partir da afirmação de um compromisso pela comunidade internacional com a Década Internacional do Abastecimento de Água e do Esgotamento Sanitário (ONU, 1977 ONU. Organização das Nações Unidas. Report of the United Nations Water Conference. E/CONF. 70/29. Mar del Plata, 14-25 March, 1977. Organização das Nações Unidas, 1977. Disponível em: https://www.ircwash.org/sites/default/files/71UN77-161.6.pdf . Acesso em: mar. 2020.
https://www.ircwash.org/sites/default/fi...
), foram desenvolvidas diversas iniciativas para o abastecimento de água potável em áreas rurais, baseadas na premissa de que esses serviços deveriam ser subsidiados pelos governos, uma vez que grande parte das famílias residentes em comunidades rurais não possuía condições financeiras para pagar pelos sistemas. No entanto, a comunidade internacional não foi unânime em adotar essa concepção. Algumas organizações financeiras, como o Banco Mundial, defendiam uma abordagem alternativa que pregava que as pessoas deveriam pagar por serviços de água melhorados, podendo despender pelo menos de 3 a 5% de sua renda (WORLD BANK, 1993WORLD BANK. The demand for water in rural areas: determinants and policy implications. The World Bank Water Research Team. The World Bank Research Observer, v. 8, n. 1, p. 47-70, 1993.).

Os estudos desenvolvidos no âmbito do PNSR seguiam a linha adotada pelo Banco Mundial. Na visão do projeto, a prática de sustentar os serviços de saneamento exclusivamente com recursos públicos demonstrava resultados limitados, uma vez que os custos de operação e manutenção eram contínuos ao longo do tempo, exigindo aportes de verbas nem sempre disponíveis nos cofres públicos (IPEA, 1989aIPEA. Instituto de Planejamento Econômico e Social. Projeto Local de Saneamento Rural. Série saneamento rural 1. Brasília, DF: IPEA, 1989a. ). Sendo assim, os encargos financeiros deveriam ser de responsabilidade compartilhada entre o poder público e a comunidade (IPEA, 1989bIPEA. Instituto de Planejamento Econômico e Social. Bases para formulação de políticas e programas em saneamento rural. Série saneamento rural 2. Brasília, DF: IPEA , 1989b. ).

O financiamento dos investimentos necessários ao desenvolvimento do PLSR seria proveniente da União, dos estados e municípios, contando também com a participação financeira das comunidades. Já os custos de funcionamento dos serviços seriam cobertos pelos usuários, sempre que possível, sob a forma de taxas ou tarifas. Quando os usuários não pudessem arcar com o valor total dos custos de funcionamento, o PNSR previa que deveriam ser estudadas alternativas que permitissem alcançar o equilíbrio entre os custos e a receita, por exemplo, subsídio pelo município e/ou pelo estado, sob a forma de recursos financeiros ou de pagamentos de custos com energia elétrica, pessoal de operação, produtos químicos etc. (IPEA, 1989aIPEA. Instituto de Planejamento Econômico e Social. Projeto Local de Saneamento Rural. Série saneamento rural 1. Brasília, DF: IPEA, 1989a. ).

