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Proposta didático experimental para o ensino inclusivo de ondas no ensino médio

Experimental didactic proposal for inclusive teaching of waves in high school

Resumo

Os modelos disponíveis para o ensino de ondas, principalmente no ensino médio, não levam em consideração o estágio de desenvolvimento real em que se encontra a grande maioria dos estudantes [1][1] R. T. Diniz, Usando Experimentação No Ensino Potencialmente Significativo De Óptica Geométrica. Dissertação de Mestrado, Universidade Federal Fluminense, Niterói, Rio de Janeiro (2016).. Aliado a isso, a dificuldade em se apresentar frequências, sejam de natureza eletromagnética ou mecânica (sonora), diferentes das faixas que somos capazes de interpretar através dos nossos sentidos, tende a constituir um enorme obstáculo epistemológico. Numa tentativa de lançar alguma luz sobre esse problema, desenvolvemos dois experimentos que apresentam relações entre frequências invisíveis e inaudíveis, mas que, através do processamento com a plataforma Arduino, podem ser convertidas em frequências que sensibilizem nossos sentidos. Desta forma pretende-se descortinar esse mundo invisível, trazendo para a sala de aula experimentos que podem ser utilizados, inclusive, por estudantes com deficiência visual ou auditiva.

Palavras-chave:
Som; Luz; Arduino; Cego-surdo

Abstract

The models available for teaching waves, especially in high school, do not consider the stage of real development in which the vast majority of students are [1][1] R. T. Diniz, Usando Experimentação No Ensino Potencialmente Significativo De Óptica Geométrica. Dissertação de Mestrado, Universidade Federal Fluminense, Niterói, Rio de Janeiro (2016).. Allied to this, the difficulty in presenting frequencies, either of electromagnetic or sonorous nature, different from the bands that we can interpret through our senses, tends to constitute a huge epistemological obstacle. In an attempt to shed some light on this problem, we have developed two experiments that have relations between invisible and inaudible frequencies but which, through processing with Arduino platform, can be converted into audible frequencies. Thus, we intend to unveil this invisible world, bringing to the classroom experiments that can be used, even by students with blindness or deafness.

Keywords:
Sound; Light; Arduino; Deaf-blindness

1. Introdução

Uma dificuldade percebida ao longo dos anos lecionando Física é conseguir explicar ao aluno que, apesar de não conseguirmos captar uma informação através dos nossos sentidos, isto não significa, entretanto, que a informação não esteja sendo enviada. As radiações eletromagnéticas nas regiões de frequências iguais ou superiores ao ultravioleta, e iguais ou inferiores ao infravermelho, não podem, via de regra, ser captadas por nossos olhos. Seus efeitos e aplicabilidades, no entanto, são amplamente divulgados. Então, como adquirir conhecimento sobre o que não se pode enxergar, ou ouvir? Talvez a resposta pareça trivial para os já iniciados nas ciências físicas, mas não é para a maioria dos estudantes.

Portanto, ao lecionar para estudantes, sobretudo de Ensino Médio, deve-se levar em conta sua capacidade de abstração. Devemos ter a sensibilidade necessária para compreender que os modelos físicos que tratam de algo que está além das nossas sensações podem ser muito abstratos para sua compreensão, configurando-se em um enorme obstáculo no processo de ensino e aprendizagem [2][2] G. Bachelard, A formação do espírito científico: contribuição para uma psicanálise do conhecimento (Contraponto, Rio de Janeiro, 1996)..

Sendo assim, devemos nos munir de métodos didáticos diversos para que, com a sua aplicação, possamos fazer com que o estudante encare os modelos científicos, principalmente os que exigem maior abstração, com um pouco mais de naturalidade. A proposta pedagógica de elaborar atividades baseadas no desenvolvimento de experimentos, no qual esteja presente o aspecto da interação social, mesmo que não ocorra em laboratório, é defendida em inúmeros trabalhos de pesquisadores do ensino como Dewey, Piaget e Vigotski [3][3] A.T. Borges, Caderno Brasileiro de Ensino de Física 19, 294 (2002)..

Piaget assinalou quatro causas principais para o desenvolvimento das habilidades de raciocínio cognitivo [4][4] A.C. Azevedo e A.C.F. Santos, Rev. Bras. Ens. Fis 36, 4402 (2014).. São eles: maturação, experiência com o ambiente físico, transmissão social e equilíbrio. A maturação significa que estudantes devem ser biologicamente maduros e fisicamente desenvolvidos. A experiência com o ambiente físico implica nas experiências concretas anteriores, bem como a habilidade de recordar estas experiências. Piaget descreve dois tipos de experiência, a experiência física e a experiência lógico-matemática. A primeira é aquela obtida diretamente dos objetos, enquanto que a segunda ocorre através de ações que afetam os objetos. Na etapa de transmissão social, os alunos devem ser capazes de comunicar informação nas formas oral e escrita. Na fase de equilíbrio ocorre um processo mental interno onde novas experiências são combinadas com expectativas anteriores e dão origem a novas operações lógicas, ou seja, devido ao crescimento cognitivo, os estudantes devem ser expostos a situações cognitivamente desafiantes, onde as suas condições de operação mental não são adequadas. O processo de acomodação, ou seja, de reestruturação dos esquemas de assimilação, também chamado de equilíbrio, é o processo pelo qual os estudantes lidam com esta nova informação resultando no crescimento cognitivo. Acomodação é representada pelo conhecimento recém adquirido.

