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PROJETOS DE GERAÇÃO DE TRABALHO E RENDA E A CONSCIÊNCIA DE CLASSE DOS DESEMPREGADOS

PROJECTS TO GENERATE EMPLOYMENT AND INCOME AND THE UNEMPLOYED WORKERS’ CLASS CONSCIOUSNESS

Resumos

Objetiva-se analisar o processo de constituição da consciência de classe em desempregados que reivindicaram a implantação de Políticas Públicas de Geração de Trabalho e Renda, operado pelos desdobramentos contraditórios das práticas de trabalho nas periferias das cidades. Para tanto, analisamos as experiências de trabalho protagonizadas pelos integrantes do Movimento dos Trabalhadores Desempregados (MTD) à luz do debate marxista sobre consciência de classe. Filiados a uma abordagem dialético-materialista, recorremos às seguintes técnicas de pesquisa: entrevistas, observação e análise documental. Concluímos que a disputa pela aplicação dos fundos públicos possibilita o processo de convergência dos interesses imediatos do grupo aos interesses necessários da classe, revelando a mediação do Estado na relação antagônica capital-trabalho. A objetivação dos projetos tem, pelo menos, dois desdobramentos contraditórios: por um lado, os membros do MTD continuam a ser produção necessária para o movimento de acumulação, mecanismo que alavanca a valorização do capital e a própria condição de existência do modo de produção capitalista, por outro, eles negam este modo antagônico de controle do sociometabolismo da humanidade, manifestando-se como uma possibilidade concreta de organização da classe trabalhadora ao compreender os limites desse modo de produção e oporem-se a ele.

Políticas públicas de geração de trabalho e renda; Desemprego; Movimentos sociais; Estado; Consciência de classe; Classes sociais


We aim to analyze the process of formation of class consciousness in unemployed who claimed the implementation of Public Policies for generating Work and Income, identifying the contradictory developments in working practices in the outskirts of cities. Therefore, we analyzed the experiences of working as practiced by members of the Unemployed Workers Movement (MTD) in the light of the debate about Marxist class consciousness. The methodology used in the present work is characteristic of the dialectical-materialist approach, which is based in three assumptions: contradiction, totality and historicity. We conclude that the dispute over the application of public funds enables the convergence of the immediate interests of the group to the necessary interests of the class, revealing the mediation of the state in the antagonistic relationship capital and labor. The objectification of the projects have at least two contradictory: on the one hand, members of the MTD is still needed to produce the movement of accumulation, mechanism that leverages the capital appreciation, and the very condition of existence of the capitalist mode of production; secondly, they deny this so antagonistic control sociometabolismo of humanity, manifesting itself as a concrete possibility of organizing the working class.

Public Policies for Generation of Work and Income; Unemployment; Social Movements; State; Class Consciousness; Social Classes


Introdução

A condição de “exclusão social” é uma das formas de subjetivação da condição concreta em que se encontram os indivíduos-trabalhadores que não possuem um contrato estável de venda da sua força de trabalho. O desenvolvimento das forças produtivas é um dos determinantes que constituiu o espaço social concreto onde os desempregados, apesar de trabalharem, percebem-se como excluídos. No entanto, uma análise menos parcializada das relações societais demonstra que estes permancem colaborando para o movimento de (re)produção do capital, estando assim excluídos – no máximo – de seus grupos imediatos anteriores, pelo fato da nova concretude da vida lhes impossibilitar a manutenção dos modos de vida já subjetivados. Se tal condição de exclusão possibilita outras formas de subjetivação das condições concretas de reprodução da vida, ela também desloca a relação antagônica entre capital-trabalho para fora do ente privado empresa, sem, contudo, superar a condição de exploração do trabalhador. Sob a insígnia da reivindicação pela cidadania, o Estado adquire, enquanto agente mediador, protagonismo naquela relação. Os programas de governo com suas múltiplas políticas de investimento e políticas públicas são exemplos de como o fundo público pode ser um móvel de disputa entre as classes, possibilitando a constituição da consciência de classe. O objetivo deste estudo é analisar o processo de constituição da consciência de classe1 em desempregados que reivindicaram a implantação de políticas públicas de geração de trabalho e renda, operado pelos múltiplos desdobramentos contraditórios das práticas de trabalho nas periferias das cidades oportunizadas por tais políticas.

O Movimento dos Trabalhadores Desempregados (MTD) no Rio Grande do Sul é um exemplo da possibilidade de indivíduos que compõem o exército de reserva, especificamente a superpopulação estagnada, subjetivarem as condições concretas da não-efetivação de contratos estáveis de venda da força de trabalho para além da “exclusão social”. A superação deste modo de subjetivação foi possível por meio da construção de propostas de trabalho para os desempregados das periferias que, sendo objetivadas, manifestaram as contradições entre capital-trabalho, tensionando o movimento de constituição de classe pela necessidade da superação dos interesses imediatos do grupo. Para a análise das reivindicações e experiências de trabalho protagonizadas pelos integrantes do Movimento, utilizaremos o debate marxista sobre consciência de classe, sobretudo, os estudos de Iasi (2006)IASI, M. L. As metamorfoses da consciência de classe: o PT entre a negação e o consentimento. São Paulo: Expressão Popular, 2006., que se ocupam da constituição do grupo subversivo enquanto negação subjetiva da (re)produção objetiva.

Na próxima seção, ofereceremos considerações sumárias quanto ao método, sucedidas por apresentação do debate teórico sobre consciência de classe com o qual nos identificamos. Optamos por apresentar o método no início do texto por considerarmos que a leitura ganha fluidez quando passamos da discussão teórica aos dados, tendo em vista que são esses que estão em ligação direta com aquela, portanto, trata-se de uma mera alteração de forma de exposição que segue a preferência da autora. Na sequência, item 3, apresentaremos a análise de dados e nossas considerações, acerca do processo de objetivação das subjetividades envolvidas no processo de rompimento com a primeira forma de consciência e do movimento que ruma à consciência de classe.

Método

Os dados foram coletados, ao longo dos anos de 2007 e 2008, por meio de entrevistas com dez integrantes do MTD, observação participante e análise documental. Alguns desses entrevistados integram ou integraram a direção estadual do Movimento, outros ainda não participaram de tal instância. A escolha dos entrevistados ocorreu pelo critério de participação política nas múltiplas instâncias da organização ao longo dos dez anos de existência do Movimento. A identificação desses sujeitos ocorreu por meio da observação participante, ou seja, a inserção no cotidiano da organização foi o que explicitou quem seriam as principais fontes a serem ouvidas formalmente. Cabe ainda destacar que os dados coletados nas entrevistas corroboraram os múltiplos depoimentos ouvidos durante os cursos de formação, as manifestações de rua, os jantares, dentre outros espaços em que a observação participante ocorreu.

Nas análises dos dados, priorizamos a compreensão dos processos de resolução dos dilemas (condicionantes internos e externos) e como esses condicionaram novos dilemas que demandaram novas soluções, tencionando o movimento de constituição da consciência de classe, por meio da problematização das contradições concretas inerentes ao modo de sociabilidade capitalista. Portanto, não serão as discordâncias internas que aparecerão no primeiro plano, mas os momentos de superação dessas. Em virtude disso, quando mencionamos nas análises que: o “MTD agiu, pensou etc.”, não estamos hipostasiando a organização, mas mencionando a práxis dos integrantes que preponderaram momentaneamente no movimento de totalização. Destacamos também que, por observarmos o momento da coletividade, não entraremos na discussão sobre os conflitos individuais decorrentes da substância de valor que comporta a psique (a primeira forma de consciência), isso foi realizado em outros dois textos já publicados (FERRAZ et al., 2010FERRAZ, D. L. S.; BIASOTTO, L.; TONON, L. A centralidade do trabalho no processo de construção da identidade: um estudo com membros do movimento dos trabalhadores desempregados. In: GARCIA F. C.; LEAL, D. H.; HONÓRIO, L. C. (Orgs.). Relações de poder e trabalho no Brasil contemporâneo. Curitiba: Juruá, 2010. p. 109-31.; FERRAZ, MENNA-BARRETO, 2012), também não descreveremos o histórico do Movimento, tampouco os condicionantes econômicos e políticos da década de 1990 que possibilitaram o vir-a-ser do movimento. Isso é matéria de texto publicado anteriormente (FERRAZ, MENNA-BARRETO, 2012). Para preservar a identidade dos participantes deste estudo, optamos por atribuir-lhes pseudônimos.

A orientação teórica adotada baseia-se nos pressupostos do materialismo dialético. Parte-se do que “se oferece” à observação, para percorrer o processo contraditório da constituição real do que é mais imediato e atingir o concreto “como um sistema de mediações e de relações cada vez mais complexas e que nunca estão dadas às observações” (CHAUÍ, 1990, p. 48). Deste modo, “O concreto é concreto porque é a síntese de muitas determinações, isto é, unidade do diverso” (MARX, 1996MARX, K. Para a crítica da economia política. São Paulo: Nova Cultura, 1996. (Coleção Os pensadores), p. 39). A concepção dialético-materialista em Marx possui três princípios fundantes: a contradição, a totalidade e a historicidade. Na dialética, a concepção de totalidade é o que permite entender a dimensão de cada elemento e a síntese desse conjunto; em suma, a estrutura significativa. A relação do todo com as partes, das partes entre si e das partes com o todo alerta que os diversos aspectos da realidade estão entrelaçados, constituindo unidades contraditórias. Segundo Löwy (1994LÖWY, M. As aventuras de Karl Marx contra o Barão de Münchhausen: marxismo e positivismo na sociologia do conhecimento. São Paulo: Cortez, 1994., p. 17), “Uma análise dialética é sempre uma análise das contradições internas da realidade”. E as contradições são produto da capacidade humana de atividade, o que quer dizer, contra as concepções de uma “essência humana”, que o ser socialé o que é enquanto está sendo, condicionado pelo que foi – eis a dimensão da historicidade. Em virtude da economia de espaço, é impossível demonstrar empiricamente em detalhe e por completo a reciprocidade dialética do encadeamento entre essas três dimensões no processo concreto. Passamos, então, às teorias que subsidiam nossas reflexões.