Todavia, como mostra a literatura, o critério financeiro de recuperação dos custos não deve ser o único balizador da prestação de serviços de saneamento pelo poder público, que deve garantir, progressivamente, acesso universal à população, de forma equânime e sem discriminação (HALL; LOBINA, 2013 HALL, D.; LOBINA, E. Políticas públicas e financiamento de sistemas de esgotos. In: HELLER, L.; CASTRO, J. E. (Org.). Política pública e gestão de serviços de saneamento. Ed. Ampliada. Belo Horizonte, Rio de Janeiro: UFMG, FIOCRUZ, 2013. p. 156-178.). A incapacidade de pagamento por grupos mais vulneráveis não deve significar, portanto, ausência de prestação do serviço. A acessibilidade econômica constitui um dos critérios dos Direitos Humano à Água e ao Esgotamento Sanitário. Na visão difundida pela ONU, as pessoas devem ter meios de pagar por esses serviços. Contudo, o custo para o atendimento a essas necessidades não pode limitar a capacidade de aquisição, pelos usuários, a diferentes bens e serviços básicos associados a outros direitos humanos. Desse modo, o referencial dos direitos humanos não exige que os serviços sejam prestados gratuitamente, mas os Estados têm a obrigação de fornecer serviços gratuitos ou de implementar mecanismos de subsídios adequados para garantir acesso aos mais pobres (HELLER, 2015 HELLER, L. Affordability of water and sanitation services. Report of the Special Rapporteur on the human rights to safe drinking water and sanitation. United Nations, General Assembly, A/HRC/30/39, 2015. Disponível em: https://digitallibrary.un.org/record/847922 . Acesso em: maio 2021.
https://digitallibrary.un.org/record/847...
; ALBUQUERQUE, 2014 ALBUQUERQUE, C. Realising the human rights to water and sanitation: a handbook by the UN special rapporteur. Booklet 1: Introduction. Portugal: Human Rights to Water & Sanitation, 2014. Disponível em: https://www.ohchr.org/EN/Issues/WaterAndSanitation/SRWater/Pages/Handbook.aspx . Acesso em: ago. 2018.
https://www.ohchr.org/EN/Issues/WaterAnd...
).

A partir da análise apresentada foi possível perceber que, embora o PNSR se baseasse no pagamento de tarifas pelo usuário como meio de garantir a manutenção e a operação dos sistemas, havia a preocupação de que o tipo de tecnologia adotada e o valor cobrado fossem correspondentes ao poder de pagamento das comunidades. Além disso, o PNSR não excluía totalmente a responsabilidade do poder público, prevendo a aplicação de subsídios governamentais, quando necessários. Contudo, apresentava a fragilidade de não verificar se os valores gastos para acesso à água estavam ou não comprometendo o acesso a outros direitos fundamentais. Assim, a atual perspectiva dos Direitos Humanos à Água e ao Esgotamento Sanitário (ONU, 2010ONU. Organização das Nações Unidas. The human right to safe drink water and sanitation. General Assembly Resolution A/RES/64/292. Organização das Nações Unidas, 2010. Disponível em: http://www.un.org/en/ga/search/view_doc.asp?symbol=A/RES/64/292 . Acesso em: mar. 2021.
http://www.un.org/en/ga/search/view_doc....
) se mostra mais legítima frente ao desafio da adequação tarifária na oferta de serviços de saneamento em áreas rurais, uma vez que podem existir segmentos da população em que quaisquer formas de pagamento são inacessíveis.

3.5 Gestão e prestação dos serviços

A proposta do PNSR para prestação e gestão dos serviços de saneamento em áreas rurais esteve assentada na descentralização administrativa. O projeto estabelecia as obrigações governamentais nas três esferas de governo - federal, estadual e municipal -, enfatizando a importância da atuação do nível municipal em conjunto com a comunidade (IPEA, 1989bIPEA. Instituto de Planejamento Econômico e Social. Bases para formulação de políticas e programas em saneamento rural. Série saneamento rural 2. Brasília, DF: IPEA , 1989b. ).

O extenso território brasileiro e as características operacionais dos serviços públicos de saneamento em áreas rurais condicionaram a versão preliminar do PNSR a considerar como altamente oneroso, em termos econômicos, o estabelecimento de ações de saneamento rural em todo o país, a partir de um órgão federal que se articulasse diretamente ao nível local (municipal ou comunitário). Por isso, a relevância do envolvimento do poder público estadual para o equacionamento da política (IPEA, 1987). Estimulava-se a formação de equipes integradas na esfera estadual, oriundas de diferentes secretarias e entidades estaduais, de modo a formatar arranjos institucionais mais adequados às peculiaridades de cada estado. Em função das diversidades regionais, o programa desaconselhava a adoção de um modelo institucional único. A organização institucional a vigorar em cada estado seria estabelecida pelos Programas Estaduais de Saneamento Rural (IPEA, 1987).

