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Nova abordagem para verificar como os alunos articulam diferentes materiais instrucionais utilizando mapas conceituais

New approach to investigate how students articulate different instructional materials using concept maps

Resumos

O presente trabalho tem como objetivo propor uma nova forma de utilizar os mapas conceituais (MCs) para verificar como os alunos articulam os diferentes materiais instrucionais (MIs) indicados para estudo pelo professor. Isso expande a possibilidade de uso dos MCs como ferramenta de avaliação, normalmente restrita à aprendizagem dos alunos. O procedimento proposto requer que os alunos incluam informações sobre a origem de cada um dos conceitos do MC, em função dos MIs indicados para estudo. MCs (n = 88) sobre astronomia formam o primeiro conjunto de dados empíricos que ratifica o potencial dessa nova abordagem. Os resultados revelam que houve diferença significativa entre as frequências das proposições que envolvem conceitos com origem no mesmo MI (25%) e as proposições que envolvem conceitos com origem em MIs diferentes (75%). A integração entre diferentes MIs é desejável porque indica uma compreensão histórica mais precisa da evolução da astronomia, bem como os impactos que as descobertas sobre o universo tiveram sobre a sociedade. A análise da relação entre os MIs não exclui a necessidade do professor ler e corrigir os erros conceituais expressos nas proposições elaboradas pelos alunos. Pelo contrário, a nossa proposta se soma aos procedimentos já tradicionais de leitura e avaliação dos MCs para fins de avaliação da aprendizagem. Uma vantagem associada ao procedimento proposto é a possibilidade do professor também avaliar o seu plano de ensino, verificando como os alunos articularam os MIs.

avaliação; aprendizagem; mapas conceituais; materiais instrucionais


This paper aims to propose a new way of using concept maps (Cmaps) to see how students articulate different instructional materials (IMs) selected by the teacher. This expands the possibility of using Cmaps as an assessment tool, usually restricted to students' learning. The proposed procedure asks students for including information about the origin of each of Cmap's concepts, based on the IMs selected for study. Cmaps (n = 88) about astronomy form the first set of empirical data that confirms the potential of this new approach. The results reveal a significant difference between the frequencies of propositions involving concepts from the same IM (25%) and propositions involving concepts from different IMs (75%). The integration between different IMs is valuable because it shows a more accurate understanding of the historical development of astronomy, as well as the impact that the discoveries about the universe had on society. The analysis of the relationship between IMs does not eliminate the necessity of the teacher to check and correct the misconceptions expressed in propositions made by students. Rather, our proposal adds to the traditional procedures for reading and evaluating the Cmaps for assessment purposes of learning. An advantage associated with the proposed procedure is the possibility of the teacher to evaluate your teaching plan, checking how students articulated the IMs.

learning; evaluation; concept maps; instructional materials


PESQUISA EM ENSINO DE FÍSICA

Nova abordagem para verificar como os alunos articulam diferentes materiais instrucionais utilizando mapas conceituais

New approach to investigate how students articulate different instructional materials using concept maps

Camila Aparecida Tolentino CicutoI; Bárbara Chagas MendesII; Paulo Rogério Miranda CorreiaIII, 1 1 E-mail: prmc@usp.br.

IPrograma de Pós-Graduação Interunidades em Ensino de Ciências, Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil

IIColégio Eduardo Gomes, São Caetano do Sul, SP, Brasil

IIIEscola de Artes, Ciências e Humanidades, Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil

RESUMO

O presente trabalho tem como objetivo propor uma nova forma de utilizar os mapas conceituais (MCs) para verificar como os alunos articulam os diferentes materiais instrucionais (MIs) indicados para estudo pelo professor. Isso expande a possibilidade de uso dos MCs como ferramenta de avaliação, normalmente restrita à aprendizagem dos alunos. O procedimento proposto requer que os alunos incluam informações sobre a origem de cada um dos conceitos do MC, em função dos MIs indicados para estudo. MCs (n = 88) sobre astronomia formam o primeiro conjunto de dados empíricos que ratifica o potencial dessa nova abordagem. Os resultados revelam que houve diferença significativa entre as frequências das proposições que envolvem conceitos com origem no mesmo MI (25%) e as proposições que envolvem conceitos com origem em MIs diferentes (75%). A integração entre diferentes MIs é desejável porque indica uma compreensão histórica mais precisa da evolução da astronomia, bem como os impactos que as descobertas sobre o universo tiveram sobre a sociedade. A análise da relação entre os MIs não exclui a necessidade do professor ler e corrigir os erros conceituais expressos nas proposições elaboradas pelos alunos. Pelo contrário, a nossa proposta se soma aos procedimentos já tradicionais de leitura e avaliação dos MCs para fins de avaliação da aprendizagem. Uma vantagem associada ao procedimento proposto é a possibilidade do professor também avaliar o seu plano de ensino, verificando como os alunos articularam os MIs.

Palavras-chave: avaliação, aprendizagem, mapas conceituais, materiais instrucionais.

ABSTRACT

This paper aims to propose a new way of using concept maps (Cmaps) to see how students articulate different instructional materials (IMs) selected by the teacher. This expands the possibility of using Cmaps as an assessment tool, usually restricted to students' learning. The proposed procedure asks students for including information about the origin of each of Cmap's concepts, based on the IMs selected for study. Cmaps (n = 88) about astronomy form the first set of empirical data that confirms the potential of this new approach. The results reveal a significant difference between the frequencies of propositions involving concepts from the same IM (25%) and propositions involving concepts from different IMs (75%). The integration between different IMs is valuable because it shows a more accurate understanding of the historical development of astronomy, as well as the impact that the discoveries about the universe had on society. The analysis of the relationship between IMs does not eliminate the necessity of the teacher to check and correct the misconceptions expressed in propositions made by students. Rather, our proposal adds to the traditional procedures for reading and evaluating the Cmaps for assessment purposes of learning. An advantage associated with the proposed procedure is the possibility of the teacher to evaluate your teaching plan, checking how students articulated the IMs.

Keywords: learning, evaluation, concept maps, instructional materials.

1. Introdução

O uso de organizadores gráficos durante o processo de ensino-aprendizagem é útil para professores e alunos. Uma explicação para esse fato é a possibilidade do duplo processamento cognitivo do conteúdo expresso por meio da linguagem e de imagens [1-3]. Um mapa cartográfico, que combine imagens e textos explicativos sobre a localização dos pontos turísticos de uma cidade, exemplifica o efeito positivo que os organizadores gráficos podem ter sobre a aprendizagem de um visitante que está no local pela primeira vez. A teoria da dupla codificação, proposta por Allan Paivio, oferece uma explicação cognitiva sobre o processamento simultâneo de signos linguísticos (escritos ou verbais) e imagéticos pela memória de curto prazo, sem implicar em sobrecarga cognitiva [3]. Ela serve de referência para os leitores que desejam um aprofundamento teórico maior, que está além do escopo desse trabalho.

Apesar de existirem várias opções de organizadores gráficos, tais como os mapas mentais e os mapas de argumentos, os mapas conceituais (MCs) são a melhor opção para representar relações conceituais. Os MCs podem ser definidos como um conjunto de conceitos, articulados numa rede proposicional. A utilização compulsória de proposições para vincular conceitos é o fato que torna os MCs mais úteis para explicitar relações conceituais [4-7]. A Fig. 1 apresenta um conjunto de proposições que relaciona os conceitos "ensino de física" e "alfabetização científica" para destacar a importância dos termos de ligação para compreender essa relação conceitual. A estrutura geral das proposições (Fig. 1a) prevê a inclusão de um verbo no termo de ligação; caso contrário, não é possível articular uma mensagem com alto grau de clareza semântica e sintática para expressar a relação conceitual (Figs. 1b-1c). O verbo "promover" foi selecionado para relacionar "ensino de física" e "alfabetização científica", mas o sentido da mensagem é drasticamente alterado dependendo do tempo verbal utilizado (Figs. 1d-1f). A inclusão do verbo "dever" (Fig. 1g) muda o sentido da relação conceitual e sugere um papel ao ensino de física, que pode ser francamente questionado com a inclusão de uma única palavra (Fig. 1h).