“As metamorfoses da consciência de classe”

O historiador dos conflitos sociais pode intrigar-se com uma questão que é a seguinte: em determinadas situações, acontecem processos de severos confrontos, episódios violentos (e não nos referimos estritamente à violência física) nos quais tomam parte milhares ou milhões de pessoas, e que depois costumam ser descritos como “grandes momentos da história” ou algo parecido; esses episódios de rupturas dão lugar a processos de institucionalização, no sentido de que o que foi subversivo passa a ser parte da “normalidade” das coisas. Como entender esses processos senão recorrendo à analogia clássica dos ciclos, que estariam sempre aí a se repetir, eternamente? Essa questão que intriga e inspira o estudo de Mauro Iasi, cujo título indica o terreno em que o autor focaliza o trato do problema: As metamorfoses da consciência de classe. “Em nossos estudos, buscamos compreender que essa aparente circularidade só pode ser entendida se incluirmos o fenômeno da consciência no conjunto das relações que determinam o ser social e as classes” (IASI, 2006IASI, M. L. As metamorfoses da consciência de classe: o PT entre a negação e o consentimento. São Paulo: Expressão Popular, 2006., p. 16).

É uma problemática ousada à que Iasi (2006)IASI, M. L. As metamorfoses da consciência de classe: o PT entre a negação e o consentimento. São Paulo: Expressão Popular, 2006. se propõe, pois consciência é largo alvo de debate filosófico e sociológico. Consciência enquanto algo como interioridade é uma formulação pós-aristotélica que provém do neoplatonismo estóico, escola que elaborou a consciência enquanto relação privada do homem consigo mesmo, vetor de desligamento das coisas e dos outros e de ligamento consigo. O cristianismo assentaria nesses pressupostos estóicos o entendimento da separação alma-mundo, mas os cristãos não foram os únicos que aderiram à noção de subjetividade (ABBAGNANO, 2000ABBAGNANO, N. Dicionário de filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 2000.). Nas Ciências Sociais, o debate também se estende em grandes proporções; Marx, Weber, Durkheim, Mauss, Lévi-Strauss, Bourdieu, Giddens, Habermas – só para citarmos alguns estudiosos – trabalham, resguardadas suas peculiaridades, com alguma noção de interior/exterior, subjetivo/objetivo etc. Por vezes, a noção de consciência é preterida em prol de noções como reflexividade, discursividade ou racionalidade, mas todas compartilham a noção de subjetividade.

Iasi (2006)IASI, M. L. As metamorfoses da consciência de classe: o PT entre a negação e o consentimento. São Paulo: Expressão Popular, 2006. se propõe a estudar o fenômeno da consciência a partir das formulações filosóficas e sociológicas elaboradas por Marx. O tema da subjetividade é uma problemática cara ao debate marxista, porque durante muito tempo a leitura positivista dos escritos de Marx soterrou a discussão da subjetividade, tratando-a como aspecto desimportante dos fenômenos sociais. No debate quanto à consciência de classe não havia muita coisa a debater – cada classe tinha uma consciência própria e, se esta não estava se manifestando “corretamente”, tratava-se apenas de “despertá-la” e ponto final. Na contramão desse entendimento, Iasi (2006)IASI, M. L. As metamorfoses da consciência de classe: o PT entre a negação e o consentimento. São Paulo: Expressão Popular, 2006. refuta a consciência como essência, seja latente ou manifesta, e também duvida que a classe encontra-se instituída à revelia dos seus próprios agentes. A seguir, reconstruiremos mais sistematicamente os passos desses argumentos.

Como a problemática de Iasi (2006)IASI, M. L. As metamorfoses da consciência de classe: o PT entre a negação e o consentimento. São Paulo: Expressão Popular, 2006. se inscreve em compreender os processos de subversão das relações de poder, os movimentos de formação de consciência de classe que lhe interessam são aqueles que possibilitam “rompimento com as amarras que prendem nossas mentes à reprodução da ordem que nos conforma” (IASI, 2006IASI, M. L. As metamorfoses da consciência de classe: o PT entre a negação e o consentimento. São Paulo: Expressão Popular, 2006., p. 16). Vemos que Iasi (2006)IASI, M. L. As metamorfoses da consciência de classe: o PT entre a negação e o consentimento. São Paulo: Expressão Popular, 2006. reafirma as considerações de Marx e Engels n’A ideologia alemã sobre que a consciência de classe não pode ser compreendida sem apreendermos como as classes estão manifestando-se concretamente em determinado contexto sócio-histórico particular, pois nenhuma classe é “portadora metafísica de uma ‘missão histórica’” (IASI, 2006IASI, M. L. As metamorfoses da consciência de classe: o PT entre a negação e o consentimento. São Paulo: Expressão Popular, 2006., p. 26), bem como a consciência de classe não “reside” no indivíduo ou na sociedade – essa polarização tão equivocada quanto recorrente –, mas num conjunto de “mediações que ligam as determinações particulares e genéricas do ser social” (IASI, 2006IASI, M. L. As metamorfoses da consciência de classe: o PT entre a negação e o consentimento. São Paulo: Expressão Popular, 2006., p. 25). E a consciência de classe determina ao mesmo tempo em que é determinada pelo ser social, de maneira que podemos defini-la como estrutura estruturante que é ela mesma estruturada2.

Temos em jogo aí um ser social cuja unidade de estratificação é uma classe. Que Iasi quer dizer com isto?

O ser da classe trabalhadora não está somente no momento particular de sua expressão cotidiana, nem na abstração sociológica de um sujeito histórico, mas precisamente no movimento que leva de um até outro. Não está num operário andando com suas mágoas e incertezas pela rua, nem em sua classe agindo como sujeito de um determinado período histórico por meio dos instrumentos criados em sua ação. O ser da classe e, portanto, sua consciência, estão no movimento que leva destas trajetórias particulares até conformações coletivas, de modo que estas são constituídas pela multiplicidade de ações particulares ao mesmo tempo que as ações particulares são constituídas por cada patamar coletivo objetivado. O ser e a consciência da classe, portanto, estão mais no processo de “totalização” do que na “totalidade” enquanto produto […] pois aqui também o produto costuma esconder o processo (IASI, 2006IASI, M. L. As metamorfoses da consciência de classe: o PT entre a negação e o consentimento. São Paulo: Expressão Popular, 2006., p. 75).

Diríamos, por conseguinte, que a classe é unidade sociológica privilegiada para se apreender os movimentos do ser social porque é irredutível ao indivíduo ou à sociedade (seja lá o que signifiquem essas noções...). O que não significa que classe seja absolutamente contingente. Ela também é um determinado tipo de mediação necessária devido às condições ontogenéticas da sociabilidade capitalista.

Iasi (2006)IASI, M. L. As metamorfoses da consciência de classe: o PT entre a negação e o consentimento. São Paulo: Expressão Popular, 2006., a fim de compreender o movimento das mediações que ligam, mobiliza as proposições elaboradas por Freud, Elias e Sartre sem, contudo, eximir-se de problematizar as bases epistemológicas desses autores a partir da concepção ontológica marxiana. Em Freud, Iasi (2006)IASI, M. L. As metamorfoses da consciência de classe: o PT entre a negação e o consentimento. São Paulo: Expressão Popular, 2006. busca uma teoria da primeira forma de consciência, baseada num padrão de reciprocidade dialética entre ego e superego; de Elias, adota entendimentos a respeito dos processos contemporâneos de individualização; em Sartre, toma uma teoria da formação dos grupos e busca resolver o impasse da subjetivação da objetividade e objetivação da subjetividade que este vislumbrou. Vejamos tudo isso em pormenor.

Iasi mobiliza Freud porque está intrigado sobre “como se dá a transformação das relações sociais em funções psicológicas”, “como este conjunto de relações interioriza e forma nos indivíduos de certa época sua consciência social” (IASI, 2006, p. 134). Freud desenvolveu uma noção de dialética psíquica – cujo vetor de realização é concebido em termos da tríade id-ego-superego – que Iasi (2006)IASI, M. L. As metamorfoses da consciência de classe: o PT entre a negação e o consentimento. São Paulo: Expressão Popular, 2006. julga pertinente à questão. O indivíduo nasce carregado com uma realidade somática pulsional e instintiva (id). Ocorre uma frustração nesse indivíduo quando ele percebe que o mundo circundante não é uma extensão do seu corpo e que desejar não basta para acioná-lo. Essa primeira frustração funda o “eu” (ego), que cumpre o papel de veículo de mediação subjetiva entre duas objetividades (pulsões somáticas e mundo externo). Inicialmente, o ego tem por critério de orientação tão somente o “princípio do prazer”, no sentido de que o mundo externo é apreendido apenas na condição de meio para realização das demandas do id. Paulatinamente, contudo, o neófito interioriza normas e valores que não implicam necessariamente prazer, e que são demonstrados pelos adultos circundantes, constituindo o superego. Agora, o mundo externo não está mais tão externo, digamos, pois se instalam na psique princípios mundanos que não coincidem necessariamente com as demandas por prazer: princípios morais etc. Devido à internalização do mundo social na forma de superego, o ego passa a mediar duas instâncias que agora são internas à psique. E o ego vai tender a priorizar as exigências do mundo externo veiculadas pelo superego ante as exigências do id; promove a castração dos desejos em troca da sobrevivência (eis o famoso complexo de Édipo).