Pesquisas mostram que os alunos aprendem melhor através do envolvimento interativo. Neste artigo, seguimos o ciclo de aprendizagem de Karplus [5[5] R. Karplus; Journal of Research in Science Teaching 14, 169 (1962).,6[6] N.C. Ferreira, Proposta de laboratório para a escola brasileira: um ensaio sobre a instrumentalização no ensino médio de física. Dissertação de Mestrado, Universidade de São Paulo, São Paulo (1978).]. O ciclo de Karplus realiza a transposição da teoria de Piaget em um modelo aplicável para o processo de aprendizagem, incorporando os quatro fatores citados no parágrafo anterior. O ciclo de aprendizagem de Karplus inclui três etapas instrucionais que conciliam experiência com transmissão social e encorajam a autorregulação. Estas três fases são: Exploração; Introdução do Conceito e Aplicação do Conceito.

A etapa 1, também conhecida como Exploração, consiste em uma breve familiarização com o tópico. Os alunos se familiarizam com equipamentos e pensam qualitativamente sobre ideias que serão discutidas nas fases seguintes. Na etapa 2, ou Introdução do Conceito, o instrutor ensina sobre o assunto da maneira usual, incluindo conceitos, derivações e terminologia, no ritmo que os estudantes podem assimilar e aplicar. Os alunos são orientados a descobrir princípios a serem posteriormente discutidos na terceira etapa. Finalmente, na etapa 3, conhecida como Aplicação do Conceito: os alunos fazem medições quantitativas para verificar e aplicar o que aprenderam nas etapas anteriores. As etapas podem também envolver resolução de problemas em grupo.

É imprescindível, no entanto, que o professor procure manter o envolvimento do estudante do início ao fim da atividade, desafiando-o a encontrar, na manipulação do experimento e usando os modelos físicos correspondentes, respostas às questões propostas pelo professor no início da atividade. A exemplo do modelo ondulatório para o som e para a luz, uma questão proposta para nortear a aula poderia ser, por exemplo: sabendo que o homem possui um limite (superior e inferior em termos frequência), tanto no sentido da audição quanto na visão, seria possível ouvir e enxergar além destas faixas?

É claro que a resposta seria não, sem o uso de um transdutor, mas o objetivo é desafiar o estudante a refletir sobre a questão. Para isso, será necessário compreender os modelos ondulatórios do som e da luz a fim de produzir uma resposta cientificamente plausível. Permitirá também um momento de reflexão sobre as dificuldades encontradas pelos alunos deficientes, tanto cegos quanto surdos. Em uma classe mista, o aluno com deficiência (cego ou surdo), poderá participar das atividades usando outros sentidos, de modo a não ser excluído da atividade, sendo orientado pelo professor e recebendo auxílio dos colegas.

Observamos ainda que as atividades experimentais demonstrativas, segundo Ferreira [6][6] N.C. Ferreira, Proposta de laboratório para a escola brasileira: um ensaio sobre a instrumentalização no ensino médio de física. Dissertação de Mestrado, Universidade de São Paulo, São Paulo (1978)., permitem desenvolver a capacidade de observação e reflexão dos alunos além de ajudar na compreensão dos conteúdos estudados, sendo, em nosso trabalho, desenvolvidas priorizando uma abordagem qualitativa, na qual os estudantes irão, juntos e sob orientação do professor, construir e interagir com os experimentos.

A proposta dos experimentos aqui desenvolvidos é fornecer meios para que o estudante possa vivenciar faixas de frequências que nossos sentidos não detectam, tanto inaudíveis quanto invisíveis. Dessa forma poderá aceitar com mais naturalidade que existe um mundo indetectável aos nossos sentidos, e que, para que seja percebido, torna-se necessária a elaboração de modelos físicos que relacionem, com uso de analogias, fenômenos físicos do nosso cotidiano, como as ondas na água que se relacionam com as ondas eletromagnéticas. Também serão abordadas características evolutivas como o fato de que, na natureza, alguns animais tiveram seus sentidos desenvolvidos de maneira diferente aos dos seres humanos e que, portanto, possuem limites de visão e audição, em alguns casos, além da nossa percepção.

Nas duas seções seguintes, trabalharemos com a plataforma Arduino. Uma plataforma de prototipagem de fácil acesso que permite ao usuário, através de uma IDE e de uma placa com pinagens de entrada e saída, o desenvolvimento de sistemas de aquisição, controle e processamento de dados. Essas informações são processadas através de um processador Atmel AVR. Após o processamento, suas saídas podem ser usadas para transmitir o resultado do processamento [7][7] M. Margolis, Arduino Cookbook (O'Reilly Media, Sebastopol, 2011), 2nd ed..

Conectado ao computador por uma entrada USB, a plataforma pode ser programada pela linguagem Processing, onde são digitados os programas ou, na linguagem do Arduino, os “sketches” [8][8] B. Massimo, Getting started with Arduino (O'Reilly Media, Sebastopol, 2009).. O computador se comunica com a placa Arduino produzindo tanto entradas como saídas de dados. Trata-se de uma plataforma de operação simples, mas muito funcional, que pode auxiliar em várias tarefas de laboratório, servindo ao estudo de diversos campos da ciência, inclusive a robótica.

Para o ensino de Física, o Arduino permite a implementação de diversos tipos de experimentos com um custo relativamente baixo, visto que pode ser reutilizado e reprogramado, conforme a necessidade.