As diferenças entre as relações conceituais apresentadas na Fig. 1 só foram reveladas por causa da necessidade de expressar as relações conceituais por meio de proposições. Organizadores gráficos como os mapas mentais, que não incluem termos de ligação na sua estrutura, não revelam como os conceitos se relacionam (eles só mostram como os conceitos se associam). Essas características devem ser consideradas para que seja selecionado o tipo de organizador gráfico mais adequado para as atividades a serem desenvolvidas em sala de aula. Davies faz uma comparação sobre as características dos mapas mentais, conceituais (MCs) e de argumentos que pode ser útil para os leitores que se pretendem utilizar organizadores gráficos [4]. O interesse do nosso grupo de pesquisa em avaliar o processo de aprendizagem a partir das relações conceituais construídas pelos alunos nos leva a optar pelo uso dos MCs.

A fundamentação teórica que subjaz o mapeamento conceitual proposto por Joseph Novak é outro diferencial que sustenta nossa opção pelos MCs. A teoria da assimilação através da Aprendizagem e da Retenção Significativas proposta por Ausubel descreve a aprendizagem entre dois extremos (aprendizagem significativa e aprendizagem mecânica), que levam a processos de retenção distintos [8-11]. A Fig. 2 apresenta de forma esquemática a diferença entre as aprendizagens mecânica e significativa, descrita como a transformação (ou não) dos conhecimentos prévios (A) pela nova informação (a). A criação de significado envolvendo o que já se sabe e a nova informação (Aa) é um esforço que deve ser feito pelo sujeito que aprende, a fim de provocar a transformação dos seus conhecimentos prévios (A). O nível de dissociação de Aa é baixo quando isso ocorre e o processo de retenção se dá por obliteração (A'). Nesse caso, a nova informação é recuperada com maior facilidade após a aprendizagem e ela pode ser transferida para contextos diferentes daquele em que ocorreu a aprendizagem. Esses aspectos são as principais características da aprendizagem significativa. Por outro lado, o nível de dissociação de Aa é alto quando o processo de criação de significado não é bem sucedido. Os conhecimentos prévios iniciais (A) não são transformados e a nova informação fica isolada na memória de longo prazo. Nesse caso, ela é mais suscetível ao esquecimento e dificilmente será utiliza num contexto diferente daquele em que ocorreu a aprendizagem. Esses aspectos são as principais características da aprendizagem mecânica.


O planejamento do ensino inclui a seleção dos materiais instrucionais (MIs) a serem utilizados em sala de aula. Segundo Ausubel, eles devem ser potencialmente significativos, isto é, os alunos devem ser capazes de relacioná-los de forma não arbitrária e não literal com os seus conhecimentos prévios [8-11]. A diversificação dos materiais pode ser útil para atingir um conjunto de alunos que apresentam conhecimentos prévios pouco homogêneos, ou diferentes níveis de interesse sobre o assunto da disciplina. O desafio que se apresenta ao professor é saber se os alunos conseguirão estabelecer relações conceituais entre os diferentes materiais apresentados durante as aulas. A compreensão adequada sobre o tema da disciplina pode ser dependente dessa articulação e o professor precisa ter um instrumento de avaliação capaz de detectar como os alunos relacionam os conceitos, indicando suas origens a partir dos MIs oferecidos para estudo. Apesar do uso crescente dos MCs no âmbito do ensino de ciências [12-18] e de física [19-25], não há nenhum trabalho na literatura que utilize os MCs produzidos pelos alunos para fazer uma avaliação de como os alunos articulam os diferentes MIs selecionados pelo professor.

O objetivo desse trabalho é utilizar os MCs produzidos pelos alunos para verificar como eles articulam os diferentes MIs selecionados pelo professor. Isso expande a possibilidade de uso dos MCs como ferramenta de avaliação, normalmente restrita à verificação da aprendizagem conceitual dos alunos. O procedimento proposto nesse trabalho extrai informações sobre como os alunos vinculam os MIs oferecidos para estudo, permitindo ao professor fazer uma avaliação sobre o seu planejamento do ensino. A hipótese de que há informações latentes nos MCs nos levou a desenvolver essa estratégia inovadora na tentativa de explicitar o que não pode ser extraído somente a partir da leitura das proposições.