A participação dos municípios se mostrava particularmente importante para o PNSR, pois envolvia o nível de poder público mais próximo dos problemas e das demandas locais, constituindo-se em sua base operacional de execução (BRASIL, 1987BRASIL. Programa Nacional de Saneamento Rural. Versão preliminar elaborada em dezembro de 1987. Brasília, DF: Instituto de Planejamento Econômico e Social, 1987.). A repartição de responsabilidades entre os diversos níveis de poder e a comunidade organizada era considerada essencial para a continuidade dos serviços ao longo dos anos. Esperava-se que as associações comunitárias dispusessem de apoio técnico e financeiro sempre que necessário (IPEA, 1989bIPEA. Instituto de Planejamento Econômico e Social. Projeto Local de Saneamento Rural. Série saneamento rural 1. Brasília, DF: IPEA, 1989a. ).

O arranjo proposto pelo PNSR para a gestão e prestação dos serviços de saneamento básico em áreas rurais apresenta similaridades com modelos tradicionalmente adotados em diferentes localidades rurais em todo o mundo, todos baseados na gestão comunitária (CALZADA; IRANZO; SANZ, 2017 CALZADA, J.; IRANZO, S.; SANZ, A. Community-managed water services: The case of Peru. Journal of Environment and Development, v. 26, n. 4, p. 400-428, 2017.; OECD, 2012OECD. Organization for Economic Cooperation and Development. Rural water and sanitation: assessing impacts. Evaluation insights, s. v., n. 6, p. 1-12, 2012. Disponível em: https://www.oecd.org/dac/evaluation/Evaluation%20insights%20WASH%20final%20draft.pdf . Acesso em: mai. 2018.
https://www.oecd.org/dac/evaluation/Eval...
; WHITTINGTON et al., 2009 WHITTINGTON, D. et al. How well is the demand-driven, community management model for rural water supply systems doing? Evidence from Bolivia, Peru and Ghana. Water Policy , v. 11, n. 6, p. 696-718, 2009.). No Brasil, estudos recentes apontam a gestão compartilhada entre a comunidade e o poder público como um modelo viável para a organização das ações de abastecimento de água e esgotamento sanitário em áreas rurais (RAID, 2017RAID, M. A. M. Soluções técnicas de abastecimento de água e modelos de gestão: um estudo em quinze localidades rurais brasileiras. 2017. Dissertação (Mestrado em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos) - Escola de Engenharia, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2017.; SILVA, 2017 SILVA, A. G. Proposição de técnicas e modelos de gestão para o esgotamento sanitário em áreas rurais brasileiras. 2017. Dissertação (Mestrado em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos) - Escola de Engenharia, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2017.).

É importante ressaltar alguns desafios que seriam enfrentados pelo PNSR no findar da década de 1980 e que dificultariam o alcance da efetividade na gestão dos serviços de saneamento em áreas rurais. Embora o princípio da descentralização administrativa defendido pelo projeto se mostrasse consonante com a nova Constituição Federal de 1988, a operacionalização de uma política de saneamento básico seguindo esse modelo demandava suporte do poder local, muitas vezes carente de recursos humanos, técnicos, administrativos e financeiros. Arretche (1999 ARRETCHE, M. T. S. Políticas sociais no Brasil: descentralização em um Estado federativo. Revista Brasileira de Ciências Sociais, v. 14, n. 40, p. 111-141, 1999.) contesta modelos de descentralização em que se transferem responsabilidades aos municípios sem dotá-los de condições para que possam cumprir suas funções. A instituição do planejamento em nível municipal apresenta, ainda, algumas outras dificuldades, principalmente em localidades de pequeno porte. A indisponibilidade de recursos financeiros e as limitações quanto à qualificação profissional e à capacidade técnica municipal são os principais desafios identificados por Lisboa, Heller e Silveira (2013 LISBOA, S. S.; HELLER, L.; SILVEIRA, R. B. Desafios do planejamento municipal de saneamento básico em municípios de pequeno porte: a percepção dos gestores. Engenharia Sanitária e Ambiental, v. 18, n. 4, p. 341-348, 2013. doi 10.1590/S1413-41522013000400006.
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) para a elaboração do planejamento municipal em saneamento.