2. Utilizando o ciclo de Karplus no ensino de ondas

Neste projeto, foram desenvolvidas duas aplicações pertinentes ao estudo de ondas, associadas a visão e a audição. A primeira pretende descortinar um mundo sonoro “invisível” aos nossos ouvidos, onde usaremos um sensor ultrassônico para ilustrar a limitação da percepção auditiva humana. No segundo teremos um sensor de barreira usando luz infravermelha, portanto invisível ao olho humano, que produzirá, quando acionado, um ruído e um sinal luminoso que nos sensibilizarão a audição e a visão, indicando a interrupção deste feixe. Ambos experimentos permitem diferentes abordagens didáticas, podendo ser utilizados em conjunto ou separadamente, inclusive auxiliando na aprendizagem de Física por estudantes com deficiência visual ou auditiva.

Para inserir o aluno com deficiência visual no estudo das ondas, foram preparadas algumas formas iniciais de abordagem que podem contribuir para a implementação do conceito, a partir da utilização de recursos de baixo custo. Estas atividades podem ser preparadas e postas em prática em uma turma mista, composta por alunos com e sem deficiência, permitindo uma integração total destes alunos.

Inicialmente, na etapa da Exploração, promove-se uma breve familiarização com os conceitos. É também a oportunidade para que os estudantes familiarizem-se com os equipamentos e que pensem qualitativamente sobre idéias que serão discutidas nas fases seguintes. Neste primeiro momento, o estudo de ondas deve ser guiado, inicialmente, pela apresentação de ondas mecânicas geralmente sendo produzidas em cordas ou molas. Esse primeiro contato com o movimento ondulatório mecânico, que ocorre antes do ensino formal, pode trazer uma experiência afetivamente positiva, quando reproduzido em sala de aula. O benefício da relação de afetividade no meio escolar é muito significativo, sendo objeto de estudo de diversas pesquisas em ensino. A profundidade das relações de afetividade, podem ser observadas em sua conceituação por Dantas: “afetividade designa [...] os processos psíquicos que acompanham as manifestações orgânicas da emoção. A afetividade pode bem ser conceituada como uma das formas de amor”[9][9] H. Dantas, A infância da razão (Editora Manole, São Paulo 1990), p. 10..

Na etapa da Introdução do Conceito, o professor apresenta o assunto da maneira usual, utilizando o quadro, livro texto, exposição oral, aliados ou não, a pequenos experimentos que podem ser desenvolvidos de maneira divertida com a participação de toda classe. Os estudos lúdicos iniciais construirão uma ponte de acesso ao posterior aprofundamento na compreensão do fenômeno ondulatório e suas características, como período, frequência, velocidade e comprimento de onda. Uma primeira experiência que pode ser feita com os estudantes é a geração de ondas em um meio mecânico. No caso de estudantes cegos, estes em um momento estarão gerando suas ondas em uma mola (pode ser uma mola de brinquedo, popularmente conhecida como “mola maluca”) e, em seguida, podem deslizar suavemente suas duas mãos ao longo das ondulações da mola, geradas por outro estudante, recuando a mão ao menor contato, percebendo assim sua constituição geométrica e forma de propagação.

Inicialmente pode ser produzida uma onda de comprimento λ/2 onde o estudante cego pode, com ambas as mãos perceber seu contorno a partir das extremidades, onde encontramos os ventres (praticamente imóveis) indo em direção ao centro onde perceberá que as mãos estarão cada vez mais para cima, atingindo o ponto máximo quando ambas as mãos se tocarem na região denominada crista da onda. O mesmo pode ser feito para uma onda de comprimento λ, onde o estudante perceberá 3 nós e duas cristas. É importante, durante a experiência, que tente se manter constante a frequência e a amplitude da onda que tenderá a perder energia ao toque, mesmo que muito suave. Através do tato, estes alunos poderão perceber o sobe-e-desce da mola e construir um modelo mental desta forma de onda englobando a maneira como se propaga, partindo do agente perturbador em direção à extremidade oposta. Esta análise pode ser reforçada através de um modelo bidimensional de uma onda senoidal de comprimento λ (pode-se colar um barbante ou cadarço em forma senoidal em uma cartolina, por exemplo, como pode ser visto na Figura 1.

Figura 1
Modelo bidimensional de uma onda de comprimento λ, feita com cadarço roliço grosso, colados sobre uma cartolina. Eixos feitos com cadarço fino.

Esta experiência será também de grande valia para estudantes videntes, que poderão acompanhar e participar da produção destas ondas e compreender melhor suas características.

A manipulação da mola e do barbante poderão contribuir para a construção dos demais conceitos como vale, crista, nó, amplitude e comprimento de onda. Outra característica deste movimento ondulatório, remete ao conceito de uma onda transversal, onde a perturbação se desloca perpendicularmente a direção da propagação. Para os demais estudantes, estas características da onda podem ser desenhadas da maneira tradicional no quadro.

A mola pode contribuir também para a compreensão do modelo de onda longitudinal, na qual, a deformação da mola se desloca na mesma direção de propagação. Para o estudante cego, pode-se distender a mola mantendo uma pequena porção desta deformada (comprimida), amarrada com barbante ou fita adesiva. Usando o tato o estudante poderá perceber esta deformação, que se diferencia do resto da mola pela proximidade dos elos, como sendo a perturbação que percorre a mola. Esta perturbação percorre a mola no mesmo sentido de sua propagação sendo, portanto, um exemplo de onda longitudinal, diferentemente da onda que vimos anteriormente, cuja perturbação é transversal a direção de propagação, como pode ser visto na Figura 2a. Apoiando a mola parcialmente distendida em uma bancada plana e segurando-a pelas duas extremidades, o aluno cego poderá produzir uma perturbação em uma das extremidades e perceber, pelo som produzido, o movimento deste pulso, percorrendo todo comprimento da mola. Para que o efeito seja percebido de maneira clara é necessário que o ambiente esteja silencioso. Os demais estudantes poderão perceber visualmente o fenômeno, sendo, portanto, uma forma interessante de ilustrar o comportamento de uma onda longitudinal para toda a classe. As Figuras 2b e 2c ilustram esta experiência.

