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A Polícia Federal no processo de transição: o desafio da Justiça de Transição e da superação dos valores autoritários, analisados a partir da gestão do delegado Romeu Tuma

The Federal Police in the transition process: the challenge to Transitional Justice and of the overcoming of authoritarian values, analyzed from the management of delegate Romeu Tuma

Resumo:

Este artigo tem como principal objetivo realizar uma leitura do processo de transição brasileira para a democracia a partir da análise da trajetória profissional do ex-delegado da Polícia Civil de São Paulo, Romeu Tuma, e demonstrar a dificuldade que houve naquele momento em promover profundas mudanças institucionais nos órgãos de repressão, a partir do exemplo específico da Polícia Federal. Este debate será realizado à luz de dois conjuntos teóricos que se interconectam: um debate sobre a Justiça de Transição e um debate neoinstitucionalista que considera a especificidade das regras do jogo sobre a reformulação de instituições vinculadas aos setores de segurança e defesa nacional.

Palavras-chave:
Polícia Federal; Transição Democrática; Romeu Tuma (1931-2010)

Abstract:

This article has as main objective to read the Brazilian transition to democracy based on the analysis of the professional trajectory of the ex-delegate of the Civil Police of São Paulo, Romeu Tuma, and to demonstrate the difficulty that there was at that moment in promoting profound institutional changes in law enforcement agencies, based on the specific ­example of the Federal Police. This debate will be held in the light of two interconnected theoretical sets: a debate on ­Transitional Justice and a neoinstitutionalist debate that considers the specificity of the rules of the game on the reformulation of institutions linked to the sectors of national security and defense.

Keywords:
Federal Police; Democratic Transition; Romeu­Tuma (1931-2010)

Introdução

Neste artigo faremos uma leitura da primeira fase da construção da Justiça de Transição no Brasil, procurando demonstrar as especificidades e os desafios para a desarticulação de um órgão do setor de segurança no referido contexto: a Polícia Federal. A leitura sobre a instituição e os desafios impostos à sua reformulação será realizada a partir da análise da trajetória profissional do delegado Romeu Tuma (1931-2010), que mesmo não sendo um integrante dos seus quadros, assumiu em 1983 a responsabilidade pela Superintendência Regional da Polícia Federal de São Paulo (SR/DPF/SP), estado responsável pelas mais trágicas histórias de violação de direitos humanos do país, considerando a estrutura repressiva Dops/Oban/Doi-Codi. Tuma seria posteriormente promovido a diretor-geral do Departamento de Polícia Federal (DG/DPF), durante o primeiro governo civil conduzido pelo presidente José Sarney, onde sobreviveu à elaboração da Constituição de 1988 e à “fritada” que Collor deu nos militares em sua gestão, permanecendo como seu diretor entre 1986 e 1992.

No artigo “Memória histórica, Justiça de Transição e democracia sem fim”, Marcelo Torelly e Paulo Abrão destacam quatro dimensões políticas da Justiça de Transição: 1) reparação das vítimas; 2) fornecimento da verdade e da construção da memória; 3) regularização das funções da Justiça; e 4) a reforma das instituições perpetradoras de violações contra os direitos humanos (Torelly, Abrão, 2010SOUZA, Percival. Autópsia do medo. Vida e morte do delegado Sérgio Paranhos Fleury. Rio de Janeiro: Editora Globo, 2000., p. 26). Os autores demonstram como a ausência de estudos aprofundados em relação à Justiça de Transição no país criou a falácia de que no Brasil foi priorizada apenas a função de reparar vítimas e familiares, direcionada a um repositório de informações de natureza trabalhista. Torelly e Abrão concordam que por muito tempo a questão da justiça transicional ficou restrita à reparação, à localização dos restos mortais e ao esclarecimento das circunstâncias dos assassinatos. No entanto, destacam que, no cumprimento da função de reparação, os aspectos trabalhistas tiveram uma função positiva, na medida em que foram uma condição sine qua non para iniciar o processo de implementação da Justiça de Transição, cujas medidas teriam alcançado patamares bem mais sofisticados do que a reparação. Assim, ainda que inicialmente o processo de reparação não tenha permitido construir uma ampla conscientização social sobre os efeitos repressivos implementados pelo Estado, foi fundamental para aprofundar a realização de parte dessa Justiça. Dessa forma elaborado, percebemos que, para os autores, o conceito de Justiça de Transição abarca um espectro contínuo, e o seu aperfeiçoamento ou retrocesso é diretamente proporcional ao desenvolvimento político-cultural da sociedade na qual se desencadeia (Torelly, Abrão, 2010SOUZA, Percival. Autópsia do medo. Vida e morte do delegado Sérgio Paranhos Fleury. Rio de Janeiro: Editora Globo, 2000., p. 29-31).

Compartilhando a perspectiva de que o processo opera em modo contínuo, Fernanda Silva (2015)SILVA, Fernanda Raquel Abreu. Anistia, reparação e políticas de memória: breve análise do processo transicional brasileiro.Contemporânea(Rio de Janeiro). v. 1, n.7, p. 1-31, 2016. Disponível em: Disponível em: http://www.historia.uff.br/nec/sites/default/files/9_anistia_reparacao_e_politicas_de_memoria-_breve_analise_do_processo_transicional_brasileiro.pdf . Acesso em:14 jan. 2019.
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estabelece um tipo de correlação temporal da divisão das fases da justiça transicional, com o recorte cronológico atribuído ao processo de anistia no país e o divide em três fases: 1979 a 1988, 1988 a 2011, e 2011 em andamento, no caso, 20151 1 É preciso considerar que a agenda que guiava os debates sobre a transição durante a última gestão do governo da presidente Dilma Roussef em nada se aproxima da atual política que visa desmobilizar os trabalhos relacionados à Justiça de Transição e desqualificar todo o debate em torno da ditadura. (Silva, 2015SILVA, Fernanda Raquel Abreu. Anistia, reparação e políticas de memória: breve análise do processo transicional brasileiro.Contemporânea(Rio de Janeiro). v. 1, n.7, p. 1-31, 2016. Disponível em: Disponível em: http://www.historia.uff.br/nec/sites/default/files/9_anistia_reparacao_e_politicas_de_memoria-_breve_analise_do_processo_transicional_brasileiro.pdf . Acesso em:14 jan. 2019.
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, p. 2). A primeira fase tem início em 1979 com a Lei de Anistia, a Lei 6.683/79 (Brasil, 1979BRASIL. Lei 6.683, de 28 de agosto de 1979. Concede anistia e dá outras providências. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Poder Executivo, Brasília, DF, 1979. Disponível em: Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L6683.htm . Acesso em: 8 maio 2020.
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). Houve no Brasil, no fim da década de 1970, uma grande demanda da sociedade civil pela elaboração de uma lei de anistia, considerando, sobretudo, a necessidade de libertação dos presos políticos. A capacidade do Estado de controlar o ritmo da transição, implementando uma abertura “lenta, gradual e segura” impôs a qualidade da legislação a ser aplicada. A lei viabilizou a libertação dos presos políticos ao mesmo tempo que preservou os agentes da repressão, impedindo uma apuração e responsabilização do aparato estatal na violação aos direitos humanos. Esta legislação foi intencionalmente interpretada de forma equivocada, conferindo uma concepção de que o Estado, o verdadeiro violador, era quem perdoava aqueles que lutaram contra o regime e a ele resistiram. Não obstante - daí sua importância enquanto marco cronológico - a lei de anistia permitiu o retorno dos exilados e a saída da clandestinidade de vários perseguidos políticos. Para a autora, a segunda fase tem início com a homologação da Constituição, em 1988. O artigo 8º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias estabeleceu novos parâmetros legais relacionados à anistia, obrigando o Estado a reparar financeiramente vítimas e familiares das vítimas do sistema repressivo. Outro fator que marcaria esta fase seria o início da desarticulação de estruturas institucionais político-repressivas (a exemplo do Serviço Nacional de Informações - SNI), bem como a criação de mecanismos de participação civil na busca pela Justiça de Transição. O marco fundamental para o início da terceira fase seria a Criação da Comissão Nacional da Verdade (Brasil, 2011aCOMISSÃO DA ANISTIA. Desaparecidos políticos: um capítulo não encerrado da história brasileira. São Paulo, 2012. Disponível em:Disponível em:http://www.dhnet.org.br/verdade/resistencia/a_pdf/livro_sdh_habeas_corpus.pdf . Acesso em: 14 jan. 2019.
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), e a aprovação da nova Lei de Acesso à Informação (Brasil, 2011bBRASIL. Lei 12.527, de 18 de novembro de 2011. Regula o acesso a informações previsto no inciso XXXIII do art. 5º, no inciso II do § 3º do art. 37 e no § 2º do art. 216 da Constituição Federal; altera a Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990; revoga a Lei nº 11.111, de 5 de maio de 2005, e dispositivos da Lei nº 8.159, de 8 de janeiro de 1991; e dá outras providências. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Poder Executivo, Brasília, DF , 2011b. Disponível em: Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12527.htm . Acesso em: 8 maio 2020..
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), ensejando a presença de novos atores e movimentos sociais na agenda da transição. A consolidação deste processo teria produzido uma virada hermenêutica, despertando o anseio por esclarecimentos relativos às violações, agora considerando os aspectos do direito à verdade e à memória (Silva, 2015SILVA, Fernanda Raquel Abreu. Anistia, reparação e políticas de memória: breve análise do processo transicional brasileiro.Contemporânea(Rio de Janeiro). v. 1, n.7, p. 1-31, 2016. Disponível em: Disponível em: http://www.historia.uff.br/nec/sites/default/files/9_anistia_reparacao_e_politicas_de_memoria-_breve_analise_do_processo_transicional_brasileiro.pdf . Acesso em:14 jan. 2019.
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, p.2).