Esse processo da dialética psíquica inaugura uma primeira forma de consciência, que se institui mediada por relações de afetividade vivenciadas por um neófito ainda incapaz de racionalizar sobre o mundo que o cerca. É a família3 que constitui o primeiro lócus mediador por via do qual se dá a primeira internalização do mundo exterior, a mais fundamental para a sedimentação da psique. Esta primeira forma de consciência é o que se manifesta socialmente enquanto aquilo que costumamos referir por senso comum. Um argumento importante no qual Iasi (2006)IASI, M. L. As metamorfoses da consciência de classe: o PT entre a negação e o consentimento. São Paulo: Expressão Popular, 2006. insiste é o de que esse movimento da dialética psíquica nos permite compreender que o controle social, a dominação, é subjetivado como autocontrole e como carga afetiva, e não como “meras ideias” que podem ser facilmente substituídas por novas ideias. A primeira forma de consciência é pré-ideológica, é mais uma estruturação das possibilidades de pensar do que os pensamentos propriamente ditos. Essa questão da conversão da ordem social em valores subjetivos remete Iasi (2006)IASI, M. L. As metamorfoses da consciência de classe: o PT entre a negação e o consentimento. São Paulo: Expressão Popular, 2006. a considerar os estudos de Elias, que se dedicou justamente a estudar problemas sociológicos implicados na relação entre estruturas sociais e estruturas de personalidade.

Elias, em A sociedade dos indivíduos (1994), comenta a produção histórica de esse ser social particular que conhecemos por indivíduo4. Para ele, o dualismo sociedade-indivíduo decorre da compreensão datada da distinção do homem em corpo-mente, possível graças ao processo de diferenciação das funções sociais (divisão social do trabalho) caracterizado por crescente complexificação da interdependência e debilitação dos laços grupais. Elias (1994)ELIAS, N. A sociedade dos indivíduos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1994. afirmar que o controle social é internalizado como autocontrole e como repressão dos impulsos, visando oportunizar uma realização do ideal de ego. O ideal de ego está relacionado ao processo histórico de individualização, em virtude do qual o homem deve experimentar-se enquanto algo distinto e independente do seu grupo, sendo esse processo de autonomização e diferenciação uma realização socialmente exigida (ELIAS, 1994ELIAS, N. A sociedade dos indivíduos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1994.). O processo de especialização das funções sociais não oportuniza a todos as mesmas possibilidades desta realização, criando uma tensão que não resulta de uma presumida relação “entre necessidades não-sociais e naturais do indivíduo e as exigências artificiais de uma ‘sociedade’ fora dele”, mas sim “de tensões e de dificuldades de cada pessoa, ligadas às normas peculiares de comportamento de uma sociedade” (ELIAS, 1994ELIAS, N. A sociedade dos indivíduos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1994., p. 121), de maneira que “a carga somática pulsional ao se expressar já o faz assumindo uma forma que a condiciona e a distancia da pura existência físico-natural” (IASI, 2006IASI, M. L. As metamorfoses da consciência de classe: o PT entre a negação e o consentimento. São Paulo: Expressão Popular, 2006., p. 182). A crítica à Freud aqui é patente, assim como é a instauração do materialismo histórico para a compreensão da carga somática pulsional. Iasi (2006)IASI, M. L. As metamorfoses da consciência de classe: o PT entre a negação e o consentimento. São Paulo: Expressão Popular, 2006. pondera que, mesmo considerando as limitações da análise de Freud em virtude da naturalização da ideia de indivíduo que promove, a dialética psíquica que este evidencia é fundamental para a compreensão da interiorização do exterior.

Outro desdobramento da exigência de autocontrole, que se intensificou conforme desenvolvimento do processo de divisão social do trabalho, foi que, se por um lado o indivíduo deve autonomizar-se crescentemente, por outro seu grau de interdependência social complexificou-se e sua identidade-nós esmaeceu, o que exige, por sua vez, mais reposição de autocontrole... De modo que, atualmente, produzem-se indivíduos encapsulados. No momento histórico em que vivemos, a forma preponderante de ser-e-estar no mundo é a das cápsulas de individualidade (ELIAS, 1994ELIAS, N. A sociedade dos indivíduos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1994.). Para Iasi (2006)IASI, M. L. As metamorfoses da consciência de classe: o PT entre a negação e o consentimento. São Paulo: Expressão Popular, 2006., essa forma particular de ser-e-estar é generalizada pelas “engrenagens do capital” ao longo de um processo de violenta expropriação, no qual a generalidade do ser social particulariza-se e a particularidade, universaliza-se.

A individualização do ser social é uma precondição para que os livres vendedores de trabalho se apresentem ao mercado, assim como é essencial para a forma privada de apropriação dos meios de produção e, mediante este ato, também do valor excedente gerado no processo de consumo da mercadoria força de trabalho. No reino da igualdade todos os indivíduos disputam entre si, seja uma vaga no mercado de trabalho, seja na livre concorrência entre capitalistas, e esta guerra é disciplinada pelas “leis do mercado” e suas mãos invisíveis (IASI, 2006IASI, M. L. As metamorfoses da consciência de classe: o PT entre a negação e o consentimento. São Paulo: Expressão Popular, 2006., p. 195).

Assim, na sociedade das cápsulas de individualidade, “a consciência imediata só pode assumir a forma de consciência do eu” (IASI, 2006IASI, M. L. As metamorfoses da consciência de classe: o PT entre a negação e o consentimento. São Paulo: Expressão Popular, 2006., p. 207), e um “eu” que tenderá a (re)produzir continuamente os parâmetros da primeira forma de consciência. Não é em virtude de alguma grande coerência interna que essa consciência permanece ao longo do tempo, mas porque ela recria a si mesma constantemente, principalmente através da mediação da família (e, posteriormente, dos grupos imediatos), como já aludimos anteriormente, que propicia a vivência primária do ser, tendo como base a afetividade.

A (re)produção social, mesmo de uma consciência encapsulada na forma do “eu”, não tem outra maneira de se processar senão coletivamente. A consciência é relacional e por isso mesmo que está plenamente permeada pelas contradições e antagonismos típicos das relações sociais sob o sociometabolismo do capital. Por exemplo: a ética liberal-burguesa do trabalho e da mobilidade social, subjetivada afetivamente, acarreta uma situação em que o trabalhador enxerga na venda de sua força de trabalho a única possibilidade de deixar de fazer parte da classe trabalhadora. Trabalhar mais horas por dia, mais dias por mês, mais meses por ano; trabalhar a serviço de mais de um empregador, ser autônomo, procurar sempre novas oportunidades de emprego; desenvolver competências, ser trabalhador flexível – quantos trabalhadores consomem suas vidas assim, convencidos de que estão se movendo em direção ao abandono da condição de trabalhador? Contudo, essas práticas, que são estratégias de valorização da mercadoria força de trabalho, tendem a produzir duas consequências:

  1. Por mais criativos, talentosos e flexíveis que sejamos, é inerente ao processo de (re)produção do capital que “não haja trabalho” para todos; os obstáculos da mobilidade social são, em geral, creditados ao sistema de méritos, o que faz encobrir a questão realmente determinante – é a posição ocupada pelo indivíduo no processo produtivo o condicionante do acesso ou não à qualificações, networks e postos de trabalhos mais rentáveis, limitando a muito poucos chances efetivas de “vencer na vida”.

  2. Um possível aumento na renda se faz acompanhar pelo aumento do desgaste físico-psíquico, que deteriora a mercadoria vendida (força de trabalho), reduzindo sua possível vida útil para o capital. Inúmeros estudos sobre prazer-sofrimento no trabalho (LADEIRA e COSTA, 2007), qualidade de vida (SALIM, 2003SALIM, C. A. Doenças do trabalho: exclusão, segregação e relações de gênero. São Paulo em Perspectiva, São Paulo, v. 17, n. 1, p. 11-24, jan./mar. 2003.; MARCONDES, 2003MARCONDES, W. B. et al. O peso do trabalho “leve” feminino à saúde. São Paulo em Perspectiva, São Paulo, v. 17, n. 2, p. 91-101,abr./jun. 2003.), mecanismos de resistência (GRISSI, 2009) e assédio moral (FREITAS, 2007FREITAS, M. E. Quem paga a conta do assédio moral no trabalho? RAE eletrônica, São Paulo, v. 6 n. 1, jan./jun. 2007.; COSTA, 1995COSTA, S. G. Assédio sexual: uma versão brasileira. Porto Alegre: Artes e Ofícios, 1995.) corroboram essa relação. Por outro, aquele aumento não ocorre sem a correspondência proporcional no aumento da produtividade do trabalho que, por sua vez, intensifica a concorrência intra-classe trabalhadora, tendendo a um decréscimo do valor da mercadoria no mercado de trabalho, isto é, efetiva-se a tendência do decréscimo do possível primeiro aumento do rendimento no âmbito geral. Tal luta heróica e individualizada para “vencer na vida” evolui num crescente de agressividade e tende a resultar em cada vez menos e menores vantagens reais para os vendedores de força de trabalho.