Figura 2
A figura (a) apresenta uma imagem da mola mantida comprimida na região central através de fita adesiva. As figuras (b) e (c) mostram um pulso percorrendo a mola.

Após esta introdução macroscópica do modelo longitudinal de ondas, pode-se imergir no modelo microscópico da vibração das moléculas do ar, como suporte mecânico para a propagação do som. Neste ponto pode ser interessante comentar sobre a vocalização do som através da vibração das cordas vocais e a captação deste som pelo sistema auditivo até o envio da informação ao cérebro, suas faixas limítrofes de captação de frequência sonora e a comparação com as faixas de frequência percebidas por alguns animais. O intuito desta comparação é a compreensão, ao final da aula, de que nossos sentidos são limitados, no caso da audição, por uma faixa de frequência que varia de 20Hz a 20.000Hz e que para detectarmos sons acima ou abaixo desta faixa precisamos de detectores específicos. Portanto, o fato de não estarmos ouvindo um ruído não significa que este ruído não esteja sendo propagado.

Depois da introdução teórica sobre o modelo ondulatório, poderá ser introduzido o experimento “O som que o surdo pode ver e o cego pode ouvir”, sendo inicialmente apresentados os componentes que compõem a montagem experimental. O principal componente é o sensor ultrassônico, responsável pela produção de um som inaudível para nós e, ao mesmo tempo, dotado de um sensor capaz de detectar o retorno deste som produzido, quando o mesmo atinge um obstáculo e retorna até ele. A explicação do seu funcionamento remete ao conceito do eco, no qual podem ser exploradas a reflexão de uma onda e a velocidade de propagação do som no ar que varia de acordo com a sua temperatura. Observando o sketch pode-se perceber que para o cálculo da distância precisamos informar a velocidade do som no ambiente onde o sensor está sendo utilizado, isso é feito através do comando “distance = (duration/2) * 0.0343”, que será tratado mais adiante.

Finalmente, na etapa da Aplicação do Conceito, os alunos responderão a um questionário, que deverá ser elaborado pelo professor, para verificar e aplicar o que aprenderam nas etapas anteriores. Algumas questões podem ser de ordem qualitativa (conceitual), com objetivo principal de avaliar se o estudante consegue distinguir características dos dois tipos de modelos ondulatórios abordados (mecânico e eletromagnéto). E questões quantitativas, podendo envolver cálculos de frequência, período e comprimento de onda. Além da velocidade de propagação que pode ainda ser usada para ilustrar exercícios usando o conceito do sonar.

3. Experimento 1 - O som que o surdo pode ver e o cego pode ouvir

O som e a luz compartilham algumas características oscilatórias, como frequência, período e comprimento. Entretanto, quando as similaridades acabam, devemos reforçar aos estudantes as diferenças que levam em consideração a forma e o meio de propagação para que possamos usar a analogia dentro do seu campo de limitação, com uma perfeita delimitação de suas fronteiras. Para a luz, enquanto onda eletromagnética, não há necessidade de um meio físico para sua propagação e a perturbação ondulatória ocorre de forma transversal. No caso da onda sonora, além se propagar longitudinalmente, há de haver um meio para suportar sua propagação, sem o qual, o som deixa de se propagar. Nesse ponto, a experiência primeira, aquela que os jovens experimentam ao ver filmes de ficção em que as explosões no espaço geram enormes estrondos, pode se configurar num enorme obstáculo epistemológico, ou seja, esses primeiros contatos com experiências pseudocientíficas, quando não sujeitos a críticas, acabam se tornando verdades difíceis de serem expurgadas, criando condições psicológicas que dificultam o progresso do espírito científico [2][2] G. Bachelard, A formação do espírito científico: contribuição para uma psicanálise do conhecimento (Contraponto, Rio de Janeiro, 1996).. O professor, com sua experiência, deve ser enfático ao afirmar que as características do som não permitem sua propagação onde não há um meio material que o suporte, diferentemente da luz, haja vista estarmos nos banhando por raios de luz que atravessam a imensidão do espaço antes de nos atingir. No entanto, mesmo o espaço sideral que constantemente é usado como exemplo de vácuo absoluto, contém matéria por onde o som pode se propagar. Em algumas regiões do espaço, como em uma nuvem interestelar, pode haver uma densidade de cerca de 10 átomos de hidrogênio por cm3 o que permite a propagação de ondas sonoras de comprimento de onda comparáveis a dimensão do sistema solar [10][10] S.T. Silva, Propagação do som: Conceitos e Experimentos. Dissertação de Mestrado, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro (2011).. É evidente que estas ondas não seriam detectadas por nossos ouvidos, entretanto, mais uma vez, é preciso deixar claro os conceitos importantes nesta questão, que são as definições de vácuo absoluto e os respectivos limites de nossa audição.

Nossa audição permite que consigamos captar, ouvir, sons da faixa de frequência dos 20 Hz aos 20 kHz. Denomina-se infrassons, frequências inferiores aos 20 Hz e ultrassons as acima dos 20 kHz. Quanto mais próximo dos 20 Hz, mais grave o som nos é percebido, no sentido oposto, quanto mais próximo dos 20 kHz, mais agudo o som se torna. Outros animais conseguem captar sons em diferentes faixas de frequência, como elefantes e morcegos. Frequências infrassônicas, abaixo dos 20 Hz, têm pouco espalhamento, o que facilita sua propagação permitindo que alguns animais consigam se comunicar através de longas distâncias. Já as frequências ultrassônicas são fortemente espalhadas por pequenos objetos e, por isso, muito utilizada na medicina, para gerar imagens do interior do nosso corpo. Com elas é possível aferir dimensões e formatos de diversos órgãos sem a necessidade de intervenções cirúrgicas e sem a possibilidade de dano celular, como ocorre com os raios X.