Como visto, tanto Torrely e Abrão quanto Silva compartilham uma concepção comum de Justiça de Transição enquanto um processo que possui características específicas para cada fase, mas que opera em um modo contínuo de produção, a pauta de reivindicações se altera e novos valores vêm sendo continuamente agregados, respondendo às características específicas de cada sociedade.

Considerando que a Justiça de Transição abarca respostas concretas ao legado de violência produzido por regimes autoritários, Esteban Cuya atribui uma grande responsabilidade ao Estado neste processo e argumenta que as questões básicas colocadas ao fim de um período autoritário giram em torno do atendimento das demandas das vítimas da violência estatal e o que fazer com os agentes. Cuya aponta quatro desafios básicos para a Justiça de Transição: a) a busca irrestrita da verdade; b) a aplicação da Justiça contra os responsáveis pelas violações aos direitos; c) a colocação em prática de medidas de reparação material e moral; d) a aplicação de reformas institucionais dentro das estruturas do Estado para transformá-lo em um órgão democrático dentro de um Estado de direito (Cuya, 2011CUYA, Esteban. Justiça de transição. Acervo(Rio de Janeiro). v. 24, n.1. p. 37-78, jan./jun. 2011. Disponível em:Disponível em:https://www.brapci.inf.br/index.php/res/download/54059 . Acesso em:8 maio 2020.
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, p. 40).

De forma objetiva, neste artigo trabalharemos com a quarta dimensão política da Justiça de Transição estabelecida por Torelly e Abrão, que aborda a reforma das instituições perpetradoras de violações contra os direitos humanos, com a primeira e segunda fase do processo de anistia definidas por Fernanda Silva, relativas à isenção de responsabilidades atribuídas aos violadores do Estado por meio da Lei de Anistia e ao processo de desarticulação dos órgãos de repressão, e, por fim, com o quarto desafio básico estabelecido por Cuya: a aplicação das reformas institucionais dentro das estruturas do Estado.

Este debate será considerado por meio da análise institucional da Polícia Federal e da trajetória de Romeu Tuma, delegado que a dirigiu durantes longos sete anos, justamente a partir do primeiro governo civil. Também procuraremos destacar que existem outros desafios que são impostos no processo de reformulação das instituições vinculadas aos setores de segurança, independente de um processo de transição democrática.

A cientista política Amy Zegart define um conjunto de premissas neoinstitucionalistas relativas às regras do jogo envolvendo a racionalidade e a natureza dos atores no processo de construção de instituições na democracia e define que há uma lógica distinta, própria à criação e reorganização dos órgãos vinculados às áreas de segurança e defesa, destacando quatro variáveis (Zegart, 1999ZEGART, Amy. Flawed by Design. The Evolution of the CIA, JCS and NSC. Stanford: Stanford University Press, 1999). Primeiro, a questão da densidade do ambiente formado pelos grupos de interesse. Quais atores políticos, econômicos e sociais têm interesse em intervir na agenda de criação destes órgãos? O segundo está relacionado ao acesso à informação. Como e em que medida há disponibilidade de informações sobre o desenvolvimento das suas atividades? Terceiro, busca analisar quem realmente tem autoridade para desenhá-los institucionalmente e estabelecer suas diretrizes. Por fim, busca compreender quais são os limites de atuação de cada instituição e como os demais órgãos vinculados ao setor de segurança e defesa interagem entre si.

Para a autora, nestas áreas a política tem um caráter menos distributivo, e os grupos de interesse na sociedade são mais recentes e relativamente mais fracos. Em relação ao acesso à informação, dados sobre as agências governamentais relacionadas à segurança e defesa e suas atividades são muito menos disseminados, tanto em função da sensibilidade do tipo de atividade de informação produzida, quanto dos pesados requisitos de segurança. Trata-se de um setor nebuloso no que diz respeito às suas práticas e produtos. Por fim, justamente em função da dificuldade de se estabelecer limites conceituais claros sobre cada atividade e seus limites jurisdicionais, há uma interdependência entre as burocracias vinculadas ao setor: Forças Armadas, chancelaria, órgãos de inteligência etc. Considerando estes quatro fatores Zegart conclui que não há nenhum tipo de incentivo à participação do Poder Legislativo no desenho e controle destes órgãos e propõe uma tese crucial para o nosso estudo sobre a Polícia Federal no processo de transição para a democracia nos anos de 1980: as burocracias da área de segurança tendem a ser criadas ou reformadas por iniciativas do Poder Executivo (com um papel secundário e sempre relutante do Legislativo), as escolhas sobre o desenho organizacional e as regras iniciais estabelecidas refletem o ordenamento institucional e as disputas entre setores da burocracia e o Poder Executivo, com o Congresso exercendo um tipo de supervisão pouco sistemático e efetivo. Este conjunto de fatores tem como resultado um alto curso de reversão, que acaba por fazer com que os desenhos iniciais tenham impacto no longo prazo (Zegart, 1999ZEGART, Amy. Flawed by Design. The Evolution of the CIA, JCS and NSC. Stanford: Stanford University Press, 1999).

A Polícia Federal

O Departamento de Polícia Federal foi criado em 1967 (Brasil, 1967BRASIL. Decreto-Lei 200, de 25 de fevereiro de 1967. Dispõe sôbre a organização da Administração Federal, estabelece diretrizes para a Reforma Administrativa e dá outras providências. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Poder Executivo, Brasília, DF, 1967. Disponível em: Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del0200.htm . Acesso em 8 maio 2020.
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). Grosso modo, esse ano marca o fortalecimento da ala radical do regime, vinculada ao general Costa e Silva, em detrimento do poder dos militares alinhados ao general Castelo Branco (Fico, 2001FICO, Carlos. Como eles agiam: Os subterrâneos da ditadura. Rio de Janeiro: Record, 2001., p. 120). Também nesse ano a Polícia Federal se torna uma polícia constitucionalizada, ação que configura mais um dos mecanismos utilizados pela ditadura para institucionalizar o seu poder repressivo. Até a data de 1967 o órgão era denominado Departamento Federal de Segurança Pública (DFSP), herdeiro jurídico da ditadura Vargas. Jurídico porque, com a criação de Brasília e o deslocamento de vários órgãos do Rio de Janeiro, o DFSP não teve como recompor sua estrutura, não houve o que podemos chamar de uma solução de continuidade, e entre 1960 e 1964 o órgão teve suas funções limitadas à de uma polícia metropolitana, com atuação restrita a Brasília. Foi em 1964 que a instituição começou a viver a sua grande guinada.