Em um contexto societal onde o trabalhador-indivíduo percebe o outro mediado por relações sociais alienadas, há o obscurecimento de que a ascendência de alguns é realizada à custa do descarte de outros. Neste caso, o problema se resolve sob a aparência de inadaptabilidade às exigências do mercado de trabalho, acionando-se outro conjunto de ideias presente no senso comum e sustentado, sobretudo, pelos estudos desenvolvidos por acadêmicos da administração, e que pode ser resumido no discurso da empregabilidade. Assim, a estrutura do mercado de trabalho existente na sociedade capitalista que não permite à maioria dos trabalhadores a concretização da mobilidade social e que propicia o desgaste físico-psíquico do indivíduo é negada apenas no âmbito da eterna busca por um trabalho melhor. Efetua-se a criação da recriação da sociedade dos indivíduos encapsulados.

A (re)produção do senso comum é alimentada e fortalecida pela tripla correspondência entre as relações concretas, as ideias aceitas pelo grupo imediato e a substância dos valores que compõem o psiquismo (estruturação afetiva id-ego-superego). No exemplo arrolado a respeito do senso comum referente à mobilidade social observamos que ele se reproduz porque é sustentado: a) pelos valores constituintes da consciência encapsulada que se manifesta no desejo do ideal de ego exigido socialmente de “vencer na vida;” b) pelas ideias aceitas pelo grupo imediato do que representar “vencer na vida” e c) pelas possibilidades concretas no mercado de trabalho – às vezes, de fato, algum trabalhador “atinge o sucesso”, que será exaustivamente propagandeado, em que pese essa eventual ascendência de alguns só se realizar a custa do descarte de muitos, como já mencionado.

Essa tripla correspondência é operante na (re)produção de todo senso comum. Espaços sociais concretos e consciência individual só podem se processar coletivamente, por certo, os grupos imediatos são a mediação primordial desse “se processar coletivamente”. Onde reside, então, alguma possibilidade de ruptura subversiva com o senso comum praticado pelo ser social? Quando há crise em algum dos pólos dessa tripla correspondência. Esse é o momento para irmos à Sartre, acompanhando os passos de Iasi (2006)IASI, M. L. As metamorfoses da consciência de classe: o PT entre a negação e o consentimento. São Paulo: Expressão Popular, 2006..

O Sartre que ele mobiliza não é aquele de O Ser e o Nada (1943), que se ocupava com o desenvolvimento de uma fenomenologia extremamente subjetivista, mas o Sartre de Crítica da razão dialética (1960), que havia se aproximado razoavelmente de Marx, sem abandonar, contudo, alguns pressupostos caros à fenomenologia. Sartre propõe a noção de projeto: o indivíduo encontra-se diante de um “campo de possibilidades” determinadas a partir do qual pode agir em direção ao “ainda não existente”, consumar um projeto por via de uma práxis; e toda práxis é, ao mesmo tempo, negativa, porque pretende superar as determinações, e positiva, porque instituído por meio dos possíveis. Trata-se de uma dialética do objetivo e do subjetivo, onde a práxis enquanto execução de um projeto

[...] é um passo do objetivo ao objetivo por meio da interiorização; o projeto como superação subjetiva da objetividade em direção à objetividade, entre as condições objetivas do meio e as estruturas objetivas do campo dos possíveis, representa em si mesmo a unidade movente da subjetividade e da objetividade, que são as determinações cardinais da atividade. O subjetivo aparece então como momento necessário do processo objetivo (SARTRE apud IASI, 2006IASI, M. L. As metamorfoses da consciência de classe: o PT entre a negação e o consentimento. São Paulo: Expressão Popular, 2006., p. 208).

Há, dessa maneira, aquilo que Sartre denomina movimento de totalização, cuja notação pode ser representada enquanto objetividade ↔ subjetividade ↔ objetividade, e assim sucessiva e ininterruptamente, pois o indivíduo é o ato que empreende em devir de totalização. A práxis negativa tem o caráter de negação da negação, porque nega as determinações que negam o que seria a livre práxis do projeto, mas sob a condição de não ter por onde romper totalmente com o que nega.

Nossa atual configuração de divisão social do trabalho, marcada pela concorrência generalizada entre indivíduos encapsulados, é caracterizada por Sartre como uma pluralidade de solidões onde estamos reunidos, mas não integrados. Isso é o que Sartre denomina situação de serialidade. “Um membro da série pode ser trocado por outro, ou mesmo todos, que a natureza da série não se altera, indicando que a serialidade é individualizante e, ao mesmo tempo, absolutamente impessoal” (IASI, 2006IASI, M. L. As metamorfoses da consciência de classe: o PT entre a negação e o consentimento. São Paulo: Expressão Popular, 2006., p. 216).

Essa serialidade é possível em virtude das individualidades encapsuladas, introjetadas já na constituição da primeira forma de consciência. Mas, na busca pela realização dos projetos de vida que são constituídos na relação subjetiva do indivíduo com a objetividade alienada, há também a possibilidade do rompimento com a primeira forma de consciência – quando o “tripé” imbricado na (re)produção do senso comum, já supracitado, conhece uma crise, definida como uma “não-correspondência entre a antiga visão de mundo e o mundo real em movimento” (IASI, 2006IASI, M. L. As metamorfoses da consciência de classe: o PT entre a negação e o consentimento. São Paulo: Expressão Popular, 2006., p. 231).

Em resumo, em determinados momentos da vida, os indivíduos percebem – ainda que não tenham essa percepção formalmente sistematizada em seu intelecto – que os projetos de vida manifestam as contradições existentes entre as relações sociais e materiais concretas, seja porque não nos tornamos o que almejávamos, seja porque as relações sociais que estabelecemos demonstram que o pretendido não se concretizará. A inquietude trazida por tais percepções abre o campo de possibilidades (condicionadas), onde as ações dos indivíduos podem tanto movimentar-se rumo ao devir de uma criação-recriada da sociedade dos indivíduos (criação recriada, porque o recriado, por mais que mantenha a mesma substância, jamais coincide com sua forma anterior) pela conformidade e amoldamento do movimento de mediação ao sociometabolismo do capital ou de negação a esse amoldamento – à criação da rebeldia –, a qual carrega consigo o devir da constituição da consciência de segunda ordem.

Ora, se a situação de consciência encapsulada e de respectiva serialidade provém da internalização das relações sociais objetivas, a inserção em novas relações sociais acarretará novas internalizações, que podem ou não ser de qualidade diferente. Como o movimento sociometabólico só se realiza enquanto mediação pela via dos grupos imediatos, os grupos são lócus fundamentais de consumação de alguma ruptura subversiva do senso comum, pois operam como as mediações fundamentais de realização da objetividade e possibilitam o local de criação de novas tríplices correspondências entre os elementos de formação da consciência. É nesse sentido que os grupos operam como mediadores no movimento de totalização da consciência: da consciência individual rumo à constituição da consciência de classe.

Iasi (2006)IASI, M. L. As metamorfoses da consciência de classe: o PT entre a negação e o consentimento. São Paulo: Expressão Popular, 2006. elabora, a partir das teorizações sobre o movimento de totalização mediado pelo grupo de Sartre, uma série de considerações acerca das possibilidades do grupo, instituído por meio da primeira negação da serialidade, tanto instituir-se e movimentar-se rumo ao regressividade na progressividade-avançada, recriando a sociedade de indivíduos-seriais no grupo, quanto avançar na progressividade-avançada. Segundo Iasi (2006)IASI, M. L. As metamorfoses da consciência de classe: o PT entre a negação e o consentimento. São Paulo: Expressão Popular, 2006., o que possibilita o avanço na progressividade é a reflexividade dos membros do grupo de que o complexo das contradições em que estão envolvidos vai além do auto-interesse ou dos interesses imediatos do grupo, pois são contradições essenciais do controle antagônico do metabolismo social. Esse movimento do auto-interesse aos interesses necessários da classe é mediado por inúmeros momentos de inquietudes entre a subjetividade dos projetos-ideados, sua objetivação e a subjetivação dos projetos-objetivados. A explicitação desses múltiplos momentos do movimento de totalização rumo à consciência de classe pode ser encontrada nas propostas de práticas de trabalho do Movimento dos Trabalhadores Desempregados que vislumbram a emancipação humana, como veremos a seguir.

A Objetivação dos Projetos Ideados: manifestação das contradições capital-trabalho por meio da relação com o Estado

Um grupo de trabalhadores desempregados constituiu um movimento social no Rio Grande do Sul em 2000, o MTD. O rompimento com a primeira forma de consciência destes indivíduos é possibilitado pela convergência de inúmeros determinantes, dos quais destacamos dois, quais sejam: 1) a impossibilidade da perpetuação da venda da força de trabalho em virtude da reestruturação na produção efetuada no Estado em meados de 1990, ou seja, trata-se do desemprego estrutural enquanto uma condição concreta que nega ao trabalhador a livre práxis do projeto de reprodução dos indivíduos encapsulados que buscam “vencer na vida”; e 2) a intencionalidade de um grupo de militantes de dar continuidade ao projeto de negar a forma de sociabilidade instaurada pela relação antagônica entre capital-trabalho, projeto que fora realizado por meio de grupos organizados nas décadas de 1970 no Brasil, mas que em meados de 1990 encontravam-se no movimento de regressividade na progressividade avançada, tais como: o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, a Central Única dos Trabalhadores, o Partido dos Trabalhadores e a Pastoral Operária.