2. Mapeando a identificação dos materiais instrucionais

A identificação dos materiais instrucionais (MIs) que dão origem para cada conceito utilizado no mapa conceitual (MC) é a estratégia apresentada nesse trabalho. Essa é uma forma inovadora de explicitar o que não pode ser extraído somente a partir da leitura das proposições dos MCs. O MI é identificado através de um campo circular no MC, associado à caixa onde é escrito o conceito. Nesse círculo, o aluno indica o MI de origem do conceito, a partir de uma legenda de letras definida pelo professor. Por exemplo, as letras X, Y e Z indicam três MIs diferentes que são origem dos conceitos dos MCs apresentados na Fig. 3. A Fig. 3a representa um MC com conceitos oriundos de apenas um MI (X), enquanto as Fig. 3b e 3c representam MCs com conceitos oriundos de mais de um MI.


A articulação entre diferentes MIs pode ser estimada a partir do número de proposições que contém conceitos associados a materiais distintos. Os MCs da Fig. 3 permitem, por exemplo, a elaboração de proposições do tipo (conceito inicial/conceito final) X/Y, X/Z, Y/Z, Y/X, Z/X e Z/Y. Muitas proposições com essas combinações num MC revelam que o aluno conseguiu estabelecer várias relações entre os conceitos dos diferentes MIs. O MC da Fig. 3a não apresenta nenhuma integração entre os MIs utilizados (somente o MI X foi indicado como fonte de todos os conceitos do MC). Por outro lado, o MC da Fig. 3c apresenta um alto grau de integração entre os MIs X, Y e Z. Essa alta integração conceitual dos MIs pode ser uma característica desejável para a aprendizagem dos alunos, dependendo do tipo de planejamento de ensino que o professor fez para as aulas da sua disciplina.

Proposições que envolvem conceitos relacionados a um mesmo MI (X/X, Y/Y ou Z/Z) também são facilmente identificadas. Elas podem estar relacionadas ao desenvolvimento de uma ideia que requer a articulação de vários conceitos, mas podem também ser decorrência da dificuldade de vincular conceitos de diferentes MIs (Figs. 3a e 3b). O professor, ao utilizar a proposta desse trabalho, terá condições favoráveis para interpretar o que está ocorrendo ao considerar os MIs selecionados, o seu planejamento de ensino e os MCs produzidos pelos alunos.

3. Procedimentos de pesquisa

3.1. Coleta de dados

A coleta de dados empíricos foi feita considerando-se os MCs (n = 88) produzidos individualmente pelos alunos que cursaram a disciplina Ciências da Natureza (CN), a partir da mesma pergunta focal: "Como a ciência e a tecnologia influenciaram a compreensão da sociedade sobre o universo?" [26]. O número máximo de conceitos utilizados por cada aluno foi igual a 9 e o conceito "mais tecnologia" deveria compor o MC final. Essa atividade fez parte da 1ª avaliação da disciplina (P1), realizada na aula 5. Um período de treinamento sobre mapeamento conceitual foi oferecido aos alunos durante parte do tempo destinado às aulas 1-4, conforme procedimento já descrito na literatura [27]. As aulas da disciplina CN foram ministradas ao longo do 1° semestre de 2012 por um dos autores desse trabalho (P.R.M.C.).

A folha da P1 apresentava um mapa conceitual semiestruturado (MCSE), que limita o número de conceitos a serem utilizados (n = 9) sem restringir a quantidade de proposições que podem ser estabelecidas (Fig. 4). A caixa pontilhada indica o conceito raiz do MC, ou seja, o ponto por onde se deve começar a leitura da rede proposicional. Todos os retângulos apresentam um círculo associado para que os alunos informem a origem de todos os conceitos utilizados, a partir dos MIs selecionados pelo professor da disciplina. A Tabela 1 descreve as atividades propostas para a discussão sobre astronomia, revolução científica e a origem do universo, destacando os MIs utilizados em cada aula. As letras A-F foram utilizadas pelos alunos para preencher os círculos disponíveis na folha de prova (Fig. 4).