No momento do golpe, em abril de 1964, o discurso sobre o combate ao inimigo interno estava extremamente radicalizado. Para atender ao desafio de desarticular a oposição, uma polícia estruturada nacionalmente poderia trazer mais eficiência à tarefa de perseguição política (Reznik, 2004REZNIK, Luiz. Democracia e segurança nacional. A Polícia Política no pós-guerra. Rio de Janeiro: Editora FGV , 2004., p. 179). A estruturação desta nova polícia e a criação de uma polícia federal foi uma das responsabilidades do coronel Amerino Raposo. Ao mesmo tempo que atuava na organização estrutural do que viria a ser o DPF, ou simplesmente Polícia Federal (PF), Raposo também atuou na implementação do SNI, imediatamente após o golpe. Segundo o coronel, o órgão existente no momento do golpe era uma “polícia local, sem finalidade abrangente, sem organização adequada: polícia federal [...] que não era nem federal, nem de segurança pública. Apenas instrumento orgânico para o DF, sem um centro de gravidade” (Raposo, 2007RAPOSO, Amerino. Estudos estratégicos: nível estratégico. Rio de Janeiro: Editora Cebres, 2007., p. 85). Dessa forma, a criação de uma polícia efetivamente federal e de um órgão de informações constituiria, naquele momento, a criação dos dois grandes pilares da repressão e de poder do governo militar que ora se iniciava, o SNI e o DPF. Apesar de nomeadamente civis, os dois órgãos sempre foram conduzidos por militares, evidenciando tratar os seus interesses apenas de uma ramificação dos interesses das Forças Armadas. Na realidade, a reformulação do DFSP, em 1964, instrumentalizaria os militares, constituindo-se em um cartório civil que lhes permitiria apurar e punir, através dos inquéritos policiais, as atividades da oposição. O DPF funcionaria como o órgão judiciário civil do Poder Executivo junto ao sistema repressivo federal, e o SNI o órgão que produziria, disseminaria e controlaria um grande fluxo de informações nos vários níveis da estrutura administrativa do país, permitindo ao governo federal o exercício de um controle social nunca antes visto no país.

O DPF

Na lógica de recrudescimento e aprofundamento institucional da ditadura na segunda metade da década de 1960, o ainda DFSP teve seus poderes ampliados por meio do Decreto-Lei n. 200, de 25 de fevereiro de 1967, que reorganizou toda a estrutura burocrática do governo federal e passou a ser denominado Departamento de Polícia Federal (DPF). A partir daquele ano também foram ampliados os poderes das Forças Armadas, sobretudo por meio do fortalecimento dos órgãos de informações militares. O argumento utilizado pelas Forças Armadas para explicar a edição do AI-5 e a expansão do poder repressivo é de que eles seriam uma resposta à radicalização dos movimentos de oposição, diante do início dos sequestros realizados por setores de esquerda, utilizados para negociar a libertação de presos políticos. Apesar de o uso da tortura já ser moeda corrente durante toda a ditadura, ela foi amplamente utilizada a partir desse período, sendo aplicada de forma ainda mais sistemática e institucionalizada.

A ampliação da atuação do DPF dentro do sistema repressivo ganhou novos contornos em 1969, quando foi criado o Centro de Informações da Polícia Federal (CI/DPF), responsável pelo contato rotineiro com os outros órgãos de repressão que posteriormente comporiam o Sistema de Segurança Interno, criado no começo dos anos 1970. Este sistema foi estabelecido por meio de diretrizes secretas, formuladas pelo Conselho de Segurança Nacional, e foi responsável pela criação dos Doi-Codi´s, órgãos militares responsáveis pela repressão (Antunes, 2002ANTUNES, Priscila. SNI e Abin. Uma leitura da atuação dos serviços secretos brasileiros ao longo do século XX. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2002., p. 70). Para a instrução de inquéritos encaminhados, os DOIs se articulavam com as Delegacias de Ordem Político-Social (Dops), e com as delegacias do DPF. Nestas delegacias os presos, que muitas vezes já haviam sido submetidos a interrogatórios em condição de extrema violência, passavam por uma formalização de sua prisão, onde eram legalmente indiciados. A PF já possuía sua própria delegacia de Ordem Político-Social, muitas vezes confundida com os seus equivalentes estatais, entretanto cabia ao CI funcionar como o elo oficial da polícia na interação com os outros órgãos de repressão do sistema, além de controlar e reprimir os opositores do governo (Simões, 2018SIMÕES, Gustavo. Política externa e geo-política no governo Castelo Branco. Anpuh- XXVSimpósio Nacional de História, Fortaleza, 2009., p. 183). A PF ainda foi parte ativa no mecanismo regional de repressão aos exilados dos países afiliados à Operação Condor, campanha conjunta realizada pelas ditaduras do Cone Sul (Rodrigues, 2018RODRIGUES, Samir Alves. A institucionalização dos sistemas repressivos no Cone Sul na Operação Condor. Monografia (Bacharelado em Relações Econômicas Internacionais), Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte, 2018.). Em resumo, a Polícia Federal, como ator institucional, teve papel preponderante na produção de informações, especialmente aquelas pertinentes e direcionadas às autoridades de primeiro escalão do regime militar instalado no país em 1964, bem como no emprego da censura, da violência e da repressão no Brasil, conforme podemos identificar no conjunto dos depoimentos coletados pela Comissão Nacional da Verdade (Comissão Nacional da Verdade, 2011COSTA, Sezostrys Alves. Crônica de um ex-soldado do Araguaia. Vermelho (São Paulo). 16 maio 2011. Disponível em: Disponível em: https://vermelho.org.br/2011/05/16/sezostrys-alves-da-costa-cronicas-de-um-ex-soldado-do-araguaia/ . Acesso em: 8 maio 2020.
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).

A transição

No Brasil a capacidade de institucionalização do poder dos militares permitiu que o governo desse as cartas no momento de retirada da Presidência, assegurando-lhes seus interesses e prerrogativas, cujas consequências ainda hoje afetam diretamente a nossa frágil democracia. No sentido de controlar o ritmo de transição e as características da democracia que ora começava a ser delineada, um dos atos mais reconhecidos do governo foi a anistia aprovada pelo presidente João Baptista de Figueiredo em 1979. Uma anistia “ampla, irrestrita e completa”, bandeira que até então vinha sendo carregada pela oposição e que, com a atuação presidencial, atingiu tanto os militantes de esquerda como também assegurou a impunidade aos militares envolvidos na repressão. Mais do que assegurar a impunidade, o controle do governo militar permitiu que ficassem intactas as principais estruturas de sustentação do regime: Ministério do Exército, Ministério da Aeronáutica, Ministério da Marinha, Estado-Maior das Forças Armadas, Serviço Nacional de Informações e Departamento de Polícia Federal. E dentro destas estruturas permaneceram atores relevantes do sistema repressivo que criaram mecanismos de proteção que dificultaram enormemente a construção da Justiça Transicional brasileira. Entre estes autores destacamos o delegado de Polícia Romeu Tuma. Mas quem era e o que fez Romeu Tuma?