O projeto geral do MTD pode ser resumido com a oposição ao movimento de acumulação do capital e ao modelo de desenvolvimento que estava sendo adotado pelo estado gaúcho, enquanto particularidade daquele que construiu a condição concreta do desemprego estrutural, ou seja, a negação da livre práxis do projeto dos indivíduos encapsulados. A negação desses dois movimentos de avanço do capital é mediada pela elaboração de projetos que viabilizem, num primeiro momento, os interesses imediatos do grupo: reprodução da existência dos sujeitos sem submissão a um patrão; pois com a reestruturação produtiva, o projeto individual de mobilidade social via emprego, foi-lhes negada. Com essa primeira ruptura na tríplice correspondência que sustenta o senso comum dos indivíduos encapsulados, o ingresso no Movimento proporcionou a cada indivíduo a interiorização de novos ideais que se concretizam nos projetos elaborados e efetuados no e pelo Movimento. Contudo, esses novos projetos não estão isentos e salvaguardados das contradições inerentes à sociabilidade capitalista, condição que nega a livre práxis dos mesmos, como veremos. E, reside no movimento de totalização (objetividade ↔ subjetividade ↔ objetividade) que envolvem cada um deles – os Projetos Frentes Emergenciais de Trabalho (FETs), Coletivos de Trabalho (CT) e Pontos Populares de Trabalho (PPT) – a possibilidade de constituição da consciência de classe, como veremos a seguir.

As Frentes Emergenciais de Trabalho (FETs): o trabalho precário por meio do Estado

O rompimento com a primeira forma de consciência dessa parcela da população proveio da impossibilidade da venda da força de trabalho a um capitalista: a condição de desempregado permitia verificar que o modelo de desenvolvimento econômico não garantiria oportunidade a todos de satisfazerem suas necessidades. Negando o emprego enquanto concretização da submissão do trabalho ao capital pela manifestação personificada dessa relação em um contratante burguês e em um contratado proletário, os militantes do MTD elaboram o projeto de trabalho via negociação com o governo gaúcho. “As FETs, a ideia que nós tínhamos: bom o estado é responsável! É responsável e, nós queremos trabalhar, nós não queremos cesta básica. Contra a história de cesta básica, nós queremos trabalhar!” (Rosa).

Assim, a substância de valor que compõe o psiquismo, ou seja, a estrutura psíquica afetivamente constituída sustentada na “certeza” de que a venda da força de trabalho é a única forma de reproduzir a existência e de “vencer na vida” está em dissonância com as relações concretas vivenciadas pelos indivíduos desempregados. Essa dissonância abre espaço para a criação do porvir, e os membros do MTD sustentado em outra ideia comum: o Estado enquanto representantes dos interesses gerais e, portanto, responsáveis pela minimização das mazelas em que vivem os trabalhadores, constroem um projeto onde possam executar a práxis negativa, ou seja, negar a necessidade de vender a força de trabalho a um capitalista como meio de reproduzir a existência. Afinal, fora a impossibilidade de manterem-se empregados (venderem força de trabalho) que os tornaram militantes do MTD. Era contra isso que eles precisavam lutar e, nesse sentido, a problematização da naturalização da relação patrão-trabalhador constitui-se como um momento em que o movimento de totalização da consciência de classe pode ser sintetizado, trata-se de um “primeiro” avanço na progressividade: trata-se do movimento da consciência do indivíduo serial à ideia do grupo de trabalhadores portadores de direitos que vão além do ser força de trabalho livre para o capital.

Desse avanço, criar as condições objetivas de trabalho que permitissem a (re)produção da vida foi a bandeira levantada pelo Movimento, por meio da proposta da compra da força de trabalho pelo Estado e, após inúmeras manifestações públicas, reuniões com os representantes do Estado, o MTD conseguiu a aprovação da Lei Estadual denominada oficialmente Coletivos de Trabalho em 2001, mas que permaneceu sendo conhecida pelos integrantes do Movimento como FETs.

No primeiro ano da efetivação das FETs, em 2002, aproximadamente 500 integrantes do Movimento foram contratados pelo período temporário de seis meses para “faxinar a cidade” (Bartolina). A experiência vivenciada pelos militantes do MTD na concretização do trabalho tensionou uma reflexão quanto aos limites desse projeto. As FETs proporcionavam a satisfação de necessidades básicas sem assistencialismo, mas não se diferenciavam do processo de trabalho sob o comando direto do capitalista. “Aí, saíamos pela manhã, faça chuva, faça sol, puxando o carrinho e batendo nas casas pedindo se tem garrafas e coisas assim” (Joana). Na objetivação do projeto ideado de trabalho sem um patrão, os militantes permaneciam subordinados ao capital pela mediação do Estado. O movimento, que nasceu negando o emprego, nesse contexto reflete sobre a alternativa que ajudou a construir.

A fala da militante Bartolina revela novos questionamentos acerca do espaço social concreto construído a partir dos trabalhos efetivados no âmbito das FETs: “Nós não queremos terceirização. Nós também não queremos que as Frentes tirem o trabalho de pessoas contratadas”.

As atividades que submeteram os membros do MTD a um trabalho precário – operando como uma forma de diminuir os custos dos serviços públicos efetuados pelo Estado através da eliminação de contratações de indivíduos concursados – potencializou a reflexão posta da condição de superexploração a que os membros do exército de reserva estavam submetidos, como também a atuação específica deles como substitutos de força de trabalho que deveria ser contratada pelo Estado segundo as regras de sociabilidade formal-legal. Segundo os dados do IBGE sobre o mercado de trabalho brasileiro, os trabalhadores do setor público são os que, em média, possuem os melhores rendimentos, como também o acesso garantido à seguridade social. Contudo, as atividades destinadas às FETs, de um modo geral, tendem a não ser mais totalmente efetuadas por servidores públicos, pois parte delas é repassada a outras empresas via contratos de concessão a terceiros, sejam estes entes privados ou cooperativas. Como demonstra o trabalho de Santos et. al. (2009), a terceirização da limpeza urbana trouxe inúmeras mazelas à saúde do trabalhador, além de precarização jurídica, social e econômica. O que presenciamos, portanto, é que as atividades de limpeza e manutenção dos espaços públicos encontram seu mais alto grau de precarização quando realizadas através das FETs.

O Movimento, mesmo sem a intencionalidade, colaborou para o barateando do preço da força de trabalho e, se no plano do projeto ideado, os militantes não querem viver em uma sociedade onde a força de trabalho seja mercadoria, na objetivação do projeto, as atividades laborais concretizaram-se por meio da venda da força de trabalho ao Estado a um baixo valor de troca. Se na subjetividade do projeto eles negam-se enquanto indivíduos na busca de um comprador para sua mercadoria, na objetivação da negação as relações sociais estabelecidas concretizam a superexploração da força de trabalho, se (re)produzem enquanto um mecanismo que pressiona o salário para baixo.

Soma-se à objetivação da FET, enquanto um trabalho precário, a não realização da requalificação profissional dos contratados prevista em lei. Os cursos não ocorreram junto à prestação dos serviços em função de problemas na licitação de entidades educadoras. A morosidade do Estado manifesta nos entraves burocráticos impôs ao Movimento a necessidade de criticar a instituição justamente no que era negado pelo MTD: a preparação do trabalhador para a venda da força de trabalho. As ações públicas, as reuniões de avaliações das mobilizações nos bairros colocaram os militantes em face de um dilema: o que fazer se a requalificação reivindicada permitisse que os membros do MTD se tornassem pequenos empreendedores? O Movimento produzindo o opressor? E quanto às atividades laborais nas FETs? Eles haviam refletido e estavam cientes de que se tratava de trabalho precário. Mas, o que fazer se o governo expandisse o programa? Para os membros do exército de reserva era um meio de garantir a satisfação de algumas necessidades sem depender do assistencialismo; mas, perpetuar-se nele era se tornar um pseudo servidor público, era ter o que negavam: um patrão.

Se a dificuldade de implementar o projeto das FETs aparece como uma derrota do Movimento na luta de classes mediada pela e na relação com o Estado, ela demonstra: 1) a limitação do instrumento elaborado pelo Movimento em conjunto com as secretarias como um mediador para a superação da auto-alienação do trabalho; 2) que, se no plano do desejo, o Movimento busca tal superação, na prática ele nega apenas as decisões políticas de alocação das verbas públicas; 3) que a proposta de uma destinação diferente tende, se efetuada em sua plenitude, a submeter os membros do MTD a um trabalho precário e a deprimir os salários; 4) que a requalificação efetuada pelas entidades contratadas colabora para o reforço do senso comum, da superação individual da condição de desemprego. Com isso, o Movimento, de espaço de negação à ordem vigente transformar-se-ia em um agente fornecedor de mão de obra barata e requalificada – seria o amoldamento à ordem negada, o movimento de regressividade na progressividade avançada. Mas a impossibilidade posta pelo governo de concretizar as Frentes atuou como um catalisador nas reflexões entre os integrantes do MTD e, conforme destacam os militantes, “[…] à medida que tu vai tendo o governo que dê contra o projeto, não tem condições de andar. Então acaba sendo espaço de resistência e o projeto vai modificando” (Caneca).