A utilização combinada de textos e vídeos sobre temas similares foi intencional para verificar se os alunos conseguiam organizar uma síntese conceitual coerente a partir de fontes em diferentes formatos. Os textos ajudaram os alunos a se prepararem para as discussões que ocorriam durante as aulas. Os vídeos foram apresentados no início das aulas como forma de acionar os conhecimentos apresentados no texto, chamando a atenção dos alunos para os tópicos principais que seriam abordados durante a exposição dialogada. Cabe destacar que o vídeo "Uma nova astronomia" (D) não foi apresentado em sala de aula. Os alunos receberam uma clara recomendação do professor para assisti-lo durante a semana, visto que ele é a continuação do vídeo "O nascimento da ciência" (C, exibido no início da aula 2).

3.2. Tratamento de dados

Todos as proposições (n = 873) dos MCs (n = 88) foram analisadas, considerando-se as indicações dos MIs feitas pelos alunos. Para isso, utilizamos uma matriz de correlação (Tabela 2) para representar todas as relações possíveis entre os diferentes MIs. Nesse tratamento de dados foram consideradas duas etapas para extrair informações dos MCs:

  • Etapa 1: descrição quantitativa das características dos MCs.

Objetivo: verificar como os alunos utilizaram os conceitos nos MCs, classificando os conceitos de acordo com sua posição na proposição (conceito inicial - CI, ou conceito final - CF) e de acordo com o MI de origem.

  • Etapa 2: descrição quantitativa das relações entre os MIs utilizados na disciplina. Objetivo: verificar a frequência das proposições com relações estabelecidas entre os conceitos oriundos do mesmo MI (diagonal na Tabela 2) comparados com as relações entre conceitos oriundos de diferentes MIs (campos não diagonais na Tabela 2).

A análise dos MIs envolveu 88 matrizes de correlação, elaboradas a fim de extrair informações para as etapas de análise de dados. A diagonal dessa matriz indica a integração entre conceitos vinculados a um mesmo MI, enquanto os campos não diagonais indicam a integração entre conceitos com origem em diferentes MIs (materiais A-F) utilizados na disciplina CN.

4. Resultados e discussão

4.1. Descrição quantitativa das características dos MCs

A Fig. 5 apresenta um gráfico de frequência representando os conceitos iniciais (CI) e os conceitos finais (CF) associados a cada MI selecionado pelo professor.


A análise da Fig. 5 revela que os MIs A (10% para ambos), B (11% para ambos) e F (7% para ambos) não apresentaram diferença nos acionamentos entre os CI e CF. Já os materiais C (10% para CI e 9% para CF), D (7% para CI e 6% para CF) e E (5% para CI e 7% para CF) apresentaram diferenças, contudo essas foram muito pequenas (sempre menores do que 2%).

Na Fig. 5 os MIs que apresentaram o maior número de acionamentos foram A, B e C (mais de 60%). Esse fato pode ter sido influenciado pelo tema abordado nos MIs. No caso dos materiais B (22%) e C (19%), a abordagem foi sobre temas relacionados à astronomia dos séculos XVI/XVII, envolvendo a disputa entre os modelos geocêntrico e heliocêntrico como forma de explicar o universo. Esse conteúdo é trabalhado no ensino médio e os MIs B e C podem ter ajudado os alunos a resgatarem esses conhecimentos prévios. Desta forma, a articulação desse conteúdo no MC é mais fácil do que aquele abordado nos MIs E e F, que contemplam o desenvolvimento da astronomia nos séculos XIX/XX. A baixa frequência de acionamentos do material D (13%) pode ser explicada pelo fato desse MI não ter sido apresentado em sala de aula: o professor recomendou aos alunos que assistissem ao vídeo após a aula, e isso pode não ter ocorrido conforme o esperado.