Voltando ao mundo animal, os morcegos conseguem captar sons de 10 kHz a 120 kHz logo, produzindo sons da ordem de 50 kHz conseguem captar seu eco e, desta forma, ter uma percepção da localização espacial dos objetos a sua frente, como um sonar em um submarino. É como se conseguissem ver com os ouvidos em um ambiente desprovido de luz, como na escuridão de uma caverna [11][11] F.V. Rodrigues e R. Collino, Fisiologia da Audição, in: Livro do V Curso de Inverno: Tópicos em Fisiologia Comparativa (Universidade de São Paulo, São Paulo, 2008)..

3.1. O experimento

O experimento que segue tem como objetivo levar à sala de aula um aparato no qual o estudante possa estar diante de um sensor que produz um som inaudível ao ser humano e que consegue captar seu eco gerando uma informação. Esta informação é gerada através de luzes coloridas que identificam a distância de um obstáculo pela simples alternância no acendimento de LEDs de cores diferentes e a produção de ruídos. Dessa forma estaremos mostrando ao estudante que precisamos de sensores corretos para captar uma informação e, da mesma forma, para conseguirmos interpretá-la. Utilizando um componente eletrônico denominado buzzer pode-se gerar um som audível de tons diferentes para cada distância, o que favoreceria o ensino para alunos cegos. No caso dos demais estudantes, o acendimento dos LEDs coloridos permitiria também uma abordagem comparativa entre a visão e a audição, mostrando ao estudante as diferenças e semelhanças entre os modelos ondulatórios da luz e do som. De certo modo, esse experimento poderia, de forma inclusiva, deixar alunos com surdez e os demais em igualdade de condições para compreender o fenômeno, já que as frequências sonoras são inaudíveis para os dois. O estímulo visual favoreceria também esse aluno portador de surdez.

O sensor ultrassônico utilizado, HC-SR04, emite um ruído na faixa dos 40 kHz e opera com uma tensão de 5 VDC, conseguindo detectar barreiras a uma distância que varia de 2 cm a 400 cm com uma resolução de 0,3 cm. Ele opera sobre um ângulo efetivo menor que 15°. Maiores detalhes podem ser encontrados na referência [12][12] R. Diosdado, Sensor de ultrasonidos HC-SR04, Zona Maker. disponível em http://www.zonamaker.com/arduino/modulos-sensores-y-shields/ultrasonido-hc-sr04.
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O dispositivo possui dois tambores cilíndricos, sendo um o emissor e o outro o receptor, que correspondem a um alto falante e a um microfone, respectivamente. Ao ser programado e alimentado, o componente emissor envia pulsos sonoros para o ambiente. Assemelhando-se a um sonar, quando esse pulso encontra um obstáculo, dentro dos limites de funcionamento, é refletido de volta para o sensor. O componente receptor consegue captá-lo e o sistema calcula o tempo decorrido entre a emissão e recepção deste sinal. Sabendo o tempo entre a emissão e reflexão e a velocidade de propagação do som no meio, no caso o ar, pode ser determinada a distância em que o obstáculo se encontra do sensor. Uma ilustração do seu funcionamento pode ser vista na Figura 3.

Figura 3
O sensor emite um ruído que ao refletir sobre um obstáculo, retorna ao sensor, sendo captado por ele [13][13] http://arduinosensors.com/index.php/arduino-ultrasonic-distance-sensor/, acesso em agosto de 2017.
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Além do sensor ultrassônico são necessários três LEDs coloridos. Foram usados LEDs nas cores verde, vermelha e azul, três resistores de 330 Ω e diversos fios adaptados para conexão no protoboard e na placa Arduino.

Outro componente utilizado é o buzzer ou cigarra, que é um dispositivo eletrônico capaz de produzir som quando submetido a uma diferença de potencial (ddp), ou seja, um transdutor que consegue converter eletricidade em movimentos mecânicos capazes de gerar som. É muito utilizado em equipamentos eletrônicos e sua finalidade é produzir um ruído sonoro que pode ser usado como alerta, como uma sirene, ou algum tipo de indicação. Podem ser de diversos tipos, como piezelétricos ou eletromecânicos.

Os buzzers piezelétricos são fáceis de serem encontrados a um custo relativamente baixo. Por isso, foi adotado no circuito do experimento. Na Figura 4 observa-se o buzzer encapsulado utilizado. A montagem com as conexões dos componentes no protoboard e na placa Arduino podem ser vistas na Figura 5.

Figura 4
Buzzer encapsulado[14][14] P. Buzzer, Arduino Sensors, disponível em https://www.robomart.com/piezo-buzzer-b-10n.
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Figura 5
Montagem dos componentes no protoboard e na placa Arduino.