A experiência com as FETs corroborou, para o Movimento, algo já intuído pelos membros do MTD mais antigos: o problema social do desemprego ou a existência de um contingente populacional excedente não é eliminado pelo aumento da qualificação individual nem por projetos assistencialistas ou políticas públicas paliativas. Esses últimos não devem ser desejados como uma forma de superar a autoalienação no trabalho, mas, no máximo, como um meio de mantê-los vivos para dar continuidade ao movimento que rompe com a consciência parcializada do grupo dirigindo-se ao universal: a consciência dos interesses necessários da classe, pois como lembra Marx e Engels (2006MARX, K.; ENGELS, F. A ideologia alemã. São Paulo: Martin Claret, 2006., p. 53), em A Ideologia Alemã, “[...] todos os homens devem estar em condições de viver para poder ‘fazer história’”. Com o objetivo de aprimorar o projeto mediador, eliminando a contradição que aflorou entre a negação da venda da força de trabalho a um “patrão” e a concretização dessa venda ao Estado enquanto personificação do capital, o grupo elaborou outra forma de organizar o labor e, pela possibilidade aberta pela lei que levou o nome de Coletivos de Trabalho, organizou-se os grupos de produção.

Os Grupos de Produção: a superexploração mediada pela “auto-exploração”

A nova proposta construída pelo MTD é um aporte financeiro do Estado para a organização de grupos de produção. Pretendeu-se com esse projeto – organização da produção coletiva – negar a realização de uma atividade com caráter individual e precário submetido à lógica do capital mediado por um contrato estabelecido com o poder público, pois a experiência anterior permitira romper com a ideia de Estado enquanto representantes de interesses gerais e percebê-lo enquanto uma entidade que constituída pela sociedade burguesa, a seus interesses necessários não se opõe. Eis uma nova ruptura, desta vez rompe-se com uma consciência coletiva ainda parcial da realidade concreta, mas o Movimento avança na progressividade avançada rumo ao universal. Tal movimento constituiu-se pela observação de que a luta pelas verbas públicas deveriam proporcionar ao trabalhador uma autonomia, tal como ao capitalista, e não a reprodução da exploração pela venda da força de trabalho.

Na concepção dos desempregados do MTD, o novo projeto deveria viabilizar a eliminação da venda da força de trabalho, seja ao capitalista, seja ao poder público. Ideia-se assim a formação de grupos de produção, onde, sendo os proprietários dos meios de produção, coletivamente, poderiam decidir quando e como seria a organização do trabalho, qual seria o produto resultante deste e como seriam distribuídos os ganhos financeiros adquiridos com a comercialização. Em 2003, após uma sequência de reivindicações públicas, o MTD conseguiu que o governo estadual cumprisse o previsto em lei: a destinação anual de um determinado percentual da receita pública para o Programa Coletivos de Trabalho, doravante PCT. Esse programa liberava bolsas-auxílio, garantindo assim as condições básicas da reprodução da vida (força de trabalho) para que os trabalhadores desenvolvessem grupos de trabalho sem a figura do patrão.

Nós tínhamos o grupo de produto de limpeza. Aí a gente fazia e saí vender nas ruas. Tinha dias que a gente só fazia e dias que a gente só vendia. E tinha também o coletivo que plantava […] e quando dava bastante, a gente vendia pra vizinhança (Maria).

A gente queria a usina de triagem. Então foi uma luta até conseguir, mas depois, a gente ganhou a permissão de coletar o material reciclado nos bairros. Aí tinha um grupo que saia de manhã para bater nas casas e conseguir o material, lá pelas 15 horas voltava para o galpão e ajudava o outro que tinha ficado no galpão separando (Clara).

Destes relatos, destacam-se dois pontos: a natureza do trabalho desenvolvido e as decisões coletivas. A realidade concreta de pauperização dos trabalhadores membros do MTD reflete as conseqüências da divisão social do trabalho. Na oportunidade de desenvolverem uma atividade “autônoma”, ingressam nos setores menos especializados da economia. São, em suma, atividades que demandam mais habilidades físicas do que mentais; contudo, a organização da execução dessas tarefas exige dos membros do MTD algo que não era requerido deles em outras experiências profissionais: decidir. Mais do que isso, decidir coletivamente. O que produzir? Quando produzir? Para quem vender? Quanto cobrar? Como comprar a matéria-prima? Quem produz e quem vende? Ou todos vão fazer tudo? Todas essas questões tensionam alterações nas relações entre os membros e evidenciam os limites deste projeto. Dois são os primeiros limites identificados pelos trabalhadores: a falta de infraestrutura para o desempenho das atividades e a submissão as determinações concorrenciais de mercado. Eis a condição concreta que nega a livre práxis do PCT e, assim, impõe-se como uma nova fissura na correspondência que constituía a consciência do grupo acerca das relações sociais.

O PCT repassa aos grupos as bolsas-auxílio no valor de um salário mínimo destinada à satisfação das necessidades das famílias. Contudo, para fazer artesanato, detergente etc., são necessários alguns meios de produção e matéria-prima que não estavam previstos no convênio. Assim, a bolsa passa a atuar como capital de investimento. Após conseguir uma quantidade de matéria-prima para iniciar as atividades, os grupos verificavam que não tinham onde produzir, que não tinham instalações nem maquinário (leia-se: agulhas de costuras, máquinas de costura, misturadores para produtos químicos etc.). Algumas saídas: conseguir com vizinhos, produzir na casa de um dos membros do grupo ou conseguir espaços públicos.

Alguns grupos, segundo depoimento, conseguiam efetivar suas atividades e concretizar os primeiro produtos do grupo, outros não avançavam.

Então na real, na real, paga por mês as pessoas, mas não dá nenhuma ferramenta de trabalho, não dá nenhuma matéria-prima. […] Então, o que aconteceu, as pessoas passavam os seis meses fazendo de conta que tava fazendo alguma coisa. Alguns grupos até conseguiram se juntar, catar doações de retalho, de uma máquina velha […] Então, era um estresse. […] Então as pessoas se reuniam e faziam de conta, com o pouco que se tinha.

Por um lado, o “fazer de conta” alimenta o senso comum de que a destinação de verbas públicas para as atividades do projeto era investir em “fundo perdido”, por outro possibilita alguns questionamentos: “por que temos que ficar aqui produzindo se não vamos conseguir vender? Costurando algo que não vai chegar ao mercado? Por que o governo dá incentivos para as empresas, mas não concede máquinas de costura para o projeto?”. Eis as questões que os membros dos grupos de trabalho levavam para os demais membros do Movimento. A essas indagações, foram acrescidas as que estavam sendo realizadas nos grupos que “deram certo”, aqueles que conseguiram, por doação ou empréstimo, certa infraestrutura que possibilitou a realização das atividades. Nestes grupos, a concretude concorrencial entre os capitalistas determinavam a falência futura dos grupos de trabalho ou sua subreprodução, como também reflexões sobre o devir do MTD.

Os grupos que definiram, no início da implementação do PCT que realizariam atividades como confecção de roupas ou a fabricação de detergentes encontraram a limitação do mercado concorrencial. O resultado do trabalho não é escoado para os centros de comercialização, pois isso aumentaria o custo do produto e, em face dos importados made in China, eles não conseguiriam compradores. Assim a comercialização fica restrita à vizinhança que possui rendimentos quase tão ínfimos quanto os membros do MTD. Enquanto a bolsa-auxílio é fornecida, os produtos são vendidos a um baixo preço, mas o que fazer quando terminar o projeto? Manter o preço traria como ônus uma redução significativa dos rendimentos familiares; aumentá-los, impossibilitaria a venda, zeraria o rendimento. Entre o pouco e o nada, os grupos persistem na produção e comercialização. Eis um exemplo das atividades desenvolvidas pelos membros da superpopulação estagnada auxiliando na reprodução do capital por meio do barateamento de produtos de subsistência da força de trabalho “da ativa”. Os militantes não possuem ciência desse subsídio que o trabalho efetuado por eles fornece ao movimento de (re)produção do capital, mas esboçam questionamentos que podem ir ao encontro dessa manifestação das relações sociais sob o modo capitalista de produção, ao ponderarem a repartição dos valores auferidos com a venda dos produtos: “E a própria questão da remuneração. Nós não estamos dando lucro para um capitalista, nós estamos repartindo tudo. Só que esse repartir é menos, porque você não tem o direito trabalhista garantido” (Bartolina).

Bartolina pondera a perda de direitos por parte da classe trabalhadora. Menciona que as atividades desenvolvidas no e pelo Movimento que nega a força de trabalho enquanto mercadoria, na práxis corresponde ao trabalho desenvolvido por muitos membros do exército ativo e de reserva, trabalhos que não garantem a seguridade social, nem rendimentos suficientes para a satisfação das necessidades do ser humano. O que diferencia é a possibilidade do controle na concepção do trabalho que ocorre no MTD, a despeito das dificuldades de objetivá-lo. Sendo que é a possibilidade da concepção do trabalho nos grupos e a sua impossibilidade de concretização que tensionam o processo de constituição do devir da consciência de classe pela reflexão da limitação de sua consciência contingente enquanto mediadora da necessidade histórica de transcendência da auto-alienação do trabalho, conforme expressa Bartolina:

Pra tornar mais consciente tudo isso. Primeiro, isso, a lógica do capitalismo o que é? Estudar mesmo, a economia, a política. Como se dá esse processo? Como é que se dá a questão das empresas, a concorrência, como se barateia custo? Para as pessoas terem bem presente isso: tá, e nós? Pra caírem a ficha de dizer assim: oh! Nesse sistema não tem alternativa! Como é que então assim, bom, então quer dizer que a gente não tem que fazer nada. E vamos viver de quê? Nós temos que usar essa experiência dos empreendimentos, da cooperação e tal como forma de ir sobrevivendo, de ir se juntando, de ir vendo, mas tendo presente todos esses limites […] Usar isso como um meio e não como um fim, né?