O Romeu Tuma

Romeu Tuma (1931-2010) era bacharel em direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), tornando-se posteriormente investigador concursado da Polícia Civil de São Paulo (1951), delegado (1967) e senador da República (1994). Entrou para o Departamento Estadual de Ordem Política e Social (Deops) para trabalhar como assessor do delegado Sérgio Paranhos Fleury e em parceria com Brilhante Ustra, um dos mais temíveis torturadores da recente ditadura. Entre 1977 e 1983, tornou-se diretor-geral do Deops, de onde saiu em 1983 para assumir a SR/DPF/SP, cargo que ocuparia até 1986, quando seria promovido a diretor-geral da Polícia Federal (Romeu Tuma, 2020ROMEU TUMA. In: Dicionário Histórico-Biográfico Brasileiro. Rio de Janeiro: Centro de Pesquisa e Documentação Contemporânea, 2020. Disponível em:Disponível em:http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-biografico/tuma-romeu . Acesso em: 8 maio 2020.
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).

A posse de Tuma como superintendente e a extinção do Deops ocorreu no dia 4 de março de 1983, dez dias antes de Franco Montoro assumir o governado do estado de São Paulo. Como Montoro era uma liderança do partido de oposição aos militares (Partido do Movimento Democrático Brasileiro), a ideia era coordenar a desarticulação do órgão de forma autônoma, de modo a controlar as ações a ele relacionadas. O Deops foi extinto pelo governador José Maria Marin, declarado apoiador dos militares. O argumento era que o presidente Figueiredo vinha alegando que as delegacias/departamentos estaduais de ordem política e social estavam desempenhando funções que não seriam de sua responsabilidade e que o combate aos crimes contra a segurança, apesar de tradicionalmente estarem delegados pela Polícia Federal a estas delegacias, a ela caberia com exclusividade desde a Constituição de 1967. Com este entendimento o Deops seria esvaziado de suas funções, então transferidas para o DPF, e não teria mais razões para continuar em funcionamento. Como modo de garantir a transferência dos seus arquivos para a tutela do governo federal, José Maria Marín determinou, por meio da Resolução 22, de 8 de março de 1983, “que todos os procedimentos policiais referentes à Lei de Segurança Nacional” fossem remetidos ao DPF (Comissão da Anistia, 2012COMISSÃO DA ANISTIA. Desaparecidos políticos: um capítulo não encerrado da história brasileira. São Paulo, 2012. Disponível em:Disponível em:http://www.dhnet.org.br/verdade/resistencia/a_pdf/livro_sdh_habeas_corpus.pdf . Acesso em: 14 jan. 2019.
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, p. 189). Assim, no dia 12 de março, três dias antes da posse do governador da oposição, Marin autorizou, por meio de um “Termo de utilização gratuita de bens móveis”, a transferência dos arquivos do Deops para a Superintendência Regional de São Paulo, da Polícia Federal, órgão que já se encontrava sob a responsabilidade de seu antigo diretor, Romeu Tuma (Comissão da Anistia, 2012COSTA, Sezostrys Alves. Crônica de um ex-soldado do Araguaia. Vermelho (São Paulo). 16 maio 2011. Disponível em: Disponível em: https://vermelho.org.br/2011/05/16/sezostrys-alves-da-costa-cronicas-de-um-ex-soldado-do-araguaia/ . Acesso em: 8 maio 2020.
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, p. 189). Durante a sua gestão, a SR/DPR/SP permaneceu extremamente militarizada e com alto grau de capacidade de intervenção na agenda política da transição, vedando o acesso do novo governo de São Paulo aos arquivos do antigo Departamento. Este acervo foi mantido sob a custódia do DPF até o ano de 1991, quando foi promulgada a Lei 8.159/91 de Acesso a Informação (Brasil, 1991BRASIL. Lei 8.159, de 8 de janeiro de 1991. Dispõe sobre a política nacional de arquivos públicos e privados e dá outras providências. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Poder Executivo, Brasília, DF , 1991. Disponível em:Disponível em:http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8159.htm . Acesso em: 8 maio 2020.
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). Decorreram oito anos até que Romeu Tuma comparecesse à Comissão Parlamentar de Inquérito Perus - Desaparecidos Políticos,2 2 Esta comissão legislativa foi a primeira a investigar crimes da ditadura (1964 e 1985), viabilizada pela atuação da prefeita de São Paulo Luiza Erundina. para disponibilizar os arquivos até então sob sua custódia. Há uma grande probabilidade de que este arquivo tenha sido “arrumado” para esta apresentação, sendo retirados documentos importantes que contribuiriam para o esclarecimento de vários crimes. Existem vários indicativos de que foi tomado muito cuidado para que não ficassem vestígios que incriminassem os torturadores.

Na época, o arcebispo de São Paulo, dom Paulo Evaristo Arns, afirmou ter recebido denúncias de que os arquivos estavam sendo esvaziados, motivando uma vigília de vítimas e familiares de vítimas da ditadura em frente à sede da PF, em São Paulo. À época, alguns familiares como Suzana Lisbôa, constataram que havia arquivos inteiros esvaziados, entre eles o que mantinha a etiqueta “colaboradores” e “Araguaia” (Costa, 2011COSTA, Sezostrys Alves. Crônica de um ex-soldado do Araguaia. Vermelho (São Paulo). 16 maio 2011. Disponível em: Disponível em: https://vermelho.org.br/2011/05/16/sezostrys-alves-da-costa-cronicas-de-um-ex-soldado-do-araguaia/ . Acesso em: 8 maio 2020.
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).

Assim, a ida de Tuma para a SR de São Paulo em 1983 vedou naquele momento o acesso aos arquivos, dificultando o processo de implementação da Justiça de Transição. Esta situação seria posteriormente agravada em função da limpeza por ele produzida no acervo do órgão antes de sua apresentação à Comissão em 1991COMISSÃO DA ANISTIA. Desaparecidos políticos: um capítulo não encerrado da história brasileira. São Paulo, 2012. Disponível em:Disponível em:http://www.dhnet.org.br/verdade/resistencia/a_pdf/livro_sdh_habeas_corpus.pdf . Acesso em: 14 jan. 2019.
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.

Mas não foram apenas os arquivos que foram protegidos sob o manto do governo federal, Tuma também transferiu para a SR/DPF/SP agentes de segurança reconhecidamente vinculados à repressão político-social, a exemplo do delegado Aparecido Laertes Calandra, que usava o codinome de Capitão Ubirajara, e David Araújo, conhecido como Capitão Lisboa, notórios torturadores da Operação Bandeirantes (Oban). Documentos revelados pelo jornal O Globo em 4 de fevereiro de 2014 denunciam a preocupação do governo militar em proteger os agentes considerados colaboradores do regime (Herdy, 2014HERDY, Thiago. Comissão da Verdade convocará agentes estaduais para depor. O Globo(Rio de Janeiro). 4 fev. 2014. Disponível em: Disponível em: https://oglobo.globo.com/brasil/comissao-da-verdade-convocara-agentes-estaduais-para-depor-11495775#ixzz2xZ7TZFyG . Acesso em:14 jan. 2014.
https://oglobo.globo.com/brasil/comissao...
). De acordo com a Informação 0190, produzida pelo Centro de Informações do Exército, em 1 de fevereiro de 1983:

Em consequência da eleição de governadores da oposição em diversos estados da Federação, é de esperar que haja promoção de perseguições de cunho revanchista. Os alvos principais serão os membros da secretaria de segurança, que se notabilizaram por seu engajamento profissional e pessoal, com o ideário da revolução de 1964, que deram origem a antipatias nos círculos políticos que assumirão funções governamentais proximamente. Com isto em vista, o CIE solicitou aos comandos militares das áreas, que indicassem os funcionários estaduais de suas respectivas jurisdições que, abrangidos pelo item 2 acima, seriam os mais visados por uma possível represália oposicionista. “A passagem desses funcionários à administração federal, livrando-os de situação de constrangimento e aflição, seria uma medida de justiça e reconhecimento” (Herdy, 2014HERDY, Thiago. Comissão da Verdade convocará agentes estaduais para depor. O Globo(Rio de Janeiro). 4 fev. 2014. Disponível em: Disponível em: https://oglobo.globo.com/brasil/comissao-da-verdade-convocara-agentes-estaduais-para-depor-11495775#ixzz2xZ7TZFyG . Acesso em:14 jan. 2014.
https://oglobo.globo.com/brasil/comissao...
, s.p.).