Se na esfera municipal fazia-se necessário o estabelecimento de apoio e capacitação técnica, na esfera estadual, predominava a atuação das companhias estaduais de saneamento, com sua visão de mercado. Com a política de autossustentação financeira imposta às companhias, a sua viabilidade dependia da escala dos empreendimentos. As áreas rurais não se mostravam, portanto, atrativas. Assim, a proposta do PNSR de repartição de responsabilidades entre as três esferas de governo, com destaque para a atuação das companhias estaduais de saneamento, sobressaía como uma novidade naquele período, algo que ainda hoje se mostra incipiente.

Um modelo recente de gestão dos serviços de saneamento em áreas rurais no Brasil, com o envolvimento de companhias estaduais de saneamento, consiste no Sistema Integrado de Saneamento Rural (Sisar).4 4 Confederação de associações comunitárias responsáveis pela gestão de sistemas de abastecimento de água rurais nas comunidades filiadas. O modelo utiliza mecanismos de envolvimento comunitário e realiza uma clara divisão de tarefas entre o Sisar e as comunidades rurais. O suporte fornecido pela Companhia de Água e Esgoto do Ceará (CAGECE) é apontado como um dos pontos que contribuem para o sucesso do modelo, promovendo sua sustentabilidade (ROCHA, 2013 ROCHA, W. S. Estudo de caso do Sistema Integrado de Saneamento Rural (SISAR) no Brasil. Nota Técnica IBDTN-589. Banco Interamericano de Desenvolvimento, 2013. Disponível em: https://publications.iadb.org/publications/portuguese/document/Estudo-de-caso-do-sistema-integrado-de-saneamento-rural-(SISAR)-no-Brasil.pdf . Acesso em: abril 2020.
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).

Além de realizar ações de saneamento básico nas áreas rurais, por meio de suas companhias, no PNSR o poder público estadual seria também responsável pela formulação dos Programas Estaduais de Saneamento Rural. A proposição de elaboração de programas estaduais de saneamento rural foi retomada no atual Programa Saneamento Brasil Rural. O Programa estabelece a adoção de instrumentos de planejamento tanto na esfera municipal quanto na estadual: como uma das competências dos governos estaduais, define a instituição de Programas de Saneamento Rural; como competências dos governos municipais, demarca a elaboração e execução dos Planos Municipais e Projetos Locais de Saneamento Básico, abrangendo as áreas rurais (BRASIL, 2019aBRASIL. Fundação Nacional de Saúde. Programa Nacional de Saneamento Rural. Brasília, DF: Ministério da Saúde, Fundação Nacional de Saúde, 2019a. Disponível em: http://www.funasa.gov.br/documents/20182/38564/MNL_PNSR_2019.pdf/08d94216-fb09-468e-ac98-afb4ed0483eb . Acesso em: dez. 2019.
http://www.funasa.gov.br/documents/20182...
; 2019bBRASIL. Ministério da Saúde. Portaria nº. 3.174, de 02 de dezembro de 2019. Dispõe sobre o Programa Nacional de Saneamento Rural e dá outras providências. Brasília, DF: Ministério da Saúde, 2019b.).

O atual Programa Saneamento Brasil Rural fomenta, também, a descentralização da política pública de saneamento rural, tal como o PNSR. Mas, para isso, advoga a criação de novas instâncias de coordenação e gestão, por meio da instituição de fóruns nos três níveis federados, buscando, assim, o envolvimento de uma ampla gama de atores relacionados ao saneamento no país (BRASIL, 2019aBRASIL. Fundação Nacional de Saúde. Programa Nacional de Saneamento Rural. Brasília, DF: Ministério da Saúde, Fundação Nacional de Saúde, 2019a. Disponível em: http://www.funasa.gov.br/documents/20182/38564/MNL_PNSR_2019.pdf/08d94216-fb09-468e-ac98-afb4ed0483eb . Acesso em: dez. 2019.
http://www.funasa.gov.br/documents/20182...
; 2019bBRASIL. Ministério da Saúde. Portaria nº. 3.174, de 02 de dezembro de 2019. Dispõe sobre o Programa Nacional de Saneamento Rural e dá outras providências. Brasília, DF: Ministério da Saúde, 2019b.). Esse arranjo se conforma em uma prática inovadora de gestão, de maneira a transcender a esfera governamental a partir da instituição dos fóruns, pelos quais se intenta evitar interrupções na execução da política a cada mudança de governo.