O sketch, ou seja, o programa que será rodado no Arduino é apresentado no Anexo 1. Não são feitos maiores comentários sobre seus comandos já que a ideia aqui não é ensinar essa linguagem de programação. Entretanto, chamamos atenção ao comando {distance = (duration/2) * 0.0343} . Este comando expressa em linguagem de computador os conhecimentos que extraímos da compreensão do mundo físico. A velocidade de propagação do som varia em função das características do meio em que está a se propagar. No ar, esta velocidade também sofre os efeitos da variação da temperatura, sendo admitida uma velocidade de aproximadamente 343 m/s para uma temperatura em torno de 20 °C [15][15] P. Francisco, Qual a velocidade do som?, disponível em http://www.sitecuriosidades.com/qual-a-velocidade-do-som/.
http://www.sitecuriosidades.com/qual-a-v...
. Para conhecermos a distância em que se encontra o objeto faremos uso desta velocidade, em conjunto com a contagem de tempo desde a emissão do pulso até seu retorno ao sensor. Como queremos saber a distância (distance) em que se encontra o objeto e não a distância percorrida pelo pulso, usaremos a metade do tempo (duration/2). Sabemos que a distância pode ser calculada pela equação (d = t * v), ou seja, a distância percorrida é igual ao produto da velocidade pelo tempo gasto em seu deslocamento. É importante ressaltar que a plataforma Arduino trabalha com pulsos da ordem de milissegundos e que queremos o resultado da distância em centímetros. Para tanto, torna-se necessário dividir a velocidade 343 m/s por 10000 para que tenhamos o resultado expresso em cm. Por essa razão vemos no comando a metade do tempo (duration/2) sendo multiplicada por 0,0343.

O programa aciona o sensor ultrassônico para que este envie de tempos em tempos o sinal sonoro. Quando o sensor capta o eco, o sistema automaticamente calcula a distância e, se essa distância for maior que 30 cm, aciona o LED azul. Quando a distância fica entre 6 a 30 cm aciona o LED verde e para distâncias menores que 6 cm aciona o LED vermelho.

Deve ser descrito ao estudante o princípio de funcionamento de cada componente do experimento e, após a conclusão da montagem, usando suas próprias mãos como obstáculo, poderão a acionar os LEDs e ouvir os sons produzidos. A intenção é que percebam que um som de frequência acima da que conseguimos captar, está de fato sendo emitido. E que, apesar de não conseguirmos ouvi-lo, o experimento comprova que este som está realmente sendo emitido. O fato é confirmado pelo acendimento dos LEDs e pelos sons produzidos pelo buzzer que, estes sim, poderão ser percebidos pelos nossos sentidos. O experimento oferece também um argumento para trabalhar com os estudantes os cálculos referentes à propagação e reflexão do som, contribuindo para a prática reflexiva sobre os conceitos abordados.

Na Figura 6 vemos o experimento montado. Na Figura 6a, com a mão a uma distância menor que 6 cm observamos a luz vermelha acender e as demais estão apagadas, o buzzer emite um som grave. Na Figura 6b, a uma distância maior que 6 cm e menor que 30 cm, observamos que só a luz verde acende e o ruído torna-se um pouco mais agudo. Já na Figura 6c, não há nada mais perto que 30 cm do sensor, isso pode ser verificado pois apenas a luz azul está acesa e pelo som emitido pelo buzzer que fica extremamente agudo.

Figura 6
(a) Com a palma da mão a uma distância inferior a 6 cm observa-se a luz vermelha se acender e um ruído bem grave é emitido pelo buzzer. (b) A uma distância um pouco maior que 6 cm e inferior a 30 cm, podemos observar a luz verde acesa e o ruído torna-se mais agudo. (c) Retirando-se a mão da frente do sensor e deixando-o distante mais de 30 cm de qualquer objeto a sua frente, observa-se a luz azul acesa e o buzzer produz um som bem agudo.

Ao se trabalhar com estudantes cegos é muito importante que durante a explicação do funcionamento de cada componente e da montagem do experimento, estes estudantes possam, com a ajuda do professor e dos colegas, participar ativamente, manuseando e ajudando os demais colegas. Desta forma, com participação ativa, poderão compreender melhor o funcionamento de cada componente e sentir-se parte integrante da construção deste experimento para que, durante seu funcionamento, seja despertado um maior interesse e esforço em tentar utilizar os conceitos que aprendera durante o estudo de ondas. Esta participação ativa será importante também para utilização deste experimento junto a estudantes surdos. No entanto, vale frisar que somos todos surdos em relação ao som emitido pelo sensor ultrassônico e que o estímulo visual, através dos LEDs coloridos, será fundamental para a percepção e compreensão do fenômeno, bem como o acionamento sonoro do buzzer.

4. Experimento 2 - A luz que o cego pode ouvir e o surdo pode ver

Da mesma forma com que nossa audição é eficaz para uma faixa de frequência bem delimitada, o mesmo ocorre com a visão. A visão do homem está associada a radiações eletromagnéticas nos comprimentos de onda que vão de 400 nm a 700 nm, compondo o que denominamos luz visível [16][16] G.H. Jacobs, Visual Neuroscience 25, 619 (2008).. No reino animal as respostas aos estímulos eletromagnéticos podem ser bem diferentes. As abelhas, por exemplo, conseguem enxergar na faixa que vai do ultravioleta ao amarelo, sendo, portanto, cegas a partir do vermelho [17][17] N.H. Ibarra, M. Vrobyev e R. Menzel, J. Comp. Physiol. A. Neuroethol. Sens. Neural. Behav. Physiol 200, 411 (2014)..