O documento do CIE apenas corrobora a veracidade da análise sobre a estratégia implementada pelos militares no ano de 1983 para proteger os reconhecidos violadores de direitos humanos. Tuma tinha uma grande proximidade com nomes muito conhecidos pela repressão, a exemplo do médico Harry Shibata, que instruía os torturadores sobre como não deixar marcas da tortura nos corpos das vítimas (Arquidiocese de São Paulo, 2013ARQUIDIOCESE DE SÃO PAULO. Brasil: Nunca Mais. Petrópolis: Vozes, 2013., p. 233), Shibata assinou os laudos relativos à causa mortis do operário Manuel Fiel Filho e do jornalista Wladimir Herzog, assim como várias requisições de exame do Instituto Médico Legal (IML) solicitadas por Romeu Tuma, nas quais a definição das causas mortis constituía um verdadeiro exercício de criatividade dos agentes de repressão. Em publicação veiculada pela Folha de S. Paulo, do dia 1 de outubro de 2000, o renomado jurista Goffredo da Silva Telles acusava Tuma de conivência com a tortura, ao afirmar que o delegado assinava documentos comprometedores: “Os papéis avalizariam versões policiais de que presos mortos sob tortura haviam se suicidado” (Telles apud Correio do Brasil, 2008CORREIO DO BRASIL. Dops não escapará do juiz espanhol Garzon. Correio do Brasil(Rio de Janeiro). 31 ago. 2008. Disponível em:Disponível em:https://arquivo.correiodobrasil.com.br/dops-nao-escapara-do-juiz-espanhol-garzon/ Acesso em: 8 maio 2020.
https://arquivo.correiodobrasil.com.br/d...
). O relatório da Comissão da Vala de Perus traz um acervo de informações que revela claramente os vários momentos em que Romeu Tuma mentiu em relação às informações solicitadas por familiares de vítimas quanto à localização de pessoas ou corpos, bem como demonstra como o Deops e Romeu Tuma participavam ativamente da dissimulação da tortura e assassinato de presos políticos e da ocultação de seus cadáveres (Desaparecidos políticos, 2012DESAPARECIDOS POLÍTICOS. Um capítulo não encerrado da história brasileira. São Paulo: Ed. do Autor, 2012. Disponível em:Disponível em:http://www.dhnet.org.br/verdade/rn/bibliografia/livro_vala_perus_emmanuel.pdf . Acesso em:8 maio 2020.
http://www.dhnet.org.br/verdade/rn/bibli...
, p. 75-85). Esta dissimulação claramente ocorria em parceria com o delegado Sérgio Fleury, que levou a grande parte da fama pelo exercício da tortura no Deops.

Apesar de sempre negar seu envolvimento com a tortura, o fato é que Tuma esteve à frente de um dos principais órgãos de repressão do país, o qual teria uma íntima relação com o sistema Doi-Codi. Esteve no Deops no período que coincide com uma série de denúncias de torturas e assassinatos. Trabalhou no Departamento juntamente com o delegado Sérgio Paranhos Fleury, por sua vez subordinado ao coronel linha dura Erasmo Dias, então secretário de Segurança Pública. Dias havia sido o responsável por comandar a invasão da PUC-SP, ocorrida no dia 22 de setembro de 1977. Fleury e Tuma estavam presentes nesta ação, e enquanto Erasmo Dias atropelava os estudantes, Tuma reservava para si a triagem dos prisioneiros, devolvendo os inocentes aos seus familiares, produzindo uma relação de gratidão e se transformando no grande herói da situação. O mesmo ocorreu durante a greve dos jornalistas de 1979. Tuma delegou aos seus subordinados a função de prender, fichar e interrogar os presos, “enquanto na outra sala consolava e tranquilizava os parentes dos jornalistas” (Leitão, 1986LEITÃO, Miriam. O caçador de manchetes. Jornal do Brasil (Rio de Janeiro). 6 abr. 1986. Disponível em: Disponível em: https://flitparalisante.wordpress.com/2007/07/09/do-sepultamento-da-nossa-policia-1983/ . Acesso em: 8 maio 2020.
https://flitparalisante.wordpress.com/20...
). Esta sempre foi a estratégia de Tuma para torná-lo mais “palatável” para a sociedade brasileira. Mesmo trabalhando no que se converteu no maior templo de tortura e fonte de assassinatos e desaparecimentos no país, são praticamente inexistentes depoimentos que confirmem a sua participação em interrogatórios. Em nossa pesquisa identificamos apenas uma acusação de que Tuma teria participado de tortura, no caso o interrogatório do economista Norberto Nehring. A acusação foi realizada por sua viúva, a historiadora Maria Lygia Quartim de Moraes, em um depoimento que consta no capítulo “Porque você é tão tristinha”, escrito pela filha do casal e publicado no livro Infâncias roubadas.3 3 Disponível em: https://www.documentosrevelados.com.br/wp-content/uploads/2015/04/infanciaroubada_2aparte.pdf. Lígia narra que, quando foi visitar seu marido na prisão, muitos acusados estavam sendo brutalmente torturados. Disse que o seu marido havia sido interrogado por um policial que já gozava de grande consideração entre os torturadores e que veio a se tornar muito conhecido no país: Romeu Tuma (Nehring, 2014NEHRING, Martha. Porque você é tão tristinha? In: Infância roubada. Crianças atingidas pela Ditadura Militar no Brasil. Assembleia Legislativa, Comissão da Verdade do Estado de São Paulo “Rubens Paiva”. São Paulo: Alesp, 2014. Disponível em:Disponível em:https://www.al.sp.gov.br/repositorio/bibliotecaDigital/20800_arquivo.pdf . Acesso em: 8 maio 2020.
https://www.al.sp.gov.br/repositorio/bib...
, p. 48). Norberto sairia do país após a sua libertação, em abril de 1969, e retornaria em abril de 1970. Não houve informações sobre sua chegada. Apenas no dia 24 de abril teve conhecimento que um caixão teria saído da Oban carregando Norberto, morto sob tortura nas mãos da equipe do delegado Fleury. Tuma assinaria o documento oficial que confirmava a versão do suicídio de Norberto (Nehring, 2014NEHRING, Martha. Porque você é tão tristinha? In: Infância roubada. Crianças atingidas pela Ditadura Militar no Brasil. Assembleia Legislativa, Comissão da Verdade do Estado de São Paulo “Rubens Paiva”. São Paulo: Alesp, 2014. Disponível em:Disponível em:https://www.al.sp.gov.br/repositorio/bibliotecaDigital/20800_arquivo.pdf . Acesso em: 8 maio 2020.
https://www.al.sp.gov.br/repositorio/bib...
, p. 49).