4.2. Descrição quantitativa das relações entre os MIs utilizados na disciplina

As proposições (n = 873) foram analisadas considerando a totalização dos valores obtidos na diagonal das matrizes (n = 212) e nos campos não diagonais (n = 661). A Fig. 6 apresenta um gráfico de frequência representando as proposições que envolveram conceitos de um único MI (barras brancas) e as proposições com conceitos de MIs diferentes (barras pretas).


A análise da Fig. 6 revela que houve diferença pronunciada entre as frequências das proposições que envolvem conceitos com origem no mesmo MI (25%) e as proposições que envolvem conceitos com origem em MIs diferentes (75%). Esses percentuais indicam que os alunos conseguiram estabelecer relações entre conceitos de diferentes MIs indicados pelo professor. A integração conceitual dos MIs não é trivial e exige a compreensão dos temas em maior profundidade para que seja possível relacionar os conceitos que foram apresentados em diferentes aulas e em diferentes formatos (Tabela 1).

As maiores frequências para as proposições que envolviam conceitos do mesmo MI foram observadas para os materiais A (6%) e B (7%), enquanto a menor frequência foi observada para o material D (2%). Destaca-se ainda que porcentagens intermediárias foram verificadas para os materiais C (4%), E (3%) e F (3%). Já para as proposições que envolviam conceitos de diferentes MIs foram observadas maiores frequências para os materiais A (15%), B (15%) e C (14%) e as menores frequências foram para os MIs D (11%), E (9%) e F (11%). Novamente, verifica-se que os conceitos dos MIs relacionados com temas já abordados no ensino médio (A, B e C) são utilizados com mais frequência. Conceitos novos (MIs D, E e F), ainda que discutidos a partir dos conhecimentos prévios dos alunos, são utilizados com uma frequência ligeiramente menor.

A identificação dos MIs nos MCs pode ser o ponto de partida para avaliar a aprendizagem dos alunos, bem como o planejamento de ensino do professor. Por essa razão, o desenvolvimento de uma estratégia que permite verificar a origem dos MIs a partir dos MCs elaborados pelos alunos é uma contribuição que expande o uso atual dessa técnica em sala de aula. Ao usar essa proposta, o professor obtém mais informações a partir dos MCs elaborados pelos alunos e pode avaliar de forma mais completa o processo de ensino-aprendizagem.

4.3. Exemplos de MC elaborados pelos alunos

A Fig. 7 apresenta os dois padrões de MCs que foram identificados após a análise dos resultados: um MC com baixa integração entre os MIs (Fig. 7a) e outro com alta integração entre os MIs (Fig. 7b).


O MC da Fig. 7a apresentou integração apenas entre os MIs A e B, que se referem a conteúdos abordados no ensino médio Consequentemente, as proposições contemplaram apenas quatro combinações entre os diferentes materiais utilizados na disciplina CN (A/A, B/B, A/B e B/A). Os seguintes exemplos de proposições mostram como os conceitos com origem em A e B foram combinados na rede desse MC:

1. hipóteses (A) - passaram por → experimentação (A);

2. mais tecnologia (B) - investiga o → sistema solar (B);

3. mais tecnologia (B) - gera → mais ciência (A);

4. mais ciência (A) - gera → mais tecnologia (B).

Os conceitos do MC da Fig. 7a apresentam pouca articulação entre os MIs selecionados pelo professor. Portanto, a ausência de relações entre os demais MIs (C, D, E e F) pode indicar uma compreensão mais superficial do tema astronomia, sobretudo pela ausência de conceitos relacionados com os avanços da astronomia no século XIX/XX. Esse é um indicador importante para que o professor acompanhe esse estudante de forma mais próxima, a fim de mantê-lo comprometido com a aprendizagem significativa ao longo das aulas.

O MC da Fig. 7b apresenta alta integração entre os diferentes MIs utilizados durante a disciplina CN. As proposições apresentaram várias combinações entre os diferentes materiais. Os seguintes exemplos de proposições mostram como os conceitos com origem nos diferentes MIs foram combinados na rede do MC:

1. ciência (A) - modifica-se a cada → época (D);

2. mais tecnologia (C) - beneficia a → ciência (A);

3. mais tecnologia (C) - proporcionou a invenção do → telescópio (D);

4. dados astronômicos (D) - explicam o → universo (E).