Nas palavras dessa militante, resume-se o movimento da consciência parcializada rumo ao universal. A falta da infraestrutura e a concorrência foram condições concretas que negaram a possibilidade de autonomia aos grupos de trabalho, que viabilizaram uma nova ruptura com a consciência coletiva (consciência de segunda ordem) ainda que não universal. A práxis negativa imposta por essa nova ruptura demandava, nesse momento, negar não somente a figura do patrão ou o estado capitalista, mas o próprio sociometabolismo do capital. Como lembra Mészáros (2006)MÉSZÁROS, I. Para além do capital. São Paulo: Boitempo, 2006., para superar o sociometabolismo do capital é preciso romper com o tripé Estado-Trabalho-Capital. Os militantes do MTD haviam, portanto, compreendido que seus interesses não eram os dos trabalhadores desempregados, mas os interesses da classe trabalhadora. E as reflexões de Bartolina expressaram o sentimento de todos os entrevistados, trata-se agora de construir um projeto que seja meio de articulação da classe e não uma mera oportunidade de proporcionar sobrevida aos desempregados que se organizaram no Movimento. E, assim, em meados de 2008 tem-se uma nova ideação: os Pontos Populares de Trabalho – PPTs5.

Os Pontos Populares de Trabalho: Fronteira com a Economia Solidária (ES)

Os PPTs enquadram-se na política pública fomentada em âmbito nacional pelo Partido dos Trabalhadores denominada Economia Solidária (ES). A discussão sobre a efetividade dessa política para a classe trabalhadora é bastante polêmica no Movimento, mas é consensual que ela possibilita reivindicar, através do Ministério do Trabalho e Emprego, justamente o que se apresentou como limitadores da realização das atividades no Projeto Coletivos de Trabalho: a infraestrutura e o maquinário, em suma, os meios de produção. O Movimento, intentando superar os limites do projeto anterior, idealiza, ainda que parcialmente, uma reivindicação necessária ao fim da submissão do trabalho ao capital: a socialização dos meios de produção, isto é, um dos pressupostos ao sociometabolismo do capital, o direito da propriedade privada. Para tanto, o Movimento elaborou um programa negociado no âmbito daquela política, buscando conciliar o que eles denominam de dimensões estruturais, econômicas e sociais.

A dimensão econômica refere-se às condições objetivas de trabalho, pois desempregados estruturais necessitam diariamente criar as condições de reprodução da vida, diante deste quadro faz-se necessário: subsídio econômico/bolsa mensal por família beneficiada, condicionada a participação no conjunto do projeto, infraestrutura para desenvolver as atividades produtivas […] incluindo reformas e construções, podendo estas ser legalmente usadas na forma de concessão de uso por parte dos governos, equipamentos, máquinas conforme o projeto de cada grupo, matérias-primas para o processo de qualificação e produção (MTD, 2007MOVIMENTO DOS TRABALHADORES DESEMPREGADOS – MTD. Projeto MTD. Rio de Janeiro, 2007. (Caderno de Estudo)., p. 1).

A justificativa para reivindicarem a realização do projeto demonstra a ciência dos membros do Movimento sobre suas posições no mercado de trabalho: desempregados estruturais que necessitam trabalhar para (re)produzirem a vida. O desemprego estrutural é um dos fatores que determina o quantum de indivíduos que não estão inseridos presencialmente no lócus produtivo que se manifesta enquanto ente jurídico empresa; como também condiciona a possibilidade dos indivíduos estabelecerem, ou não, contratos de trabalho que seguem as regras de sociabilidade formal.

No que tange às dimensões estruturais e sociais, o Movimento menciona que, em virtude dos membros dos grupos de trabalhos serem, em sua maioria, mulheres, faz-se necessário que os mesmos englobem creches e cozinhas comunitárias, e a efetivação de um projeto educacional que vise a possibilidade de elas “reconstruírem sua dignidade, sobrevivendo do seu próprio esforço” (Projeto Pedagógico MTD, 2008MOVIMENTO DOS TRABALHADORES DESEMPREGADOS – MTD. Projeto pedagógico. Rio de Janeiro, 2008. (Caderno de Estudo)., p. 2).

Segundo o Movimento, a forma de realizar conquistas para a classe trabalhadora é possibilitada e está condicionada pela política da ES. Em julho de 2008, o MTD convidou inúmeras organizações para debater o projeto dos PPTs e a viabilidade daquela forma de economia que, para alguns autores manifesta-se como uma alternativa ao capitalismo (SINGER, 2003SINGER, P. Economia solidária. In: CATTANI, A. D. A outra economia. Porto Alegre: Veraz, 2003. p. 116-25.), para outros como uma alternativa no capitalismo (FRANÇA-FILHO, 2004). Nesse encontro estavam representantes do Ministério do Trabalho e Emprego, de universidades (UFRGS e Unisinos), de pastorais da Igreja Católica, de Organizações Não-Governamentais, de cooperativas da Economia Solidária e membros do MTD de todas as regiões do estado. Cerca de 300 pessoas participaram do evento e múltiplas opiniões e exemplos foram postos em pauta. O debate mais polêmico emergiu do depoimento do representante de uma das cooperativas de trabalho ligadas à ES, que buscou ressaltar como a experiência em questão estava “dando certo”. As palavras do cooperado podem assim ser resumidas: 1) a cooperativa especializou-se na fabricação de determinado produto, por meio das políticas de responsabilidade social empresarial, fidelizou duas grandes empresas; 2) a remuneração de cada cooperada varia de 500 a 800 reais/mês, elas trabalham de oito a dez horas por dia, dependendo da demanda produtiva; 3) em virtude da exigência da qualidade dos produtos, foram contratados técnicos para organizarem a produção, cujas responsabilidades são de definição e distribuição das tarefas, equalização entre demanda e carga horária de trabalho etc.; 4) os técnicos, por sua maior qualificação, recebem uma remuneração superior a das cooperadas; 5) assembleias acontecem anualmente, quando se define o ano produtivo seguinte.

A descrição desta cooperativa contrasta com outras experiências narradas, cujos rendimentos individuais mensais estão aquém de um salário mínimo e cuja organização produtiva não se encontra tão “profissionalizada”, segundo cooperados dos demais empreendimentos. Para o MTD, manifesta-se empiricamente um problema elencado na elaboração do projeto PPT: a economia solidária, para ser autossustentável, necessita reproduzir ipisis literis as relações capitalistas de produção – o que não é desejado pelo Movimento –, caso contrário, não passa de mais uma forma de trabalho para a sobrevivência que não tensiona reflexões sobre as limitações da política pública para a luta de classes. Ferraz e Dias (2008)FERRAZ, D. L. S.; DIAS, P. Discutindo Autogestão: um diálogo entre os pensamentos clássicos e contemporâneos e as influências nas práticas autogestionárias da economia popular solidária. Organizações & Sociedade, v. 15, n. 46, p. 99-117, 2008. http://dx.doi.org/10.1590/S1984-92302008000300005
https://doi.org/10.1590/S1984-9230200800...
, em estudo sobre as experiências da ES e a prática da autogestão nos empreendimentos, destacam que, de um modo geral, trata-se mais de uma alternativa reformista do que revolucionária.

Na avaliação dos membros do MTD, uma das limitações do projeto dos grupos de trabalho pode ser superada com o ingresso nos programas de ES por meio dos Pontos Populares, ainda que este se mantenha amarrado às limitações econômicas daquele. O esforço do Movimento seria de romper com as amarras políticas e, para isso, não poderia entender a ES como um fim em si mesmo, mas como um meio para a continuidade de problematizações que desvelem a contradição essencial do modo antagônico de controle do metabolismo social, conforme menciona Margarida.

Mas nós, agora, e isso [a reflexão], já tá na base, já tá indo pra vila, de que nós estamos nos organizando hoje não mais, com essa leitura de ser por frente de trabalho, porque não vai ser. O que vai ser? Vai ser os pontos populares de trabalho? A gente vai dar conta? Bom, aí a gente não sabe, mas aí a gente vai continuar em movimento. E seria o meio pra alcançar o fim. Continua sendo o meio, as nossas brigas aí eu acho, pelo que eu entendo, as nossas brigas, todas são o meio. O fim seria uma nova sociedade. O fim é um novo homem e uma nova mulher.

Uma das maneiras de viabilizar as problematizações estaria contemplada na própria proposta dos PPTs, pois em um fator ele se difere das demais iniciativas da ES, seu caráter político-pedagógico. Construiu-se junto a essa proposta de trabalho um programa educacional cujos três eixos centrais são: social, gestão e produção. Os eixos sobrepõem-se em alguns aspectos, visando complementarem-se. No eixo gestão, o projeto menciona a necessidade de:

Fazer acompanhamento político-pedagógico dos Grupos priorizando aspectos relacionados à administração, contabilidade, organização política e relações Humanas, visando à organização autogestionária dos Grupos de Produção. […] Tarefas [dos educadores e educadoras]: ajudar o GP a fazer combinações coletivas (regimento interno, atribuições dos postos de trabalho e outras combinações que perceber necessárias), implementar uma organicidade nos núcleos e grupos de produção […] estudo de temas a partir das situações-limite observadas no Grupo de Produção (MTD, 2008MOVIMENTO DOS TRABALHADORES DESEMPREGADOS – MTD. Projeto pedagógico. Rio de Janeiro, 2008. (Caderno de Estudo)., p. 5)

O acompanhamento político-pedagógico também é mencionado no eixo social. Neste, se enfatiza a formação política e humana, aprofundando conhecimentos acerca da constituição sócio-histórica do “povo brasileiro” em seus embates de classe.