A análise apresentada evidencia que a gestão dos serviços de saneamento básico em áreas rurais não apresenta um modelo único de sucesso, podendo ser estruturada com diferentes arranjos. Um importante aspecto da gestão do PNSR era o de que a política pública de saneamento voltada para as áreas rurais deveria ser planejada, executada e avaliada de acordo com cada realidade.

4. Conclusões

A partir das análises realizadas, há evidências de que o PNSR apresentava proposições inovadoras quando comparadas ao Planasa, plano de abrangência nacional, e às recomendações internacionais do Banco Mundial referentes ao saneamento em áreas rurais. O PNSR encontrava-se à frente de seu tempo: sinalizava uma ruptura com os padrões tecnocráticos estabelecidos e estava sintonizado com as tendências que começavam a se esboçar no cenário internacional, bem como com o ambiente de redemocratização do país, após a derrocada do regime militar.

A visão integrada de saneamento - baseada em ações conjuntas de abastecimento de água, esgotamento sanitário e melhorias sanitárias - e sua relação direta com a saúde pública, a qualidade de vida e o bem-estar da população demonstram a busca da superação da visão puramente tecnicista do saneamento, focada na infraestrutura. As propostas de educação e participação social procuravam promover a troca de saberes e a assimilação consciente de informações. No que concerne à prestação dos serviços de saneamento, a relevância do poder público é enfatizada, sendo recomendado o fornecimento de suporte às associações comunitárias para operação e manutenção dos sistemas. O PNSR demonstrava preocupação em se adequar à realidade local e dela se aproximar, prevendo a adoção de instrumentos de planejamento nas esferas municipais e estaduais. Ademais, estimulava a adoção de tecnologias apropriadas às peculiaridades culturais, regionais e demográficas. Em um país tão extenso e rico em diversidade quanto o Brasil, o PNSR rejeitava a rigidez e instigava a pluralidade - na concepção de soluções, na composição de equipes técnicas, na implementação dos sistemas e na gestão dos serviços.

O PNSR deixou como legado significativo aporte de conhecimentos, por meio de estudos baseados na estrutura institucional e na organização federativa brasileiras, que, ainda hoje, se mostram atuais em diversos pontos. As sementes deixadas pelo PNSR em seus princípios e diretrizes geraram frutos, como é possível observar nas atuais proposições contempladas pelo Programa Saneamento Brasil Rural. Ainda que o objetivo final do projeto não tenha sido alcançado, uma vez que o país não promoveu a formulação de uma política pública de saneamento na década de 1980 que contemplasse o rural, seus conceitos e propostas ficaram marcados na trajetória histórica do saneamento no Brasil, chamando a atenção para as recomendações inovadoras para o período.

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  • 1
    Os autores agradecem à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig), pela bolsa de doutorado fornecida à primeira autora; à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), pelo apoio financeiro ao Programa de Pós-Graduação; e ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), pela bolsa de produtividade em pesquisa fornecida à autora Sonaly Rezende.
  • 2
    Atualmente denominado Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
  • 3
    Paulo Freire (1921-1997) foi um educador e filósofo brasileiro que influenciou o movimento da pedagogia crítica, a partir da visão de que a educação é um ato político. Ver FREIRE, P. Pedagogia do oprimido. Paz e Terra: São Paulo, 1974. 253 p.
  • 4
    Confederação de associações comunitárias responsáveis pela gestão de sistemas de abastecimento de água rurais nas comunidades filiadas. O modelo utiliza mecanismos de envolvimento comunitário e realiza uma clara divisão de tarefas entre o Sisar e as comunidades rurais.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Ago 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    26 Ago 2021
  • Aceito
    17 Mar 2022
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