Sobre esta narrativa vale tecer uma consideração. Naquele momento Tuma compunha a equipe de Fleury, ele assumiria a Direção-Geral do Deops apenas em 1977. De acordo como relatório da Comissão Nacional da Verdade, apesar de ser um órgão oficial da polícia paulista, o Deops não tinha uma hierarquia rígida e a atuação do delegado Fleury seria o caso mais emblemático desta situação. Ele trabalhava por conta própria e estava diretamente ligado aos órgãos federais, sobretudo ao Doi-Codi do II Exército (Comissão Nacional da Verdade, 2014COMISÃO NACIONAL DA VERDADE. Relatório Comissão Nacional da Verdade. Brasília. Presidência da República, 2014. v. 1. Disponível em:Disponível em:http://cnv.memoriasreveladas.gov.br/images/pdf/relatorio/volume_1_digital.pdf . Acesso em: 14 jan. 2019.
http://cnv.memoriasreveladas.gov.br/imag...
, p. 168). Tuma sempre foi visto como um bom interlocutor entre o Deops e o Doi-Codi paulista, a ponto de receber vários elogios por parte de um dos mais implacáveis torturadores da ditadura, o coronel Brilhante Ustra, em seu livro A verdade sufocada. Como bem destacou a imprensa na época do lançamento do livro, o coronel Ustra cita, “a propósito, mais vezes o nome de Tuma do que o de seu legendário chefe” (Senhor, 1987SENHOR. A revanche da tortura. Revista Senhor (São Paulo). 17 maio 1987. Disponível em:Disponível em:http://bnmdigital.mpf.mp.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=DOC_BNM&PagFis=9679&Pesq=Romeu%20Tuma . Acesso em:8 maio 2020.
http://bnmdigital.mpf.mp.br/DocReader/Do...
, p. 26).

Apesar de toda a sua proximidade física e ideológica com os torturadores do regime, Tuma afirmava que desconhecia a tortura quando trabalhava lá. Em certa ocasião afirmou que, apesar de já ter sido constatado que houve violência no Deops, ele não sabia: “Nós éramos compartimentados, trabalhávamos fora. Era dentro do prédio, mas isolados no quinto andar” (Magalhães, 2000MAGALHÃES, Mário. Sobrevivente, Tuma chega à reta final. Folha de S. Paulo (São Paulo). 25 set. /2000. Disponível em:Disponível em:https://www1.folha.uol.com.br/fsp/brasil/fc2509200016.htm . Acesso em:14 jan. 2019.
https://www1.folha.uol.com.br/fsp/brasil...
). E realmente Tuma construiu uma trajetória política que o isentou de responsabilidades em termos de violações de direitos humanos. Este discurso foi muitos anos absorvido por parte da historiografia brasileira.

Não obstante, novos depoimentos já deixam claro que este desconhecimento relativo à tortura seria impraticável. De acordo com o jornalista Ivan Seixas, ex-militante do Movimento Revolucionário Tiradentes, era Tuma quem analisava as informações e instruía os interrogatórios. De acordo com o seu depoimento seria impossível não ter conhecimento das torturas, na medida em que elas ocorriam no terceiro andar, onde estava instalado o pau de arara. Segundo o depoente, que havia sido torturado no local, do subsolo se escutavam os gritos que vinham do terceiro andar, pois não havia isolamento acústico na sala (Magalhães, 2000MAGALHÃES, Mário. Sobrevivente, Tuma chega à reta final. Folha de S. Paulo (São Paulo). 25 set. /2000. Disponível em:Disponível em:https://www1.folha.uol.com.br/fsp/brasil/fc2509200016.htm . Acesso em:14 jan. 2019.
https://www1.folha.uol.com.br/fsp/brasil...
).

Destaque damos aqui para a análise da historiadora Beatriz Kushnir. Ela afirma que sem dúvida Tuma esteve ativo na desarticulação dos movimentos de esquerda e no desmantelamento de organizações políticas que atuavam no meio sindical e estudantil do país, o que fez com que ele despontasse como responsável por torturas e assassinatos. Sua estratégia, segundo a autora, era de não estar presente nas partes mais delicadas das operações, que seriam os momentos de prisão e interrogatório, função que ele delegaria para a Oban ou para o II Exército (Kushnir, 2012KUSHNIR, Beatriz. Cães de guarda: jornalistas e censores, do AI-5 à Constituição de 1988. São Paulo: Boitempo 2012., p. 80).

Se são escassas as informações sobre a participação de Tuma nos interrogatórios, abundantes são as acusações de que teria sido conivente com o sumiço dos corpos, fosse no próprio Deops, fosse, para nossa surpresa, na Guerrilha do Araguaia. As Comissões Estaduais da Verdade (Pará, Amapá, Tocantins), bem como o Grupo de Trabalho do Araguaia receberam vários depoimentos que informavam sobre a presença de Tuma na região da guerrilha. O livro Habeas corpus: que se apresente o corpo, a busca pelos desaparecidos políticos no Brasil faz menção ao nome de Romeu Tuma em diversas atividades relacionadas à repressão, com destaque para a Operação Limpeza, realizada com o objetivo de recuperar os corpos e destruir quaisquer indícios de sua materialidade. Segundo relatos coletados junto aos moradores da região, existe a menção de que o conhecido delegado Tuma teria comandado uma equipe deslocada para o Araguaia para promover a remoção de cadáveres usando o nome de Delegado Silva (Secretaria de Direitos Humanos, 2010SECRETARIA DE DIREITOS HUMANOS. Habeas corpus. Que se apresente o corpo. A busca dos desaparecidos políticos no Brasil. Brasília, 2010. Disponível em: Disponível em: http://www.dhnet.org.br/verdade/resistencia/a_pdf/livro_sdh_habeas_corpus.pdf . Acesso em:14 jan. 2019.
http://www.dhnet.org.br/verdade/resisten...
, p. 202). Em depoimento ao antigo Grupo e Trabalho do Tocantins, atual GTA,Valdim Pereira de Souza, militar membro do 52o Batalhão de Infantaria de Selva, enviado à região para desempenhar a função de motorista do principal comandante do Exército na condução da operação, afirma que demorou para saber que o Dr. Lichini, a quem obedecia, era o tenente-coronel Sebastião Rodrigues de Moura, famoso como Major Curió, e que o Dr. Silva, um dos “doutores” que sempre o acompanhava, era o delegado Romeu Tuma. Ele seria reconhecido após a posse de Tuma como diretor-geral da Polícia Federal: “Era o Romeu Tuma, que chamávamos de cara de cavalo. Ele estava sempre por lá, garante” (Amaral, Merlino, 2011AMARAL, Marina; MERLINO, Tatiana. Ex-soldados dizem que Romeu Tuma participou de combate à guerrilha. Pública(São Paulo). 20 jun. 2011. Disponível em: Disponível em: https://apublica.org/2011/06/ex-soldados-dizem-que-romeu-tuma-participou-do-combate-a-guerrilha/ . Acesso em:14 jan. 2019.
https://apublica.org/2011/06/ex-soldados...
).

Abel Honorato, preso na região do Araguaia e encaminhado para a famigerada Casa Azul (sede do Departamento Nacional de Estradas e Rodagens), foi torturado e posteriormente obrigado a servir como mateiro para as Forças Armadas durante a guerrilha. Em seu depoimento à CNV também reconheceu Tuma como o Dr. Silva e afirmou que ele trabalhava em parceria com o Sebastião Curió nas ações do Araguaia (Comissão Nacional da Verdade, 2014COMISÃO NACIONAL DA VERDADE. Relatório Comissão Nacional da Verdade. Brasília. Presidência da República, 2014. v. 1. Disponível em:Disponível em:http://cnv.memoriasreveladas.gov.br/images/pdf/relatorio/volume_1_digital.pdf . Acesso em: 14 jan. 2019.
http://cnv.memoriasreveladas.gov.br/imag...
, p. 796).