No caso da Fig. 7b, a variedade de relações entre os diferentes MIs permite verificar a habilidade do aluno para relacionar os diferentes abordagens do tema astronomia durante a disciplina. Destaca-se também que o aluno vinculou conceitos ao MI D, que representa o vídeo não exibido em sala de aula. Nesse contexto, é importante ressaltar que o acompanhamento do aluno que elaborou esse MC deve ser diferente do aluno que produziu o MC da Fig. 7a.

Em ambos os casos, a identificação de como os alunos articulam os diferentes MIs é rápida, verificando apenas o campo circular representado ao lado dos conceitos do MC. O uso dessa estratégia pode ajudar o professor a avaliar o efeito dos MIs utilizados na disciplina, a fim de atingir os objetivos pedagógicos pretendidos para a disciplina. Vale destacar que essa análise da relação entre os MIs não exclui a necessidade do professor ler e corrigir os erros conceituais expressos nas proposições elaboradas pelos alunos. Pelo contrário, a nossa proposta se soma aos procedimentos já tradicionais de leitura e avaliação dos MCs para fins de avaliação da aprendizagem.

5. Considerações finais

O uso do mapeamento conceitual em sala de aula tem despertado o interesse de um número crescente de professores e alunos. Há, porém, muito a fazer para que todo o potencial dos MCs seja verificado nas salas de aula e no âmbito do ensino à distância. Pequenas inovações, como o uso de um campo circular para a identificação de MIs, podem expandir de forma surpreendente algumas das práticas mais comuns que os professores já adotam. No caso desse trabalho, os MCs produzidos pelos alunos foram avaliados através da leitura das proposições que eles elaboraram, a fim de identificar erros conceituais. Além disso, o efeito do ensino sobre a aprendizagem pode ser estimado ao se verificar como os alunos acionaram os diversos MIs oferecidos para estudo. A combinação dessas análises permitiu verificar que havia alunos que valorizaram os conteúdos já abordados no ensino médio (astronomia dos séculos XVI/XVII), relacionando somente conceitos provenientes dos MIs A, B e C. Outros alunos ousaram na elaboração dos MCs e incluíram conceitos referentes a temas menos comuns no ensino médio (materiais D, E e F). Os comentários feitos pelo professor foram específicos e direcionados a esses grupos de alunos, de acordo com as suas necessidades específicas de aprendizagem. Isso não teria acontecido se as informações sobre a articulação dos MIs não estivessem disponíveis no momento de correção dos MCs.

O professor ganhou a chance de avaliar o impacto dos MIs que foram selecionados durante a etapa de planejamento de ensino. A integração dos MIs que abordavam a astronomia dos séculos XVI/XVII (A, B e C) e dos séculos XIX/XX (D, E e F) era um objetivo de aprendizagem que só se verificou em alguns casos. Os MIs na forma de vídeo (C, D e F) funcionaram bem, excetuando-se aquele que deveria ser assistido como atividade extraclasse (D). Nenhuma dessas observações teria sido feita caso os MCs tivessem sido utilizados na sua forma convencional. Isso reforça o valor da inclusão dos campos circulares para que os alunos vinculem os conceitos aos MIs de estudo indicados pelo professor. Por esse motivo, a proposta desse trabalho merece ser avaliada em outros contextos educacionais, considerando-se diferentes níveis de ensino e outros temas relacionados ao ensino de física.

Agradecimentos

Os autores agradecem à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), processo nº 2012/22693-5 e ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), processo nº 486194/2011-6, por financiarem nossas pesquisas.

Recebido em 17/12/2012

Aceito em 12/3/2013

Publicado em 26/9/2013

Copyright by the Sociedade Brasileira de Física. Printed in Brazil.

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    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      31 Out 2013
    • Data do Fascículo
      Set 2013

    Histórico

    • Recebido
      17 Dez 2012
    • Aceito
      12 Mar 2013
    Sociedade Brasileira de Física Caixa Postal 66328, 05389-970 São Paulo SP - Brazil - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: marcio@sbfisica.org.br