Em virtude das propostas educacionais, o Movimento menciona que as experiências dos grupos na ES não superarão as limitações econômicas de submissão do trabalho ao capital, mas configuram-se como um meio concreto para problematizar com o contingente do exército de reserva que reside nas regiões periféricas dos grandes e médios centros urbanos e que se agrega ao Movimento questões como a situação da mulher, dos negros, dos jovens no mercado de trabalho e nas relações sociais gerais. Por esse motivo, o Movimento dá sequência à elaboração e discussão dos PPTs, desejando também que suas práticas, no âmbito da ES, potencializem a problematização nos demais grupos não vinculados ao MTD. Temos, assim, nesse projeto ideado, a manifestação do desejo de potencializar o movimento da constituição da consciência de classe nesse estrato da população. Diferentemente do ocorrido com a objetivação do primeiro projeto, as FETs, nos PPTs os integrantes do MTD já conseguem conceber junto ao desejo do fim da submissão do trabalho ao capital as possibilidades da manifestação das contradições dessa relação e, com isso, conseguem antecipar-se e idear formas de superar essas contradições. Contudo, as contingências objetivas que possibilitarão a objetivação do PPTs são inúmeras e, em grande parte, escapam à agência de seus agentes ao mesmo tempo em que o MTD só se tornou possível pela ação de pessoas que construíram uma consciência comum a respeito da situação comum em que se encontravam; uma consciência de ser uma classe.

Considerações (ainda que não) finais

A negação de um modo de produção somente pode ser efetuada a partir deste modo de produção; é condicionada pelo que nega e, ao mesmo tempo em que é o pólo negativo da contradição, também contém, internamente, tal contradição. Sendo que é a manifestação da contradição no interior do pólo que a nega, que mantém tensionado o movimento de constituição da consciência de classe: do interesse imediato do grupo – seu entendimento parcial das relações sociais – ao interesse necessário da classe, em um processo que pode ter tanto momentos em que há regressividade na progressividade avançada, como avanço nessa progressividade, posto que a consciência guarda relação de reciprocidade com o as condições concretas de reprodução das relações classistas, tendo ela a mediação do Estado ou não. Presenciamos isso nas contradições experienciadas pelos integrantes do MTD que, a cada objetivação dos projetos, demonstram como o rompimento com o senso comum imprescinde da crise em um dos pólos da tripla correspondência, crises que potencializam o movimento de constituição da consciência de classe. A efetivação das propostas alternativas de trabalho demonstra os limites do desejo de emancipação humana sob o modo de produção capitalista, por outro lado aponta a possibilidade de manter o projeto da transcendência da autoalienação do trabalho enquanto um desejo partilhado pelo grupo imediato determinando a práxis negativa no Movimento que tenciona o avanço da constituição da consciência na progressividade avançada.

A gente fez a avaliação da luta, […] [as militantes] sentiram que o mais difícil de tudo, era assim: sair de manhã cedo, ir para a parada de ônibus ouvindo a vizinhança escutando a Rádio Viva, que chama [a gente] de vagabundo. […] Então, as vizinhas ouvindo o cara lá xingando e sabendo que elas tava indo pegar o ônibus para vir para a luta. […] e, daí elas se sentiam super constrangidas. […] Mas também quando chegava ali [no local da manifestação] e se juntava com os outros, mesmo que passasse outros e xingassem parece que não atingia. Porque tava em grupo, fortalecido (Bartolina).

A reestruturação da psique sustenta-se nos novos projetos elaborados reflexivamente no e pelo Movimento que, estando cada vez mais ciente dos limites de cada projeto, supera as contradições de um, mas sabe que, em outros, novas contradições surgirão, pois não se superou a contradição essencial, a contradição capital-trabalho. No atual contexto sócio-histórico, superar as contradições de cada projeto torna-se o meio de continuar avançado rumo à superação da contradição capital-trabalho, torna-se meio de organização da classe trabalhadora. Assim, a negação da submissão ao patrão, a negação ao direito à propriedade privada, a negação dos projetos do Movimento como um fim em si mesmo e a afirmação deles enquanto um meio de potencializar a constituição da consciência de classe revelam os múltiplos momentos do movimento de avanço na progressividade avançada. Sendo assim, percebemos que a disputa pela aplicação dos fundos públicos possibilita o processo de convergência dos interesses imediatos do grupo aos interesses necessários da classe, revelando a mediação do Estado na relação antagônica capital-trabalho. Destacamos então que o movimento de rompimento da consciência parcializada dos desempregados rumo a constituição da consciência de classe é operada pelas práticas de trabalho nas periferias e a critica às mesmas. A consciência constitui-se, então, no processo reflexivo acerca das condições e relações precárias a qual o trabalhador está submetido na relação capital-trabalho e, nesse caso, por tratar-se de desempregados, relação mediada pelo Estado. Estado que replica, por meio das políticas públicas, a precarização do trabalho seja nas Frentes Populares, seja na Economia Solidária. Os integrantes do MTD têm consciência disso, mas, ainda assim, só se pode negar o capital por meio das possibilidades criadas no e pelo capital, de modo que, sendo o Estado, ou melhor, os governantes, a “personificação” do capital no fenômeno estudado, o avanço do movimento de totalização se perpetua pela disputa da aplicação do Fundo Público, disputa realizada valendo-se da política de ES. Decorre que não é a migração do mercado formal à economia solidária que permite a constituição de uma consciência de classe, isso seria uma análise mecanicista e ingênua, mas o modo como essa condição concreta de reprodução da existência é subjetivamente apreendida e refletida no coletivo, são as reflexões coletivas que constituem, na esfera da ideia, as condições desejadas e que não se concretizam quando os projetos são efetivados. Em suma, a consciência de classe é engendrada pela práxis coletiva.

Ademais, a objetivação desses projetos de Políticas Públicas de Geração de Trabalho e Renda tem, pelo menos, dois desdobramentos contraditórios: se, por um lado, alavancam o processo de totalização rumo à superação da auto-alienação do trabalho, por outro alavancam o movimento de (re)produção do capital, pois recriam a superexploração do trabalho no âmbito do movimento global do capital, colaborando para a diminuição do preço da mercadoria força de trabalho. Dessa forma, os membros do MTD, ao objetivarem seu desejo de projetos mediadores na construção da emancipação humana, continuam a ser produção necessária para o movimento de acumulação, mecanismo que alavanca a valorização do capital, e a própria condição de existência do modo de produção capitalista, ao mesmo tempo em que o negam. É deste modo que o MTD manifesta-se como uma possibilidade concreta de organização da classe trabalhadora, por meio da organização do exército de reserva. Eis um momento da constituição contingente da classe negando-se enquanto condição necessária para o sociometabolismo da humanidade.

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  • i
    Cabe ressaltar os nomes de estudiosos desse tema de suma importância, tais como: Georg Lukács, Alain Touraine, André Gorz, dentre outros. Por limitações de espaço, as proposições deles não serão apresentadas, tendo em vista que demandariam um debate mais profundo sobre as concepções, os limites e as contribuições de cada um deles, em relação à escolha teórica efetuada.
  • ii
    A fórmula da estrutura estruturada e estruturante foi bastante difundida através do trabalho do sociólogo francês Pierre Bourdieu, que a reputava como uma das elaborações mais caras à sociologia. Há uma famosa passagem de Marx na qual ele demonstra operar com a mesma lógica, que é a de considerar a ação humana como instituinte instituída: “Os homens fazem sua própria história, mas não a fazem como querem; não a fazem sob circunstâncias de sua escolha e sim sob aquelas com que se defrontam diretamente, legadas e transmitidas pelo passado. A tradição de todas as gerações mortas oprime como um pesadelo o cérebro dos vivos. E justamente quando parecem empenhados em revolucionar-se a si e às coisas, em criar algo que jamais existiu, precisamente nesses períodos de crise revolucionária, os homens conjuram ansiosamente em seu auxílio os espíritos do passado, tomando-lhes emprestado os nomes, os gritos de guerra e as roupagens, a fim de apresentar e nessa linguagem emprestada.” (MARX, 1997, p. 21).
  • iii
    Convém frisar as limitações da concepção de família que Freud considera – núcleo burguês “tradicional”, composto por pai, mãe e prole. Contemporaneamente, encontram-se uma multiplicidade de formas de configuração familiar que demonstram não ser a família burguesa “a” família. À guisa de exemplo, estudos como os de Fonseca (1997)FONSECA, C. Ser mulher, mãe e pobre. In: DELPRIORE, M. (Org.). História das mulheres no Brasil. São Paulo: Contexto, 1997. p. 510-53. comunicam distintos arranjos familiares. Contudo, cremos que essa limitação não altera o sentido do argumento de Freud, que é o de indicar o papel “socializador” do grupo próximo com que o neófito convive regularmente em seus primeiros anos de vida.
  • iv
    O tema é extremamente profícuo em Elias, de maneira que não consideraremos com maior detalhe suas discussões sobre individuação e individualismo. Para tanto, indicamos ainda a leitura de O processo civilizador.
  • v
    O Projeto dos Pontos Populares de Trabalho foi concluído no ano de 2009, porém até o presente momento não recebeu a devida atenção dos órgãos federais e a experiência segue efetivada de forma incipiente com os escassos apoios dos governos estadual e municipais, qual é o caso.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Mar 2015

Histórico

  • Recebido
    01 Fev 2012
  • Aceito
    10 Out 2014
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