Com a abertura dos arquivos do Deops/SP, novos documentos foram localizados e desmentiram várias declarações de que Tuma não tinha conhecimento sobre a localização de corpos de militantes sequestrados por agentes do complexo Deops/DOI/II Exército. Um documento enviado a Tuma, datado de 1978, comprova que ele tinha informações sobre os corpos de várias pessoas. Muitos foram enterrados na vala clandestina do Cemitério de Perus, tendo o laudo da causa mortis sido requisitado por Tuma e assinado por Harry Shibata. Em 2009, o Ministério Público de São Paulo moveria uma ação contra Tuma por ocultação de cadáver, que se encerraria com a sua morte (Barbosa, 2010BARBOSA, Adauri. Justiça abre ação contra senador Romeu Tuma por ocultação de cadáver na época da ditadura. O Globo (Rio de Janeiro). 27 maio 2010.. Disponível em:Disponível em:https://oglobo.globo.com/politica/justica-abre-acao-contra-senador-romeu-tuma-por-ocultacao-de-cadaver-na-epoca-da-ditadura-3001866 . Acesso em: 8 maio 2020.
https://oglobo.globo.com/politica/justic...
).

Com esta discussão sobre a figura de Romeu Tuma procuramos demonstrar dois fatores relevantes para o debate em questão: primeiro, que a função repressiva da Polícia Federal se encontrava mascarada por trás da atuação dos órgãos repressivos estaduais, constituindo-se o DPF em um dos pilares de poder dos militares durante a ditadura. Segundo, que Tuma, apesar de civil, representava na instituição os mesmos interesses dos militares envolvidos no sistema repressivo, e que sua escolha para a SR/DPF-SP se deveu à autoimagem que o delegado construiu, constituindo-se em uma figura mais palatável para os militares envolvidos no processo de transição e para a sociedade de modo geral. Não obstante, a ida de Tuma para a SR/DFP-SP foi marcada por vários atritos, bem como a sua indicação para a direção do órgão não foi isenta de problemas, sendo alvo de muita barganha política.

A direção-geral

A Polícia Federal foi conduzida, entre 1974 e 1985, pelo coronel linha-dura Moacir Coelho. O coronel não emplacou Tuma imediatamente na direção-geral da PF após a posse de Sarney. Antes disto, após as eleições para governadores em 1982, a sua grande preocupação era evitar a exoneração de Tuma do seu cargo de SR de São Paulo, pressão que vinha sendo exercida desde a posse do governador Franco Montoro. Já no começo de 1983, um grupo de intelectuais do PMDB, associados a alguns delegados liderados pelo chefe da polícia, Maurício Henrique Guimarães Pereira, pressionavam por sua exoneração. No entanto, Tuma foi nomeado para a SR/DPF-SP, e logo depois foi o próprio Maurício quem foi afastado da chefia da Polícia Civil de São Paulo. Em seu lugar entraria o delegado José Vidal Pilar Fernandes, amigo íntimo de Tuma (Costa, 2011COSTA, Sezostrys Alves. Crônica de um ex-soldado do Araguaia. Vermelho (São Paulo). 16 maio 2011. Disponível em: Disponível em: https://vermelho.org.br/2011/05/16/sezostrys-alves-da-costa-cronicas-de-um-ex-soldado-do-araguaia/ . Acesso em: 8 maio 2020.
https://vermelho.org.br/2011/05/16/sezos...
), deixando muito claro o seu trânsito e a sua capacidade de influência política junto a civis e militares.

Em 1986, após a posse de José Sarney e diante da possibilidade de sofrer retaliações do governo de São Paulo caso reassumisse suas funções no estado, Romeu Tuma começou a se movimentar no sentido de permanecer no poder sob a proteção dos militares. Ele já tinha conhecimento das pressões que eram exercidas sobre o ministro da Justiça, pelo PMDB de São Paulo, para exonerá-lo da SR/DPF/SP, mas a sua boa circulação nos meios políticos e a sua cumplicidade com os militares permitiria não só a sua permanência na Superintendência Regional, ainda durante o início da gestão do presidente Sarney, como a sua posterior promoção a diretor-geral. Tuma não havia sido a primeira escolha de José Sarney, pois em substituição ao coronel Moacyr Coelho foi nomeado o coronel Luiz Alencar Araripe, demonstrando claramente como a PF sobreviveu à transição como um dos alicerces de proteção dos militares na nova democracia. O coronel havia sido mais um destacado nome da linha dura. Quando estava na condução da PF foi pressionado para evitar a nomeação de superintendentes que fossem oriundos da repressão, especialmente aqueles cujos nomes haviam sido revelados pelo projeto Brasil: Nunca Mais. Este era o caso de João Batista Xavier, cotado para a Superintendência Regional do Ceará. Logo após o conhecimento de que Xavier seria nomeado, foram realizadas várias denúncias de que ele esteve envolvido com a tortura durante a ditadura. Fernando Lyra, responsável pelo Ministério da Justiça, tentou demover o coronel desta nomeação e não conseguiu (Confiança torturada, 1986CONFIANÇA TORTURADA. Veja(São Paulo). 8 jan. 1986. Disponível em: Disponível em: http://bnmdigital.mpf.mp.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=DOC_BNM&­PagFis=9877&Pesq=Romeu%20Tuma . Acesso em: 7 maio 2020.
http://bnmdigital.mpf.mp.br/DocReader/Do...
). Dessa forma, logo após a nomeação de Xavier, Lyra se viu obrigado a passar por cima da autoridade de Araripe, que era seu subordinado, e exonerar o novo SR do Ceará. Como protesto, o coronel Araripe pediu a sua demissão do cargo, permanecendo na PF pouco menos de um ano (22 de março de 1985 a 13 de janeiro de 1986). Com a sua saída foi aberta uma nova rodada de negociações sobre a direção do órgão (Luiz de Alencar Araripe, 2020LUIZ DE ALENCAR ARARIPE. In: Dicionário Histórico-Biográfico Brasileiro. Rio de Janeiro: Centro de Pesquisa e Documentação Contemporânea, 2020. Disponível em:Disponível em:http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-biografico/luis-de-alencar-araripe . Acesso em: 8 maio 2020.
http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionari...
).

Havia dois grandes desafios para que Tuma chegasse à direção do DPF. Primeiro, a incansável oposição do ex-ministro Fernando Lyra. Segundo, a pressão dos militares, exigindo que o posto se mantivesse nas mãos de um militar. Beatriz Kushnir afirma que a ida de Tuma para a direção-geral foi uma indicação do próprio presidente José Sarney. Em depoimento à autora, o próprio Fernando Lyra desmentiu os boatos de que teria sido ele o responsável pela aprovação de Tuma (Kushnir, 2012KUSHNIR, Beatriz. Cães de guarda: jornalistas e censores, do AI-5 à Constituição de 1988. São Paulo: Boitempo 2012., p. 79). Em depoimento transcrito no livro de Percival Souza, Autópsia do medo, Tuma afirma que foi o ex-ministro da Justiça do governo Figueiredo, Ibraihm Abi-Akel, quem teria lhe avisado que o presidente Sarney o queria na direção-geral da Polícia (Souza, 2000SOUZA, Percival. Autópsia do medo. Vida e morte do delegado Sérgio Paranhos Fleury. Rio de Janeiro: Editora Globo, 2000., p. 60), não sem se gabar do fato de que contaria com a aprovação de Lyra: “No Ministério da Justiça, em Brasília, o ministro Fernando Lyra me elogiou e disse que havia recebido pressões do professor Michel Temer e do advogado José Carlos Dias para que eu não fosse diretor da Polícia Federal no primeiro governo pós-abertura” (Souza, 2000SOUZA, Percival. Autópsia do medo. Vida e morte do delegado Sérgio Paranhos Fleury. Rio de Janeiro: Editora Globo, 2000., p. 60). Conforme visto, esta informação não condiz com as declarações emanadas pelo então ministro da Justiça, quando pressionado para retirar da Polícia Federal pessoas vinculadas à repressão, ainda do ano de 1986. Lyra informou que nada poderia fazer em relação à nomeação de Tuma e que descobriu isto quando tentou, ainda no início de sua gestão, afastar o delegado Romeu Tuma da SR de São Paulo (Leitão, 1986LEITÃO, Miriam. O caçador de manchetes. Jornal do Brasil (Rio de Janeiro). 6 abr. 1986. Disponível em: Disponível em: https://flitparalisante.wordpress.com/2007/07/09/do-sepultamento-da-nossa-policia-1983/ . Acesso em: 8 maio 2020.
https://flitparalisante.wordpress.com/20...
).