Há espécies de beija-flores que conseguem discernir diferentes tons alaranjados, imperceptivelmente diferentes ao olho humano, em flores de bromélias que indicam maior concentração de néctar. Na outra extremidade temos os animais que conseguem ver na região do infravermelho, como algumas espécies de peixes. Nós, humanos, que possuímos três tipos cones (ou quatro, no caso de algumas mulheres [18][18] K.A. Jameson, S.M. Highnote e L.M. Wasserman, Psychonomic Bulletin & Review 8, 244 (2001).), conseguimos enxergar apenas na região visível, salvo em cirurgias para retirada do cristalino que aumentam a sensibilidade para uma pequena faixa do ultravioleta. Foi o caso do célebre pintor francês Oscar-Claude Monet, que tendo passado por uma cirurgia para remoção de catarata, passou a perceber essa parte do espectro [19][19] C. Zimmer, Monet's Ultraviolet Eye, disponível em http://www.downloadtheuniverse.com/dtu/2012/04/monets-ultraviolet-eye.html.
http://www.downloadtheuniverse.com/dtu/2...
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4.1. O experimento

Nas Figuras 7a e 7b, podemos observar dois tipos de diodos emissores de luz infravermelha. O primeiro tem seu encapsulamento levemente azulado e o segundo é transparente. Estes diodos são muito utilizados em controles remotos de televisores e outros equipamentos eletrônicos. Na Figura 7c temos um fototransistor infravermelho, que possui seu corpo escurecido para evitar que haja interferências de outras frequências, que não a faixa do infravermelho. A recepção é possível pois o infravermelho é capaz de atravessar o encapsulamento escurecido, tal como ocorre em águas turvas, podendo ser enxergado por algumas espécies de peixes.

Figura 7
(a) LED emissor infravermelho com corpo azulado. (b) LED emissor com corpo transparente. (c) Fototransistor. Seu corpo escurecido permite uma filtragem da luz, deixando passar apenas radiação infravermelha [20][20] https://www.radioshack.com/products/radioshack-infrared-led-emitter-and-detector, acessado em junho de 2018.
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O fototransistor é um dispositivo eletrônico que possui dois terminais; um é o coletor e o outro, o emissor. A base é a parte do fototransistor que fica exposta à luz. Quando a base recebe uma quantidade suficiente de luz infravermelha, se torna ativa, permitindo a passagem de corrente elétrica do coletor para o emissor. Sem luz suficiente não ocorre condução de corrente, ficando, portanto, o emissor e o coletor, eletricamente isolados.

A Figura 8 apresenta o esquema de montagem dos componentes no protoboard e na placa Arduino. O circuito é basicamente um sensor de barreira infravermelha que, quando acionado, produz um ruído sonoro e faz um LED vermelho acender, concomitantemente. O LED emissor infravermelho recebe alimentação direta da placa Arduino (5 VDC). Para limitar a corrente sobre o LED emissor, foi utilizado um resistor de 330 Ω, bem como para o LED vermelho. O buzzer tem seu terminal negativo ligado ao terra da placa Arduino e o positivo no pino 13 que lhe enviará +5 VDC quando a barreira for interrompida. O esquema eletrônico detalhado é apresentado na Figura 1 do Anexo 2.

Figura 8
Esquema de montagem do experimento A luz que o cego pode ouvir e o surdo pode ver.

Para formar um sensor de barreira é necessário que a luz do LED infravermelho seja apontada para o fototransistor a fim de que este receba quantidade suficiente de radiação infravermelha em sua base, permitindo assim a passagem de corrente do coletor ao emissor. O fototransistor é montado conforme o esquema da Figura 8. Podemos observar que há um resistor de 10kΩ ligado no coletor do fototransistor, já o emissor está ligado ao terra. Entre o resistor e o coletor é feita uma ligação até o pino 2 da placa Arduino. Ao receber luz, o fototransistor permite a passagem de corrente elétrica, não chegando nenhuma tensão significativa ao pino 2, já que o coletor e emissor, nesta circunstância, estão em curto alimentando o resistor de 10kΩ. A função do resistor de 10kΩ é justamente a de não permitir que a placa Arduino seja curto-circuitada. Sem receber luz infravermelha suficiente, o fototransitor não conduz, levando ao pino 2 os 5 VDC da alimentação. Quando isso ocorre, ou seja, quando chega tensão no pino 2, a Arduino interpreta essa informação e direciona + 5 VDC ao pino 13, acionando o buzzer. Deve ser observado que no LED infravermelho emissor, assim como nos demais LEDs, o terminal mais longo, que é o anodo, deve ser ligado ao polo positivo da alimentação. Entretanto, no caso do fototransistor, o terminal mais longo é o emissor, que deve ser direcionado ao terra, como mostra a Figura 9 [21][21] D. Quadros, LED e Fototransistor Infravermelho TIL32 e TIL78, disponível em http://dqsoft.blogspot.com.br/2013/01/led-e-fototransistor-infravermelho.html.
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. O fototransistor é um componente eletrônico muito empregado em experimentos didáticos, tanto para construção de espectrômetros [22][22] E. Lüdke, Rev Bras Ens Fís 32, 1506 (2010)., como para sensores de barreira que permitem calcular a velocidade e sua variação ao longo do tempo [23][23] M. A. Cavalcante, A. Bonizzia e L.C.P. Gomes, Rev Bras Ens Fís 30, 2501 (2008)..

Figura 9
Esquema de circuito com o fototransistor.

O sketch deste experimento é bem simples. Com poucos comandos é possível programar a Arduino para executar a função. O sketch disponível no Anexo 2 pode ser copiado exatamente como é reproduzido e compilado para a placa Arduino.

Com o experimento montado, como visto nas Figuras 10a e 10b, o LED infravermelho à direita ilumina a base do fototransistor. Desta forma o circuito está em prontidão e permanecerá assim até que o feixe de luz seja interrompido. O protoboard com o circuito pode ser colocado dentro de uma caixa para que os estudantes possam observar que nenhuma luz visível sai do LED emissor infravermelho.

