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Crenças e valores sobre a escrita em manuais escolares de língua materna para o ensino médio

Resumo

Based on new studies of literacy (Barton, Hamilton, Kleiman, Rojo,Signorini, Sreeet), this paper was designed to provide the discussion of the set of values and beliefs about writing identified in three secondary school textbooks for mother-tongue Portuguese. In the first part of the article, we comment briefly on the relations between school literacy, the culture of writing and textbooks. After that, we analyze six chapters of the textbooks which are concerned with writing, the history of writing, or the relation between writing and the spoken language. The analysis suggests the existence of a set of beliefs which may help understand writing practices within school literacy. On the one hand, we have observed that students in secondary schools are commonly treated as non-writers and/or non-readers. This attitude serves not only as a model of autonomous literacy (Street, 1984), but also as a model of society. On the other hand, the textbooks are themselves in conflict in relation to values and beliefs about writing, such as what good writing is and the kind of writing that should be taught in the secondary school. Considering these issues, our research suggests that understanding (des)established values and beliefs about writing has become a crucial aspect of the teaching and learning process, at least insofar as inculcating patterns of behavior and values actually reproduces and consolidates the social order.

Values and beliefs; teaching writing; Portuguese as a mother tongue


Values and beliefs; teaching writing; Portuguese as a mother tongue

ARTIGOS

Crenças e valores sobre a escrita em manuais escolares de língua materna para o ensino médio* * Este trabalho está inserido no âmbito do Projeto Integrado "Práticas de escrita e de reflexão sobre a escrita em contextos de ensino" (CNPq- Nº 520427/2002-5).

Clécio Bunzen

Mestrando em Lingüística Aplicada - UNICAMP

ABSTRACT

Based on new studies of literacy (Barton, Hamilton, Kleiman, Rojo,Signorini, Sreeet), this paper was designed to provide the discussion of the set of values and beliefs about writing identified in three secondary school textbooks for mother-tongue Portuguese. In the first part of the article, we comment briefly on the relations between school literacy, the culture of writing and textbooks. After that, we analyze six chapters of the textbooks which are concerned with writing, the history of writing, or the relation between writing and the spoken language. The analysis suggests the existence of a set of beliefs which may help understand writing practices within school literacy. On the one hand, we have observed that students in secondary schools are commonly treated as non-writers and/or non-readers. This attitude serves not only as a model of autonomous literacy (Street, 1984), but also as a model of society. On the other hand, the textbooks are themselves in conflict in relation to values and beliefs about writing, such as what good writing is and the kind of writing that should be taught in the secondary school. Considering these issues, our research suggests that understanding (des)established values and beliefs about writing has become a crucial aspect of the teaching and learning process, at least insofar as inculcating patterns of behavior and values actually reproduces and consolidates the social order.

Keywords: Values and beliefs, teaching writing, Portuguese as a mother tongue

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  • *
    Este trabalho está inserido no âmbito do Projeto Integrado "Práticas de escrita e de reflexão sobre a escrita em contextos de ensino" (CNPq- Nº 520427/2002-5).
  • letramento

    1 Estamos concebendo , neste trabalho, como as inúmeras práticas sociais que integram direta ou indiretamente a produção e/ou leitura de materiais escritos e que integram a dinâmica da vida cotidiana de uma dada comunidade (cf. Barton e Hamilton, 1998). É nesta direção que podemos falar também de
    letramento escolar e não mais tratar essa relação como dois pólos opostos: letramento x escolarização. Para Rojo (2001:70), "escola é letramento e dele decorre, quer suas práticas sejam orais ou escritas; quer haja ou não texto escrito sendo utilizado na sala de aula. Logo, só é admitida a forma composicional adjetiva: 'letramento escolar' ". Para um aprofundamento da questão ver Kleiman (1995).
  • 2
    Um outro aspecto que está sendo analisado, ainda no âmbito desse projeto integrado, é como os manuais mobilizam saberes específicos sobre o ensino de língua escrita (cf. Bunzen e Torres, 003).
  • 3
    Rojo (1995:66) demostra que uma das crenças em relação à escrita é justamente considerá-la como "um artefato contraposto à naturalidade da fala". Ver a escrita com algo não natural implica necessariamente aprendê-la em contextos especializados, no caso a escola, através de técnicas específicas planejadas artificialmente, como sugere a autora.
  • 4
    Essa visão talvez seja fruto da visão de que a escrita é o órgão do progresso social. Segundo Olson (1997:21), "admite-se de modo geral que foi a difusão da leitura e da escrita que criou as instituições racionais e democráticas da sociedade, assim como o desenvolvimento industrial e o crescimento econômico; e que um declínio nos graus de alfabetização representa uma ameaça para qualquer sociedade progressista e democrática".
  • retextualização

    5 Estamos utilizando o termo , neste artigo, para o processo de alteração e edição por que passam os textos publicados em outros veículos (jornais, livros, revistas) e que passam a compor o livro didático. Uma entrevista impressa, por exemplo, ao ser retextualizada para fins didáticos pode sofrer diversas alterações: mudança de título, de diagramação; cortes de fragmentos, de imagens, etc. É justamente esse processo de retextualização que ocasiona a mudança do gênero: a entrevista com as diversas alterações passa agora a fazer parte do gênero livro didático.
  • 6
    Assim como as práticas de letramento se constituem historicamente, as concepções de leitura e de escrita acompanham as mudanças que ocorrem nas sociedades de forma geral. Neste sentido, algumas instituições tem (ou tiveram) o "poder" de ser a controladora dos tipos de leitura: a escola ou a igreja, por exemplo. E desta perspectiva que podemos dizer com Guedes-Pinto (2002:199) que existem "leituras não autorizadas", ou seja, leituras consideradas "ruins ou de baixa qualidade em relação a uma suposta leitura erudita ou de melhor qualidade, segundo a classificação da escola, alicerçada pela teoria literária". Ver também Kleiman (2001).
  • 7
    Uma pesquisa, realizada por Lima (2003), com professores universitários de uma universidade particular do Curso de Letras mostra também enunciados semelhantes aos encontrados nos livros didáticos: i) "escrever é você colocar numa folha de papel suas idéias, os seus conceitos, o seu pensamento, enfim que tenha sentido" ou ii) "escrita é a materialização da linguagem. Quando eu quero colocar no papel meu pensamento. Manifestação concreta e visual do pensamento.
  • 8
    O fragmento foi retirado do livro "A magia da mudança: vestibular Unicamp - língua e literatura" de Regina H. de Almeida Durigan et al, publicado em 197, pela Editora da Unicamp.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      16 Abr 2014
    • Data do Fascículo
      Jun 2004
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