A trajetória de Tuma até que chegasse à direção do DPF foi bastante turbulenta. No começo do ano de 1983 já tinha havido pressão da própria Polícia Civil de São Paulo, então sob responsabilidade de Franco Montoro, para tirar Tuma da Superintendência de São Paulo (Tuma Júnior, 2013TUMA Júnior, Romeu. Assassinato de reputações: um crime de Estado. Rio de Janeiro: Toobooks, 2012., p. 369). No começo da Nova República, este intento foi retomado e foi organizado um movimento na Câmara, pelo então deputado petista Aírton Soares, que reivindicava a exoneração de Tuma. Por trás destas manobras estariam o então governador Franco Montoro, o vice-governador Orestes Quércia, e o secretário de Segurança Pública, Michel Temer. No entanto, Tuma sabia muito bem como se articular no meio político e construiu sua base de apoio: “personalidades de muito respeito, com livre trânsito e muita credibilidade na Nova República, têm prestado (estariam prestando) ao gabinete do novo ministro da Justiça, Fernando Lyra, informações positivas a respeito do delegado Romeu Tuma” (Agência Estado, 1985AGÊNCIA ESTADO. Os políticos discutem a permanência de Tuma. O Estado de S. Paulo (São Paulo). 15 mar. 1985.). Esta pressão por sua permanência seria uma manobra dos amigos de Tuma para mantê-lo no cargo, em resposta ao movimento que havia sido criado para removê-lo. De acordo com Francisco Garisto, agente aposentado do DPF, a ida de Tuma para a direção da PF teria ocorrido por influência de George Gonzales, amigo pessoal do presidente João Baptista Figueiredo. Este processo teria ocorrido em função de uma rede de influências construída pela capacidade de Tuma de repassar informações e influenciar determinadas decisões: “era Tuma quem ia às empresas e pressionava a compra ou venda de determinados equipamentos, a indicação de pessoas etc.” (Garisto apud Rocha, 2004ROCHA, Bruno Lima. A Polícia Federal após a Constituição de 1988: polícia de governo, segurança de Estado e polícia judiciária. Dissertação (Mestrado em Ciência Política), Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, 2004., anexo I). Uma análise do conjunto das leituras, entrevistas e reportagens nos permite afirmar que se tratava de alguém com grande capacidade de influir nas decisões políticas, seja em termos de troca de informações ou barganhas, tanto com os militares, quanto com a elite política. Desta forma, na prática, a sua nomeação enquanto civil não significaria nenhuma mudança no perfil institucional da Polícia Federal. O grupo Brasil Nunca Mais criticou duramente sua indicação, alegando se tratar de um nome reconhecidamente vinculado à repressão política, mas não à estrutura institucional. E, naquela altura, Tuma já havia construído a sua imagem de bom moço, sendo sua indicação bem recebida por setores da imprensa que o isentavam destas responsabilidades (Romeu Tuma, 2020ROMEU TUMA. In: Dicionário Histórico-Biográfico Brasileiro. Rio de Janeiro: Centro de Pesquisa e Documentação Contemporânea, 2020. Disponível em:Disponível em:http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-biografico/tuma-romeu . Acesso em: 8 maio 2020.
http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionari...
). Sarney o teria indicado em função da sua própria ausência de legitimidade, que o fez se apoiar nos militares para garantir a sua governabilidade (Rocha, 2004ROCHA, Bruno Lima. A Polícia Federal após a Constituição de 1988: polícia de governo, segurança de Estado e polícia judiciária. Dissertação (Mestrado em Ciência Política), Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, 2004., p. 115). Como o poder dos militares também se encontrava em declínio e concentrado em determinados redutos, a exemplo da PF e do SNI, era natural que estes órgãos fossem alvos de disputa, assim como a sua capacidade de controlar setores estratégicos. Desse modo, apesar de não assegurarem um militar, a presença de Tuma na Polícia Federal no primeiro governo civil ainda refletiria “a capacidade decisória do Exército Brasileiro em assuntos de segurança interna” (Rocha, 2004ROCHA, Bruno Lima. A Polícia Federal após a Constituição de 1988: polícia de governo, segurança de Estado e polícia judiciária. Dissertação (Mestrado em Ciência Política), Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, 2004., p. 115).

Considerações finais

A trajetória de Tuma nos permite afirmar que mudar a maneira de compreender e lidar com a sociedade não seria uma tarefa fácil para a Polícia Federal na nova democracia, na medida em que ela foi um projeto do regime militar, pensada para ele e por ele, e o fim do regime infelizmente não significou uma mudança na maneira de pensar e agir de boa parte dos órgãos de segurança e das polícias do país. Muito do que foi praticado e da maneira como foi praticado ainda permaneceu, talvez com outra roupagem ou outra justificativa, pois mudou o regime, mas em princípio não mudou o capital humano, os policiais, os delegados, a mentalidade e a cultura de quem a dirigia.

Desta forma corroboramos as perspectivas de Torelly e Abrão, de que para a promoção da institucionalização democrática é necessário promover uma efetiva reforma das instituições, sobretudo as responsáveis pelo poder coercitivo. Mas no Brasil, considerando a capacidade de controle dos militares sobre o ritmo da transição, resta claro que este seria um momento inviável para a promoção destas reformas, colocadas também por Cuya como uma condição sine qua non para a realização da Justiça de Transição. O Brasil entrou no regime democrático depois de uma transição tão negociada, que não conseguiu resolver politicamente a permanência de determinadas práticas consolidadas durante o regime militar. Por fim, afirmamos que, para além da questão da transição, outros fatores tornam a reforma dos órgãos coercitivos muito mais complexa, seja em regimes autoritários, seja em democracias. No Brasil não foram consideradas de imediato a extinção do SNI ou a reforma da Polícia Federal, no máximo o Poder Executivo se articulou para definir o seu comando sendo, na prática, constrangido pelo poder dos militares. Em relação à sociedade civil, houve apenas a oposição do Grupo Brasil Nunca à indicação de Tuma, que não necessariamente implicava um projeto da sociedade política ou civil para uma alteração mais profunda da estrutura do DPF, o que nos leva à conclusão de que a agenda destes órgãos é pautada pelo Poder Executivo e que a interdependência das instituições dos setores de segurança faz com que as alterações institucionais sejam realizadas em função da correlação de forças destes mesmos órgãos, em disputa. Isto exemplifica o que diz Zegart, quando afirma que o desenho inicial deste tipo de órgão reflete o ordenamento institucional e as disputas envolvendo as burocracias relacionadas ao setor de defesa e segurança no momento de sua criação, com predominância da decisão do Executivo. O problema maior é que os custos de reversão destes desenhos institucionais são muito altos e estas culturas acabam por prevalecer ao longo do tempo. Exemplo incontestável deste autoritarismo continua sendo a atuação da PF no avançar do século XXI. Mas esta é outra história.

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  • 1
    É preciso considerar que a agenda que guiava os debates sobre a transição durante a última gestão do governo da presidente Dilma Roussef em nada se aproxima da atual política que visa desmobilizar os trabalhos relacionados à Justiça de Transição e desqualificar todo o debate em torno da ditadura.
  • 2
    Esta comissão legislativa foi a primeira a investigar crimes da ditadura (1964 e 1985), viabilizada pela atuação da prefeita de São Paulo Luiza Erundina.
  • 3
    Disponível em: https://www.documentosrevelados.com.br/wp-content/uploads/2015/04/infanciaroubada_2aparte.pdf.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Abr 2022
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2022

Histórico

  • Recebido
    02 Set 2020
  • Aceito
    17 Dez 2021
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