Figura 10
(a) Nesta fotografia podem sem observados todos os componentes conectados ao protoboard, além das conexões à placa Arduino, com destaque para o LED infravermelho e o fototransistor. Estudantes com deficiência visual podem tatear os dois para perceber que um aponta diretamente para o outro. (b) Introduzimos um canudo entre LED infravermelho e o fototransistor. (c) Pressionando o canudo com os dedos, o fototransistor deixa de receber a luz do LED infravermelho, acionando, desta forma, o LED vermelho e o buzzer. (d) Utilizando uma câmera de celular, e apontando o LED infravermelho para cima, é possível verificar que ele permanece aceso quando o circuito está em operação. Percebe-se que, desta forma, o fototransistor não recebe a luz deste LED, acionando o LED vermelho e o buzzer

Para confirmar que há uma luz sendo emitida pelo LED infravermelho, os estudantes podem acionar as câmeras dos seus celulares, resultado visto na Figura 10d, visualizando assim, algo que nossos olhos não podem ver.

O aviso sonoro e o LED vermelho que são acionados toda vez que o feixe de luz é interrompido permite que os estudantes, mais uma vez, reflitam sobre as características da luz e do som. No caso de estudantes com deficiência visual, é necessário, mais uma vez, que toda montagem seja preparada com participação destes estudantes. Os LEDs, em especial, devem ser tateados pelos estudantes cegos para que percebam uma certa direcionalidade da luz emitida (ou recebida, no caso do fototransistor), através da lente disposta em sua extremidade. Por esta direcionalidade do feixe de luz, torna necessária a disposição frontal de ambos os componentes (emissor e receptor infravermelho), para que o fototransistor possa receber a luz infravermelha suficiente, do LED infravermelho emissor, o que permitirá seu correto funcionamento. Após a disposição frontal dos dois componentes, para facilitar a compreensão de que ambos os componentes estão dispostos frontalmente, pode-se utilizar um canudo cortado no comprimento da distância que os separa (Figura 10b), encaixando as extremidades em ambos os componentes. Desta forma, o estudante cego poderá, pelo tato, perceber de forma inequívoca que os componentes estão apontados um para o outro. Além disso perceberá, pelo diâmetro do canudo (similar ao diâmetro do LED) que a porção do feixe infravermelho que se dirige do LED emissor ao fototransistor, está contida no interior deste canudo. Sendo assim, ao pressionar lentamente o canudo (com o polegar e indicador), o estudante estará interrompendo gradativamente a transmissão deste feixe, até o momento em que seus dedos se encontrarão. Neste momento o buzzer será acionado, indicando que o feixe foi completamente interrompido. No caso de um aluno surdo, o LED vermelho, acionado junto com o buzzer, irá indicar a interrupção do feixe.

Como desdobramentos da utilização deste trabalho, o professor pode levar os estudantes a perceberem (no caso do primeiro experimento) que o sensor ultrassônico usado para detectar distâncias pode ilustrar, por exemplo, de que forma os morcegos conseguem se deslocar usando o sentido da audição como forma de “enxergar” o mundo desprovido de luz. Esse tipo de analogia pode ser usado em sala de aula e, como complemento, pode ser explicado o funcionamento do sonar. Da mesma forma que não se pode enxergar, com os olhos, na ausência de luz, há uma grande dificuldade de se enxergar em águas turvas e de grandes profundidades. Então, as embarcações utilizam o sonar, que é um equipamento que funciona seguindo o mesmo princípio, ou seja, envia um sinal sonoro de alta frequência para a direção que quer mensurar e calcula a distância através do tempo que o eco leva para ser captado.

Pode ser trabalhada com o estudante uma atividade complementar, em que se use o fato de que na água o som se desloca com velocidade muito maior (cerca de 1480 m/s) que no ar (cerca de 343 m/s) [15][15] P. Francisco, Qual a velocidade do som?, disponível em http://www.sitecuriosidades.com/qual-a-velocidade-do-som/.
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, o que permite um cálculo da distância de um obstáculo, de forma mais rápida. Por outro lado, comparando-se com a visão, já que a luz se propaga, no ar, a uma velocidade aproximada de 300.000.000 m/s, a audição produz uma percepção de forma muito lenta. Por esse motivo enxergamos o relâmpago (luz) antes de ouvir o trovão (som).

5. Considerações finais

Uma das maiores dificuldades encontradas por um estudante de física deficiente visual está relacionada com a realização de experimentos. Numa tentativa de abordar esse problema, foram apresentados dois experimentos que permitem ao professor trabalhar as relações entre frequências invisíveis e inaudíveis que, através do processamento com a plataforma Arduino, podem ser convertidas em frequências que sensibilizem nossos sentidos.

As atividades propostas permitem que o aluno deficiente visual ou auditivo estabeleça suas relações com o aprendizado de física através de um processo contínuo que leva ao desequilíbrio – no sentido Piagetiano - adquirindo conceitos mais adequados bem como padrões de raciocínio mais elaborados.

Os experimentos ajudam a ilustrar os limites de nossas percepções e algumas propriedades do som e da luz, mostrando a existência de um universo além dos nossos sentidos. Através de uma proposta didático experimental inclusiva, permite uma experiência sensorial a alunos cegos e surdos em classes mistas.

Referências

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    21 Set 2018
  • Data do Fascículo
    2019

Histórico

  • Recebido
    21 Mar 2018
  • Revisado
    05 Jun 2018
  • Aceito
    20 Jul 2018
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